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2.8 Imunidades em Espécie

2.8.1 Imunidade Recíproca

A Carta Magna brasileira, em seu artigo 150, inciso VI, alínea a, determina que é vedado à União, Estados, Distrito Federal e Municípios instituírem impostos sobre o patrimônio, renda e serviços, uns dos outros67.

O dispositivo constitucional, inspirado no Direito norte-americano, visa garantir o pacto federativo adotado pelo Estado brasileiro, que foi instituído como forma de se promover a distribuição do poder entre os entes políticos, de modo que cada uma das unidades federativas pudesse desempenhar suas atividades precípuas de forma autônoma, porém, limitadas à competência atribuída pelas regras estabelecidas pela Constituição Federal.

A forma federativa adotada pelo Estado encontra-se prevista no ordenamento jurídico brasileiro com o status de cláusula pétrea, conforme se depreende do artigo 60, §4º, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...]

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais. [grifo nosso]

A imunidade recíproca, no concernente às propriedades, aos bens e aos serviços utilizados na consecução das finalidades das entidades federativas, permitiu a esses detentores do poder, desempenhar as atividades constitucionais que lhe foram entregues, sem que a incidência tributária pudesse consistir em óbice a sua realização.

67 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao

Distrito Federal e aos Municípios: [...]VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; [...] § 2º - A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes. § 3º - As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

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A regra imunizante visa promover a igualdade, a harmonia e a independência das unidades políticas, impedindo que a prescrição de regras tributárias possa impedir o livre exercício das prerrogativas constitucionais entregues a cada um dos entes.

A imunidade tributária conferida às entidades federativas não está adstrita, tão somente ao seu patrimônio, rendas e serviços, devendo também atingir todo o conjunto patrimonial incorporado, desde que seja ele indispensável à consecução das atividades por essas desenvolvidas, de tal sorte que, sejam alcançadas por elas as finalidades eleitas pela Constituição.

Neste tocante, a jurisprudência pátria aponta que o acréscimo patrimonial decorrente de aplicações financeiras promovidas pelos entes políticos, quando destinados à realização da atividade estatal e a consecução dos desígnios constitucionais são imunes à incidência tributária, in verbis:

EMENTA: IMUNIDADE. ART. 150, VI, ALÍNEA C. RENDAS DE APLICAÇÕES FINANCEIRAS. ABRANGÊNCIA. Os rendimentos de aplicações financeiras de renda fixa ou variável não implicam renda dissociada da atividade fim do ente imune. As operações financeiras destinadas à viabilizar ou otimizar a atuação das entidades nas suas atividades fins não desbordam do seu objetivo, caracterizando-se como simples instrumento administrativo para a consecução das suas atividades. Sendo os recursos destinados à sua atividade fim, não há que se afastar a imunidade. O STF suspendeu a eficácia do §1º do art. 12 da Lei 9.532/97 na ADIn 1.802. (TRF da 4ª Região, MAS 200004010689187. 1ª Turma. Juiz Federal Dr. Leandro Paulsen, out/03).

Asseverando o apresentado, Sacha Calmon leciona:

Não se trata de imunizar apenas a incidência do imposto de renda, dos impostos sobre o patrimônio e dos impostos sobre serviços, como durante muito tempo pensou o STF e também nós. Trata-se de vedar a incidência de quaisquer impostos sobre a renda, o patrimônio e os serviços das pessoas políticas, como sempre quis Baleeiro. [...] o que importa é preservar o ‘patrimônio’ e a ‘renda’ das pessoas políticas e de suas autarquias do ataque de quaisquer impostos. Este, sem dúvida, é o melhor caminho, o mais consentâneo com a axiologia do princípio imunitório in examen68.

A imunidade recíproca igualmente se aplica às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que tange ao seu patrimônio, à renda e aos serviços, de acordo com o §2º do artigo 150, da CF.

Nesse ínterim, importante mencionar o entendimento de José Eduardo Soares de Melo:

68 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 6ª ed., São Paulo: Forense,

48 Esta imunidade é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados às suas finalidades essenciais ou às dela decorrentes (§2º do art. 150), significando que a fruição do benefício é também aplicável a tais entidades, em razão de serem consideradas como uma verdadeira extensão da Administração Pública, praticando atos e procedimentos que lhe são peculiares69.

Contudo, o art.150, §3º, da Constituição Federal de 1988, dispõe, in verbis:

§ 3º. As vedações do inciso VI, a, e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

Portanto, encontra-se expressamente previsto que a imunidade recíproca não beneficiará as unidades políticas, ou suas autarquias e fundações, quando esses, no exercício de suas atividades, promoverem o regime concorrencial com os particulares.

O efeito imunizatório está relacionado à supremacia do Poder Público, dessa forma, quando despido das prerrogativas caracterizadoras, os entes federativos devem suportar igual ônus tributário, em semelhança aos particulares, a fim de que seja garantido um tratamento isonômico, como comanda o texto constitucional.

Analisando os §§ 2º e 3º do art. 150 da Constituição Federal, a Egrégia Corte Suprema do Brasil firmou jurisprudência no sentido de que as empresas públicas e sociedades e economia mista prestadoras de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado são abrangidas pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal.

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO – PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA TUTELA – AÇÃO CAUTELAR SUBMETIDA A REFERENDO – TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE RECÍPROCA – ART. 150, VI, A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – 1. Plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) diante do entendimento firmado por este Tribunal quando do julgamento do RE 407.099/RS, Relator Ministro Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 06.08.2004, no sentido de que as empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado são abrangidas pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. 2. Exigibilidade imediata do tributo questionado no feito originário, a

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49 caracterizar o risco de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora). 3. Decisão cautelar referendada70. [grifou nosso]

EMENTA: Tributário. Imunidade recíproca. Art. 150, VI, a, da Constituição Federal. Extensão. Empresa pública prestadora de serviço público. Precedentes da Suprema Corte. Já assentou a Suprema Corte que a norma do art. 150, VI, a, da Constituição Federal alcança as empresas públicas prestadoras de serviço público, como é o caso da autora, que não se confunde com as empresas públicas que exercem atividade econômica em sentido estrito. Com isso, impõe-se o reconhecimento da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. 2. Ação cível originária julgada procedente71. [grifo nosso]