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5 O PROCESSO DE AMPLIAÇÃO DO CONCEITO DE

5.2 A EXPERIÊNCIA ITALIANA: DO TRABALHO PARASSUBORDINADO AO

5.2.5 A reforma Biagi e o contrato a projeto

5.2.5.5 Os elementos do contrato a projeto

O contrato a projeto, para ser válido, requer a presença de certos elementos, sendo que cada um deles será trazido a partir deste momento, de modo a verificar se, de fato, o contrato a projeto se presta ao fim a que foi proposto.

5.2.5.5.1 Projeto, programa ou fase deste

A grande novidade trazida pelo Decreto Legislativo de n. 276/2003 ao trazer o contrato de trabalho a projeto, foi justamente exigir, salvo exceções previstas no próprio Decreto, que as relações de trabalho co.co.co fossem transformadas em relações de trabalho co.co.pro. Assim, as antigas relações de trabalho parassubordinadas deveriam ser reconduzidas a um ou mais projetos específicos ou programas de trabalho ou fase destes.

Pretendeu-se, portanto, evitar ou, ao menos, restringir a utilização indiscriminada e fraudulenta da relação de trabalho parassubordinado. Na teoria, essa nova relação jurídica trabalhista (co.co.pro) faria com que somente verdadeiros colaboradores coordenados, e não subordinados, fossem objeto de contratação através desta modalidade. Todavia, na essência, a única diferença existente entre a relação de trabalho parassubordinado e o contrato de trabalho a projeto é que, nesta última, o contratante deve especificar o projeto ou programa ou fase deste no qual o trabalhador irá atuar.379

Portanto, reside na vinculação do trabalhador a um projeto ou programa a diferença entre a relação de trabalho co.co.co e a relação de trabalho co.co.pro.

378

ITALIA, Op. cit.

379

No que tange ao projeto, tem-se que o mesmo “[...] seria uma atividade

(produtiva) identificável e coligada a um resultado, podendo ou não ser conexa à atividade principal do comitente”.380

Já com relação ao programa, a diferença reside no fato de que este “[...] pode não

ser necessariamente ligado a um resultado final, podendo ter como objetivo uma atividade dentro do ciclo produtivo”.381

Como se vê, a noção de projeto ou programa trazida pelo instituto do contrato a projeto é “[...] extremamente ampla, vaga e imprecisa, permitindo o

enquadramento das mais diversas atividades e modalidades de execução”,382 o que dificulta a concretização da proposta legislativa que, em sua essência, visava evitar ou reduzir as contratações fraudulentas de trabalhadores verdadeiramente subordinados através de uma relação de trabalho parassubordinada.

Com vistas a delimitar os conceitos de projeto e programa, ressalta Priscila Soeiro Moreira que a jurisprudência italiana não vem permitindo a utilização destes em atividades habituais do tomador de serviços, exigindo, portanto, que o projeto ou programa seja caracterizado pela originalidade e excepcionalidade.383 Todavia, adverte Lorena Vasconcelos Porto que a Portaria Ministerial de n. 1, de 2004, passou a possibilitar que o projeto esteja ligado à atividade principal ou acessória da empresa.384

A questão da originalidade e excepcionalidade, conforme advertido por Luiz de Pinho Pedreira da Silva, divide também a doutrina italiana: de um lado, há o posicionamento encampado por Santoro Passarelli, Miscione e Sferrazza no sentido de que o projeto deve ser original e excepecional, ou seja, sem relação com as atividades normais desenvolvidas pelo trabalhador e; de outro lado,

380

MOREIRA, op. cit., p. 111.

381

Ibidem, p. 112.

382

PORTO, op. cit., p. 136.

383

MOREIRA, op. cit., p. 112.

384

autores como Proia, Pizzoferrato e Leone, defendendo a tese de que o projeto pode consistir em uma exigência normal da empresa.385

Por fim, prevê o §1º do art. 69 do Decreto Legislativo de n. 276/2003 que as relações de colaboração coordenada e continuativa instauradas sem a vinculação a um projeto ou programa específico são consideradas relações de trabalho subordinado por tempo indeterminado desde a data de sua constituição.386

Todavia, conforme adverte Lorena Vasconcelos Porto387, caso alguma relação de colaboração seja estipulada sem a vinculação a um projeto ou programa específico, é possibilitado ao tomador de serviços comprovar que, na prática, tratava-se de uma relação de trabalho autônoma.

Esse entendimento, atualmente seguido pela jurisprudência italiana, é fruto da Portaria n. 1, de 2004, do Ministério do Trabalho que, deixando de lado a presunção juris et de jure trazida inicialmente pelo Decreto Legislativo de n. 276/2003, incorporou ao tema uma presunção juris tantum, ou seja, passível de prova em contrário.

Portanto, verifica-se que, na hipótese de inobservância dos aspectos formais por parte do tomador de serviços, utiliza-se o princípio da primazia da realidade em desfavor do trabalhador, ou seja, visando oportunizar ao tomador de serviços a prova de que, de fato, tratava-se de uma relação de trabalho autônoma.

5.2.5.5.2 Autonomia e coordenação

A autonomia exigida pelo Decreto Legislativo de n. 276/2003 através do art. 61, §1º, vincula-se à liberdade emprestada ao prestador dos serviços na execução do ofício que visa, em última análise, à obtenção do resultado pactuado entre as partes.

385

SILVA, op. cit., p. 347.

386

ITALIA, op. cit.

387

Portanto, trata-se de uma autonomia meramente relacionada aos meios utilizados para se chegar ao fim contratado. Ressalte-se ainda que a referida autonomia encontra-se mitigada em função da coordenação existente no contrato a projeto.

Desta forma, além de limitar a autonomia do prestador através da definição do conteúdo do projeto ou programa, o tomador de serviços pode coordenar a atividade desenvolvida pelo prestador, dando as orientações gerais para a execução da atividade.

Como se vê, o que não se admite é o exercício efetivo do poder diretivo do tomador dos serviços, identificado pelo controle de horários e pela imposição constante de ordens e direções.

Assim, nos dizeres de SFERRAZZA apud Luiz de Pinho Pedreira da Silva, a coordenação é:

[...] a ligação que funciona entre o comitente e o trabalhador a projeto, atuada mediante a inserção da prestação de serviços no âmbito da organização do mesmo comitente, que se reserva ao direito de dar as diretivas gerais para a realização da atividade, garantindo, porém, a salvaguarda da autonomia do colaborador no desenvolvimento da atividade laboral derivada do contrato e orientada em função da realização do projeto.388

Portanto, fica evidente que o prestador de serviços contratado mediante um contrato de trabalho a projeto possui uma autonomia limitada à execução da prestação dos serviços, ficando, em contrapartida, vinculado ao tomador pelo resultado pretendido, pelo projeto ou programa fixado e ainda em razão do poder de gerenciamento que mantém o tomador dos serviços.

5.2.5.5.3 Duração determinada ou determinável

Nos termos do artigo 62 do Decreto Legislativo de n. 276/2003, verifica-se que o contrato de trabalho a projeto é um contrato a termo, ou seja, de duração

388

determinada ou, no mínimo, determinável.389 O que irá determinar, portanto, o tempo de duração do contrato a projeto é justamente a natureza do projeto ou programa contratado pelas partes.

É importante destacar que o Decreto Legislativo de n. 276/2003 é omissivo com relação às hipóteses de prorrogação dos contratos a projeto, ficando esta matéria reservada à disciplina da Portaria Ministerial n. 1/2004 que possibilitou a prorrogação do contrato caso esta seja necessária para o cumprimento do programa ou projeto.

Por fim, cumpre registrar que não há limitações quanto ao número de prorrogações nem tampouco com relação ao objeto das prorrogações. Portanto, o contrato a projeto pode ser prorrogado tanto para cumprir o programa ou projeto antes pactuado, como também para vincular o prestador de serviços a um novo projeto ou programa ou parte deste, o que, segundo Priscila Soeiro Moreira, possibilitou a ocorrência de fraudes.390

5.2.5.5.4 Prestação de serviços prevalentemente pessoal

Assim como ocorria com o trabalho parassubordinado, a execução dos serviços no âmbito de um contrato a projeto deve ser prevalentemente pessoal, ou seja, o contratado deve assumir a carga principal de labor.

Isto não impede, entretanto, que o contratado seja auxiliado, nas tarefas acessórias, por pessoas diversas, sejam familiares ou até mesmo empregados contratados diretamente pelo prestador de serviços.391

5.2.5.5.5 A remuneração

No que tange à remuneração devida ao contratado que, conforme destacado anteriormente, deve constar expressamente no contrato escrito, vale destacar que

389

ITALIA, op. cit.

390

MOREIRA, op. cit., p. 114.

391

o Decreto Legislativo de n. 276/2003 prevê, em seu artigo 63, que a referida remuneração deve ser proporcional à qualidade e quantidade do trabalho prestado e deve ter como base a remuneração normalmente paga pela prestação similar do trabalho autônomo no local da execução da relação.392 Portanto, fica evidente que a norma em questão, em que pese não estipule um padrão remuneratório mínimo, impõe limites, objetivos e subjetivos, para o valor da remuneração a ser acordada entre as partes.

Vale ressaltar que o art. 63 do Decreto Legislativo de n. 276/2003 afasta a possibilidade do trabalhador subordinado ser utilizado como parâmetro para aferição da remuneração do prestador de serviços no âmbito de um contrato a projeto, o que possibilita a existência de um padrão remuneratório inferior para estes últimos trabalhadores, o que violaria inclusive o princípio da isonomia.