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DEPOIS DA FESTA: A IMAGEM COMO LEGADO

Após mais de dois anos da realização de um megaevento como uma Copa do Mundo no Brasil, e em especial, em Fortaleza, que, pela primeira vez, recebeu algo do gênero, tem-se condições de identificar os efeitos do Mundial de 2014 na Capital. Estes se deram, seja em função do que foi construído para o evento na Cidade ao longo de sete anos de preparação, ou seja, as obras contidas na Matriz de Responsabilidades, seja, a partir das imagens que o poder público construiu da Cidade no contexto do Mundial. Analisando de que forma se deu o Mundial e como os turistas que vieram à Copa construíram a sua visão sobre Fortaleza, assim como constatando o que, de fato, se incorporou ao cotidiano da Capital, é possível ter noção destes efeitos.

Neste sentido, vale ressaltar, até o mês de setembro de 2016, das obras previstas para o Mundial, somente a Arena Castelão (finalizada em dezembro de 2012) e o Terminal Marítimo de Passageiros (concluído em janeiro de 2015) foram entregues totalmente à Cidade. O uso destes equipamentos será analisado neste capítulo, entretanto, não é possível precisar quais os efeitos urbanísticos de outras obras de mobilidade previstas para o Mundial por estas não estarem finalizadas, assim como não é possível visualizar os efeitos da ampliação do Terminal do Aeroporto Internacional Pinto Martins, também ainda inconcluso. A avaliação geral da presente pesquisa, em linhas gerais, aponta para o fato de que o conjunto destas obras inacabadas, além de centralizar ainda mais investimentos em áreas da Cidade já muito beneficiadas em termos de infraestrutura urbana, ampliam nestas a valorização do espaço urbano já praticada pelo capital privado.

Quanto aos efeitos da Copa em relação ao turismo em Fortaleza, o Mundial na Capital foi uma estratégia do poder público local de incentivo à internacionalização do setor na Cidade. Esta visão está presente nas ações e falas de agentes públicos, em documentos, vídeos, banners, folders, posters, placas, ou seja, no aparato de comunicação criado para o evento, assim como está presente na mídia local como uma forma de reverberação do discurso oficial. Além disto, a prioridade em relação à viabilização do evento, com a conclusão do estádio antes do prazo estabelecido em detrimento da conclusão das obras de mobilidade, por exemplo, revelam que possíveis legados

urbanísticos não foram tão prioritários como a construção de Fortaleza como destino turístico.

A análise da imagem construída pelo poder público junto aos turistas da Copa foi objeto de pesquisa, tanto em nível federal, como estadual. O entendimento dos resultados é importante para a avaliação de quais imagens a organização da Copa no Brasil, e em particular no Ceará, causaram. Os dados extraídos destes levantamentos estão expressos em relatórios oficiais juntamente com os resultados econômicos e políticos da realização da competição, tentando, em geral, justificar os recursos aplicados e apresentando uma imagem de sucesso na maior parte das ações voltadas à Copa no País.

Os relatórios que embasam e serão analisados no presente capítulo são: 1) o Balanço Final para as Ações da Copa do Mundo da FIFA Brasil 2014 (6º

Balanço), publicado em dezembro de 2014 pelo Ministério dos Esportes,

responsável da União pela realização da competição em nível nacional; 2) Os

estudos de demanda turística Internacional e doméstica, realizados,

respectivamente, pela FIPE e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em 2014; 3) o Relatório de Indicadores Turísticos 2015 - Secretaria de Turismo do Ceará (SETUR); e 4) o documento da Secretaria do Turismo do Estado do Ceará intitulado Copa do Mundo FIFA 2014: pesquisas de fluxo e de perfil da

demanda turística para o Ceará, também publicado pela SETUR em julho de

2014.

Note-se que tal material é constituído de documentos oficiais que embasam um discurso estatal a respeito do que foi o Mundial no País e no Ceará, ou seja, as imagens que o poder público afirma como consolidadas com a Copa 2014. Como se verá, os resultados oficiais, além de apresentar os investimentos realizados e os não concluídos, tentam demonstrar que a Copa das Confederações de 2013 e o Mundial foi exitoso quanto à promoção da imagem do Brasil e suas cidades-sedes para o mundo, a despeito do discurso contra-hegemônico que surgiu das manifestações existentes em 2013 e 2014 e os contrausos (LEITE, 2004) verificados durante tais eventos.

5.1. A Copa de 2013 e a “Copa das Copas?

Como se afirmou, a Copa das Confederações é uma competição continental de futebol promovida pela FIFA que serve desde 2009 como uma espécie de evento-teste para a realização da maior competição da FIFA no território que a sediará. Reúne ao todo oito equipes: os campeões das confederações regionais, o campeão da última Copa do Mundo e o país sede da Copa que se seguirá. O torneio contempla uma série de 16 jogos com fase de grupos e eliminatórias.

Na edição realizada no Brasil em 2013, seis cidades abrigaram os jogos da competição: Fortaleza (CE), Recife (PE), Salvador (BA), Brasília (DF), Belo Horizonte (MG) e Rio de Janeiro (RJ). A escolha destas cidades se deu em 2011 e foi influenciada pelo estágio avançado em que se encontrava nestas sedes o cumprimento do cronograma das reformas de estádios e das obras de infraestrutura em geral previstas.

Por ser um evento com menor tradição, a Copa das Confederações atrai, geralmente, um público bem inferior do que o de uma Copa do Mundo, cerca de 25% menor (ERNST; YOUNG, 2010). Mesmo assim, para a FIFA, a edição brasileira do evento foi muito exitosa, atraindo uma média de 50 mil pessoas109 aos jogos realizados. No entanto, o Banco Central do Brasil (BC) afirma que as despesas dos estrangeiros no país no mês de realização da competição foram 2% inferiores em relação a anos anteriores110. Esta relação talvez se explique, sobretudo, porque o público do evento foi constituído principalmente por brasileiros, divididos entre os moradores dos locais de competição (73,6%) e os que atravessaram o país para assistir aos jogos (23,5%), tendo a presença de somente 2,9% de visitantes estrangeiros, de acordo com dados oficias do Portal da Copa (2014)111. Portanto, a maior parte das divisas econômicas diretamente geradas com a realização da Copa das Confederações 2013 foi oriunda de gastos dos próprios brasileiros motivados pelo torneio.

109 Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/esportes,fifa-nao-cita-protestos-em-

relatorio-da-copa-das-confederacoes,1166642,0.htm. Acesso em 14/05/14.

110 Disponível em: <http://oglobo.globo.com/economia/copa-das-confederacoes-nao-aumentou-

turismo-no-brasil-em-junho-9139844> Acesso em 14/05/2014.

111 Disponível em: http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/copa-das-confederacoes-cerca-de-

Este fato, apontado pelo próprio Governo Federal, liga-se ao dado revelado em abril de 2014 pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas - FIPE de que foram cerca de R$ 20 bilhões movimentados durante o período da competição, resultado de R$ 11 bilhões originários dos gastos de turistas e dos Comitês Organizadores Locais (COLs) e R$ 9,7 bilhões de incremento no PIB por esta movimentação de recursos112.

Segundo o levantamento realizado pela Câmara Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e a SPC Brasil (2013)113, que entrevistou torcedores nas saídas de todos os locais de jogos, o interesse e disposição do brasileiro em relação ao evento e a movimentação de recursos se deu por este ser um evento internacional de grande porte - esta foi a resposta dada por 40% dos 625 entrevistados. Este dado denota que parte dos brasileiros enxerga na dimensão do evento uma oportunidade que deva ser valorizada, em especial, com sua presença aos jogos na "vitrine mundial" que é a competição. Entretanto, como se verá no capítulo quarto, tal característica foi encarada por outra parcela da população como oportunidade de denúncia da situação socialmente desigual no Brasil. Isto foi o que se observou nas diversas manifestações que tomaram o território brasileiro em junho de 2013 (CASTELLS, 2013).

Por outro lado, como forma de resposta governamental às tensões políticas existentes na Copa das Confederações em 2013, o slogan "Copa das Copas" foi amplamente difundido pelo governo federal em suas campanhas publicitárias relacionadas ao Mundial. Isto se deu porque, além das manifestações em 2013, meses antes do evento, algumas páginas de redes sociais via internet difundiram nas mídias sociais a hashtag #naovaitercopa. Apesar disto, a realização de uma Copa no País se deu e, como será visto no último capítulo, um dos aspectos mais exaltados pelos turistas estrangeiros ou brasileiros em suas visitas às cidades-sede, de acordo com o Ministério dos Esportes 2014), foi o aspecto "humano". Em tal assertiva está implícita a

112 Disponível em http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/copa-das-confederacoes-rendeu-r-

97-bilhoes-ao-pib-brasileiro. Acesso em 20/02/16

113 Disponível em: http://pt.slideshare.net/spcbrasil/spc-brasil-

avaliação positiva a respeito da interação dos visitantes com os habitantes das cidades-sede em geral.

As grandes manifestações prometidas para a competição, aos moldes de junho de 2013, não ocorreram, em parte pela "operação de guerra" montada pelo Governo Federal, que coibia com força maior que em 2013 a realização de atos políticos, em parte também, pela dispersão que o movimento do ano anterior sofreu após o atendimento de algumas demandas pelo poder público. Além destas questões, há o histórico envolvimento emocional da população brasileira com uma Copa em si.

Dentro de campo o evento foi marcado por uma Copa de muitos gols (171 a todo, o maior número da história das Copas, junto com o Mundial da França de 1998), obtendo a média de 2,67 gols por partida, o que, por si só, contribuiu para a atratividade da competição em relação ao público em geral. O total de pagantes nos estádios, segundo dados do Ministério do Esporte, foi de 3,43 milhões de pessoas nas 64 partidas realizadas no campeonato, alcançando a segunda maior média de público da história da competição (53.592 pessoas por jogo114), ficando atrás da média da Copa de 1994, realizada nos EUA, onde, em geral os estádios possuíam capacidade bem maior que a das arenas brasileiras. Somente um terço do total dos 11 milhões de pedidos de ingressos para a competição foi vendido. Isto se deu porque, para a aquisição de entradas às partidas mais disputadas, houve a realização de sorteios do direito de compra entre os solicitantes.

Para aqueles que não conseguiram os ingressos para os jogos, a FIFA, juntamente com as prefeituras das cidades-sede, organizam desde 2006 na Copa da Alemanha, eventos que são os FIFA Fan Fests, os quais buscam aproveitar tal público em espaços de acesso gratuito onde os jogos são transmitidos em telões e abrigam stands dos patrocinadores da competição no país, transformando-se em mais um espaço vendido a patrocinadores tendo em vista a Copa realizada.

Nas primeiras Fan Fests, realizadas em 2006 pela FIFA na Alemanha, obteve-se a marca de 18 milhões de pessoas de público presente. Na África do

114 Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/esportes/copa/2014/copa-tem-segunda-