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Direito Fundamental a Proteção de Pessoas e Bens

No documento Estado regulador no setor da proteção civil (páginas 113-117)

Lei do Financiamento das AHB

2019-2022 Despesa a Realizar pela

B. Entidade Reguladora no Setor da Proteção civil 1 Direito Constitucional

1- Direito Fundamental a Proteção de Pessoas e Bens

É no âmbito desta primeira conclusão sobre a necessidade de uma revisão constitucional que surgem as dúvidas. A proteção civil é um direito fundamental? Hoje estamos perante uma jurisprudência dos princípios, dentro dos quais se engloba a proteção civil, ou seja, a proteção civil é um princípio fundamental da nossa constituição no âmbito do estado de direito?

Há muito que o Tribunal Constitucional não só tem aceite como o segue a «jurisprudência dos princípios».

Será que a proteção civil se trata de um direito constitucional como um direito análogo aos direitos, liberdades e garantias mesmo que não esteja tipificado na letra da lei?

Ou será que a proteção civil é um somatório do conjunto de direitos fundamentais diferenciados já existentes como o direito à vida, o direito à integridade física ou mesmo o direitopropriedade ou o direito à proteção da saúde?

Será que a proteção civil é um direito de proteção? Ou um direito de segurança? A ser esse direito fundamental, quanto se omite o socorro a uma vítima, não estamos a atentar contra essa garantia?

Ao longo do trabalho não deixamos de referir que não existe inconstitucionalidade por omissão quando o estado falha na execução de uma tarefa fundamental.

Vejamos, o percurso que o direito ao ambiente já trilhou. Será o ambiente um direito subjetivo? Responde-nos (Canotilho, 2008) “a Constituição Portuguesa de 1976, logo na sua redacção originária, incluiu o direito ao ambiente no catálogo dos direitos económicos, sociais e culturais. Independentemente da caracterização do ambiente como direito e da natureza desse direito, era inequívoco que o ‘legislador constitucional’ consagrava também o ambiente como tarefa que obrigava o Estado a adoptar medidas de protecção.” É assim a nossa Constituição 1976 “das primeiras a positivar constitucionalmente o ambiente como direito constitucional”214. Mas será que foi

positivado como direito fundamental o ambiente?

Perante estas duas premissas (“direito individual ao ambiente” ou o “ambiente como tarefa do Estado e da comunidade”)215?

214 Canotilho, José Joaquim Gomes Canotilho – Estudos sobre Direitos Fundamentais. 2.ª Edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2008 p. 179

«Defender a natureza e o ambiente» é uma das tarefas fundamentais do Estado216.

Mais esclarece (Canotilho, 2008) “no plano prático, a consideração do ambiente como tarefa ou fim normativo-constitucional consagrado implica a existência de autênticos deveres jurídicos dirigidos ao Estado e demais poderes públicos. Estes deveres jurídicos subtraem à disponibilidade do poder estadual a decisão sobre a protecção ou não protecção do ambiente. Por outras palavras: não está na livre disposição dos poderes públicos decidir se o ambiente (os elementos naturais da vida) devem ou não ser protegidos e defendidos. A imposição constitucional é clara: devem”217!

A este respeito e porque em muito se assemelha à proteção civil se refere (Canotilho, 2008) “ao lado, ou em vez de, direito ao ambiente, alude-se a um direito à proteção do ambiente. A ideia de proteção especificamente referenciada ao ambiente significa, desde logo, que o Estado tem o dever: (1) de combater os perigos (concretos) incidentes sobre o ambiente, a fim de garantir e proteger outros direitos fundamentais imbricados com o ambiente (direito à vida, à integridade física, à saúde); (2) de proteger os cidadãos (particulares) de agressões ao ambiente e à qualidade de vida perpetradas por outros cidadãos (particulares)”218.

Não deixando de salientar (Canotilho, 2009) “a constituição não pode deixar de ser uma constelação normativa atenta à situação do mundo político, sob pena de se transformar num “esqueleto normativo”. O que se pergunta, porém, é se o sistema normativo aberto de regras e princípios é suficiente para garantir a força normativa do estatuto do político perante eventuais deficits de legitimação e de legitimidade, ou se, para além da juridicidade, é necessário voltar a apelar para os valores éticos e morais, questionando o fundamento moral da constituição e das instituições democráticas por ela conforma”219.

Quando Gomes Canotilho pergunta primeiro se o direito ao ambiente e depois se o direito à proteção do ambiente constitui os direitos subjetivos do cidadão, que assim ganha o poder e a faculdade de exigir ao estado uma atuação efetiva. E não está no arbitro do Estado o

«facere» ou «non facere» nos casos todos concretos. Assim também no

direito da proteção civil, se trata de um direito fundamental, como indiscutivelmente um

216 Alínea e) do art. 9.º da CPR.

217Canotilho, José Joaquim Gomes Canotilho, 2.ª Edição, 2008, Op. Cit. p. 181 218Canotilho, José Joaquim Gomes Canotilho, 2.ª Edição, 2008, Op. Cit. p. 188

219 Canotilho, J. J. Gomes – O princípio democrático sobre a pressão dos novos esquemas regulatórios. Coimbra: Revista de Direito Público e Regulação, 2009 p. 105

direito social, mas que força do tipo de valores defendidos, dos bens a proteger e do direito de exigir a ação do Estado não deixa de haver, uma quase decalcada analogia do direito do ambiente e como direito social, nos termos apresentado por Gomes Canotilho. E neste sentido é um direito subjetivo, porque não está nas mãos do Estado, na proteção do socorro, o agir ou não agir, o «facere», ou «non facere», está vinculado ao «facere», e aqui não pode haver inconstitucionalidade por omissão, porque não se trata de normas perspetivas, de normas bandeiras, de normas que. Fixam objetivos, mas normas que fixam direitos subjetivos aos cidadãos, e neste caso muito particular da proteção civil, também há sociedade conjugada no todo. Se bem que a construção de direitos subjetivos, num conjunto, se trate da dificuldade difusa dos cidadão no todo.

Não temos qualquer dúvida que em sede de revisão constitucional, nos princípios fundamentais e tarefas fundamentais do estado b) do art.º 9 não basta aquela referência genérica aos direitos e liberdades fundamentais, mas afigura-se muito conveniente, para efeitos de reforço da proteção e garantia que se faça uma referência expressa, como tarefa fundamental do estado a «garantia da proteção civil».

A complexidade da interligação das mais diferentes ações de socorro, dos mais indiferenciados meios humanos, rodoviários e aéreos, a formação dos agentes, o ensarilhado de instituições à volta da proteção civil, seja o INEM, a ENB, a LBP, seja associações de proteção civil, as forças armadas, os municípios, as freguesias, as unidades locais de proteção civil, tudo se trata nos termos que atualmente funciona de uma grande manta de retalhos, muito mal cozida, muito interligada e sem qualquer forro. E foi ao longo deste trabalho, que nós não poupamos críticas a situações concretas de ineficiência que foram sendo descritas e evidenciadas. É no sentido de criação de um serviço de proteção civil, que possa constituir uma garantia da resposta dos socorros às situações de emergência, sejam elas de que natureza forem e, escala ou dimensão tiverem, que se entende trata-se de um direito subjetivo de exigir. Mas um direito subjetivo de exigir, como e de quem. Em primeiro lugar de um cidadão, estamos no direito à vida, à integridade física, à felicidade, como direito tão prodigamente foi neste trabalho referenciado.

E se essa situação de direito de exigir ao estado anula a ideia de inconstitucionalidade por omissão, configura também assim uma garantia.

Mas perguntamo-nos, como de resto Gomes Canotilho também o fez, relativamente ao ambiente, se este direito subjetivo não será um direito da coletividade?

A coletividade não tem personalidade jurídica, mas os cidadãos portugueses no seu conjunto nos termos constitucionais têm garantias, tem direitos e não são direitos de titulares relativamente indeterminados, são direitos reais, são direitos concretos, que aqui ganham uma dupla dimensão ou uma dupla forma, tal como o direito do ambiente, é por um lado um direito subjetivo, é por outro lado uma garantia real e efetiva, e então sem grande dificuldade podemos dizer que o direito da proteção civil é um direito fundamental, em sede de direitos, deveres económicos, sociais e culturais, e é uma garantia em sede de direitos, liberdades e garantias como sendo aplicáveis aos direitos fundamentais de natureza análoga, nos termos do art. 17.º da CRP como garantia no âmbito dos direitos, liberdades e garantias. E dá-nos particular alegria, trabalhar estes conceitos de garantia constitucional. Mas não são só as garantias criminais ou do Estado de polícia, mas são estas novas garantias como no direito do ambiente e do direito da proteção civil.

Ainda em sede de direito a constituir, e no âmbito de uma futura revisão constitucional só poderemos concluir, porque a conclusão a que chegamos resulta da própria natureza das coisas, o direito de proteção civil merece tutela direta constitucional, à semelhança do estatuto da entidade reguladora da comunicação social, ou com estatuto próprio e portanto no âmbito dos direitos sociais “o Estatuto da proteção civil será aprovado por lei da assembleia da república por maioria de dois terços” e assim dado a sua natureza e importância a autoridade nacional de emergência e proteção civil em direito a constituir seria uma lei de valor reforçado, uma vez mais deixamos claro, tratar- se apenas e só de contributos para reflexão e discussão. Temos posição para cada um dos temas e assuntos e podermos fazer a sua discussão em termos fundamentados, científicos e técnicos, independentemente do ponto de vista que cada um sustenta. E o melhor que existe num trabalho científico é começarmos num posição e acabarmos a posição contrária.

O que aqui é posto é feito em alternativa, ou seja, o efeito pretendido é “de jure constituto” por valor reforçado, com um estatuto constitucional próprio seja por via de um estatuto próprio ou por via de lei orgânica, à discussão que vier a ser feita, ao entendimento de uma destas duas soluções, se é que a solução possa ser considerada com suficiente mérito.

No documento Estado regulador no setor da proteção civil (páginas 113-117)