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International purchasing/global sourcing – o caso das Pequenas e Médias Empresas

Capítulo 2 – R EVISÃO DE L ITERATURA

2.5 International purchasing/global sourcing – o caso das Pequenas e Médias Empresas

Já foi anteriormente referido que as pequenas e médias empresas constituem a parcela dominante do comércio, tanto nacional como internacional, pelo que a forma como aquelas encaram e gerem as compras nos mercados internacionais não pode ser ignorado, se se pretender ter uma visão realista e representativa da globalidade das empresas (Ramsay, 2008).

As PME são tradicionalmente vistas como empresas pouco organizadas, na maioria das vezes com definição de funções e responsabilidades pouco claras entre os colaboradores e elevada centralização de responsabilidades no gerente. Esta fraca definição da estrutura organizacional e centralização de funções tende a ser mais acentuada nas empresas de menor dimensão ou cariz familiar e têm uma influência decisiva nas compras e na forma como são geridas as relações cliente/fornecedor (Morrissey e Pittaway, 2004). Pelo contrário, e particularmente no que diz respeito à interdependência entre as motivações pessoais do dono/gerente e o modo de atuação da empresa, verifica-se que aquela se vai diluindo à medida que a dimensão da empresa aumenta (Morrissey e Pittaway, 2004).

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Dentro do contexto das PME, e apesar da literatura existente no âmbito das compras a nível internacional ter vindo, nos últimos anos, a suscitar maior interesse por parte dos investigadores (Ellegaard, 2006; Knudsen e Servais, 2007; Nassimbeni, 2006), o que se verifica é que a grande maioria dos estudos se tem debruçado sobre empresas de grande dimensão. Até à data, constata- se que existe um número limitado de estudos que se dedicam às compras especificamente no âmbito das PME (Overby e Servais, 2005; Quayle, 2002; Ramsay, 2008), sendo que essa limitação se acentua quando se alarga a função compras ao contexto internacional. Neste subcapítulo pretende-se então fazer uma revisão da literatura no âmbito das PME, sendo este tratamento diferenciado justificado pelas razões já apontadas anteriormente. O objetivo fundamental será o de tentar perceber se é justificável tratar as PME de forma distinta das empresas de grande dimensão, no contexto deste projeto de investigação.

2.5.1 Definição de Pequena e Média Empresa

A definição mais usual para pequena e média empresa está relacionada com o número de colaboradores ou com o volume de negócios anual. De forma a uniformizar os critérios relativos às PME, em 6 de Maio de 2003 a Comissão Europeia adotou a Recomendação 2003/361/EC, no que diz respeito à definição de micro, pequenas e médias empresas e que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2005 (tabela 2.4). Além da uniformização de critérios, esta nova definição de PME pretendeu promover o espírito empresarial, o investimento e o crescimento, facilitar o acesso ao capital de risco, reduzir os encargos administrativos e aumentar a segurança jurídica (IAPMEI – EICPME, retirado em 12/11/2010).

Em Portugal, e segundo os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística e que são relativos a 2013, as PME representam 99,9% do tecido empresarial e são responsáveis por 60,9% do volume de negócios nacional (Portal do Instituto Nacional de Estatística, acedido em 28/02/2016)

Tabela 2.4 - Definição de PME segundo as Recomendações de 2003 da Comissão Europeia Dimensão Nº Efetivos Volume de Negócios ou Balanço Total

PME < 250 <= 50 milhões de euros (VN) ou <= 43 milhões de euros (BT)

Micro < 10 <= 2 milhões de euros

Pequena < 50 <= 10 milhões de euros

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2.5.2 Investigação sobre international purchasing/global sourcing em PME

O estudo da função compras especificamente em PME é justificado, segundo a esmagadora maioria dos investigadores, pelo facto daquelas empresas possuírem uma elevada representatividade nas economias nacionais (Presutti, 1988; Dollinger e Kolchin, 1986; Mudambi e Schründer, 1996; Perkins e Gunasekaran, 1998; Quayle, 2003; Ellegaard, 2006; Paik, Bagchi, Skjott-Larsen e Adams, 2009). Além disso, no âmbito específico das PME verifica-se que, de uma forma geral, estas têm uma forma organizacional distinta das empresas de grande dimensão, proporcionando, também por isso, um contexto particular de estudo no que diz respeito à função compras (Ellegaard, 2006), e nomeadamente à internacionalização das compras. De uma forma geral, fatores como as atitudes ao nível da gestão, a estrutura organizacional e uma influência limitada sobre o mercado são algumas características que tornam o estudo das compras, no contexto das PME, interessante (Ellegaard, 2006) e diferenciado relativamente às empresas de grande dimensão.

A função compras é uma atividade com uma importância vital na produção, porque as matérias-primas/componentes comprados constituem uma parte significativa dos custos de produção (Perkins e Gunasekaran, 1998), e como consequência é fortemente influenciadora da performance financeira da empresa (Presutti, 1988). Daqui se depreende que é extremamente importante a forma como as compras são geridas, especialmente nas PME, uma vez que estas simplesmente não possuem capital financeiro que possa ser desperdiçado em atividades de compras ineficientes ou ineficazes (Pressey, Winklhofer e Tzobas, 2009; Presutti, 1988). Por outro lado, e além dos custos diretos, as matérias-primas/componentes comprados são decisivos para a qualidade do produto final, aspeto que as empresas não podem de todo descurar, porque este é um fator que influencia, e de forma significativa, a estrutura de custos da empresa (por via da maior produtividade, menores desperdícios, maior volume de vendas,…), o seu prestígio nos mercados onde atua e, de forma indireta, a sua performance financeira.

Uma outra característica muito particular das PME é a frequente centralização das funções de gestão e as características comportamentais, por parte do dono ou gestor da empresa, que condicionam igualmente a abordagem que é feita à gestão estratégica das compras nas PME (Ellegaard, 2006; Knudsen e Servais, 2007; Morrissey e Pittaway, 2004).

Segundo um estudo efetuado por Ramsay (2008), um dos poucos autores que se dedicaram ao comportamento das PME em relação às compras, uma grande parte dos donos/gestores destas empresas não encaram a função compras como uma atividade chave, e alguns não a reconhecem

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mesmo como uma atividade diferenciada. Também Morrissey e Pittaway (2004) dizem que, em muitas PME, a atividade de compras recebe pouca atenção por parte do dono/gerente. Em grande parte devido aos seus escassos recursos, as PME dedicam muito pouco tempo à gestão estratégica e desenvolvimento da função compras; ao invés, o pouco tempo disponibilizado para as compras é utilizado na otimização da eficiência dos fornecimentos (Ellegaard, 2006). Esta ideia é reforçada por Paik et al (2009), em que estes autores consideram que os donos/gerentes, por necessidade, centram a sua atenção em problemas operacionais, que requerem atenção imediata, deixando pouco espaço para o planeamento estratégico, nomeadamente na área das compras. Esta linha de ação é, no entanto, contraproducente, uma vez que as PME são particularmente vulneráveis às consequências da ineficácia das compras (Presutti, 1988).

Um outro aspeto que importa analisar são as relações cliente-fornecedor no âmbito das PME que, na sua maioria, são do tipo competitivo (adversário) e não colaborante (Morrissey e Knight, 2011; Mudambi, Schründer e Mongar, 2004). Aquele tipo de relações (competitivo) é tipicamente caracterizado como sendo de curta duração, onde o preço desempenha um papel fundamental como condicionante das compras. A gestão destas relações pode potenciar um hipotético conflito entre a necessidade de cooperação-colaboração com os seus fornecedores e a necessidade de autonomia e controlo que muitos donos/gestores procuram (Morrissey e Pittaway, 2004).

Nas PME, parece ser evidente que os motivos pessoais do dono/gerente são indissociáveis do comportamento da empresa em relação às compras e têm uma importância decisiva nas relações cliente-fornecedor, podendo condicionar de forma significativa a maneira como aquelas são geridas. Por outro lado, a noção e a gestão de risco associado às compras assume uma importância acrescida nas PME. Efetivamente, estas empresas tendem a ser mais vulneráveis aos riscos associados às compras, nomeadamente às compras a nível internacional, uma vez que a tolerância às potenciais perdas é mínima (Ellegaard, 2007; Ellegaard, 2008).

Se a gestão das compras nas PME ainda é um assunto pouco estudado pelos investigadores, a internacionalização das compras neste mesmo contexto ainda o é menos (Ellegaard, 2006). Efetivamente, quando se fala em internacionalização, e em particular nas compras, a tendência é pensar em grandes empresas e em multinacionais, ficando as PME ou esquecidas ou inseridas no mesmo contexto das empresas de grande dimensão. No entanto, e como já foi referido atrás, as particularidades das PME parecem indiciar que o funcionamento das compras se processa de forma diferenciada das empresas de grande dimensão (Agndal, 2006; Ellegaard, 2006), justificando, segundo aqueles autores, o seu estudo individualizado. É reconhecido na literatura que, nas PME, os interesses e/ou ambições dos donos ou gestores são normalmente tidos como

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tendo uma grande influência no processo de internacionalização, ao contrário do que acontece nas empresas de grande dimensão (Agndal, 2006).

De acordo com Agndal (2006), alguns responsáveis das PME vêm o international purchasing como algo problemático, que consome tempo, causa incerteza, atrasos e acarreta custos extra. Para estes gestores, compras fora do mercado doméstico são uma opção apenas e exclusivamente se não houver alternativas a nível local. O processo de entrada nos mercados internacionais é muitas vezes impulsionado por fatores externos, nomeadamente pressão por parte dos próprios clientes ou oportunidades inesperadas (não solicitadas). É notório que, no caso das PME, os donos/gestores despendem pouco tempo a planear as compras no plano internacional, sendo que o seu tempo é maioritariamente ocupado em resolver problemas operacionais e administrativos, no curto prazo. Além disso, segundo Ellegaard (2007), os donos/gestores das PME são normalmente compradores inexperientes, faltando-lhes as competências necessárias para geriram as compras de forma eficiente.

Devido à estrutura particular das PME, verifica-se igualmente, nalguns casos, que estas têm falta dos recursos necessários para procurar a nível internacional as soluções ótimas em termos de compras. Efetivamente, está comprovado que, para poder comprar a uma escala global, é preciso tempo, recursos e pessoal especializado (Quintens et al, 2005b).

Uma das possíveis soluções para este problema poderá ser o recurso a intermediários (empresas intermediárias), que são usados principalmente por conveniência e pelos serviços que oferecem. O trabalho de procurar os fornecedores mais qualificados, que entregam produtos com o nível de qualidade desejado e a um custo adequado passa para os intermediários, libertando assim a empresa compradora. Isto é especialmente importante quando a empresa compradora tem poucos recursos (caso da maioria das PME) ou quando existem barreiras culturais e/ou linguísticas difíceis de ultrapassar. De acordo com Quintens et al (2005a), é um facto que as PME tendem a ter departamentos de compras menos organizados ou a não o terem de todo. Também Lloyd-Reason e Mughan (2002) defendem que as características comportamentais nas PME em termos de atividades internacionais, são determinadas em primeira instância pelo dono/gerente da empresa. Segundo aqueles autores, essas características comportamentais resultam daquilo a que se pode chamar de “orientação cultural” do dono/gerente. Esta “orientação cultural” é influenciada por um certo número de fatores como sejam conhecimentos linguísticos, conhecimento acerca dos concorrentes estrangeiros, nível de formação, conhecimento de culturas estrangeiras, entre outros. Quando se pretende internacionalizar PME, o primeiro passo a dar será perceber até que ponto o dono/gerente da empresa está recetivo à abertura aos

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mercados internacionais, quer seja no plano das vendas ou das compras. Nenhuma PME se conseguirá internacionalizar com sucesso se não tiver o apoio e a liderança do dono/gerente (Lloyd-Reason e Mughan, 2002).

Apesar do reconhecimento dos problemas e condicionantes que as PME enfrentam face à opção de comprar internacionalmente, este não é (ainda) um tema de estudo privilegiado pelos investigadores (Overby and Servais, 2005; Quayle, 2002; Ramsay, 2008). No entanto, segundo Agndal (2006) e Quintens et al (2006b), um estudo sobre internacionalização de compras focado nas PME poderia ser útil, não só como validação das conclusões obtidas para empresas de grande dimensão, como também para trazer uma nova perspetiva na investigação sobre as compras feitas fora do mercado doméstico.