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Para a divisão dos temas de interesse dessa investigação em capítulos, me oriento por uma seleção dos principais assuntos subjacentes à discussão teórico- prática do Lehrstück, encontrados nos escritos teóricos de Brecht sobre as peças didáticas e readequados aos acréscimos teóricos que a pesquisa me apresentou. A escolha dos temas recebe influência direta das categorias reunidas nas leituras de Roland Barthes (2007), Walter Benjamin (1987, 1994, 2002) e Heiner Müller (1997; 2003). Os capítulos foram estruturados para que se estabelecesse um diálogo produtivo entre teoria e prática, como um caminho de inspiração.

O segundo capítulo desta pesquisa tem um enfoque prioritariamente teórico, discutindo em sua primeira parte a Episierung ou epicizacão, a partir de um entendimento ampliado da presença de traços estilísticos épicos na dramaturgia brechtiana. Staiger (1972), Rosenfeld (1997), Szondi (2001), Bornheim (1992), Wirth (1999), Lehmann (2007; 2009) e Sarrazac (2012) são os principais interlocutores na discussão sobre as tensões entre ação e narração como elementos fundantes da forma épica brechtiana, radicalizada com as propostas formais da peça didática. A segunda parte do primeiro capítulo chama-se Erhfarungstheater: experiência, vivência, choque. Trata especialmente da possibilidade de leitura das peças didáticas como experimentos onde os conceitos benjaminianos de Erhfarung e Erlebnis ganham força na descoberta de novas formas de narrar, através do uso refuncionalizado do teatro como linguagem. Lehmann (2009) e Wirth (1999) articulam as tensões entre teatro e política, postas no Lehrstück quando experimentado como modelo de ação. A terceira parte desse capítulo examina as noções de crítica e a forma dramática do fragmento, recorrendo ao primeiro romantismo alemão e às discussões postas por Schlegel e Novalis, a partir, especialmente, da leitura de Walter Benjamin (1993). Através dessas categorias chego à obra de Heiner Müller e abordo seu teatro e seu trabalho com o fragmento

sintético, como experiência em dramaturgia que reflete as possibilidades contemporâneas com a peça didática. A obra de Heiner Müller, especialmente quando afetada pela forma da tipologia dramatúrgica da peça didática, se apresenta como um outro espaço de possibilidade formal e reflexiva para os encaminhamentos contemporâneos da peça didática.

O terceiro capítulo aborda o Lehrstück a partir das noções de modelo de ação, fábula, gesto e estranhamento, articuladas aqui como conceitos operativos que nortearão as etapas práticas dessa pesquisa. O capítulo é dividido em duas seções. Trato inicialmente do termo Handlungsmuster como prerrogativa para o entendimento do projeto teórico das peças didáticas. Koudela (1991) aprofunda as noções de modelo de ação e ato artístico coletivo em sua pesquisa com o jogo teatral e as peças didáticas, a partir das contribuições de Reiner Steinweg (1972; 1976). Modelo de ação e estranhamento são instrumentos didáticos propostos por Brecht, os quais supõem a abertura do texto para novos contextos, a partir da prática do jogo entre os participantes do experimento, ou seja, os textos funcionam como modelos para experimentos que investigam, através da imitação e da improvisação, as relações entre os homens, constituindo-se, portanto, em sugestões para exercícios artísticos coletivos; exercícios estes que, reunidos, formatariam um ato artístico coletivo. A segunda seção desse capítulo aborda os conceitos de fábula, gesto e estranhamento. Aqui dedico à fábula o papel de categoria condutora no desdobramento das demais categorias eleitas como conceitos-operativos, porque na revisão contemporânea da produção de Brecht, especialmente pelo papel desempenhado por Müller nessa revisão, a discussão sobre a fábula ganha destaque crítico. A linguagem gestual e o estranhamento são definidos prevendo sua aplicação no processo de criação com o texto como modelo de ação. As definições são aprofundadas a partir do recorte da peça didática.

O quarto capítulo tem quatro seções: a) Exploração do material; b) Abordagem do material; c) Orientações para a prática e d) Procedimentos técnicos. Na primeira seção o Material Fatzer é apresentado e aprofundado. Elaboro sua discussão e problematização em assunto e forma, embora no caso específico dessa dramaturgia as partes estejam muito engenhosamente articuladas, o que torna a divisão entre assunto e forma mais um procedimento didático de análise, do que a definição de campos distintos dentro do Fatzer. Para essa problematização os trabalhos de Macgowan (2011), Wirth (1999) e Lehmann (2009) são importantes na

contextualização histórico-crítica da produção do Fatzer, especialmente o ensaio crítico de Müller (2003) e o de Wilke (1999), que aprofundam a discussão em torno dos aspectos formais do material. Levanto os principais eixos temáticos que elegi como norteadores para a construção do plano operativo e, nas seções seguintes, apresento as escolhas metodológicas para abordagem do material na sua experimentação prática, definindo princípios de trabalho e procedimentos. Exponho o planejamento da prática desde os critérios para a seleção dos textos, da divisão dos encontros e das atividades até a descrição dos procedimentos técnicos.

O quinto e o sexto capítulos descrevem os resultados dos exercícios com o Teatro Máquina. O quinto capítulo traz a descrição detalhada de todas as atividades realizadas e das discussões promovidas ao final de cada encontro. Prezo por manter os relatos das atividades com o grupo em um nível de detalhamento rigoroso, porque acredito que a descrição minuciosa pode aproximar essa leitura do material que surgiu do encontro criativo com o Material Fatzer, além de produzir um documento que pode contribuir para o entendimento dos processos criativos em teatro de grupo. No capítulo final também trago os resultados desse encontro, mas através do roteiro dramatúrgico que foi produzido durante a etapa prática da pesquisa e que reúne parte da produção textual dos atores e parte das atividades de improvisação reconfiguradas como seções de um roteiro aberto para o jogo. Na apresentação do roteiro justifico as escolhas feitas e retomo as reflexões sobre experiência e formas de narrar. Diga que você está de acordo! é a síntese poética das experimentações surgidas do Teatro Máquina com o texto de Brecht, seus motivos e figuras.

Reúno ainda nos anexos todos os textos produzidos pelos atores e a pesquisa de referências para uma possível montagem do roteiro criado.