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Resultado da Ineficiência

B. Lei-Quadro das Entidades Administrativas Independentes – o Papel do Estado

4- Resultado da Ineficiência

Onde está o homem está o perigo. Mas hoje, também «se fala e assiste» onde não está o homem está o perigo e o risco para o homem e para a sociedade. As alterações climáticas, o comportamento humano, a falta de consciência para a problemática da proteção civil, o risco, a escassez de recursos (destacando-se a falta de água e qualidade do ar), os custos, a falta de uso da tecnologia, são muitas as circunstâncias que concorrem para a ineficácia do setor da proteção civil. Daí a necessidade de uma maior exigência aos atores das políticas de proteção civil com vista à implementação de procedimentos mais adequados e mais eficientes para as exigências que põe.

Este ponto não pretende apresentar um custo financeiro do setor da proteção civil, nem tão pouco uma análise ao trabalho técnico dos operacionais do setor.

O problema da ineficiência da proteção civil é que gera as consequências mais graves. Vejamos o caso dos incêndios florestais, como o grande marco desta análise.

- Grandes incêndios florestais que tiveram como consequência mortes: • 2006 – 3499 incêndios - morreram 5 bombeiros Chilenos

• 2012 – 4425 incêndios florestais – morreram 6 pessoas (4 bombeiros e 2 civis)

• 2013 – 3829 incêndios – morreram 9 pessoas (8 bombeiros e 1 civil) – 120 mil hectares de floresta ardida

2016 – (Madeira) – 3 mortos – recorde-se que levou o Governo a fazer um pedido de ajuda à União Europeia para combater o sinistro

Para além das mortes acima referenciadas, houve os prejuízos financeiros com os incêndios florestais:

• 2005 – o resultado de perdas em euros resultante dos incêndios foi de 757 milhões de euros, quando em

• 2003 – tinham sido 611 milhões de euros.

Há ainda custos que não são contabilizados nos prejuízos financeiros dos incêndios florestais.85

85 Dados da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil no sítio da internet. Quanto ao ano de 2013, optou-se por referir a área ardida, o que não se fez relativamente aos outros citados, porquando foi o ano com menos ocorrências registadas e mais área ardida. Osanos de 2006, 2012, 2013 e 2016 foram os anos em que houve mortes, e correspondeu a uma opção do autor. E ainda os anos dos financiamento

Diz-nos (Roque, in Diário de Leiria 14.05.2019) “Em Outubro de 2017 a região de Leiria foi assolada por um incêndio que consumiu grande parte da sua mancha verde, e uma das freguesias mais afectadas foi a do Coimbrão, onde arderam “mil hectares particulares”, o que mexeu com a economia familiar local. “Estamos a falar de uma economia de subsistência, da venda de madeira e resina. Mexeu com toda a gente”, vincou o presidente da Junta de Freguesia de Coimbrão”86.

Não querendo entrar no direito económico, mas chamaremos de externalidades. A esse respeito, vejamos o que nos diz (Lobo, Vol. II, 2019) ”advoga-se, portanto, a adopção de um princípio geral de organização económica ao nível da actividade que tem de suporte o solo, tendo em vista o desenvolvimento eficiente das respectivas actividades no panorama económico nacional: a actividade florestal deverá estar sujeita a um regime imperativo, tendo em consideração a escala necessária para o desenvolvimento eficaz da mesma e a eliminação das externalidades (máxime os incêndios florestais); a actividade agrícola deverá estar sujeita a um regime facultativo, permitindo-se o acesso de terceiros interessados a solos que o proprietário opte por não explorar por via do arrendamento rural; e a actividade urbanística deverá estar sujeita a um regime excepcional, só sendo desenvolvido o direito a urbanizar quando for efectivamente provada a sua necessidade e viabilidade, garantindo-se a cobertura dos custos públicos na infra-estruturação e a redistribuição das mais-valias que decorram da alteração da classificação dos usos do solo”87.

A título de exemplo e para além dos atrás enunciados, temos outros custos como o tempo que os bombeiros estão longe das suas famílias ou do seu trabalho, os danos causados pela perda do trabalho de uma vida (como algumas espécies de árvores), os animais perdidos ou mortos, o medo instalado de morar em zonas de baixa densidade e, com isso o êxodo para as grandes cidades, entre outros.

Se o n.º 1 do art. 267.º da Constituição nos refere que “a Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização”, é importante situar o que se entende por burocracia. É interessante situar no tempo o conceito de burocracia introduzido por Max Weber em 1904 no livro ”A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”.

apresentados, explicam-se por omissão dos outros anos por se tratarem dos anos com maiores prejuízos apurados nas últimas duas décadas. Fonte: Dados da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil no sítio da internet.

86Roque, José. (2019). Incêndio de 2017: mexeu com a economia local. 14.05.2019. Diário de Leiria p. 12 87Lobo, Carlos Baptista, 2019, Vol. II, Op. Cit. p. 117

Em que isola a autoridade burocrática, como autoridade dos departamentos do estado e a carateriza-se do seguinte modo: i) caráter formal das comunicações; ii) caráter racional e divisão do trabalho; iii) impessoalidade nas relações; iv) hierarquia da autoridade; v) rotinas e procedimentos padronizados; vi) competência técnica e meritocracia; vii) especialização da administração; e vii) profissionalização dos participantes. Esta teoria assenta numa organização virada para a racionalidade e para a eficiência.

Segue-se nas teorias da teorias da administração, Peter Drucker no seu livro “The Practice of Management” na década de 50 do século XX. Sucede que tanto Max Weber como Peter Drucker eram positivistas. Mas Weber despreza a legitimidade democrática pelo valor que dá à eficiência e eficácia dos burocratas sobre qualquer outro método do exercício do poder.

Recorde-se que os conceitos de eficiência e de eficácia foram introduzidos por Drucker que introduziu o conceito de administração por objetivos ou por resultados assente na eficiência e enfâse nos meios: i) fazer corretamente as coisas: ii) resolver problemas; iii) salvaguardar os recursos; iv) cumprir tarefas e objetivos; v) treinar os subordinados; e vi) manter as máquinas, e na eficácia, ênfase nos resultados pretendendo: i) fazer as coisas certas; ii) atingir objetivos; iii) otimizar a utilização dos recursos; e iv) obter resultados.

Para Maria Celeste Cardona “sobre o crescimento e o desenvolvimento de uma política europeia no contexto dos diversos Estado Membros, refere-se ao Livro Branco sobre a Governança que consagra cinco grandes princípios cumulativos na base de uma boa governança: (i) abertura: As instituições europeias devem atribuir maior importância à transparência e à comunicação das suas decisões; (ii) Participação: implicar de forma mais sistemática os cidadãos na elaboração e na aplicação das políticas; (iii) Responsabilização: é necessária uma clarificação do papel de cada interveniente na processo de decisão, devendo depois cada um assumir a responsabilidade das suas atribuições; (iv) Eficácia: as decisões devem ser tomadas ao nível e no momento adequados, e produzir os efeitos pretendidos; (v) Coerência: as políticas praticadas pela União são diversas e requerem um esforço sustentado de coerência...”8889.

88Cardona, Maria Celeste Ferreira Lopes, Op. Cit., p. 32 89Saliento que o negrito foi opção do autor para dar destaque.

Pode ser analisado o aumento da severidade pelo aumento das alterações climáticas. Relembremos o que escreveu o (Observatório, 2018) “em casos de enorme severidade devem ser criadas formas mais ágeis e flexíveis de atuação, devendo este organismo procurar determinar quais as zonas-chaves, a serem identificadas suscetibilidades específicas à perda de solo e eventual potenciação de desastres associados”90.

Em sede de ineficácia do setor da proteção civil, somos obrigados a repetir o que dissemos em sede da ineficácia da atual Lei da ANEPC, na senda do que já acontecia com a Lei anterior91, mantém-se na mesma entidade regulado e regulador, o que limita os

procedimentos e os resultados.

Lembremos a este respeito o que nos ensina (Amaral, Vol. II, 2015) “um órgão de controlo, para ser eficaz, tem de ser qualitativamente diferente dos órgãos controlados. E também alguns serviços de gestão administrativa, apesar da sua função instrumental, têm que ter alguma independência relativamente aos outros órgãos e departamentos que servem”92.

Também a sustentabilidade está diretamente ligada à proteção civil por diversos prismas e ângulos. Tanto do ponto de vista da intervenção, desde as florestas, oxigénio, cheias (terreno ardido não retém água), um prédio que não tenha as condições de habitabilidade por perigo para a saúde pública ou que esteja em perigo de ruir. Como ao nível do planeamento florestal, mas também do planeamento urbano com a construção de um hospital ao lado de uma estação de abastecimento de combustíveis (tudo isto é ordenamento do território). No planeamento há que, ponderar e, trabalhar para eliminar ou mitigar riscos. No âmbito do risco, também o conceito de risco evoluiu. Novos perigos, novas realidades, novos bens sociais (bem-estar social diferente, o contrato social mudou). Logo uma «nova proteção civil».

Quando falamos de sustentabilidade, falamos é de eficiência dos processos, para se garantir a eficácia do resultado. Nova proteção civil, nova organização é uma exigência do sistema, porque ao mudarem os riscos, ao mudar a sociedade, ao mudar a tecnologia, há que mudar as formas de organização.

90 Observatório Técnico Independente – Relatório: Avaliação do sistema nacional de proteção civil no âmbito dos incêndios rurais. Lisboa, Assembleia da República, 2018 p. 90

91Lei Orgânica da Autoridade Nacional de Proteção Civil. 92Amaral, Diogo Freitas, 2015, Op. Cit. p. 246

O atual estado do sistema faliu. Ruiu93. Não é mais capaz de ser eficiente. De ter

sucesso nas intervenções, já referenciava com dureza e em modo de sentença a (Resolução de Conselho de Ministros n.º 157-A/2017 “os incêndios de grandes dimensões que, nos dias 17 de junho e 15 de outubro de 2017, deflagraram em Portugal Continental tiveram consequências trágicas ao nível de vidas humanas, para além dos inúmeros danos e prejuízos em habitações, explorações agrícolas, infraestruturas, equipamentos e bens de pessoas, empresas e autarquias locais, que se somam à destruição da floresta e dos bens e serviços por ela produzidos.” Mais refere a Resolução “O Relatório produzido por esta CTI (Comissão Técnica Independente), entregue na Assembleia da República a 12 de outubro de 2017, aponta falhas estruturais e operacionais no modelo de prevenção e combate aos incêndios florestais e ao Sistema de Proteção Civil que ficaram expostas durante estes incêndios e apresenta reflexões e recomendações centradas na problemática da valorização da floresta e da sua defesa contra incêndios”94.

Há a necessidade de mudança. Citamos uma frase conhecida e adiante designada “Insanidade é continuar a fazer o mesmo e esperar um resultado diferente”.

Atingimos o estado de insanidade coletiva na proteção civil.

Não podemos deixar de fazer referência à própria organização do Estado. Esta ineficiência resulta assim das falhas do Estado. Reconhecemos que podem existir falhas de mercado, mas acima de tudo houve falhas do Estado.

Esta insanidade individual diagnostica por Albert Einstane e insanidade coletiva como qualificação do autor do estudo. A conjugação da insanidade pessoal e insanidade coletiva leva-nos a seríssimos problemas de insanidade do pensamento e de higiene de ação. E aqui mais uma vez está-se a tocar na catadura que é a incapacidade de proporcionar e garantir a felicidade individual dos cidadãos e a felicidade coletiva da sociedade.

As falhas do estado no direito económico são consideradas ineficiências, vejamos o que refere (Samuelson, 1990) a este respeito “como se viu anteriormente, as economias são na prática afectadas por falhas de mercado. Num sistema concorrencial, os produtores não sabem muitas vezes qual a técnica de produção menos onerosa, não obtendo, por consequência, a devida minimização dos custos. Nos mercados, tal como eles existem na prática, uma empresa pode tirar proveito tanto através da manutenção de um preço alto

93Esta afirmação reporta-se ao verão de 2018. Hoje temos um quadro normativo em transição. 94Resolução de Conselho de Ministros n.º 157-A/2017. D.R. I Série A. 208 (2017-10-27) 5818

como da manutenção da produção a um nível elevado. Noutras áreas verificam-se importantes externalidades, como a poluição nociva ou a fuga de importantes conhecimentos, que fazem sentir os seus efeitos em outras empresas ou sobre os consumidores. Em cada um destes casos uma falha de mercado provoca ineficiências na produção ou no consumo, cabendo às instituições públicas a responsabilidade de remediar a doença. Mas, ao avaliarmos o papel do Estado no tratamento dos males económicos, há que ter também em atenção as «falhas governamentais» - as situações em que as instituições públicas agravam ou provocam, elas próprias, as doenças”95.

Ainda a este respeito, (Moreira, et al., 2003) refere-nos “a intervenção do Estado em todos os domínios da vida económica, social e cultural, com o consequente crescimento desmesurado do aparelho administrativo, influenciou negativamente a funcionalidade e a eficiência da Administração e contribuiu para o esbatimento das fronteiras entre administração e política. Ao nível da opinião pública gerou-se uma forte corrente no sentido da desconfiança perante a imparcialidade da Administração por esta se ter deixado dominar pela influência político-partidária”96.

Falhas de mercado, diz-nos (Samuelson, 1990) “existem na realidade, duas falhas de mercado que distorcem o quadro idílico da concorrência perfeita, implícito a teoria da mão invisível: a concorrência imperfeita e as externalidades”97.

A questão que se coloca é saber qual o resultado da atuação desta instituição «Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil» enquanto autoridade nacional do setor, mas sem verdadeiramente ter poderes típicos de regulação de uma entidade administrativa independente e, se neste enquadramento se tratara materialmente de uma autoridade reguladora?

Sabemos que contribuem para as falhas, fatores externos como as alterações climáticas, crescente comportamento de risco por parte dos cidadãos. Mas existem outros fatores que podem contribuir para mitigar ou minimizar os anteriores como a evolução tecnológica ou a massificação da comunicação.

Hoje existem melhores condições de vida. Há melhores vias de comunicação. Não se escrevem postais ou telegramas, ou telex, escrevemos e-mails. A informação chega a outro lado do mundo «na hora». Mais ciência, melhor ciência. O valor dos bens também mudou. Hoje a informação tem valor económico (o deter a informação é uma mais-valia).

95Samuelson, Paul A.; Nordhaus, Willian D., Op. Cit. p. 57 96Moreira, Vital; Maças, Fernanda, Op. Cit.p. 49

O mundo deixou de ter fronteiras, a economia deixou de ter fronteiras, «as catástrofes e os sinistros deixaram de ter fronteiras». Os perigos e riscos deixaram de ter fronteiras. O socorro deixou igualmente de ter fronteiras e, tem de ser pensado nesse contexto. O conceito de rede, tal como em outros áreas, é essencial do ponto de vista da operacionalidade.

A evolução tem levado à criação de novos bens jurídicos, novas tarefas do Estado, mas também novos serviços.

Hoje há empresas que «limpam as estradas» na sequência de acidentes de viação. Empresas especializadas em limpar os locais dos sinistros é uma nova atividade económica. Novos bens jurídicos que falamos em sede do papel do Estado concorrem, igualmente, para reforçar a necessidade uma entidade reguladora no setor da proteção civil.