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Entidade Reguladora da Proteção Civil Ser uma Lei de Valor Reforçado e a Sua Composição Ser Regulada na Constituição

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1- Entidade Reguladora da Proteção Civil Ser uma Lei de Valor Reforçado e a Sua Composição Ser Regulada na Constituição

Na segunda linha145 de desafios, o problema está em saber a quem cabe criar uma

autoridade reguladora no setor da proteção civil.

Realça (Moreira, et al., 2003) “finalmente, outro problema em aberto respeita à questão de saber a quem caberá, se ao Governo ou à Assembleia da República, a instituição de AAI.

Em alguns casos, na medida em o diploma que cria as AAI contende com matéria de direitos, liberdades e garantias, e considerando que a maior parte delas dispõe de amplos poderes sancionatórios, estamos desde logo no domínio de matéria reservada legislativa da Assembleia da República (reserva relativa).

No entanto, mesmo em geral, fora do âmbito dos direitos, liberdades e garantais, cremos que a instituição das AAI devia caber sempre à Assembleia da República, uma vez que faz pouco sentido ser o próprio Governo a subtrair, por vontade própria, à sua direcção e responsabilização, uma parte do aparelho administrativo, em restrição norma constitucional que o constitui como "órgão supremo da Administração Pública"”146.

No que respeita a esta resposta, carece primeiro de se definir o fundamento legitimador.

Utilizemos então o critério de (Cardona, 2014) “desta abordagem verificamos que tais entidades foram criadas ao abrigo dos seguintes fundamentos legitimadores:

a) Entidades criadas com fundamento directo em preceito constitucional;

b) Entidades criadas ao abrigo e com fundamento directo em estatuto constitucional;

c) Entidades criadas para o exercício de missões de promoção e de garantia de direitos fundamentais e de natureza análoga previstos na Constituição:

d) Entidades criadas ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 267º da Constituição, para a prossecução de atribuições/incumbências do Estado previstas na Constituição”147.

A Constituição da República Portuguesa, conforme tivemos oportunidade de verificar anteriormente, prevê a criação de entidades administrativas independentes por dois motivos: i) a proteção de direitos fundamentais; e ii) por lei com atribuições de

145Recorde-se que a primeira é saber se o setor deve ser regulado. 146Moreira, Vital; Maças, Fernanda, Op. Cit.p. 252

regulação da atividade económica, de defesa dos serviços de interesse geral.

Não estatui (em norma) a Constituição a proteção civil como direito fundamental. Será que são só direitos fundamentais o que estão definidos na letra da lei?

Salientámos ao longo deste trabalho e face à classificação de direitos de Vasak, que a proteção civil é um serviço prestado ao cidadão e à comunidade.

Refere (Amaral, Vol. I, 2015) “os direitos, liberdades e garantias são aqui perspectivados como instrumentos de defesa dos cidadãos contra o poder público e, antes de mais, contra o poder administrativo. Daí que o Governo e a sua máquina administrativa seja visto como um agressor potencial dos direitos em causa. Para defender esses direitos foi necessário conceber um conjunto de órgãos que estejam fora dessa máquina, com outro tipo de legitimidade e de independência: órgãos não sujeitos a poderes de direcção, superintendência ou tutela do próprio Governo”148.

Outra questão que se colocou inicialmente, era a de saber se hoje em dia poderemos dizer se estamos perante um novo contrato social, face aos novos desafios («riscos», «sustentabilidade» e «eficiência»)? Ou, se por outro lado, deva manter o conceito de contrato social no originário tácitos consensos e «olhar e ver» a proteção civil como uma um setor que é chamado para prestar o serviço de socorro?

Não obstante, de não estarmos ainda em sede de conclusões, a resposta a esta questão, para nós é clara, e há que a assumir. Hoje estamos hoje perante um novo conceito de proteção civil, que sem margem para dúvidas enquadra a emergência, mas não pode deixar de ter como atribuições o planeamento e a assistência, independente do seu grau de integração.

Assim sendo, princípios constitucionais: da eficiência, da justiça, da igualdade, da solidariedade, da proporcionalidade, juntando-se a coesão territorial e inclusão, deveram estar sempre no pensamento do legislador quando trata as matérias do setor da proteção civil.

Estes princípios, estão, todos eles, interligados entre si. Hoje e, de forma exaustiva tem sido feita neste trabalho, não podemos olhar para um setor, ou para um conceito de forma isolada. O conceito de rede e, permitam-nos a analogia, não querendo ferir os mais crentes, «não sendo omnipresente é uma realidade». Se começarmos a mapear as circunstâncias em que setores, serviços e entidades se relacionam, está-se perante um

novo desafio na administração, «a necessidade de se estabelecerem redes e parcerias»149.

Estamos numa nova forma de organizações e de gestão, o «New Public Management»150

e a «New Public Governance»151.

Quando se planeia um território, é «fazer conetividades». Seja ao nível da edificação, seja da mobilidade ou do vivenciar o espaço e paisagem. Considerando o setor da proteção civil, é seguir uma agenda das alterações climáticas, é a otimização de recursos. «Tudo no plano se cruza».

Quando se tem a visão que tudo se cruza, entidades, perigos, conceitos e ciências, vê-se a inclusão não apenas como igualdade de oportunidades e equidade, mas numa perspetiva mais ampla, de serviços, de gestão e de pessoas. Inclusão pode ser introduzir novo design nos produtos ou serviços por forma a que as pessoas se sintam iguais. A título exemplificativo deixamos o exemplo do um relógio para invisuais. Este deveria ser um relógio que possa ser utilizado por todos. E já existe. Quando falamos de coesão territorial, não falamos apenas do ponto de vista económico ou do princípio da unidade da decisão administrativa, ou da redistribuição de riqueza, mas também do ponto de vista social, do sentimento que cada um tem na vivência e na afirmação de um território, seja esse território de baixa densidade ou um grande aglomerado urbano. Quem vive num território não se pode sentir menorizado nos seus direitos. Não é que seja por eu morar num território de baixa densidade, ou num território de floresta que devo sentir estar «menos seguro» do que alguém que vive na cidade, passe esse sentimento de insegurança pelo risco elevado de incêndio, por não ter acesso fácil a cuidados de saúde, ou o serviço

149A administração local é rica no estabelecimento de redes, seja ao nível nacional, seja internacional. 150 O New Public Management pretende ser uma resposta à falta de eficácia e de eficiência dos serviços públicos, defendendo um novo modelo de gestão para o sector público, cujo argumento ideológico assentaria nas ideias do New Right, ou seja, na defesa de formas liberais de acção, realçando a eficiência e a capacidade do mercado como método de apoiar a tomada de decisão e a escolha individual (cfr. J. FILIPE ARAÚJO, “Tendências Recentes de Abordagem à Reforma Administrativa”, Revista Portuguesa de Administração e Políticas Públicas, volume I, n.o 1, 2000, p. 42) in Apud Apolinário, Marisa – O Estado Regulador: o novo papel do Estado: Análise da perspectiva da evolução recente do Direito Administrativo: O exemplo do sector da energia. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Direito, 2013 p. 91 151a análise da Administração Pública segundo a orientação da "new public governance" não tem a pretensão de substituir modelos de funcionamento ou modelos explicativos do funcionamento da Administração. O que está em causa é uma tentativa de compreender as vias que podem conduzir a uma boa governação. Ora, neste sentido, não há qualquer antinomia entre a NPM e a "new public governance", nem esta significa um estádio de evolução mais avançado. Eis a razão por que a NPM - no sentido de autonomia de gestão do administrador, de Administração Pública focada nos resultados e, portanto, na eficiência - surge aqui como um valor central da boa governação da Administração Pública” in Gonçalves, Pedro Costa – O Governo da Administração Pública. Coimbra: Almedina, 2013 pp. 20 e 21

de emergência rápido e eficiente. Logicamente que não se quer, nem é viável que exista um «quartel de bombeiros» em cada aldeia, ou um «hospital» em cada cidade.

Quanto à constituição de uma entidade reguladora para o setor da proteção civil, recordamos o que nos refere (Cardoso, 2002) “quanto à primeira categoria, por força do disposto no artigo 165.º, n.º 1, al. b), da Constituição da República Portuguesa, a criação de autoridades administrativas independentes incumbidas da protecção de direitos fundamentais constitui matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República sempre que o direito fundamental cuja regulação lhes for confiada constar do "catálogo" constitucional de direitos, liberdades e garantias ou revestir natureza análoga a estes”152.

A constituição não reconhece a Lei-Quadro das Entidades Reguladoras enquanto lei de valor reforçado (ao invés do que acontece com a Lei-Quadro das Privatizações)153.

A Lei de Bases da Proteção Civil à semelhança do que sucede com a Lei Geral Tributária, por se tratar da competência habilitante de modo a fazer nos termos do art. 112.º n.º 3 deveria de ser uma lei de valor reforçado, ou em alternativa por via de um estatuto de lei reforçado estabelecido diretamente pela CRP em sede de revisão a incluir no âmbito dos direitos sociais, sistematicamente à proteção da saúde e da segurança social sendo aditado o n.º 2 estabelecendo o seguinte: o direito enunciado no número anterior segue o regime dos direitos liberdade e garantias por força da sua natureza análoga.

O facto da Constituição ter sofrido a última alteração em 2005 não terá permitido que a Lei-Quadro das Entidades Reguladoras fosse considerada uma lei de valor reforçado ao invés do que acontece com as privatizações.

Outros dos exemplos de lei de valor reforçado é a Lei de Enquadramento Orçamental, nos termos do art. 106.º n.º 1 e art. 112 n.º 3 da CRP, considerando lei prevalente sobre a lei norma. Porque fazemos esta analogia com outros diplomas? Se esta analogia é por nós feita com outros diplomas é pelo facto de esta (Lei de Enquadramento Orçamental) prevalecer sobre a Lei-Quadro das Entidades Reguladoras e dos seus estatutos limitando muito a autonomia orçamental destas entidades, que por força de um instrumento financeiro podia haver lugar à governamentalização das autoridades reguladoras independentes. No entanto, somente mediante uma revisão constitucional se

152Cardoso, José Lucas, Op. Cit.p. 451 153Cfr. o n.º 3 do art. 112.º da CRP.

poderia retirar a força intensíssima, que pelo Tribunal Constitucional foi dado à Lei de Enquadramento Orçamental e portanto o efeito útil dos nossos receios, mantêm-se.