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Capítulo 2 – R EVISÃO DE L ITERATURA

2.3 International purchasing vs global sourcing

Ao longo dos anos, têm surgido na literatura vários conceitos para designar a atividade de aquisição de bens ou serviços no contexto empresarial. São disso exemplo os termos procurement, purchasing ou sourcing. Cada uma destas designações é frequentemente utilizada indiferenciadamente embora haja autores que as distingam consoante a extensão ou o tipo de aquisição. Quando a atividade de compras é alargada ao contexto internacional, verifica-se igualmente que, reiteradas vezes, os conceitos utilizados não são definidos de forma clara. Assim, na literatura existente sobre o tema em causa surgem vulgarmente várias designações para definir o mesmo tipo de atividades ou, ao contrário, a mesma designação é utilizada em contextos diferentes. Importa, pois, clarificar alguns dos conceitos associados aos termos mais comummente utilizados: international purchasing, international sourcing, global purchasing e global sourcing.

Quintens, Matthyssens e Faes (2005a) usam a designação international purchasing para descrever as atividades de compra das empresas fora do mercado doméstico. Já outros autores, como Birou e Fawcett (1993) ou Nassimbeni (2006), definem international sourcing como sendo a compra de materiais e componentes a fornecedores localizados fora das fronteiras nacionais do comprador. Numa análise imediata, as duas expressões anteriores, embora diferentes, são utilizadas para descrever o mesmo tipo de atividades. As definições anteriores aplicam-se ainda à designação global purchasing, utlizada por Smith (1999), que não faz distinção entre esta designação e international purchasing.

Uma perspetiva mais abrangente de global purchasing é dada por Quintens et al (2006b, 171), sendo por estes autores definida como a “atividade de procura e obtenção de produtos, serviços e outros recursos, a uma escala mundial, de modo a satisfazer as necessidades da empresa e a promover e/ou fortalecer a sua posição competitiva.” Esta definição inclui não só a tarefa operacional de comprar, mas também acarreta responsabilidades a um nível mais estratégico, como sejam o desenvolvimento de fornecedores e a geração de sinergias de compras globais (Faes, Matthyssens e Vandenbempt, 2000; Quintens et al, 2006a). O global purchasing pode resultar de uma decisão oportunista e reativa, com vista à diminuição de custos, mas também pode ser um esforço estratégico e coordenado para fortalecer a posição competitiva da empresa.

Ainda na perspetiva de Quintens et al (2006b), o global purchasing inclui todas as fases do processo de compra, começando antes da definição da lista de potenciais fornecedores, passando

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pela seleção dos mesmos e compra propriamente dita, até ao posterior acompanhamento e avaliação.

Um outro termo frequentemente utilizado para descrever as atividades de compra a nível internacional é global sourcing (Bozarth, Handfield e Das, 1998; Fagan, 1991; Mohammad et al, 2009; Trent e Monczka, 2003), mas, mais uma vez, nos vários estudos onde esta temática é tratada são-lhe por vezes atribuídos significados diferentes. A título de exemplo, enquanto Fagan (1991) usa o termo global sourcing dando-lhe o mesmo significado de international purchasing, Trent e Monczka (2003) fazem uma distinção clara entre estes dois conceitos.

Em suma, embora muitos investigadores utilizem os termos international purchasing e global sourcing indiferenciadamente, o facto é que existem diferenças fundamentais entre eles e que importa esclarecer.

De acordo com Monczka e Trent (2002), o termo international purchasing refere-se a uma transação comercial entre um comprador e um fornecedor, localizados em países diferentes, sendo este um tipo de compra normalmente mais complexo do que as compras domésticas. A justificação para este aumento de complexidade prende-se com o facto de as empresas terem de lidar com uma série de questões relacionadas com a gestão da cadeia de abastecimento, como sejam a existência de canais de distribuição mais longos, maiores quantidades de stock em trânsito e a maior variabilidade dos prazos de entrega. Outros fatores, como oscilações do valor da moeda, procedimentos alfandegários e a própria língua são também condicionantes deste tipo de transações internacionais.

Ainda segundo Monczka e Trent (2002), o conceito de global sourcing difere do conceito de international purchasing em abrangência e complexidade. O global sourcing implica a coordenação e integração, de uma forma pró-ativa, de materiais, processos, design, tecnologias e fornecedores a uma escala mundial. Além disso, o global sourcing requer ainda uma integração horizontal entre conceção do produto e grupos de desenvolvimento, bem como no planeamento das atividades de fornecimento e compra. Esta integração concretiza-se durante o processo de desenvolvimento de novos produtos, bem como durante a procura de bens ou serviços, de modo a satisfazer as necessidades dos clientes. A integração dos vários níveis da cadeia de abastecimento é também um requisito do global sourcing.

Ao longo dos anos foram vários os autores que tentaram caracterizar o processo de internacionalização das empresas ao nível das atividades de compra. De uma forma geral, essa caracterização é feita através de modelos evolutivos, em que a atividade de compras vai crescendo em complexidade e abrangência acompanhando a evolução e maturidade da própria

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empresa. Também nestes modelos, as designações para descrever as compras fora do mercado doméstico são várias e carecem de alguma uniformização (ver tabela 2.3, pág. 30)

A figura 2.1 apresenta o modelo desenvolvido por Monczka e Trent (2002) que, além ser o mais recente, é o que parece reunir maior consenso no que toca ao processo de internacionalização das atividades de compra. Este modelo, suportado por estudos anteriores levados a cabo pelos autores, por um lado, diferencia de forma clara os conceitos de international purchasing e global sourcing e, por outro, apresenta estes dois conceitos como parte integrante de um processo evolutivo nas empresas. Será, pois, oportuno fazer uma descrição mais detalhada do modelo em causa.

Fig. 2.1 – Níveis de evolução desde international purchasing a global sourcing (Monczka e Trent, 2002)

No nível I, as empresas adquirem todos os bens ou serviços de que necessitam através de fornecedores localizados no mercado doméstico; os bens adquiridos até podem ser oriundos de mercados estrangeiros, mas são os fornecedores ou distribuidores os responsáveis pela gestão das compras a nível internacional (Salleh e Mohammad, 2007).

O nível II representa uma primeira fase da internacionalização do processo de compras, e normalmente emerge como uma necessidade partindo das compras a nível doméstico, tratando- se, por isso, de um processo reativo. O surgimento desta necessidade pode ser desencadeado por acontecimentos relacionados com o mercado abastecedor, tais como perturbações ao nível do

 Integração e coordenação de estratégias de global sourcing com outros processos e grupos funcionais  Integração e coordenação das estratégias de global

sourcing entre todas as centrais de compras internacionais

 Compras a nível internacional como parte da estratégia de compras

 Compras a nível internacional mas só se forem uma necessidade

 Compras somente a nível nacional (compras domésticas)

Global Sourcing

International

Purchasing

Nível I

Nível II

Nível III

Nível IV

Nível V

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fornecimento, alterações rápidas no mercado cambial, um declínio ou diminuição do mercado doméstico ou o aparecimento súbito de competidores internacionais (Salleh e Mohammad, 2007; Trent e Monczka, 2003).

No nível III, as empresas assumem uma perspetiva mais global e efetuam as suas compras a nível internacional como uma estratégia para obtenção de melhorias de desempenho significativas. Contudo, a este nível, as estratégias entre os locais de compra internacionais, os centros de operação, grupos funcionais ou unidades de negócio ainda não são convenientemente coordenados. Acontece frequentemente que o foco das compras está mais voltado para os mercados emergentes e cujo principal objetivo é a obtenção de redução dos preços. É comum, neste nível, o recurso a subsidiárias ou centros de international purchasing para auxiliar ou gerir as atividades de compras à escala global (Monczka e Trent, 2002).

O nível IV já representa um nível sofisticado de desenvolvimento estratégico, no qual as empresas integram e coordenam as suas necessidades de materiais e/ou serviços utilizando uma central de compras, de onde coordenam as várias divisões ou centros de compras nas várias partes do globo. Aqui, já é um requisito fundamental a existência de sistemas de informação com capacidade para operar a nível mundial, recursos humanos com um elevado nível de conhecimentos e competências (altamente especializados), uma estrutura organizacional capaz de coordenar as atividades à escala mundial e uma liderança assumidamente comprometida numa abordagem integrada ao global sourcing.

As empresas do nível V integram e coordenam de uma forma proactiva, além de materiais e/ou serviços comuns, processos, design, tecnologias e fornecedores a partir de centrais de compras que operam a uma escala global e com outros grupos funcionais. No nível V, a estratégia de global sourcing funciona em integração horizontal com outros grupos funcionais como sejam a engenharia, operações e (cada vez mais) o Marketing (Salleh e Mohammad, 2007; Trent e Monczka, 2003).

Face ao exposto, depreende-se que o global sourcing, quando visto nos patamares IV e V, é claramente uma iniciativa levada a cabo e só ao alcance das empresas de grande dimensão, uma vez que só estas possuem capacidade estratégica e os recursos necessários para enfrentarem a concorrência a nível mundial com o nível necessário de complexidade. Empresas de menor dimensão só terão capacidade para atingir os níveis II e III no processo de internacionalização das compras (Monczka e Trent, 2002), fundamentalmente pela sua maior limitação de recursos.

Neste projeto de investigação, a terminologia adotada será a de international purchasing porque, face ao que foi atrás descrito, se considera ser a mais adequada ao contexto do estudo,

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que são as empresas industriais em Portugal. No entanto, durante esta revisão bibliográfica, serão utilizados os vários termos presentes na literatura, nomeadamente International Purchasing/Global Sourcing (IP/GS), de modo a respeitar a terminologia utilizada pelos diferentes autores.