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6.2 O IP nas empresas portuguesas

6.2.2 Empresa B

Esta é uma empresa de capital 100% português, implantada (e com sede) no Carregado. É uma empresa familiar, fundada há cerca de 60 anos. A atividade inicial da empresa foi a reparação de automóveis e evoluiu posteriormente para o fabrico de carroçarias e cabinas para camiões. Em 1978 foi iniciada a construção das atuais instalações que permitiram o alargamento da atividade da empresa para o fabrico de peças estampadas para a indústria automóvel, fabricação e manutenção de moldes e ferramentas e ainda a montagem de veículos automóveis. Atualmente está organizada em quatro unidades de negócio com áreas de atuação distintas, a saber: Automative (estampagem e soldadura para a indústria automóvel e que constitui a principal área de atuação), solar, laser e tooling (fabrico de ferramentas). A empresa B é considerada de média dimensão, com cerca de 400 colaboradores no total das quatro unidades de produção e com uma faturação aproximada de 34 M€ para 2015. O mercado direto de exportação representa 43% da faturação, sendo os restantes 57% para consumo direto interno. A tabela 6.4 sintetiza alguma da informação agora descrita e acrescenta alguma informação de base relativa ao IP.

Tabela 6.4 – Caracterização sumária da empresa B

EMPRESA

B

IDENTIFICAÇÃO

ATIVIDADE CONFIGURAÇÃO DIMENSÃO

Fabrico de componentes metálicos (áreas de

atuação: automotive, solar, laser, tooling) Empresa portuguesa Empresa de média dimensão INTERNATIONAL PURCHASING

MATURIDADE REPRESENTATIVIDADE DEP.COMPRAS –CONFIGURAÇÃO Não especificado, mas depreende-se que haja

grande maturidade, especialmente ao nível das compras de produtos mais estandardizados

O IP representa cerca de 10%

O Departamento de Compras é centralizado e integrado no Supply Chain, onde também está a Logística

O desencadeamento do International Purchasing

A empresa B possui quatro áreas de atuação distintas (unidades de produção) mas o Departamento de Compras está centralizado e é transversal às quatro unidades produtivas. Em termos de compras, os fornecedores da empresa B são, maioritariamente, empresas implantadas em Portugal. A matéria-prima principal, a chapa, constitui a fração mais importante das compras e é toda proveniente do mercado doméstico em termos de fornecedores de 1ª linha. De salientar que as empresas fornecedoras de chapa, embora estejam implantadas em Portugal, são filiais de

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multinacionais estrangeiras, com grande capacidade de fornecimento, como o comprova um dos entrevistados2:

“ […] as nossas principais compras é o aço, a chapa. Cá em Portugal, tínhamos dois players, […] e agora está a entrar um novo. E não temos mais, todos os outros são muito pequenos, não conseguem, derivado aos volumes que são, não conseguem ter capacidade para fornecer. […] Estes grupos, apesar de estarem em Portugal, não são portugueses. Maioritariamente são espanhóis. São grandes grupos. Por exemplo, se a dependência aqui de Portugal tivesse um problema, eles aqui, através de Espanha, conseguiam fornecer; daí o risco ser menor. São multinacionais, não são portugueses.”

O IP representa apenas cerca de 10% das compras totais e aquilo que é comprado no exterior do país são sobretudo componentes, produtos standard como parafusos, porcas e alguns consumíveis. A principal razão apontada pelos entrevistados para as compras fora do mercado doméstico foi a maior competitividade que os fornecedores estrangeiros apresentam, sobretudo no mercado de proximidade, em Espanha.

Face ao historial de compras no mercado português a empresas estrangeiras e ao envolvimento em compras no mercado internacional, depreende-se da entrevista que deve existir longevidade no IP ao nível de produtos mais estandardizados; a já referida falta de competitividade dos fornecedores portugueses é a principal razão apontada para que tal aconteça.

Das cerca de 90% de compras feitas no mercado interno, a grande maioria é chapa que é proveniente, na sua quase totalidade, de apenas três fornecedores (estrangeiros) que operam em Portugal. No caso particular desta matéria-prima, os fornecedores no mercado interno conseguem ser mais competitivos (entenda-se vender a um custo mais baixo) que os fornecedores implantados fora do mercado nacional porque o custo da logística associada ao fornecimento tem um peso significativo no custo total. Aliás, os projetos de compra abertos a novos fornecedores são feitos, no caso da chapa, a nível ibérico porque, de experiências anteriores, os responsáveis das compras já verificaram que potenciais fornecedores geograficamente mais distantes não conseguem competir a nível de custo, precisamente devido ao peso da logística.

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Na empresa B foram entrevistados o Diretor de Compras e o Diretor da Supply Chain (o departamento de Supply Chain integra Compras e Logística)

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Além do custo, existem outras motivações que levam a que haja por parte da empresa uma escolha preferencial, sempre que possível, por fornecedores localizados em Portugal. Efetivamente, a proximidade geográfica tem algumas vantagens inerentes como sejam a diminuição de stocks e a maior facilidade e rapidez de atuação no caso de surgirem eventuais problemas, como o confirmam as palavras do entrevistado:

“Quando surge um novo negócio em que é necessário fazer uma prospeção de mercado, nós abrimos um projeto de compra. […] são definidas todas as características para a compra e consultamos fornecedores não só portugueses, mas também estrangeiros. Depois da análise conjunta, tentamos sempre que o negócio seja feito com um fornecedor português. […] Nós queremos os fornecedores mais perto de nós, foi uma decisão estratégica de há cerca de quatro anos que tomámos, e tentamos sempre ter os fornecedores o mais perto possível. […] Porque nos permite ter stocks mais baixos. Num problema, numa crise que haja, é mais fácil atuar […]. Ao estar mais perto, é mais fácil de solucionar, tendo sempre em atenção a questão do custo e da qualidade, mas foi uma decisão estratégica que tomámos.”

A estrutura organizacional e os processos de compra (no mercado internacional)

Como foi mencionado no início desta análise, a empresa B, embora tenha quatro áreas de negócio distintas (em que três são autónomas), possui alguns processos transversais e centralizados, como é o caso do Departamento de Supply Chain. Neste Departamento estão integradas as compras e a logística. Em termos de organização da função compras, existe um Diretor de Compras e, além deste, fazem parte da equipa mais dois compradores e dois aprovisionadores. Para o Departamento de Compras, são valorizadas as pessoas com experiência, frequência universitária e inglês como requisito mínimo no que diz respeito ao domínio de línguas estrangeiras. Possuir capacidade negocial é outra competência considerada fundamental para assegurar a função e daí ser dada preferência a colaboradores com experiência, como foi transmitido por um dos entrevistados:

[..] e por fim, a capacidade negocial, que não é uma coisa muito tangível mas que se adquire com a experiência, daí o pedirmos 2/3 anos de experiência. […] Naturalmente dentro da empresa todos os compradores não entraram logo como compradores, têm um percurso interno em que normalmente passam por aprovisionadores primeiro e nalguns casos até passam por alguns departamentos técnicos até que chegam às

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compras. E isso acaba por ser uma mais-valia porque conhecem a empresa e o tipo de produtos que nós compramos […]”.

A cargo do Departamento de Compras estão todas as compras para as quatro unidades de negócio, com exceção de compras muito específicas, como por exemplo um equipamento, que por norma é da responsabilidade do Diretor Industrial da unidade que pretende efetuar a compra.

Em termos de procedimentos, o Departamento de Compras possui um portefólio onde constam todos os fornecedores, tanto os que estão ativos como os inativos (considera-se inativo um fornecedor com mais de 3 anos de não comercialização) e onde está contida toda a informação sobre aqueles. Sempre que surge um novo negócio em que seja necessário fazer uma prospeção de mercado, é aberto aquilo que a empresa apelida de projeto de compra, no qual são definidas todas as características para a compra e onde é feita uma consulta tanto a fornecedores portugueses como estrangeiros. A negociação pode decorrer através de uma de três formas possíveis: (1) leilões, (2) plataforma de compras e (3) contacto direto. A fase final, quando são fechados os contratos, é sempre feita presencialmente.

Em termos de avaliação de fornecedores, estão definidos três critérios principais que ditam a seleção de novos fornecedores: a qualidade, o custo e a localização, sendo que, quanto a este último critério privilegiam-se, sempre que possível, os fornecedores geograficamente mais próximos. Além destes critérios, todos os fornecedores devem ser certificados e, durante o processo de seleção é sempre feita uma auditoria às instalações do potencial novo fornecedor. Já os fornecedores ativos são avaliados semestralmente e são tidos em conta os seguintes critérios: qualidade, quantidade, desvio de tempo (entenda-se atrasos nas entregas), custo e requisitos da documentação. Do exposto depreende-se que são mantidos contactos regulares com os fornecedores existindo uma relação de proximidade, em especial com os mais importantes. No que diz respeito à longevidade das relações mantidas com os fornecedores, são claramente privilegiadas as relações de longo prazo e são encaradas, inclusive, como relações de parceria.

Ao nível da logística associada às compras, a esmagadora maioria dos fornecimentos (cerca de 95%) é contratualizada com o transporte incluído. Todas as questões logísticas são definidas e acordadas com os fornecedores, ficando estes com a responsabilidade de colocar o material vendido nas instalações da empresa B. No caso particular desta empresa, em que a principal matéria-prima comprada, a chapa, representa uma parte considerável das compras, a logística tem um peso significativo no custo da compra e influencia claramente as escolhas feitas ao nível dos fornecedores, como já foi explicado atrás. Efetivamente, no caso daquela matéria-prima e havendo capacidade de fornecimento, a opção por fornecedores mais próximos é quase uma

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inevitabilidade uma vez que os fornecedores estrangeiros, mais distantes geograficamente, não conseguem apresentar custos totais concorrenciais devido aos elevados custos logísticos.

O International Purchasing e a competitividade da empresa

O objetivo estratégico da empresa B está focalizado nas vendas. A empresa tem uma agenda definida até 2020 e, em função dessa agenda, são definidos objetivos anuais que vão sendo revistos. Assim, numa base anual, a administração da empresa fixa os objetivos e define para cada Departamento qual deverá ser a sua margem de contribuição para os resultados da empresa. Em função da margem de contribuição definida para o Departamento de Compras são então determinados internamente os objetivos em cascata até “ao operador de chão de fábrica”, citando um dos entrevistados. Para o departamento de Compras estão então definidos objetivos em três categorias: financeira, stocks e prazos de entrega. A nível financeiro são definidos objetivos em termos de redução de custos; quanto aos stocks são fixados objetivos de modo a garantir determinados níveis de stock e em termos de prazos de entrega os objetivos são definidos para controlar os atrasos nas entregas. Os dois primeiros objetivos, o primeiro diretamente ligado às compras e o segundo às compras e aprovisionamento, têm uma contribuição direta nas margens operacionais da empresa. O terceiro objetivo é extremamente importante em temos da performance produtiva uma vez que a empresa labora em Just In Time, o que significa que quaisquer atrasos nas entregas podem implicar paragens de produção e o consequente atraso na chegada ao cliente. Apesar da margem de contribuição do Departamento de Compras ser definida numa base anual ela é analisada e revista trimestralmente.

Relativamente a objetivos ou indicadores fixados pela empresa referentes particularmente ao IP, eles não existem. Os objetivos fixados para o Departamento de Compras são globais, ou seja, englobam a totalidade das compras, sem especificarem o tipo ou a proveniência da compra. A contribuição direta do IP para os objetivos não é analisada separadamente, até porque representa uma minoria ( 10%) face às compras totais. No entanto, e porque o IP existe porque os fornecedores estrangeiros oferecem custos menores, a contribuição deste tipo de compras para o resultado operacional da empresa é uma realidade, embora com pouca expressão.

Em suma, e de uma forma geral, na empresa B as compras são consideradas estratégicas e fundamentais para a performance global, em especial ao nível financeiro, como o comprova e justifica o que foi dito pelo Diretor do Departamento de Supply Chain:

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“[…] as compras podem ser definidas como uma função estratégica porque é nas compras que se ganha o dinheiro. É a negociar bem que se consegue ganhar dinheiro, porque todas as outras margens estão esmagadas.”

Na tabela 6.5 pode ver-se o excerto da análise de conteúdo que resume a descrição efetuada em relação à empresa B.

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Tabela 6.5 – Parte da análise de conteúdo relativo à empresa B

TEMAS CATEGORIAS SUB CATEGORIAS UNIDADES DE REGISTO

Como é que é desencadeado o international purchasing nas empresas industriais? FATORES INFLUENCIADORES

PRODUTO COMPRADO Não tem influência INFLUÊNCIA DA

SC/CLIENTE Não tem influência CARACTERÍSTICAS DO

MERCADO Falta de competitividade dos fornecedores portugueses OUTRAS MOTIVAÇÕES - Relação entre as questões organizacionais /estruturais e os processos de compra nos mercados internacionais ORGANIZAÇÃO DO DEP COMPRAS

CONFIGURAÇÃO O Departamento de Compras é centralizado e integrado no Supply Chain, onde também está a Logística

AUTONOMIA São completamente autónomos

PROCESSOS Existe um portefólio de fornecedores e, no caso de novos negócios, abre-se um projeto de compra

RECURSOS HUMANOS O Departamento de Compras é composto por uma equipa de cinco pessoas

QUALIFICAÇÕES/PERFIL

Valoriza-se pessoas com experiência, frequência universitária, e inglês como mínimo para o domínio de línguas estrangeiras

FORNECEDORES

SELEÇÃO/AVALIAÇÃO

Existem critérios definidos, nomeadamente custo, qualidade e localização. Os fornecedores são avaliados semestralmente

FORMAS DE COMUNICAÇÃO

O processo negocial reparte-se entre momentos de negociação presencial e momentos de negociação com recursos às TIC

CARACTERIZAÇÃO DAS RELAÇÕES

São mantidos contactos regulares com os fornecedores, nomeadamente a avaliação semestral.

MATURIDADE DAS

RELAÇÕES Privilegiam-se as relações de longo prazo

LOGÍSTICA

ORGANIZAÇÃO Toda a logística, ou é da responsabilidade do fornecedor ou subcontratada

GESTÃO DOS SERVIÇOS LOGÍSTICOS

As questões logísticas são definidas e contratualizadas com cada um dos fornecedores

Contributo (como e de que forma) do international purchasing na competitividade das empresas PRIORIDADES

COMPETITIVAS DEFINIÇÃO O objetivo estratégico está focalizado nas vendas

OBJETIVOS

DEFINIÇÃO (S/N)

São definidos objetivos para toda a empresa, e também para o Departamento de compras (não especificamente para o IP)

BASE TEMPORAL/

CONTROLO Objetivos anuais com avaliação trimestral

FIXAÇÃO Estão definidos objetivos para a redução de custos, níveis de stock e atrasos nas entregas

CONTRIBUTO DO DEP DE COMPRAS/IP

MEDIÇÃO

Os objetivos definidos para as compras (não

especificamente para o IP) contribuem diretamente para o resultado operacional da empresa, nomeadamente ao nível de redução de custos

PERFORMANCE DA

EMPRESA

As compras (como um todo) são consideradas estratégicas e fundamentais para a performance da empresa.

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