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Países Suprimentos de águas

3.3. MUDANÇAS CLIMÁTICAS

3.2.4. Externalidades e impactos ambientais advindos das mudanças climáticas

3.3.4.2. Ecossistemas aquáticos

Estima-se que, em virtude da intensificação do efeito estufa, a temperatura média na sua superfície deverá elevar-se entre 1,5 e 4,5ºC. Essa elevação se dará em resposta ao aumento do nível de CO2 na atmosfera, que em meados do século, deverá estar em torno de 560 a 600ppm. Ainda não se sabe qual será o padrão de elevação da temperatura, posto que o aquecimento não se dará na mesma intensidade nas diferentes latitudes. Espera-se um aquecimento menor nos trópicos (+2ºC) e maior na medida em que se avança em direção aos pólos (+7ºC no Círculo Polar Ártico) (PEIXOTO et al., 2001).

O aumento da temperatura terá como conseqüência mudanças no padrão de circulação atmosférica e, com isso, alterações no regime de chuvas. Estima-se que as áreas atualmente úmidas poderão vir a se tornar mais úmidas e regiões hoje áridas poderão se tornar ainda mais áridas. Haverá, portanto, mudança considerável nos Biomas do planeta, dada a influência da precipitação sobre as comunidades vegetais (MARTINEZ, 2001).

De acordo com esse mesmo autor, a velocidade de mudança do clima será de dez a cem vezes mais rápidas do que a verificada na última transição glacial- interglacial. Com isso, muitas espécies poderão não conseguir migrar com a rapidez necessária para acompanhar a mudança climática e virem a se extinguir. Estima-se, por exemplo, que o aquecimento de 1ºC no limite mais quente e seco de uma floresta fará com que cerca de 100 a 200 milhões de ha se transformem em savanas. Espera-

se, ainda, que o aumento de CO2 na atmosfera provoque um aumento da fotossíntese

deverá beneficiar a flora, já que em comunidades naturais as plantas dependem de outros fatores, como nutrientes e água.

A mudança no padrão de chuvas poderá trazer sérias conseqüências em muitas regiões do planeta, às atividades que dependem dos recursos hídricos. Segundo GISS (2008), efeitos devastadores podem ser provocados pelos chamados ''eventos climáticos extremos'', como inundações e tempestades. A entidade afirma que ''65 países em desenvolvimento, representando mais da metade da população total dos países em desenvolvimento em 1995, vão perder cerca de 280 milhões de toneladas em potencial de produção de cereais como resultado das mudanças climáticas''.

Diante desses fatos, questiona-se o que poderá acontecer ao Brasil, no que diz respeito à água. As conseqüências das mudanças climáticas são inúmeras e já estão sendo evidentemente sentidas. O que tem sido consenso e divulgado por muitos cientistas, é que mesmo o Brasil, que possui boa parte da água doce e potável do planeta, terá sérios problemas com relação à água e à produção de alimentos. Nos dias atuais, boa parte das cidades de médio e grande porte já tem problemas com o abastecimento de água, tendo de captá-las por intermédio de extensas tubulações, a um elevado custo (FERNANDEZ e GARRIDO, 2002).

Os eventos climáticos não ocorrem de maneira isolada. As atividades antrópicas sobre o meio ambiente, tais como a pecuária e a agricultura, estão também alterando a dinâmica do clima, e, por conseguinte, das águas de todo o planeta. Considerando os efeitos individuais e cumulativos do efeito estufa e da destruição da camada de ozônio, pode-se sugerir que os recursos hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco poderão ser afetados (BARRETT, 1998). A Figura 24 (A e B) mostra as alterações climáticas ocorridas no Estado de Minas Gerais, quando comparadas as décadas de 1970 e 1990.

(A) (B)

FIGURA 24 - Alterações no clima no Estado de Minas Gerais entre as décadas 1970- 1990. Fonte: ANA, 2004.

A bacia hidrográfica do rio São Francisco é totalmente dependente do nível e da distribuição das chuvas. Nas bacias do ribeirão Entre Ribeiros e do rio Preto, já se percebem a redução da precipitação na área de drenagem das bacias (LATUF, 2007). Dessa forma, aí está a importância de natureza climática. Na verdade são de difícil quantificação todas as possíveis conseqüências, especialmente porque muitas das externalidades e impactos são desconhecidos e incalculáveis. As mudanças climáticas podem elevar a necessidade de escolha entre usos, por exemplo, irrigação ou geração de energia, proteção da vida aquática ou diluição de esgoto.

Estudo de Caso (2): Mudanças climáticas e a bacia hidrográfica do rio São Francisco

Os eventos climáticos não ocorrem de maneira isolada. Um exemplo desse fato é que a intensidade de chuva sobre o nordeste e o sudeste do Brasil, áreas geográficas onde a bacia hidrográfica do rio São Francisco está inserida, em parte pode ser explicada pela temperatura da superfície das águas do Oceano Pacífico (HASTENRATH e HELLER, 1997; HASTENRATH, 2006). De acordo com BARRETT (1998), o clima local, global e regional resulta da interação entre variáveis como pressão atmosférica e temperatura das águas superficiais dos oceanos. Essas e outras variáveis afetam, por conseguinte, a ocorrência de chuvas.

Vários cientistas, em todo o mundo, concordam que as mudanças climáticas já afetam e afetarão o ciclo hidrológico; mas os impactos e a capacidade de remediação destes, quando possível, ocorrerão de formas diversas nas diferentes regiões (GLEICK e KIPARSKY, 2004). Essas ligações ou interconexões (teleconexões, de acordo com NASCIMENTO, 2007), como o El Niño, modificam o clima local, regional e global, e, conseqüentemente, alteram o ciclo hidrológico.

As atividades antrópicas, tais como a pecuária e a agricultura, estão também alterando a dinâmica do clima e, por conseguinte, das águas do planeta. Sobre essas relações e alterações, cabe considerar os conceitos de cumulatividade e sinergia. Tais conceitos partem do princípio que as mudanças ao meio ambiente causadas por ações antrópicas em combinação com outras ações - do passado, presente ou futuras - podem de alguma forma potencializar os efeitos ambientais em uma dada região. Considerando os efeitos individuais e cumulativos das interconexões, do efeito estufa e da destruição da camada de ozônio, sugere-se que os recursos hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco poderão ser afetados (SOUZA, 2007; EPE, 2008).

Segundo NASCIMENTO (2007), as teleconexões e mudanças climáticas em geral influenciam os recursos hídricos porque alteram o clima e podem causar eventos extremos, como secas e inundações, levando ao aumento ou redução na vazão dos rios; no nível de evaporação da água contida no solo, da superfície das plantas e dos

corpos aquáticos; na quantidade de água perdida por transpiração por diferentes espécies de plantas; na quantidade e distribuição de chuva; na infiltração de água no solo; entre outros.

Considerando a grande extensão do rio São Francisco e a diversidade de ambientes que compõem a sua bacia hidrográfica, a sua grande população, a geração de hidroeletricidade, a irrigação e a diluição de esgoto, que figuram entre os maiores usos dos recursos hídricos da bacia, tais efeitos poderão ser imprevisíveis e, ou, dramáticos (CBHSF, 2004). Para se analisar os efeitos das teleconexões e mudanças climáticas, em geral, tem-se de pensar em duas situações (NASCIMENTO, 2007): escassez e excesso de chuvas – que, no caso do rio São Francisco, podem ocorrer conjuntamente em regiões distintas da bacia.

A seca é um fenômeno que castiga o Nordeste e afeta a qualidade e quantidade de água disponível, assim como ocasiona outras externalidades e impactos sócio-econômicos e ecológicos. As mudanças climáticas podem afetar a freqüência e a intensidade desses eventos. Considerando as zonas áridas do nordeste do Brasil, estudos indicam que sofrerão ainda mais com secas resultantes das mudanças climáticas, se nada for feito para reverter o quadro atual (Marengo, 1992,

apud LIMA, 2006). A redução do volume anual de chuva no nordeste do Brasil foi

correlacionada a anos de ocorrência do El Niño (Aceituno, 1988; Uvo, 1998, apud IPCC, 2001).

Uma elevação da freqüência e da área de ocorrência das secas afetará o acesso e a distribuição da água da bacia hidrográfica - externalidades e impactos diretos e indiretos podem ser criados. A redução dos recursos hídricos pode, entre outros: levar à ocorrência de desertos (OYAMA e NOBRE, 2004); causar a escassez de água para consumo humano, para espécies de animais e plantas; destruir/reduzir a produção/produtividade agrícola; aumentar a demanda de água para irrigação; incrementar a migração populacional para centros urbanos (AB’ SABER, 1999).

A seca pode afetar, também, a geração de energia e o tamanho da população atingida, já que a Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF), principal empresa de geração elétrica da bacia, é responsável pelo abastecimento de energia das grandes capitais nordestinas (CHESF, 2004). Já se sentiu o efeito da falta d’água durante o racionamento e “apagão” ocorrido no ano de 2001. Espécies aquáticas também serão prejudicadas. A mudança nas características dos corpos aquáticos, como a elevação da temperatura e o aumento da salinidade devido à escassez e baixo nível da água, pode causar alteração na composição de ecossistemas, como a perda de espécies. O decréscimo da vazão na foz pode levar à entrada de água salgada do oceano Atlântico no rio São Francisco, destruindo habitats e espécies.

Por outro lado, poderia acontecer o caso de aumento da quantidade e freqüência das chuvas. Isso já está ocorrendo em diferentes lugares do mundo, como nos Estados Unidos, e vem sendo atribuído às mudanças climáticas e às teleconexões (National Center for Atmospheric Research, 1994, apud SCHMIDT et al., 2001). O El Niño também pode causar aumento de chuva no sul do Brasil, efeito inverso ao que pode ocorrer no nordeste (Ropelewski e Halpert, 1989; Grimm et al., 1996, 2000 apud IPCC, 2001). Mudanças climáticas podem alterar a intensidade das chuvas na região sudeste (Marengo, 1992 apud OYAMA e NOBRE, 2004).

Considerando que 73,5% da vazão natural média do rio São Francisco vem do estado de Minas Gerais (MMA & SRH-MMA, 2006), dessa forma, a vazão do rio São Francisco seria elevada. Esse fato poderia influenciar o uso das estruturas construídas para a geração de energia e outras formas do uso da água e da terra. Mais chuva levaria a uma maior erosão na bacia, a maior entrada de sedimentos e outros elementos poluentes nos afluentes e no rio São Francisco, por exemplo, resíduos de agroquímicos. A poluição das águas poderia elevar os custos para limpeza e purificação de água pelas empresas de tratamento e distribuição (NASCIMENTO, 2007).

As espécies aquáticas poderiam ser prejudicadas pela destruição dos habitats, pelo aumento da quantidade de sedimentos e conseqüente turbidez da água, além da redução da penetração da luz necessária as espécies que precisam desta para realizar a fotossíntese (MASON, 2002). Populações ribeirinhas sofreriam com inundações, perdendo as produções das várzeas e casas; especialmente porque as companhias hidroelétricas, provavelmente, precisariam abrir as comportas para permitir a passagem da água e reduzir o perigo da destruição das estruturas (CHESF, 2004; ANEEL, 2005).

Por outro lado, o crescimento no volume de chuva, em outras regiões da bacia, poderia aumentar o potencial agrícola que hoje depende de irrigação em áreas interioranas e semi-áridas (de Minas Gerais e do Nordeste), se a água chegasse a áreas apropriadas; e poderia elevar a capacidade de produção de energia elétrica, que hoje é abaixo do potencial instalado (ibidem).

A bacia hidrográfica do rio São Francisco é totalmente dependente do nível e da distribuição das chuvas. Dessa forma, aí está a importância de natureza climática. Na verdade é difícil a quantificação de todas as possíveis conseqüências, especialmente porque muitas das externalidades e impactos são desconhecidos e incalculáveis. As mudanças climáticas podem elevar a necessidade de escolha entre usos, por exemplo, irrigação ou geração de energia, proteção da vida aquática ou diluição de esgoto.

As políticas públicas destinadas à administração dos recursos da bacia terão que levar em consideração essas questões e ter em mente a necessidade de existência de diversos cenários para tentar se adaptar às mudanças climáticas. A água doce não tem substitutos para a maioria dos usos e o seu ciclo tem sido diretamente influenciado por mudanças antrópicas para atender as necessidades humanas, como no caso de irrigação e hidroeletricidade (VOROSMARTY e SAHAGIAN, 2000).