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Educação, Arte e Tecnologia – para uma visão integradora

Capítulo Um EDUCAÇÃO E SUPERVISÃO DA FORMAÇÃO 1 Nota introdutória

SUPERVISÃO DA FORMAÇÃO

4. Educação, Arte e Tecnologia – para uma visão integradora

resultado que não seja a eficiência, sentido, razão de ser, legitimidade, reconhecimento, identidade, enfim, qualidade” (p.24).

E, é também por esta razão, que se torna importante reflectir e questionar os modelos de formação dos professores, fazendo apelo à ampliação e aprofundamento epistemológico das suas compreensões e competências, para aqui, em contextos actualmente marcados pela sua própria história, perceber os modelos de supervisão da formação nas suas relações com esta possibilidade de ampliação da compreensão da acção educativa.

4. Educação, Arte e Tecnologia – para uma visão integradora

A arte é, na sua ampla abrangência, indispensável à educação e ao desenvolvimento equilibrado do ser humano. O contacto com realidades e contextos facilitadores da contemplação, fruição, reflexão e produção artísticas, implica formas de fazer e de construção do saber, às quais a imaginação, a razão e a emoção não são normalmente alheias. As vivências excepcionais inscritas no fazer artístico marcam e diferenciam a vida e a postura do indivíduo, proporcionando-lhe novas visões sobre o mundo, e sobretudo, novas formas de interacção e compreensão da vida em sociedade. Por sua vez, uma atitude de aceitação da arte, viabiliza novas formas de aprendizagem, de comunicação e de relação intersubjectiva, implementadoras do desenvolvimento de capacidades, competências de acção e pensamento nas suas múltiplas dimensões e níveis.

A vida em sociedade e a participação dos indivíduos em formação, em contextos culturalmente diversificados e em eventos individuais e ou colectivos, podem contribuir para a regeneração do panorama artístico de um país, consolidando o seu espólio cultural e contribuindo para que outros se sintam identificados com as dimensões da arte e da educação pela arte, que, não pretendendo clonar artistas ou modelos, deve fazer desta problemática e do seu amplo universo, áreas de reflexão e de formação, fundamentais a um processo de construção da personalidade integral do aluno.

A questão que então se coloca, é perguntarmo-nos se a produção artística associada à tecnologia configurará um processo de ensino-aprendizagem ou, fundamentalmente, um processo educativo? É uma questão que tem (pre)ocupado inúmeros investigadores. Sabendo-se das finalidades últimas do ensino e da educação, será fácil anuir que a arte e a tecnologia parecem dever estar presentes nos dois contextos formativos. Contudo e nesta relação, parece que será a partir do processo educativo mais imediato, que arte e tecnologia acabarão por reflectir-se como meta educacional num maior número de alunos, quer os que especificamente optam pelos estudos artísticos e ou tecnológicos como objecto de estudo, quer aqueles, que são interpelados por ela e de forma não intencional no quotidiano.

A escola, enquanto entidade à qual compete garantir o desenvolvimento integral do aluno, deve nesse sentido, proporcionar experiências e aprendizagens no campo da educação pela arte e pela tecnologia, facilitadoras e contributivas do desenvolvimento de competências gerais mais compreensivas e de competências específicas no seu âmbito. Para tal, as actividades e as estratégias de ensino-aprendizagem, e genericamente a educação, podem e devem ser diversificadas, passando pelo desenvolvimento de iniciativas de pesquisa e de produção artística e tecnológica, recorrendo a estilos, técnicas e meios diferenciados.

Cabem nesta perspectiva as iniciativas interinstitucionais ligadas ao meio cultural/patrimonial e a produção de exposições e espectáculos para a escola e para a comunidade, como estratégias culminares de um quotidiano curricular particularmente atento a estas questões da formação. Também a organização de actividades e a definição de estratégias de natureza inter, multi e transdisciplinar, devem ser outras das vias a adoptar, uma vez que conforme Patrocínio (2002), a ligação entre arte, tecnologia e ciência gera uma civilização tecno-lógica, indutora de mudanças em todos os domínios, com impacto sobre a ética e sobre a estética, dimensões essenciais na formação e desenvolvimento das sociedades contemporâneas.

Civilização tecnológica, que assume neste estudo, e particularmente neste capítulo, essa fusão entre ciência e técnica, que no entender de Freitas (1993) resulta em “tecnologia”. Ora sendo a tecnologia um conceito vastíssimo, merece no âmbito desta abordagem, ser compreendido nas relações que estabelece com a arte.

O mundo mudou muito e continuará em mudança, a evolução científica e logo a evolução tecnológica, convida a modificações que arrastam consigo alterações profundas ao nível das práticas, com reflexos sensíveis na acção e produção artísticas (França, 1993). Facto reincidente ao longo do tempo, que não sendo novo, nem sempre foi entendido como tendo subjacente o carácter criativo e inovador que os artistas introduzem nas suas produções, constituindo tantas vezes o embrião para a ciência, na linha do que França (1993) suscita, quando diz que ”(…) certas obras de arte podem abrir perspectivas insuspeitadas à investigação e mesmo à praxis científica – já que os sonhos de Leonardo geraram muita realização, e muita realidade também” (p.179).

Teoria, que reforça a possibilidade sempre emergente, de uma ligação cada vez mais presente entre as duas áreas: tecnologia e arte, enquanto compreensão integrada, porque quando independentes, a leitura do projecto técnico corresponderá sempre a uma leitura de rigor e de fidelidade ao objecto projectado; a leitura da obra de arte, abrirá independentemente do gesto reflectido do autor, a possibilidade da divergência e do encontro com os universos subjectivos e profundos do homem e do tempo. Será no território de ninguém, situado entre a arte e a tecnologia, que parece haver espaço para uma “luta” fascinante em que a energia tudo reduz ao inesperado – exemplo disso, o design contemporâneo, aplicado à comunicação e ao equipamento.

A tecnologia que, na sequência da Revolução Industrial, parecia condenada à concepção da máquina pela máquina, sem a incorporação da componente emocional do autor homem, sente-se

e pressente-se hoje, como realidade que incorpora essa dimensão associada ao gosto, que o homem persegue como se de glicose ou afecto se tratasse.

Um facto que cruza áreas disciplinares e dá lugar a uma arte tecnológica, que bebe na consistência e insistência dos tempos passado e presente, e na ansiosa necessidade do ser humano em alterar a alma das coisas, esse estigma que Camões citado por Caraça (1993) sintetiza na ideia segundo a qual, “Todo o mundo é composto de mudança” (p.189).

Esta ideia de mudança essencial, configura, actualmente, nos contextos da arte e da tecnologia, uma visão que integra positivamente as duas áreas, na linha do que Lopes (1993), considera, “(…) os meios tecnológicos são assim colocados no plano “tradicional” dos materiais, não necessariamente para os substituir, mas sobretudo para aumentar a sua variedade e o leque das opções formais e expressivas que podem ser “geridas” num determinado percurso artístico.” (p. 237). Esta é uma perspectiva que apela à conciliação entre arte e tecnologia, mas que deixa contudo uma advertência cautelar: não pode nem deve colocar em causa a identidade e singularidade dos autores. Segundo França (1993), “(…) a técnica diz respeito, por assim dizer, ao objecto e a arte ao sujeito, uma tem a ver com uma situação exterior, a outra com uma situação interior” (p.179), sendo que neste pressuposto e segundo o mesmo autor, a acção criativa e criadora não ficará comprometida, garantindo-se a “(…) preservação do valor lúdico da criação artística, para além do processo técnico implicado” (p.183).

Como tal, a interacção entre áreas disciplinares, cujas afinidades se estabelecem nas lógicas formativas, reveste-se de grande importância na descoberta de pontos de interesse comuns, podendo por isso ser cruzados os diferentes saberes, fazendo emergir novas afinidades nunca antes previstas ou sequer imaginadas. Trata-se conforme já foi referido, do fenómeno de emergência criativa como processo de aquisição e de uso de competências, potenciador da interpretação de signos, sinais e símbolos que povoam o nosso universo sensorial e que os converte em mensagens com significado, ou seja, com elevado potencial de compreensibilidade pelos alunos, quando em situação pedagógica.

Esta partilha e confluência de saberes permite a partilha de conceitos e de opiniões, como factor de valorização do espólio de saberes pessoais de cada indivíduo, podendo modificar a(s) sua(s) concepções, atitudes e desempenhos e, constituir um contributo para que possam ocorrer mudanças na arena em que a sociedade se move e na qual, continuadamente se reelabora. Visto nesta perspectiva educacional, o contexto artístico-tecnológico, constitui uma realidade em permanente evolução, e, como tal, sempre inacabado, porque marcado pelas dinâmicas do tempo e da sociedade em processo de continuada mudança.

A escola não pode, portanto, apresentar-se negligente, nem estar ausente das dinâmicas e desafios desta perspectiva que concilia arte e tecnologia, através dos seus vários movimentos e abordagens. A função dinamizadora da cultura, quando não reconhecida, significa uma escola que se demite do seu estatuto, condenando à arbitrariedade social a possibilidade de desenvolvimento integral dos seus alunos.

4.1 O artista como cultor e agente de cultura

Deste ponto de vista, o artista é, também ele, um agente de cultura e um participante activo nas mudanças que se operam na sociedade. É um antevisor das ocorrências que a sociedade pressente mas não identifica claramente, é um positivo especulador de ideias que implicitamente marcam o espectro social em que se movimenta.

Na sua praxis o artista mobiliza saberes e veicula realidades que, pela sua novidade, conferem novos significados às pré-existências e ao próprio conhecimento. O criador artístico afirma-se como agente singular de uma dada expressão, tornando-se referência e factor de valorização do património social. Fá-lo sobretudo acentuando as dimensões da interculturalidade e promovendo a releitura com e do mundo. Desenvolve o espírito e iniciativa criativos, assumindo-se pelo prazer e pela liberdade de criação e de expressão, partilhando com os outros o seu diálogo arquitectado na acção, concomitantemente, emocionada e reflectida.

Quando investido em funções pedagógicas, torna-se simultaneamente professor e artista, educando pela e para a arte, conciliando o seu potencial prospectivo, o seu conhecimento e a sua experiência, numa perspectiva educacional, que assume como um dever seu e direito dos seus alunos: a formação integral.

A adequação de metodologias às perspectivas educacionais contemporâneas, a indução progressiva da conquista de autonomia e o desenvolvimento das capacidades do educando, bem como a veiculação de práticas artísticas, a materialização de objectos de arte e a adopção de estratégias de diferenciação inovadoras - tais como o recurso às novas formas de expressão e comunicação artística, constituem os contributos de cada professor para que se atinjam as finalidades últimas da acção educativa (Ministério da Educação, 2001).

Estes novos professores, que marcam a diferença pelo seu esforço continuado de estimulação da criatividade, são segundo Nias referido por Nóvoa (1991), mais intuitivos, espontâneos, flexíveis e mais realizados profissionalmente. Também conforme Woods (1995), no ensino estes professores “(…) incluem a imaginação, isto é, a capacidade de tomar o lugar do outro e de ensaiar potenciais interacções antes do acontecimento. Este processo é acompanhado pela adaptabilidade, flexibilidade, prontidão e facilidade para a improvisação e experimentação” (p.132).

Competências essenciais, que se reconhecem fundamentais à estimulação de condutas criativas, que segundo Lourenço (2000), não são exclusivas de alunos sobredotados. Pelo contrário, conforme Schön (1992), inscrevem-se nas tradições da formação artística e implicam “(…) um tipo de aprender fazendo, em que os alunos começam a praticar, juntamente com os que estão em idêntica situação, mesmo antes de compreenderem racionalmente o que estão a fazer” (p.89).

Opiniões, que Nicole Morin (2001) enfatiza a propósito das práticas artísticas e do seu ensino: “On sait que l’une des spécificités des arts plastiques réside dans la démarche exploratoire, laquelle requiert de la part de l’élève accueil de l’inconnu et prise de risque et, de la part du professeur, attention et ouverture. Cependant, l’expérience montre que l´essentiel de la

progression de l’élève, dans cette discipline, se construit à l’oral. Echanges informels, débats contradictoires, confrontations de points de vue sont autant de lieux où l’autonomie de pensée s’apprend.” (p.7)

A mesma autora salienta ainda que assumir práticas pedagógicas reflectidas e adequadas, como garante da emancipação dos sujeitos em formação, legitimará concerteza um processo formativo para um tipo de competência particularmente singular, ao qual se refere do seguinte modo;

“Le travail progresse par ricochets, rebonds, une recherche en engendrant une autre, intégrant aléatoire et méthode, méthode et aléatoire, expérimentation des matériaux, observation attentive des effets, saisie de l’imprévu, de ce qui semble erroné, insignifiant pour y trouver de nouvelles voies, pour y repérer la direction que l’enfant cherchait désespérément. Cela exige du maître une grande disponibilité d’écoute, un regard sur la (et les) différence(s), une capacité à rapidement synthétiser qui ne peut reposer que sur un contenu dynamique de culture et une volonté continue de curiosité.” (p.15)

Pese embora o facto do reconhecimento da importância da educação e do ensino artísticos serem olhados em muitos contextos, como parentes pobres do sistema educativo, convirá estar atento a Edgar Morin (2003), quando este autor refere que:

“A imaginação, a iluminação, a criação, sem as quais o progresso das ciências não teria sido possível, só entravam na ciência às escondidas: não eram logicamente assinaláveis e eram sempre epistemologicamente condenáveis. Falava-se delas nas biografias dos grandes sábios, nunca nos manuais e tratados, de que no entanto a sombria compilação, como as camadas subterrâneas do carvão, era constituída pela fossilização e pela compreensão do que, em primeiro lugar, tinham sido fantasias, hipóteses, proliferação de ideias, invenções, descobertas” (p.81).

Em conclusão, a educação pela arte, a que deve neste âmbito, associar-se esta nova concepção de tecnologia, constitui-se como imprescindível, se e quando, em educação se quer promover a sensibilidade criativa, o pensamento crítico e a interculturalidade. A escola deve, então, assumir-se como entidade e território privilegiados de concepção, promoção, valorização e divulgação da arte na múltipla possibilidade das suas experiências educativas, propiciando a formação pessoal que integra e interliga as dimensões cognitiva, afectiva, motora e comunicativa dos seus estudantes. O professor, quando detentor desta visão educacional, releva sobretudo o sentido ético da sua função e intervenção, porque deve reconhecer nessa mesma função, a responsabilidade directa relativamente aos seus alunos e indirecta quanto ao futuro das sociedades.

Trata-se, portanto, de um desafio da máxima actualidade e de grande pertinência no quadro do desenvolvimento pessoal, social e humano, justificando por isso o seu aprofundamento através da investigação.

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