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Distinção entre Imunidade, Isenção, Não Incidência e Alíquota Zero

2.7.1 Isenção

A isenção não se confunde com a imunidade tributária. Esta se encontra adstrita à competência tributária prevista na Constituição, no sentido de, previamente, impedir a criação de regras jurídicas de tributação, enquanto a isenção, veiculada através de legislação

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infraconstitucional, atua no exercício dessa competência, retirando, do campo de incidência da tributação, a pessoa ou o bem isento56.

O preceito de imunidade exerce função de colaborar, de uma forma especial, no desenho das competências impositivas. São norma constitucionais. Não cuidam da problemática da incidência, atuando em instante que antecede, na lógica do sistema, ao momento da persecução tributária. Já a isenção se dá no plano da legislação ordinária. Sua dinâmica pressupõe um encontro normativo, em que ela, regra de isenção, opera como expediente redutor do campo de abrangência dos critérios da hipótese ou da consequência da regra-matriz do tributo57.

A imunidade e as isenções (incluída a alíquota zero) são permissões explícitas do ponto de vista do contribuinte e configuram proibições ou deveres de omissão aos entes estatais. Uma proibição aos entes políticos da Federação de instituir tributos (no caso de imunidade) ou uma proibição à cobrança do tributo (no caso da isenção ou da alíquota zero)58

A outorga de isenção é matéria que se submete ao princípio da legalidade, ou seja, sob reserva de lei59, tendo em vista que a lei não apenas opera no sentido positivo de instituição de tributos, mas, também, sob o prisma negativo da exoneração fiscal, porque, se inexiste tributo sem que a lei o institua, tampouco existe isenção tributária sem lei que a determine.

Na isenção, o ente tributário competente exerce a prerrogativa constitucional recebida, vindo a introduzir no sistema normativo o gravame tributário, e em momento posterior, institui a regra isentiva com o propósito de desonerar da incidência tributária aqueles atos, fatos ou situações que considera pertinentes.

Desse modo, a isenção atua como mecanismo reducionista, total ou parcial, de um ou mais elementos da regra-matriz de incidência tributária, situados no antecedente ou no consequente normativo, de modo a impedir o surgimento do liame obrigacional, em relação àquelas situações abrangidas pela isenção.

No que se refere à imunidade, constitui-se como regra jurídica que delimita negativamente a competência tributária, pois impede que os entes políticos venham instituir tributos incidentes em dadas situações constitucionalmente previstas.

56 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral das Isenções tributárias. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p.

163.

57

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 234

58 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 119.

59 Nos termos do artigo 97, inciso VI, do Código Tributário Nacional (CTN), somente a lei pode estabelecer,

dentre outras, as hipóteses de exclusão do crédito tributário, dentre as quais se inclui a isenção, nos termos do artigo 175, inciso I, do mesmo código.

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Em algumas disposições constitucionais relacionadas a desonerações tributárias, o constituinte utiliza o termo isenção, para se referir a hipóteses de imunidade tributária. Como bem asseverou o então Ministro do Supremo Tribunal Federal, Moreira Alves, no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.02860, cujo acórdão foi publicado no Diário de Justiça em 16 de junho de 2000, isenção prevista na Constituição imunidade é. Segunda a jurisprudência do STF61, isenção é a dispensa legal do pagamento de um tributo, e a imunidade, por sua vez, é a exclusão constitucional da competência para instituir o tributo.

Portanto, a imunidade e a isenção são instrumentos jurídicos distintos, que não se coadunam dentro do sistema normativo, pois a imunidade consiste em regra jurídica, albergada na Constituição Federal, que delimita, de modo negativo, a atuação legislativa ordinária ao impossibilitar a instituição de tributos incidentes sobre determinada classe de indivíduos ou coisas. Enquanto a isenção atua no campo da legislação ordinária, operando na norma previamente positivada, impedindo a manifestação, de um ou alguns, dos critérios da regra-matriz de incidência tributária, e obstando o surgimento da obrigação prestacional.

2.7.2 Não incidência

A não incidência ocorre quando os requisitos previstos na lei tributária não se verificam concretamente, de modo que não surge a obrigação tributária para o contribuinte. Hugo de Brito Machado define referido fenômeno jurídico a partir da contraposição ao conceito de hipótese de incidência:

[...] a não incidência é tudo que está fora da hipótese de incidência. Não foi abrangido por esta. Resulta da própria regra jurídica de tributação que, definindo a hipótese em que o tributo é devido, por exclusão, define aquelas em que não é62.

Para Yoshiaki Ichihara, a não-incidência, que não se confunde com a imunidade nem com a isenção, é a ocorrência de fatos que não estão no campo da norma de incidência ou no campo da competência, sendo, portanto, fatos atípicos incapazes de gerar a obrigação tributária63.

60 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.028. Rel.

Min. Moreira Alves. 11 de novembro de 1999. Diário de Justiça, 16 jun. 2000.

61 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 93.770, Primeira Turma. Rel. Min. Soares

Muñoz. 17 de março de 1981. Diário de Justiça, 3 abr. 1981.

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MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 233.

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Na isenção, o fato gerador tributário não ocorre por decorrência de uma norma jurídica que impede o surgimento da obrigação tributária, na hipótese de não incidência, sequer existe norma tributária tipificando a situação fática.

Hugo de Brito Machado classifica a não incidência como simples, quando resultante da incoerência do suporte fático da regra de tributação, e juridicamente qualificada, caso exista regra jurídica expressamente prevista atribuindo que não se configura, no caso, a hipótese de incidência tributária. Contudo, esclarece:

A não incidência mesmo quando juridicamente qualificada não se confunde com a isenção, por ser mera explicitação que o legislador faz para maior clareza, de que não se configura, naquele caso, a hipótese de incidência. A rigor, a norma que faz tal explicitação poderia deixar de existir sem que nada se alterasse. Já a norma de isenção, porque retira parcela da hipótese de incidência, se não existisse, o tributo seria devido64.

Rui Barbosa Nogueira amplia as distinções entre não incidência, isenção e imunidade, no âmbito da competência tributária:

[...] os campos de incidência e isenção cabem ao legislador ordinário. Este, dentro de sua competência, tem a faculdade de traçar o círculo da incidência e excepcionar a isenção. O da não incidência ficou fora do círculo da incidência. Em princípio a área de incidência ou de isenção podem ser aumentadas ou diminuídas pelo competente legislador ordinário, porém jamais ultrapassar a barreira da imunidade, porque esta é uma vedação constitucional.

Por fim, colacionamos a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 286, apresentou distinção entre os institutos jurídicos da não incidência e da isenção tributária:

A não incidência do tributo equivale a todas as situações de fato não contempladas pela regra jurídica da tributação e decorre da abrangência ditada pela própria norma. A isenção é a dispensa do pagamento de um tributo devido em face da ocorrência de seu fato gerador. Constitui exceção instituída por lei à regra jurídica da tributação. A norma legal impugnada concede verdadeira isenção do ICMS, sob o disfarce de não incidência. (ADI 286, Rel. Min.Maurício Corrêa, julgamento em 22-5-2002,

Plenário,DJde 30-8-2002).

2.7.3 Alíquota zero

O constituinte originário facultou ao Poder Executivo, nas condições e limites estabelecidos legalmente, alterar as alíquotas aplicáveis na apuração de determinados tributos

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como medida de intervenção nos setores socioeconômicos, dado o caráter extrafiscal das referidas exações.

A atuação do ente estatal pode acarretar a redução da alíquota até o limite denominado alíquota zero, do qual decorre uma desoneração do pagamento de tributo por ausência de resultado positivo a pagar. Nessa situação, não se configura a isenção, tendo em vista que nesta se exige a edição de lei ordinária, que atua como instrumento de delimitação do alcance da norma tributária impositiva.

Na lição de Sacha Calmon, neste caso há a hipótese de incidência (descrição do fato gerador) para propositura da tributação. Contudo, não se configura o tributo porque no plano do consequente da norma tributária existe uma ressalva de intributabilidade, traduzida na fixação de uma alíquota zero, elemento impossibilitador de quantificação do dever tributário65.

Existem situações em que o Poder Executivo necessita atuar de modo célere, dada exigências conjunturais, não tributando temporariamente certo produto como medida de atuação no mercado, valendo-se, para tanto, da alíquota zero, que se demonstra mais apta este fim que a isenção, sujeita a princípios constitucionais irredutíveis, como o da legalidade e o da anterioridade da lei tributária em relação ao exercício da cobrança do tributo66.

É possível perceber na Constituição Federal distinções entre a isenção e a alíquota zero, pois a primeira exige a observância obrigatória do princípio da legalidade, enquanto na segunda, o constituinte excepcionou de forma expressa o mesmo princípio, bem como o da anterioridade.

O Poder Executivo, na sistemática da alíquota zero, encontra-se autorizado a alterar as alíquotas, nos limites fixados em lei, por meio de um simples ato administrativo, aumentando-as ou reduzindo-as, inclusive a zero, independentemente do exame do legislador, o que não é factível em relação à isenção.

A atribuição de uma alíquota zero, portanto, demonstra-se como possibilidade autorizada pelo texto constitucional, ao Administrador Público competente em prol de interesses públicos, não se sujeitando à legalidade estrita como na instituição de uma isenção.

65 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. A imunidade dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua

impressão. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Imunidade tributária do livro eletrônico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 273-281.

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