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O YT nunca foi uma plataforma completamente livre para a veiculação de qualquer tipo de conteúdo. No ano da sua fundação em 2005, não havia uma seção específica sobre as Diretrizes da Comunidade, que são uma série de regras a serem seguidas por usuários e criadores de conteúdo. Entretanto, já estava explícito que não deveriam ser postados ou transmitidos nos servidores do site qualquer tipo de comunicação, texto, gráficos e outras informações que sejam

ilegais, obscenos, fraudulentos, indecentes ou que difamem, abusem, assediem ou ameacem os outros, ou sejam odiosos, racistas ou etnicamente ou de outras formas censuráveis. [...] que defendam ou encorajem qualquer atividade ilegal. Que infrinjam ou violem o direito e a privacidade dos indivíduos, incluindo outros usuários do site ou que violem qualquer lei local, estadual, nacional ou internacional" (YT TS, 2005).

A partir de 2006, quando a plataforma é adquirida pela Google, uma série de diretrizes são delineadas para especificar estes elementos indesejáveis. De 2006 a 2016 as diretrizes eram abertas com a seguinte frase:

Não estamos pedindo o tipo de respeito reservado para freiras, idosos e neurocirurgiões. Queremos dizer que não abuse do site. Todos os novos recursos interessantes da comunidade no YouTube envolvem um certo nível de confiança.

Confiamos em você como responsável e milhões de usuários respeitam essa confiança, então, por favor, seja um deles (YT DC, 2006-2016).

Esta era uma tentativa espirituosa de fazer com que as pessoas soubessem que certos limites devem ser respeitados, mas que a plataforma era “descolada” o suficiente para que o controle não fosse excessivo. A tônica das regras basicamente sugeria aos seus usuários que “não cruzassem a linha” e algumas regras que deveriam ser "senso comum" eram elencadas. “O YT não é um site de pornografia”; não devem ser postados vídeos mostrando atos ilegais ou perigosos (como abuso de animais ou criação de bombas); vídeos de violência real não são permitidos (como pessoas sendo machucadas, atacadas ou humilhadas); não devem ser enviados vídeos de acidentes, cadáveres e "coisas do tipo". Ainda, sobre a liberdade de expressão, as diretrizes sublinham que o YT "encoraja a liberdade expressão e defende o direito de todos de expressar opiniões impopulares" (YT DC, 2016), entretanto, não são permitidos discursos de ódio "que contém insultos ou o uso malicioso de estereótipos destinados a atacar ou rebaixar um determinado sexo, orientação sexual, raça, religião ou nacionalidade" (Ibid.). São vedados “comportamentos predatórios, perseguição, ameaças, assédio, invasão de privacidade ou a revelação de informações pessoais de outros membros” (Ibid.). Caso um usuário seja pego fazendo isso pode ser permanentemente banido da plataforma.

Desde o início a ideia que se tenta promover através dessas linhas gerais de permissões e restrições é que o YT é uma comunidade e que as pessoas têm que se divertir durante sua utilização. Ao longo dos anos algumas outras questões foram sendo inseridas, como "abuso de drogas" (YT DC, 2007), "menores de idade bebendo e fumando" (YT DC, 2008), a orientação de não criar vídeos com chamadas sensacionalistas (já que, segundo a plataforma "todos odeiam spam") (YT DC, 2007), proibição ao discurso de ódio à veteranos de guerra (YT DC, 2007) e ataques à grupos baseado na "identidade de gênero" (YT DC,2008). A partir de 2008 o YT passa a fazer um resumo sobre cada ponto, especificado nos anos anteriores através de um texto, a partir de recursos gráficos vão ganhando espaço para facilitar o acesso à informação (Figura 6 e como no caso das políticas de privacidade mencionadas na seção anterior).

FIGURA 6 - VÍDEO SOBRE AS DIRETRIZES DA COMUNIDADE

Fonte: Reprodução de frame do vídeo “When users ask us to remove content”, disponível em: https://www.youtube.com/yt/about/policies/#community-guidelines. Acesso em 03/03/2019.

A plataforma também oferece um acesso nomeado "modo restrito". Os criadores de conteúdo ativam essa opção em seus vídeos caso avaliem que o vídeo possa ser veiculado neste modo. Também é informado aos criadores de conteúdo que a ativação deste modo não afeta a qualificação dos vídeos para a geração de receita. Ela apenas possibilita que certos usuários que ativaram esta opção (como no caso de escolas, instituições ou bibliotecas que queiram restringir o acesso a todo conteúdo existente, ou pais ao controlarem o conteúdo assistido pelos filhos) tenham acesso apenas aos vídeos marcados com esta característica. É uma maneira encontrada pela plataforma para incitar um sistema de autogestão dos conteúdos pelos próprios usuários da plataforma, que tem o poder de denunciar determinado conteúdo

possivelmente classificado como para maiores, a saber: Drogas e álcool: falar sobre uso e consumo de drogas ou consumir bebidas alcoólicas em vídeos; Teor

sexual: conversas muito detalhadas ou representações de sexo ou atividade

sexual. Alguns conteúdos educativos e objetivos sobre educação sexual, afetividade ou identidade podem ser incluídos no Modo restrito, bem como conteúdos com beijos ou outras demonstrações de afeto que não sejam excessivamente sexualizadas ou o foco do vídeo; Violência: descrições explícitas de violência, atos violentos, desastres naturais e tragédias ou violência em noticiários; Temas adultos: vídeos com detalhes específicos sobre eventos relacionados a terrorismo, guerra, crime e conflitos políticos que resultaram em

morte ou lesões graves, mesmo que não apareça nenhuma imagem explícita;

Linguagem obscena e adulta: linguagem imprópria, incluindo palavrões71 .

FIGURA 7 - PRINCIPAIS PONTOS ESTABELECIDOS PELAS DIRETRIZES

Fonte: Montagem elaborada pelo autor a partir da reprodução dos dados disponíveis em

https://www.youtube.com/yt/about/policies/#community-guidelines. Acesso em 03/03/2019.

Certamente existem linhas bastante tênues que saparam aquilo que pode ser veiculado dos conteúdos proibidos. Em relação ao discurso de ódio, por exemplo, as diretrizes estabelecem que "geralmente é okay criticar uma nação, mas não é okay fazer generalizações sobre pessoas de uma nacionalidade específica" (YT DC, 2008). A "linha" estabelecida e posta para não ser cruzada diz respeito, sinteticamente, 1) ao consumo de substâncias psicoativas, 2) atividade sexual, 3) violência e conflitos e 4) controle da linguagem. As restrições dependem dos desenvolvimentos culturais e padrões julgados como aceitáveis na veiculação de conteúdo em um espaço virtualmente aberto a todos. O policiamento intrausuários torna, assim, o conteúdo do YT uma amostra dos desejos e das rejeições morais em conteúdos veiculados em meios de comunicação em massa.

71 Ver “Pesquisa e descoberta no YouTube”, disponível em

https://creatoracademy.youtube.com/page/lesson/discovery?hl=pt-BR#strategies-zippy-link-8. Acesso em 03/03/2019.