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Didática da História

No documento Centro Universitário UniProjeção (páginas 170-173)

A PESQUISA NO VARAL DAS MEMÓRIAS: A DIDÁTICA DA HISTÓRIA E O USO DA MEMÓRIA NA SALA DE AULA

3. Didática da História

A Didática da História, na sua formulação da historiografia alemã do XX, onde se destacam as proposições do historiador Jörn Rüsen, encontra no Brasil a aproximação com o ensino de História, visto que anteriormente, a Didática da História proposta pelo alemão não dizia respeito ao ambiente escolar, mas sim a uma característica que seria fundamental para a constituição do campo, almejando um retorno ao período em que a História era tida com um sentido prático de orienta- ção da vida no tempo e se preocupava com a aprendizagem histórica.

Nas várias definições do que seria a Didática da História, é per- ceptível a necessidade de que, antes de se ater a definição de fato do campo, se abordem dois aspectos: a visão equivocada do que seria a Didática da História e também a qual lugar ela pertence. Esse padrão de raciocínio pode ser analisado na maioria dos artigos que se dedicam a esse tema, e, por isso, serão aqui tratados.

A primeira questão que surge ao trabalharmos com a Didática da História diz respeito a uma visão enraizada de que no campo didático, o objeto de estudo é o método com o qual se ensina. Percebemos nessa

visão, que a didática, portanto, se resumiria a um conjunto de ferra- mentas que o professor deve possuir para articular suas aulas. Essa didática aplicada no ensino de história, portanto, seria o arcabouço metodológico com o qual o professor de história construiria suas aulas.

Há nesse ponto, algo que não está dito, mas é sensível ao analisar- mos essa visão equivocada do que é a Didática da História. O professor de História, ao perceber a didática dessa forma, tem as ferramentas e o método necessário para construir suas aulas, mas não é produtor de conhecimento. Ou seja, as ferramentas trabalhadas em didática dizem respeito a uma tradução do saber, da academia para a sala de aula nas escolas. Dessa forma, além de se desarticularem escola e universidade, afirma-se uma ideia (também equivocada) de que a escola tem a função de transmitir conhecimento, que por sua vez, é produzido na academia. Assim, ao tentar definir a Didática da História, Rüsen precisa antes dei- xar claro o que está por trás da visão equivocada a respeito do campo. Para o autor alemão, a Didática da História, portanto,

via o conhecimento histórico como sendo gerado unicamente através do discurso interno dos historiadores profissionais. A tarefa da didática da história era transmitir esse conhecimento sem participação na ge- ração desse discurso. A didática da história compensava esta modesta recusa em participar da pesquisa histórica pela tradução de resultados dessa pesquisa em pressuposições filosóficas gerais. (RÜSEN, 2006, p. 4).

Ainda segundo Rüsen, outro ponto importante na análise da Didá- tica da História se dá no fato de que ela propõe uma nova-velha manei- ra de se perceber a História. Digo nova-velha por que atualmente ela é considerada como algo recente, entretanto, segundo seu propositor, ela é na verdade um retorno ao período em que a História era carregada de sentido, baseada “nas necessidades sociais para orientar a vida dentro da estrutura tempo” (RÜSEN, 2006, p. 2).

Seguindo ainda nessa problemática visão a respeito da Didática da História, é perceptível um rompimento, em que se transforma o mo- delo historiográfico, fazendo com que a História perdesse relação com as “necessidades sociais” de que fala Rüsen. Esse rompimento data do

final do século XIX, quando da busca do chamado Método Científico da História. Nesse momento, os historiadores, baseados nas proposi- ções da Escola Metódica francesa, abdicam de uma História que pos- sua ligação com o presente, abandonando também a dimensão didática do processo, que seria aos poucos associada com a área da Pedagogia. Percebemos, portanto, que os preconceitos vistos hoje não só com a Didática da História, mas, como já dito anteriormente, com o uso da memória e da História Oral, são antigos e se encontram enraizados em uma comunidade acadêmica que, via de regra, recusa-se a abandonar seu pedestal epistemológico de produtor do conhecimento histórico.

Esclarecida a visão tida como equivocada a respeito da Didática da História, o segundo ponto que visa a definição do campo diz respeito ao lugar (fundamentalmente acadêmico) que ela pertence. Atualmente, na visão comum, fruto da separação entre a dimensão didática da História e a constituição do campo, como dito anteriormente, a didática é as- sociada à pedagogia. Por esse motivo, a definição do que é Didática da História só pode vir depois de a compreendermos enquanto definidora do próprio campo histórico. Nesse sentido, destaca-se a proposição de Saddi (2010), de análise da Didática da História enquanto uma subdis- ciplina do campo histórico.

O campo histórico pode ser definido enquanto um tripé, engloban- do teoria, método e discurso. A proposta de Rafael Saddi visa pôr, asso- ciada intrinsecamente com a Teoria da História, a Didática. Assim, fica clara a função da Didática da História enquanto constituinte do campo, mantendo o elo entre a produção do conhecimento e a função prática de ensino-aprendizagem do mesmo.

Definidas, então, as problemáticas relacionadas à Didática da His- tória, é importante que se aborde do que ela trata, de fato. Segundo Rü- sen, o campo seria investigador do fenômeno de aprendizagem históri- ca, pondo-a como uma das formas de se perceber o que o autor chama de consciência histórica. O autor alemão diz, então, que

[...] gostaria de propor uma definição mais modesta do objeto de pes- quisa da didática da história. Seu objetivo é investigar o aprendizado histórico. O aprendizado histórico é uma das dimensões e manifesta-

ções da consciência histórica. É o processo fundamental de socialização e individualização humana e forma o núcleo de todas estas operações. A questão básica é como o passado é experienciado e interpretado de modo a compreender o presente e antecipar o futuro (RÜSEN, 2006, p. 10).

É preciso destacar, visto que o problema que tive com essa defini- ção pode ser compartilhado por alguns colegas, que quando da leitura da proposição de Rüsen, me chamou muito a atenção o fato de que na graduação em História, uma das primeiras visões tidas como extrema- mente equivocadas era a de que a História deveria se ocupar de trazer o passado ao presente para se antecipar ou ainda prever um futuro. Essa visão, para mim, era fruto da minha experiência enquanto ser humano, pois sempre realizei esse movimento de planejar o futuro, baseado na relação entre presente e passado. Percebi, naquele momento, ainda no primeiro ano como graduando, que deveria mudar essa visão para me tornar historiador.

Na pós-graduação, então, logo nas primeiras conversas a respeito da Didática da História, percebi que o que nos faz humanos não pode ser ignorado pelo ensino de História, que, por sua vez, deve se preo- cupar não só com a maneira com a qual ela é ensinada, mas funda- mentalmente pela maneira com a qual é aprendida, para que os alunos possam tornarem mais complexas suas consciências. Vale ressaltar que tais consciências não deverão ser “melhoradas” ou ainda “transferidas” do professor para o aluno, apenas complexificadas, ou seja, munidas de um arcabouço epistemológico mais variado.

4. Cultura histórica, consciência histórica e a razoabili-

No documento Centro Universitário UniProjeção (páginas 170-173)