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DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA E A RELAÇÃO COM

O direito ao acesso à alimentação garante o mínimo existencial e advém do conteúdo da dignidade humana e não se concretiza sozinho. Ele está vinculado, necessariamente, a outros direitos humanos para se tornar concreto. Nesse sentido, os direitos humanos são considerados universais, posto que têm disciplina normativa, em âmbito internacional, ou seja, são indivisíveis e interdependentes, pois nenhum deve se sobrepor ao outro, são fundamentais e devem ser resguardados pelo Estado sem hierarquia entre si151.

Segundo André de Carvalho Ramos, os direitos humanos são indivisíveis, pois, no que tange ao seu reconhecimento, todos são essenciais para uma vida com dignidade, por isso, possuem a mesma proteção jurídica. A indivisibilidade desses direitos significa que a proteção se dá por meio de uma unidade incindível em si. Quanto ao reconhecimento da indivisibilidade, este tem o significado de que o Estado proteja também os direitos sociais, além dos de liberdade. A interdependência significa que os direitos humanos interagem para a satisfação das necessidades essenciais dos indivíduos. O conteúdo de um direito se vincula a outro. Os direitos humanos também não se exaurem152.

O DHAA está intimamente ligado ao direito humano à água, previsto em diplomas internacionais de proteção aos direitos humanos e está relacionada à viabilidade da existência do ser humano. Esse direito é o pressuposto de existência do acesso à alimentação adequada. De acordo com Jales Dantas da Costa, nos últimos anos, o direito humano à água surge como um tema importante na discussão dos direitos fundamentais. Inclusive, no ano de 2010, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, por meio da Resolução Nº 64/292, passou a reconhecer o direito à água potável limpa e o saneamento básico como direitos essenciais para o pleno exercício da vida e dos direitos humanos. Além disso, no ano 2000, a ONU também aprovou os objetivos de desenvolvimento do milênio para o período de 1990 a 2015. Entre as metas programadas está a redução, pela metade, do número de pessoas que

151 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRICULTURA. Cadernos de

Trabalho sobre o Direito à Alimentação. O direito à alimentação no quadro internacional dos direitos humanos e nas Constituições. v. 1. Espanha: Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, 2014. Disponível em: http://www.fao.org/right-to-food/resources/rtf-handbooks/pt//. Acesso em: 6 mar. 2019. p. 7.

passam fome no mundo, bem como pessoas sem acesso à água potável e ao saneamento básico153.

Recentemente, foi aprovada a Lei Nº 13.839, de 4 de junho de 2019, que altera o artigo 4º da Lei Nº 11.346/2006, que criou o Sisan, com fins de prever também, no conceito de segurança alimentar e nutricional, a ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio de medidas que diminuam o risco de escassez de água potável, além da formação de estoques reguladores e estratégicos de alimentos154. Esse artigo, particularmente o inciso II, dispõe sobre a ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio da produção, em especial da agricultura tradicional e familiar; do processamento; da industrialização; da comercialização, incluindo-se os acordos internacionais; do abastecimento e da distribuição de alimentos, considerando também a água e as medidas que mitiguem o risco de escassez dela; da geração de emprego; e da redistribuição de renda, por meio de nova redação dada pela Lei Nº 13.839/2019.

A água é um recurso indispensável para a sobrevivência. Consiste no resguardo aos direitos mínimos, além de ser um recurso natural que mantém a sobrevivência de todo o biossistema. O DHAA necessita da água para todo o seu sistema de processamento, desde a produção até o consumo final.

O DHAA está vinculado à propriedade e ao trabalho, pois é por meio destes que os indivíduos encontram capacidades. Segundo reflexão de Amartya Sen, a liberdade substantiva do indivíduo e da família estabelece a propriedade adequada de alimentos, o que pode ser feito quando o indivíduo tem condições de cultivar a própria comida, ou a adquire no mercado, por meio do seu poder econômico155. O direito à propriedade sobre os bens, sobre as coisas, é um direito fundamental, que tem proteção constitucional do artigo 5º, quando disciplina os direitos e as garantias fundamentais; e no artigo 6º, quando trata dos direitos sociais, sendo a moradia parte do direito social básico, de mínimo existencial, que deve ser garantido à pessoa e à família.

153 BRASIL. Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Direito Humano à Água. 2017.

Disponível em: http://www4.planalto.gov.br/Consea/comunicacao/artigos/2014/direito-humano-a-agua. Acesso em: 2 abr. 2019.

154 BRASIL. Lei 13.839, de 04 de junho de 2019. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Lei/L13839.htm. Acesso em: 9 jun. 2019.

155O crucial ao analisar a fome é a liberdade substantiva do indivíduo e da família para estabelecer a propriedade

de uma quantidade adequada de alimento, o que pode ser feito cultivando-se a própria comida (como fazem os camponeses) ou adquirindo-a no mercado (como faz quem não cultiva alimentos) [...]. O enfoque tem que ser sobre o poder econômico e a liberdade substantiva dos indivíduos [...]. SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 211.

Nessa mesma linha de proteção, o artigo 25 da DUDH, assim como o artigo 11 do PIDESC trazem, em seus respectivos textos, a previsão de que o direito à propriedade garante o direito fundamental ao mínimo existencial. Essa liberdade substantiva do indivíduo, por meio da reflexão de Amartya Sen, será resguardada quando esse indivíduo tiver, com base no direito fundamental à propriedade, a possibilidade de produzir ou adquirir, pela força de trabalho, o Direito Fundamental e Humano à Alimentação Adequada. Sem o poder econômico garantindo a liberdade substantiva do indivíduo, ele não tem como ter acesso ao DHAA, e essa capacidade só é possível por meio do trabalho que transforma a força na aquisição de produtos para a subsistência.

O direito ao trabalho e à previdência são direitos sociais básicos que vão possibilitar ao indivíduo o acesso aos bens de que necessita para a sobrevivência. Os programas de transferência de renda do governo federal, já citados no presente trabalho, resguardam o acesso ao DHAA. Essa alimentação também está ligada ao direito humano à saúde, pois somos saudáveis na medida em que temos acesso a uma alimentação devida, que garante a dignidade da pessoa humana.

A alimentação produzida pela agricultura familiar, fomentando a agroecologia, com base na produção de renovação do solo, na preservação do meio ambiente, respeitando os direitos das presentes e futuras gerações, também é uma via de combate à fome. Por sua vez, o direito à saúde que se vincula ao acesso à alimentação saudável, segundo o Comentário Geral Nº 12 da ONU do Comitê DESC, tem como componentes: a disponibilidade, que garante o acesso ao alimento diretamente da terra ou advindo de outros recursos naturais; a estabilidade, que é o acesso aos alimentos de forma contínua; e a acessibilidade, pois os alimentos devem estar acessíveis física e economicamente de forma a atender as necessidades básicas. Nessa perspectiva, o direito à alimentação adequada deve partir de uma cadeia de produção sustentável, por meio da agricultura familiar e da adequação quanto aos nutrientes básicos que demandam uma alimentação saudável156.

As políticas públicas, nesse sentido, devem ser destinadas à preservação e à manutenção dos direitos sociais básicos, da garantia ao mínimo existencial, buscando sempre

156 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRICULTURA. Cadernos de

Trabalho sobre o Direito à Alimentação. O direito à alimentação no quadro internacional dos direitos humanos e nas Constituições. v. 1. Espanha: Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, 2014. Disponível em: http://www.fao.org/right-to-food/resources/rtf-handbooks/pt//. Acesso em: 6 mar. 2019. p. 9.

promover proteção, preservação e ampliação dos direitos sociais sob pena de um retrocesso quanto à proteção destinada aos grupos mais vulneráveis, que demandam permanência de assistência social em fluxo contínuo. As políticas públicas, por parte do Estado, devem garantir os direitos sociais de alimentação, moradia, saúde, trabalho, água, pois são direitos humanos previstos no ordenamento jurídico interno e internacional, apresentando características de indivisibilidade e interdependência no resguardo à dignidade.

4 TRATADOS INTERNACIONAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA

A relação entre o DHAA e outros direitos fundamentais, como, por exemplo, à água, à propriedade, ao trabalho, à saúde traduz que se trata de um direito social, que, para se concretizar, está intimamente relacionado a outros igualmente indispensáveis aos indivíduos. O Brasil, como já abordado, além da previsão constitucional do Direito Humano à Alimentação, no artigo 6º, bem como em outros artigos constitucionais que tratam sobre a ordem econômica, o direito à saúde, entre outros preceitos constitucionais, internalizou tratados de proteção que dispõem sobre o Direito Humano à Alimentação como basilar, para que os outros direitos fundamentais sejam concretizados. Para tanto, o Brasil necessita que haja uma continuidade nas políticas públicas, no sentido de tornar o DHAA efetivo, principalmente em se tratando de torná-lo acessível aos grupos de pessoas socialmente mais vulneráveis.

Diante dessas previsões normativas, é importante analisar as obrigações internacionais que viabilizam a concretização do DHAA na realidade brasileira, com base nas políticas sociais de Estado, analisando se o Brasil realmente está cumprindo os dispositivos dos Tratados Internacionais de Proteção aos Direitos humanos, no que tange ao resguardo e à garantia ao acesso do DHAA. Para tanto, considera-se a produção legislativa interna e a realização de políticas públicas, no sentido de cumprir não só os mandamentos constitucionais como também os dispositivos dos tratados internacionais de garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada.

Uma importante discussão acerca dessa análise pode ser feita primeiro com base na Emenda Constitucional Nº 95, de 15 de dezembro de 2016, que alterou o ato das disposições finais e transitórias da Constituição Federal para instituir um novo regime fiscal com previsão de vigor por 20 anos de exercício financeiro157. A Emenda em comento faz a previsão de limites orçamentários do Estado no que tange aos serviços sociais de educação e saúde. Segundo o artigo 106 das disposições finais e transitórias da Constituição Federal, fica instituído o novo regime fiscal no âmbito dos orçamentos fiscal e de seguridade social da União, que irá vigorar por vinte exercícios financeiros, nos termos dos artigos 107 a 114158.

157 BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 6 mar. 2019.

158 BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em:

A atual realidade constitucional apresenta um paradoxo, pois as disposições finais e transitórias, após as modificações trazidas pela EC Nº 95/2016, diminuindo a contrapartida orçamentária de investimentos nos setores de educação e saúde, conflitam com os artigos iniciais da Constituição Federal, que tratam sobre a dignidade da pessoa humana (no artigo 1º), assim como sobre os objetivos da República Federativa do Brasil, entre eles, erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (artigo 3º). Dialogando com esse posicionamento, foram ajuizadas, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Ações Diretas de Inconstitucionalidade, ADIs 5715 e 5734, que estão tramitando e questionam a inconstitucionalidade da referida Emenda da previsão de teto de gastos públicos da União nos setores de saúde e educação por 20 anos159.

As respectivas ações foram distribuídas por prevenção à ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, que já é relatora de outras quatro ações sobre o mesmo tema. A primeira ação, ADI 5633, foi proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe)160. A ministra Rosa Weber também é relatora da ADI 5643, ajuizada pela Federação Nacional dos Servidores e Empregados Públicos Estaduais e do Distrito Federal (Fenasepe); ADI 5658, apresentada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT); e ADI 5680, de autoria do Partido Socialismo e Solidariedade (PSOL). A sociedade civil, organizada por meio das entidades de classes e dos partidos políticos, alegam inconstitucionalidade formal e material no que tange a essa Emenda. Até o momento deste estudo, as referidas ações ainda estão em trâmite161.

Os cortes de gastos públicos destinados aos serviços sociais em comento comprometem o resguardo e a garantia do acesso ao DHAA, posto que o direito humano à alimentação é atualmente garantido por programas de atenção à saúde básica e por programas sociais de educação, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar. A redução de gastos do orçamento público no período de 20 anos, comprometendo os programas sociais, atinge as garantias destinadas aos grupos de pessoas mais vulneráveis, indo de encontro ao mandamento

159 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Novas ações questionam emenda constitucional que limita gastos

públicos. Notícias STF, 11 jul. 2017. Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=349227. Acesso em: 12 ago. 2019.

160 Ibid. 161 Ibid.

constitucional previsto no § 2º do artigo 5º da Constituição Federal, que trata da garantia de proteção aos direitos humanos, previstos nos tratados ratificados pelo Brasil, comprometendo o acesso ao direito à alimentação.

A dignidade da pessoa humana está relacionada ao direito à vida, disciplinada no caput do artigo 5º da Constituição Federal. Também merece destaque o artigo 6º que, de forma explícita, apresenta como direito social básico o direito humano à alimentação como sendo fundamental, estando relacionado à saúde, à educação e a outros direitos sociais elencados no mesmo artigo.

Consoante dispõe Synara Monteiro Mariano (2017), as regras no novo regime constitucional de diminuição dos gastos públicos, trazida pela EC Nº 95/2016, em contrapartida, não permitem o crescimento das despesas totais e reais do governo acima da inflação, o que diferencia a situação do Brasil dos outros países que também já adotaram o teto dos gastos públicos, posto que somente será possível aumentar os investimentos em uma área a partir do momento que sejam realizados cortes em outras áreas162. A contenção de gastos e de orçamento tem previsão de aumentar os cortes nos anos subsequentes, em 20 anos, e não há possibilidades de que esse orçamento melhore, posto ter como parâmetro que as despesas públicas não podem ir além dos índices da inflação. Tal previsão se traduz como um comprometimento do Estado Social e Democrático estabelecido pela Constituição Federal.

Em continuidade, Synara Monteiro Mariano faz a reflexão de que as novas regras constitucionais de contenção dos gastos públicos, dispostas na EC Nº 95/2016, desconsideram as taxas de crescimento econômico e demográfico no período de 20 anos, o que poderá fatalmente levar ao sucateamento das políticas sociais, especialmente nas áreas de saúde e de educação, pondo em risco por completo a qualidade de vida da população brasileira163. Como consequência, as políticas públicas que já existem estão ameaçadas, quanto a sua continuidade, em função dos cortes no orçamento, pois fazem parte do texto constitucional, nas disposições finais e transitórias. O crescimento, que considera muitas variantes, investimentos, política de Estado, além da circulação da economia, entre outros fatores, está comprometido.

Tal medida constitucional de limite orçamentário entra em confronto, inclusive, com a previsão constitucional da vedação ao retrocesso em relação à aquisição dos direitos sociais,

162 MARIANO, Synara Monteiro. Emenda Constitucional 95/2016 e o teto dos gastos públicos: Brasil de volta ao

estado de exceção econômico e ao capitalismo desastre. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, v. 4. n. 1, jan./abr. 2017. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/rinc/article/view/50289. Acesso em: 15 jun. 2019.

que são uma eterna batalha no Brasil, país de grandes desigualdades sociais, de concentração extrema de riquezas. O Supremo Tribunal Federal fundamenta decisões com base no princípio da vedação ao retrocesso, posto ser considerado um princípio implícito na Constituição, a exemplo da decisão recente ADI 5016, julgada em 26/10/2018, que trata da gestão pública dos recursos hídricos do Estado da Bahia, definindo que uma lei estadual não pode dispensar outorga de direito de uso de recursos hídricos, posto usurpar competência da União. Tal decisão foi justificada pela divisão de competências legislativas, pelo federalismo e pela participação da sociedade civil declarando a inconstitucionalidade de uma Lei Estadual da Bahia164.

A Emenda Constitucional de Contenção Orçamentária dificulta o cumprimento das obrigações que estão previamente estabelecidas na agenda 2030, como uma agenda de crescimento social e humano, de combate à pobreza, à fome e às desigualdades sociais, internas e internacionais entre os países, estabelecida pela ONU, tendo o Brasil como um dos países das Organizações das Nações Unidas, participante dessa agenda de objetivos, que apresenta como plano de ação promover o desenvolvimento e a prosperidade do planeta. Ademais, todos os direitos sociais disciplinados pelo artigo 6º da Constituição estão comprometidos quanto à concretização continuada como uma obrigação do Estado, em função da EC Nº 95/2016, que diminui os gastos com programas sociais destinados à educação e à saúde.

Os artigos que disciplinam os direitos fundamentais também protegem os direitos sociais, e a própria Constituição Federal estabelece que o desenvolvimento demanda recursos, posto serem investimentos de grande importância, em contrapartida, terão o retorno econômico e social em longo prazo. A educação é um exemplo. Diante dessa realidade, é conclusivo que a EC Nº 95/2016 vai de encontro à garantia dos direitos sociais fundamentais mínimos, previstos na Constituição; e aos direitos humanos previstos nos tratados internacionais de proteção aos direitos mínimos, dos quais o Brasil se tornou signatário, consoante já apresentados. Nesse contexto, os orçamentos destinados à educação e à saúde, em 20 anos, passarão por cortes graduais. Com isso, os direitos sociais efetivamente vão sofrer um comprometimento, atingindo, sobremaneira, os grupos de pessoas mais em situação de vulnerabilidade social.

Ainda na análise acerca da adequação das políticas públicas e das ações afirmativas de proteção aos direitos humanos previstas nos tratados de direito internacional, dos quais o Brasil

164 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Acórdãos. Pesquisa de Jurisprudência, 11 out. 2018. Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28VEDA%C7%C3O+AO+RETROCE SSO%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/y2sy9s7e. Acesso em: 14 ago. 2019.

se tornou signatário, importante pontuar o Projeto de Lei Nº 6.299/2002, popularmente conhecido como PL do veneno, que busca alterar os artigos 3º e 9º, da Lei Nº 7.802, de 11 de julho de 1989. Tal lei dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e a rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, os componentes e afins, e dá outras providências165. Já o Projeto de Lei em comento está tramitando e foi aprovado pela Comissão Especial da Câmara, por isso, ainda não modificou em definitivo os artigos da Lei Nº 7.802/1989. Ele foi intitulado vulgarmente como o PL do veneno, pois, se aprovado, flexibilizará a utilização de agrotóxicos na agricultura em larga escala. Tais modificações estão travando discussões entre a ANVISA, o IBAMA e o Ministério da Agricultura.

Os principais pontos em discussão são os de que o PL Nº 6.299/2002 propõe a substituição, no texto normativo, do termo “agrotóxico”, por “defensivo fitossanitário e produtos de controle ambiental”, o que poderia causar uma confusão; ou até retirar o significado ofensivo, que já está vulgarmente conhecido no que tange ao termo agrotóxico. Um ponto importante é o de que, atualmente, a liberação da utilização de agrotóxicos no país passa pelo crivo de três órgãos, a saber: o IBAMA (Meio Ambiente), a ANVISA (Saúde Humana) e o Ministério da agricultura, pecuária e abastecimento (Agricultura). Com o novo projeto, a análise sobre a liberação da utilização de agrotóxicos só passaria pelo Ministério da Agricultura por meio de um órgão que seria criado: Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários – CTNFito166.

A alimentação é um direito humano internacionalmente reconhecido por meio dos tratados e convenções internacionais, prevista no artigo 6º da Constituição, devendo ser resguardada quanto ao acesso, mas com qualidade, estabelecendo a proteção à insegurança alimentar, possibilitando que essa alimentação seja saudável, não comprometendo a qualidade de vida do indivíduo. A liberação dos agrotóxicos, ou a flexibilização quanto à utilização, beneficia a agroindústria de exportação que necessita de produção em larga escala, objetivando

165 BRASIL. Projeto de Lei 6.299, de 13 de março de 2002. Disponível em:

https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=46249. Acesso em: 15 jun. 2019.

166 CAMPOS, Karina. Entenda o que está em jogo na nova Lei dos agrotóxicos. Edição de Cassiano Ribeiro. Globo

Rural, 20 jun. 2018. Disponível em:

https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Agricultura/noticia/2018/06/entenda-o-que-esta-em-jogo-na-nova-