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3 DA AÇÃO DE CLASSE À AGREGAÇÃO PROCESSUAL

3.5 DESAFIOS DA AGREGAÇÃO PROCESSUAL: A AGREGAÇÃO ÓTIMA

O desafio da agregação processual, de uma maneira geral, é encontrar o ponto ótimo de agregação, isto é, quais são as circunstâncias dadas pelo direito material que tornam necessária e apropriada a técnica de agregação processual, de forma a evitar julgamentos repetitivos sobre a questão comum à categoria, sem implicar gravames à autonomia individual. O indivíduo deve poder narrar a sua história pessoal que pode não coincidir ou contrariar a história do grupo.

A agregação ótima, segundo Tidmarsh e Trangsrud398, é aquela que permite minimizar os custos

futuros de novos processos individuais e coletivos repetitivos, bem como minimizar os custos atuais do saneamento, do julgamento e da satisfação dos múltiplos processos individuais e coletivos pendentes em juízo, os quais obstam à racionalização da administração da justiça.

De igual modo, no tocante ao escopo jurídico, a agregação ótima também visa a tratar casos iguais com igualdade. A agregação visa a garantir que os indivíduos recebam a sua parte na compensação a eles devida, bem como que essa parte seja equitativa ou paritária em relação aos demais indivíduos que, porventura, não são autores na referida demanda judicial. De igual modo, visa a evitar o conflito prático de decisões, quando a atuação de um indivíduo retira a eficácia do provimento pretendido por outro indivíduo, com relação ao bem controvertido.399

Para alcançar esse ponto ótimo, todas as técnicas de agregação antes mencionadas – se preenchidos os pressupostos legais – podem ser utilizadas para essa finalidade. Se uma situação de direito substancial, que é suscetível à agregação processual, escapar de uma das técnicas, ela

398 TIDMARSH, TRANGSRUD, 2002, p. 10. 399 Ibidem, p. 11

pode ser recapturada por outra técnica de agregação, também aplicável, até alcançar um grau de ótimo de agregação no sistema jurídico. As técnicas podem ser combinadas, alternadas etc.

Não há prévia definição do grau ótimo de agregação, contudo, existem critérios que podem auxiliar o intérprete a aferir as hipóteses de agregação e a ensejar a otimização dessa técnica. Adianta-se que é a unitariedade ou paridade dada pelo direito substancial que permite identificar as hipóteses suscetíveis de agregação processual e as técnicas necessárias e idôneas para tanto.

Outro não é o entendimento no sistema jurídico brasileiro. São os contornos da relação jurídica de direito substancial que determinam os fenômenos de pluralidade de partes, do litisconsórcio, da intervenção de terceiros, do concurso subjetivo e, por fim, da tutela coletiva e agregada. O direito substancial define não só a necessidade da técnica, como a própria técnica adequada.400

A otimização, antes mencionada, faz, por sua vez, uma inequívoca remissão ao postulado da proporcionalidade e ao justo equilíbrio que vigem no direito processual civil brasileiro. A forma, isto é, a técnica processual, deve ser necessária e adequada para atingir os escopos do processo e, dentre eles, o escopo jurídico401, a saber, a atuação concreta e específica da norma

de direito substancial, com eficiência, economia processual, uniformidade e coerência.

Segundo Samuel Meira Brasil Jr402, a instrumentalidade nada mais é do que sede material do

princípio da proporcionalidade no direito brasileiro. Trata-se do reconhecimento da relação meio (processo) e fim (direitos) que orienta a aplicação das normas de direito processual. O importante é alcançar o escopo pretendido pelo processo, com o alcance dos resultados práticos postulados, sem prejuízo aos demais valores processuais concorrentes no sistema jurídico.

Em obra clássica do direito processual civil brasileiro, mencionada por Brasil Jr403, Ada

Pellegrini Grinover, Antônio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco assinalam,

400 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo: influência do direito material sobre o processo. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 108-109. No mesmo sentido, Liebman também aponta que é o direito substancial que determina a figura das ações concorrentes e sua disciplina jurídica. (Cf. LIEBMAN, 2007, p. 212). 401 Escopo jurídico, segundo Cândido Rangel Dinamarco, consiste na atuação da vontade concreta da lei, percebida essa última, no entanto, em conformidade à tendência de universalização da tutela jurisdicional e da adaptabilidade da técnica processual. Há que se observar uma interpretação dinâmica da lei, que não pode parar no tempo do legislador, com a manutenção do espírito individualista e arredio à molecularização do processo (Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 217).

402 BRASIL JR, 2007, p. 100. 403 Ibidem, p. 101.

com originalidade, a questão da necessidade e da adequação da técnica processual. O problema da forma processual somente se resolve pela resposta a duas questões. Vejamos quais são elas:

...problema das formas do próprio procedimento, o qual se desdobra em duas questões distintas: a) são necessárias as formas procedimentais? b) em caso de resposta afirmativa, qual a forma mais adequada para atingir o escopo do processo, em uma

época determinada e segundo dadas condições?404

Marcelo José Magalhães Bonício405, a seu turno, ao estudar a proporcionalidade, salienta a

correlação entre o princípio da proporcionalidade e da equidade processual. Trata-se da proteção da correta administração da justiça e da racionalidade de sua atuação concreta.

Carlos Alberto Alvaro de Oliveira406, também em obra específica sobre o tema, salienta a necessidade de se emprestar a maior efetividade possível ao direito processual no desempenho de sua tarefa básica de realização do direito material e outorga da justiça. A adequação da técnica processual às necessidades substanciais deve favorecer o grau máximo de efetividade.

Por fim, Carlos Alberto de Salles407 é preciso ao afirmar a necessidade de adaptação do design

procedimental às necessidades e especificidades do direito material. O processo torna-se o ponto de chegada, após uma ponderação sobre as necessidades e as especificidades materiais.

No tocante à agregação processual, as assertivas, antes citadas, não são mais que verdadeiras. Na agregação processual, o processo é o ponto de chegada. Isso não quer dizer a liberdade total do método, a liberdade das formas, a atecnia processual. A forma não é livre, o que ocorre é que existem várias formas, várias técnicas e vários instrumentos processuais, possíveis e disponíveis para a resolução das controvérsias de massa. Justamente por isso é que são os contornos da relação de direito substancial que determinam a necessidade e a adequação de uma forma, técnica e instrumento processual, da combinação de formas, da alternância das formas.

404 CINTRA, GRINOVER, DINAMARCO, 2009, p. 285.

405 BONÍCIO, Marcelo José Magalhães. Proporcionalidade e processo: a garantia constitucional da proporcionalidade, a legitimação do processo civil e o controle das decisões judiciais. São Paulo: Atlas, 2006, p. 35.

406 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. Do formalismo no processo civil: proposta de um formalismo-valorativo. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 134-135.

No sistema jurídico estadunidense, Frederick Schauer408 ressalta que a forma é necessária para

a previsibilidade do procedimento. Constitui, no entanto, uma mera presunção, que pode ser afastada ou adaptada quando inadequada ou desnecessária ao alcance dos escopos substanciais.

Muito bem. É, sob esse contexto, diga-se compartilhado entre os sistemas estadunidense e brasileiro, que se busca as hipóteses ou pontos ótimos em que a agregação constitui a técnica necessária e adequada à atuação do direito substancial, sem prejuízo à autonomia individual.

Esse ponto ótimo reside em equilibrar o que individual e o que é coletivo e, portanto, agregável. Por essa razão, esse será o objeto da próxima seção: a agregação à luz do direito substancial.

3.6 SÍNTESE PARCIAL

A representação, na ação coletiva, ocorre não porque o representante conhece as especificidades dos argumentos individuais. Ela ocorre porque não há, ao menos em parte (na questão comum), especificidades ou singularidades dos sujeitos interessados. O indivíduo apresenta-se, assim, como membro do grupo. O centro de cognição da controvérsia é o próprio grupo ou classe.

O mesmo ocorre nas demais técnicas de agregação, que envolvem a seleção de uma questão comum ao grupo. Essa questão comum ao grupo nada mais é do que uma amostra representativa da controvérsia de massa. De forma que, é possível perceber, nessas hipóteses de agregação de larga escala, sempre uma espécie de representação de interesses ou direitos comuns ao grupo, seja pela atuação de um portador ideológico do grupo em juízo, seja pela existência de uma amostra representativa dos interesses ou direitos comuns ao grupo, a ser resolvida.

As categorias de agregação processual são divididas em agregação representativa e litisconsorcial (processo agregado), agregação administrativa e agregação privada. A primeira categoria engloba as ações coletivas e o litisconsórcio. A segunda categoria abrange a consolidação, a coordenação de demandas individuais e o caso-teste. E, a última categoria alcança os mecanismos alternativos de resolução de disputas, como a arbitragem e a mediação.

No sistema jurídico estadunidense, pode-se dizer que a agregação processual já constitui um sistema único. Diante de um interesse substancial coletivo ou de alcance coletivo, o design procedimental pode ser reorganizado para conferir simetria entre direito e processo. Se um indivíduo exclui-se da ação coletiva, por exemplo, ele pode ser incluído em outras técnicas de agregação, como na consolidação, no caso teste, na coordenação informal de demandas, quando persiste a mesma natureza coletiva, objetiva, paritária e impessoal do direito substancial.

SEÇÃO II

OTIMIZAÇÃO DAS TÉCNICAS DE AGREGAÇÃO PROCESSUAL À

LUZ DO DIREITO SUBSTANCIAL