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Essa seção apresenta uma análise dos fatores associados ao uso da Internet e examina como esses afetaram a probabilidade de seu uso. Em especial, investigou-se se a presença ou ausência de deficiência auditiva, controlando para todos os demais fatores sociodemográficos, afetaria a probabilidade de uso da Internet e qual seria o nível dessa influência. Para esse fim, foram utilizadas as estimativas de uma série de regressões logísticas (Tabela 5).

TABELA 5

Surdez ou deficiência auditiva -0,384***

(0,0170)

Constante 1,471*** 1,474***

(0,00519) (0,00520)

Observações totais 2.757.288 2.757.288

Pseudo R-quadrado 0,378 0,378

Os números relatados são os coeficientes logísticos. Os números entre parênteses são os desvios padrões. *** p<0,01, ** p<0,05, * p<0,1

Uma categoria foi omitida de variáveis como faixa etária, área e grau de instrução (14 a 29 anos, Montevidéu e Ensino Primário completo ou incompleto), servindo como linha de base para a variável. Todas as comparações foram feitas com relação àquela categoria.

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Em consonância com a metodologia de Dobransky e Hargittai (2006), foram geradas estimativas para um modelo sem a condição de deficiência auditiva para estabelecer o relacionamento entre as variáveis relativas às desigualdades digitais “tradicionais” e o uso da Internet. Somente então foram criadas estimativas para um segundo modelo que incluiu a variável de interesse (deficiência auditiva).

Para facilitar a leitura, os resultados das regressões logísticas foram transformados em estimativas dos efeitos marginais das variáveis explanatórias na probabilidade de se observar o fenômeno estudado (uso da Internet). A Tabela 6 apresenta os efeitos marginais, que devem ser entendidos como o grau em que a probabilidade de usar a Internet é alterada como resultado de uma mudança unitária em cada variável explicativa, controlando para todas as outras.

A tabela mostra que todas as variáveis do primeiro modelo foram estatisticamente significativas, com p<0,01. Pessoas mais velhas, afrodescendentes e residentes de áreas rurais e assentamentos irregulares (Slum) indicaram menor probabilidade de uso da Internet; por sua vez, aquelas com maior grau de instrução e com emprego revelaram maior probabilidade de usá-la.

Entretanto, o resultado mais importante do segundo modelo foi que, mesmo no controle para todos os outros fatores socioeconômicos, as pessoas com deficiência, ainda assim, indicaram menor probabilidade de ter usado a Internet.

Os resultados assinalam que a faixa etária e o grau de instrução foram as duas variáveis que afetaram o uso da Internet em ambos os modelos. Indivíduos com 65 anos ou mais de idade apresentaram probabilidade 53% maior de ter usado a Internet do que pessoas com Ensino Primário completo ou incompleto. Depois de controlar para essas variáveis, a presença de deficiência auditiva teve um efeito discreto, mas significativo, no uso da Internet. Indivíduos com deficiência auditiva revelaram 5% menos chance de uso da Internet do que pessoas sem deficiência auditiva.

PORTUGUÊS TABELA 6

EFEITOS MARGINAIS MÉDIOS

Modelo 1 Modelo 2

Masculino -0,00614*** -0,00619***

(0,000463) (0,000463) Faixa etária

30 a 49 anos

-0,243*** -0,243***

(0,000550) (0,000550)

50 a 64 anos -0,370*** -0,369***

(0,000544) (0,000544)

65 anos ou mais -0,532*** -0,530***

(0,000632) (0,000638)

Afrodescendente

-0,0164*** -0,0165***

(0,000698) (0,000698) Área

Urbana

-0,0972*** -0,0972***

(0,000479) (0,000479)

Rural -0,159*** -0,159***

(0,000876) (0,000876)

Assentamentos irregulares (Slum) -0,0894*** -0,0892***

(0,000845) (0,000845) Grau de instrução

Ensino Secundário inferior 0,192*** 0,191***

(0,000478) (0,000478)

Ensino Secundário 0,300*** 0,300***

(0,000584) (0,000584)

Ensino Superior 0,446*** 0,445***

(0,000877) (0,000877)

Empregado 0,0529*** 0,0527***

(0,000514) (0,000514)

Surdez ou deficiência auditiva -0,0523***

(0,00232)

Observações totais 2.757.288 2.757.288

Os números relatados são os efeitos marginais. Os números entre parêntesis são os desvios padrões. *** p<0,01, ** p<0,05

Uma categoria foi omitida de variáveis como faixa etária, área e grau de instrução (14 a 29 anos, Montevidéu e Ensino Primário completo ou incompleto), servindo como linha de base para a variável. Todas as comparações foram feitas com relação àquela categoria.

Fonte: ELPS 2011, elaborado pelo autor.

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CONCLUSÕES

O presente artigo analisou os níveis de uso da Internet entre pessoas com deficiência auditiva no Uruguai. Para atingir esse fim, ajustaram-se vários modelos de logística binária para estimar a probabilidade de um indivíduo ter sido usuário de Internet no Uruguai no período de 2012 a 2013.

Os resultados demonstram que a porcentagem de pessoas com surdez que usou a Internet foi significativamente menor do que a de pessoas sem deficiência: 57% da população em geral contra 21% de pessoas com deficiência auditiva. No entanto, ao controlar para grau de instrução, idade, área, emprego, gênero e etnia, o efeito da deficiência na probabilidade de uso da Internet, apesar de estatisticamente significativo, foi bastante reduzido. Em outras palavras, as desigualdades socioeconômicas, especialmente, quanto ao ensino formal, foram tão ou ainda mais relevantes para determinar o uso da Internet entre pessoas com deficiência em comparação com aquelas sem deficiência.

Em contraste com os resultados de Dobransky e Hargittai (2006), nos Estados Unidos, a presença de deficiência auditiva continuou a afetar a probabilidade de uso da Internet mesmo depois de controlar para características socioeconômicas e demográficas. Esses números apontaram para a necessidade de cautela ao extrapolar-se resultados de países desenvolvidos para contextos em desenvolvimento. É preciso, entretanto, mais estudos para avaliar se tais diferenças são produto de diferentes níveis de desenvolvimento e penetração da Internet, ou se há a contribuição de algum fator cultural ou local (por exemplo, diferentes níveis de desenvolvimento da língua de sinais naquele local).

Assim, deve-se levar em conta a hipótese de que o fato de pessoas com deficiência terem, em média, menor grau de instrução do que aquelas sem deficiência, reforça diferenças de acesso e uso dessa tecnologia. Para as faixas etárias compostas por pessoas mais velhas, no Uruguai, até o Ensino Secundário estava fora de alcance. Apesar de a oferta educacional ter aumentado, apenas uma escola de Ensino Secundário para o país inteiro parece ser insuficiente. Os autores acreditam que mais do que a exclusão digital, a população com surdez uruguaia enfrenta uma exclusão educacional, que é ainda mais problemática e afeta gravemente suas chances de usar a Internet – muito mais do que a deficiência em si. Além disso, as evidências sustentam que, no contexto do Uruguai, as melhores políticas públicas de inclusão digital para pessoas com surdez são educacionais: a expansão da educação básica e formal.

Finalmente, mais pesquisas precisam ser conduzidas com outras populações com deficiências no Uruguai. Pessoas com deficiência visual, cognitiva ou com mobilidade reduzida também teriam menor probabilidade de usar a Internet do que a população em geral? Ou será que a condição de minoria linguística da população com surdez é o fator determinante? Portanto, novos estudos qualitativos precisam ser desenvolvidos para explorar como indivíduos com deficiências vivenciam a Internet, assim como os benefícios e obstáculos que encontram on-line.

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AGRADECIMENTOS

Este estudo usou dados da Pesquisa Longitudinal de Proteção Social. Os autores agradecem ao Banco de Previdência Social (Banco de Previsión Social - BPS), proprietário intelectual do levantamento, pela autorização para usar seu banco de dados anonimizados. Todos os resultados deste artigo são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem as opiniões do BPS ou o envolvem de qualquer maneira.

FINANCIAMENTO

O presente artigo foi extraído do projeto de pesquisa “Acesso à Internet e à mídia por pessoas com deficiência” (Internet and media access for people with disabilities), financiado pelo Instituto Carolan de Pesquisa e Universidade Católica do Uruguai.

REFERÊNCIAS

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