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Docência Online: Bases Epistemológicas para uma Pedagogia Interativa

3 EDUCAÇÃO ONLINE: UM NOVO PARADIGMA

3.3 Docência Online: Bases Epistemológicas para uma Pedagogia Interativa

Por situarmos a Educação Online como nova modalidade educativa, um novo comunicacional, ela se apresenta como desafio para todos os docentes, pois os mesmos foram formados em um outro tempo-espaço social anterior ao lócus das redes, e assim requer um esforço para compreensão teórica e prática para atuar como forma de construir um processo educativo significativo, e não uma mera transposição do presencial, como tem se constituído na maioria dos cursos.

Dependendo das concepções filosóficas e epistemológicas de educação, de sociedade, o professor pode caminhar para uma prática baseada no Paradigma conservador, de ensino e aprendizagem instrucional, que reproduz conhecimento, coadunando com a Educação a Distância, ou seguir para um processo educador de Paradigma emergente, que tem como estruturantes os seguintes elementos: Visão Sistêmica ou Holística: que significa o resgate do ser humano em sua totalidade, ou seja, considerar o humano com suas inteligências múltiplas; Abordagem Progressista: que visa a transformação do social, sendo o diálogo e a discussão coletiva um ponto fundamental para aprender de maneira significativa, contemplando assim trabalhos colaborativos entre alunos e professores, parceira entre tais atores do processo

educativo; Ensino como pesquisa: que traz os alunos e professores como pesquisadores e produtores de conhecimento (BEHRENS, 2010). O paradigma emergente de educar coaduna com o olhar sobre a Educação Online, sendo os elementos que o estruturam que são a visão sistêmica, abordagem como pesquisa e ensino como pesquisa, juntos constituem uma tecnologia inovadora no olhar da autora, que é a produção do conhecimento.

Educar Online é construir conhecimento, é fazer um processo educativo para autonomia do discente, para sua autoria, colaboração entre pares, é educar para humanizar, para a formação crítico reflexiva, é dar voz aos atores e fazê-los empoderados de seu fazer histórico e social, ou seja, que por meio da educação possa ter consciência do poder que tem em mãos de construir/transformação a sociedade em que vive. Isso requer do docente saída da posição de detentor, ser professor reflexivo, e neste movimento de ir “[...] pensando criticamente a prática de ou ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário a reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática” (FREIRE, 1996, p. 18).

É na ação-reflexão-ação (SCHÖN,2003), na desenvolver do olhar de experimentação, pesquisa e reflexão da prática docente, ou seja, do professor reflexivo, que se irá compreender o significado de Educar Online, e assim, desenvolver as competências necessárias para atuar nesta nova modalidade educativa. É preciso ousadia, pois só se aprende Educação Online no seu fazer, pois imergimos neste novo tempo histórico-social, que é complexo, híbrido, hipertextual, efêmero, e precisamos dar sentido a todo este novo movimento de ser, estar e viver em sociedade, e evidentemente fazer educação na Cibercultura.

Educação Online é possível de ser realizada quando buscamos realmente entender este novo comunicacional que é a interatividade. A Sociedade em Rede nos coloca o desafio de mudarmos o paradigma de uma Pedagogia da Transmissão para uma Pedagogia Interativa, e encarar tal desafio requer coragem e ousadia, que só aqueles que compreendem o papel da Educação como forma de transformação social é que sabem a importância de sua função enquanto docente conseguirão iniciar esta caminhada, que apesar de árdua se faz como nossa obrigação enquanto sujeitos que construímos a sociedade do amanhã.

Neste sentido, precisamos rever a didática no contexto do online, ressignificar e reconfigurar tanto em função do espaço-tempo como nas peculiaridades do online (MELO; BARROS, 2017, p. 45). É acrescentado pelas autoras elementos que sustentam esta, digamos isso, nova didática do online, e entre estes temos as palavras de ordem: comunicação, mediação da comunicação virtual, relações de colaboração, busca de informações e construções entre as pessoas no online envolvendo os conteúdos trabalhados, e por fim, a coaprendizagem.

Mesmo sendo abordado tal debate para o ensino superior, Mello e Barros (2017) a partir de diversos autores constroem características importantes para esta nova didática no online, a qual podemos ver no quadro:

Quadro 10 – Características da Didática no Online

Elementos Clássicos da Didática Elementos da Didática Online

Docente Comunidades de aprendizagem

Estudantes Autoria e participação

Estratégias metodológicas Estratégias focadas na ação do aluno

Conteúdos Conteúdos significativos

Objetivos Cenários Diversificados

Contexto de aprendizagem Participação e liderança partilhada Comunicação e interação com os

estudantes

Coaprendizagem e coinvestigação

Atividades e exercícios para os estudantes Sustentabilidade pedagógica

Recursos disponíveis Redes e interfaces

Avaliação Avaliação processual e compartilhada

Fonte: Mello e Barros (2017, p. 49)28.

Portanto, como podemos ver e que salientam as autoras, a Didática passa a ser a mediadora entre o conteúdo e o aprendiz, em sua dimensão técnica, além de novas estratégias, conteúdos, formas de avaliar, atividades, tempo, desencadear das atividades e mediações. Além disto, vemos que há um partilhar da responsabilidade do processo de aprendizagem com o aluno, e de tal forma “a aprendizagem se dá a partir das mediações entre as pessoas e os objetos (MELLO; BARROS, 2017, p. 50). É interessante também refletir no mesmo sentido a fala de Souza, Cruz e Amante (2017)

[…] o processo de ensino e aprendizagem para o online deve ser planejado, desenhado para contemplar estratégias que levem os estudantes ao envolvimento com o outro e com os grupos de discussão virtual pela comunicação síncrona e assíncrona, efetivada pela interação escrita, potencializando a capacidade de reflexão crítica (p. 67).

Deste modo, o processo educativo Online tem como centralidade o sociointeracionismo trazido por Vigotski (2007), e assim, os sujeitos aprendem na/com a interação, e ao professor cabe agir na zona de desenvolvimento proximal (ZDP), o qual ele define como

28 Quadro elaborado pelas autoras baseados nos autores Garisson (2000), Petters (2006), Trentin (2008), Dias (2013), Harasim (2015) e Mello e Barros (2015).

A distância entre o nível de desenvolvimento real que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VIGOSTKI, 2007, p. 97).

Concretizada como a diferença entre o que o sujeito desenvolve sem o auxílio de seus pares (nível de desenvolvimento real) e o que ele consegue realizar com a ajuda dos outros sociais (nível de desenvolvimento potencial), seja com o professor a realizar a mediação pedagógica, ou seus outros sujeitos. A interatividade e o aprender pela interação, debate crítico com outros sujeitos, em colaboração com estes pode fazer com que alcancem um desenvolvimento maior que quando estudam de maneira individual.

No ambiente online e/na rede o professor modifica a sua autoria, pois para construir um espaço autêntico de educação, uma sala de aula interativa, colaborativa, para que ele construa um desenho didático que atue na zona de desenvolvimento proximal de seus alunos, faz-se preciso modificar sua prática no sentido de criar uma ambiência comunicacional, sendo um instigador de inteligências e assim

O professor constrói uma rede e não uma rota. Ele define um conjunto de territórios a explorar, enquanto a aprendizagem se dá na exploração- ter a experiência- realizada pelas aprendizagens e não a partir da sua récita. O professor não se posiciona como o detentor do monopólio do saber, mas como aquele que dispõe teias, cria possibilidades de envolvimento, oferece ocasião de engendramentos, de agenciamentos e estimula a intervenção dos aprendizes como coautores da aprendizagem (SILVA, 2012 a, p. 57-58).

O professor na Educação Online deve ser um arquiteto de percursos, deve dispor a obra para que ela se desenlace na rede, e isto só acontece se ele compreende o conceito de interatividade, ou seja, de construir o AVA e diversas possibilidades nas redes como disponibilização para autoria e coautoria, e o significado de disponibilizar se constitui a partir de três investimentos, de acordo com Silva (2014a, p. 32)

Oferecer múltiplas informações em imagens, sons, textos etc., utilizando ou não tecnologias digitais, mas sabendo que estas, utilizadas de modo interativo, potencializam consideravelmente ações que resultam em conhecimento. Ensejar, oferecer ocasião para urdir, dispor entrelaçados os fios da teia, enredar múltiplos percursos para conexões e expressões com que os aprendizes possam expressar no ato de manipular informações e percorrer percursos arquitetados.

Estimular cada aprendiz a contribuir com novas informações e a criar e oferecer mais e melhores percursos, participando como co-autor do processo.

Convidar os alunos para construir o desenho didático do caminhar de aprendizagem, construir atividades diversas e motivadoras à participação por autoria e coautoria, dispor diversas interfaces para que o aluno possa construir o conhecimento a partir da metacognição, mediação pedagógica e/ou zona de desenvolvimento proximal, bem como trazer os diversos espaços das redes em que os alunos estão inseridos, são algumas formas de disponibilizar uma multirreferencialidade de espaços educativos e um aprender que caminhe para a formação cidadã e que tenha sentido para o aluno.

Entendemos o desenho didático de um ambiente virtual de aprendizagem como um elemento de extrema significância, pois é a partir de sua disposição para os alunos, ou seja, da sua clareza e compreensão, das interfaces acionadas para interação, de sua hipertextualidade, de sua abertura à participação do aluno, enfim, a partir de toda sua teia de possibilidades criadas pelo professor para o caminho da aprendizagem do aluno, pode-se ou não criar uma ambiência que seja favorável a interatividade. Temos que ressaltar também que tal desenho didático é criado pela docência inicialmente, mas sempre amparado no contexto da discente, de suas necessidades, mas que só isso não atinge o objetivo de um desenho didático inclusivo, interativo.

É essencial pensar um desenho didático flexível, que tenha participação ativa dos estudantes no sentido de contribuir seja com materiais, com ideias que reconfigurem o próprio desenho do curso, as atividades de avaliação da aprendizagem entre outros aspectos, pois só a partir da inclusão do aluno na própria construção de todo o cenário educativo online que poderemos edificar com eles um sentimento de pertença, de inclusão, de importância, o qual será base para concretização de uma real comunidade virtual de aprendizagem. Neste sentido, coadunamos com Santos e Silva (2009, p. 275, grifos dos autores)

Pensar a prática pedagógica para a educação online é antes de qualquer coisa pensar um desenho didático interativo como arquitetura que envolve o planejamento, a produção e a operatividade de conteúdos e de situações de aprendizagem, que estruturam processos de construção do conhecimento na sala de aula online. Estes conteúdos e situações de aprendizagem devem contemplar o potencial pedagógico, comunicacional e tecnológico do computador online, bem como das disposições de interatividade próprias dos ambientes online de aprendizagem. Uma sala de aula online não é apenas o conjunto de ferramentas infotécnicas, mas um ambiente que se auto-organiza nas relações estabelecidas pelos sujeitos com os objetos técnicos que interagem e afetam-se mutuamente ao longo do processo de construção do conhecimento. Neste sentido, é preciso que o desenho didático contemple uma intencionalidade pedagógica que garanta a educação online como obra aberta, plástica, fluida, hipertextual e interativa. Caso contrário, repetirá práticas próprias da pedagogia da transmissão.

Portanto, o desenho didático do curso é um ponto de partida para a concretização de um caminho de aprendizagem potencial do ponto de vista comunicacional, podendo servir de aparato para uma concepção bancária, onde em lugar de comunicar-se o educador faz comunicados e o papel do aluno é de mero receptor, memorizador e repetidor do saber (FREIRE, 2013), ou de dar base para uma Pedagogia interativa, da comunicação, a qual tem como cerne o processo de ensino e aprendizagem e centrada no diálogo, no debate, na interação professor e aluno.

De acordo ainda com esta discussão, podemos perceber que o desenho didático está intrinsecamente ligado tanto com o paradigma de educação quanto com uma determinada prática de comunicação (KAPLÚN, 2002, p. 15). A respeito das concepções pedagógicas, apesar de colocar que existem várias o autor coloca em três modelos, os quais consideram que eles se dão de forma imbricada e não pura e, faz parte com diferentes medidas em cada realidade educativa, o qual podemos visualizar na imagem:

Figura 2 - Modelos Pedagógicos por Kaplún

Fonte: Kaplún (2002, p. 16).

Entendemos a partir da imagem que os Modelos Exógenos são concebidos de tal modo por se centrar em aspectos externos ao sujeito da aprendizagem, subdivide-se em dois aspectos: com foco nos conteúdos ou nos efeitos. O com foco nos Conteúdos é colocado como educação instrucional, em que professor é o detentor do saber e o repassa ao aluno, oriundo da clássica educação escolástica e enciclopédica europeia. O com foco nos Efeitos, corresponde a engenharia do comportamento, centrada em o educador moldar o comportamento do sujeito de acordo com objetivos previstos, ou seja, de um ensino programado com técnicas para aprender, a qual é oriunda do educar tecnicista emergido nos Estados Unidos na segunda guerra para tornar o ensino mais eficiente e eficaz do que o instrucional.

A base paradigmática educativo do Modelo Exógeno baseado nos Conteúdos é de um processo transmissivo, behaviorista, sendo o aluno visto como objeto, e “así como existe una educación «bancaria», existe una comunicación” (KAPLÚN, 2002, p. 22), o que significa que a comunicação neste olhar é simplesmente de transmissão de informação. Já no Modelo Exógeno centrado nos Efeitos nomeada de Educação Manipuladora, todos os passos do ensino e aprendizagem estão programados, e o aluno não tem autonomia para atuar, agir e pensar, ou seja, o ensino tecnicista prevalecente no Brasil no período ditatorial como forma de conseguir aumentar a produtividade da educação. Há portanto aqui Comunicação, mas ainda em sentido restrito, pois se consolida na Informação/Persuasão, buscando fazer os indivíduos atuarem mecanicamente e com a pseudo ideia de terem papel ativo na comunicação, por poder responder a mensagem, por dar feedback, contudo comportamental, o que de algum modo atenua a unidirecionalidade e se compara ao modelo centrado nos conteúdos, mas não concretiza bidirecionaldiade necessária a um processo comunicativo.

No Modelo Endógeno, denominado assim porque se considera o sujeito como centro do processo educativo, baseado em Paulo Freire, coloca-se como centro o processo de transformação da pessoa e da comunidade, ou seja, há uma preocupação com “la interacción dialéctica entre las personas y su realidad, del desarrollo de sus capacidades intelectuales y de su conciencia social” (KAPLÚN, 2002, p. 17). Vemos assim, que este modelo preocupa-se com um educar em que há interação, diálogo entre os sujeitos do conhecimento, desenvolvimento de capacidades intelectuais e de consciência de seu papel social, conduzindo assim a um educar libertador/transformador, baseado tríade ação-reflexão-ação e como instrumento de transformação social.

Neste aspecto há a Comunicação em seu sentido amplo, interativa, bidirecional, e que colocam os sujeitos do conhecimento em papel ativo na mensagem e na construção do conhecimento, do ponto de vista educativo. Portanto, vemos este como uma base para uma Pedagogia Interativa que nada mais é do que professor e alunos como partícipes e coaprendentes do processo de ensino e aprendizagem no online, que haja real interatividade, comunidade de aprendizagem ativa com foco em autoria, coautoria, enfim, produzir conhecimentos.

3.4 Mediação Pedagógica online: Construção da Identidade Docente para uma Pedagogia