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Gestão e design organizacional do international purchasing/global sourcing

Capítulo 2 – R EVISÃO DE L ITERATURA

2.4 Investigação sobre international purchasing/ global sourcing

2.4.3 Gestão e design organizacional do international purchasing/global sourcing

No desenvolvimento de um programa de compras a nível internacional, o primeiro passo e o mais importante deverá ser o desenvolvimento de um conhecimento rigoroso acerca das necessidades e objetivos da empresa. Este processo envolve um planeamento extenso das exigências de qualidade da empresa, vital para estabelecer os requisitos em termos de qualificação dos potenciais fornecedores. A obtenção de apoio por parte da gestão de topo e o planeamento das necessidades em termos logísticos são também fatores chave que devem ser considerados aquando da formulação de uma estratégia para comprar internacionalmente. Só depois de se estabelecer o âmbito da estratégia de compras e planear para a sua implementação,

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é que as empresas deverão avançar para o passo seguinte: seleção e desenvolvimento de fornecedores. Efetivamente, é considerado muito importante no sucesso do international purchasing/global sourcing, a seleção e desenvolvimento de fornecedores, uma comunicação eficaz e partilha de informação com os fornecedores internacionais e o estabelecimento de relações próximas com aqueles (Birou e Fawcett, 1993; Salmi, 2006).

Na operacionalização da estratégia de compras a nível global, um aspeto essencial que as empresas têm que considerar quando operam em mercados globais fortemente competitivos, é a forma como adaptam a sua estrutura organizacional e forma de gestão a esses mercados, num contexto em que as próprias empresas são tendencialmente mais complexas (Trautmann, Bals e Hartmann, 2009). Alguns autores (Trent e Monczka, 2003; Quintens et al, 2006a) reforçam esta ideia defendendo que, na implementação do global sourcing, um pré-requisito fundamental e crítico é o alinhamento da estratégia de global sourcing/purchasing com o design organizacional. Mais especificamente, Quintens et al (2006a) consideram que a estratégia de global purchasing é a resposta funcional das empresas aos desafios e oportunidades, tanto organizacionais como externos, relacionados com as compras e que lhes permite, através da aquisição de novas capacidades e recursos, melhorar esse mesmo desempenho funcional e das próprias empresas. Segundo aqueles autores, uma estratégia de global purchasing deve indicar como competir no mercado com sucesso e ter como objetivo a obtenção de vantagens competitivas para a empresa. A busca por este objetivo traduz-se na forma como as empresas se organizam e como encaram as atividades de compras a nível global. Para Quintens et al (2006a), a conceptualização da estratégia de global purchasing assenta em quatro dimensões:

1) Configuração (centralização/descentralização) do processo de compra – sendo esta a medida da dispersão de responsabilidades e definição de autoridades, transversal a todos os níveis hierárquicos. Em linha com outros autores, Quintens et al (2006a) consideram que a configuração do processo de compras deve ser operacionalizada em quatro fases: (1) pesquisa de mercados e triagem de potenciais fornecedores, (2) seleção de fornecedores, (3) negociação e contratualização com fornecedores e (4) subsequente avaliação e acompanhamento dos mesmos.

2) Normalização do processo de global purchasing – medida pelo grau de padronização com que são efetuadas as compras a nível global e que é também operacionalizada nas quatro etapas já referidas atrás.

3) Normalização das características dos produtos – definida como a medida com que as características dos produtos/materiais comprados são entendidos da mesma forma em

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toda a empresa. Esta uniformização será proporcional à criticidade dos produtos comprados e deve incluir elementos como especificações, normas de qualidade para os produtos e condições do serviço pós-venda.

4) Normalização das características do pessoal afeto às compras – sendo esta a medida do grau de normalização com que as empresas organizam e gerem os recursos humanos afetos às compras globais. Os colaboradores envolvidos nas atividades de compras são fundamentais para uma implementação bem-sucedida dos programas de global sourcing (Faes et al, 2000), sendo portanto de importância crucial a forma como são geridos e estão organizados.

Para Quintens et al (2006a), os inúmeros fatores dos quais depende a estratégia de global sourcing, próprios de um mercado dinâmico (como sejam as características dos produtos, as preferências dos clientes, influências culturais ou ambientais, a dependência da rede, as relações cliente-fornecedor) são determinantes nas questões da centralização/descentralização e normalização/adaptação que definirão a estratégia de compras. Segundo aqueles autores, na formulação da sua estratégia de global sourcing e para se manterem competitivas, as empresas devem alinhar de forma integrada e coesa as suas políticas de produto, processo e recursos humanos.

Uma questão que tem vindo a ser discutida ao longo dos anos (e referida como uma das dimensões da estratégia de global sourcing) é a centralização ou descentralização da procura no contexto internacional, um aspeto que tem implicações óbvias na estrutura organizacional das empresas. A este respeito, Giunipero e Monczka (1990), através de um estudo em multinacionais americanas, abordaram as questões organizacionais na gestão do international sourcing. Esse estudo permitiu-lhes distinguir quatro tipos de abordagens, utilizadas pelas empresas nas atividades de international sourcing. São elas: (1) international sourcing totalmente descentralizado, (2) international sourcing descentralizado mas coordenado entre as várias filiais, (3) responsabilidade centralizada para o international sourcing e (4) grupos funcionais especializados no international sourcing. Apesar de terem identificado estes quatro tipos de abordagens, Giunipero e Monczka (1990) chegaram, no entanto, à conclusão que há uma tendência para as empresas multinacionais continuarem a operar numa base de descentralização, no que toca ao international sourcing. Esta configuração é reflexo da filosofia organizacional das empresas, fortemente orientadas também para a descentralização.

Também Arnold (1999) se debruçou sobre a temática da configuração organizacional das empresas que operam além-fronteiras no que concerne às compras. Para Arnold (1999), o

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international purchasing evolui para o global sourcing quando existe uma orientação estratégica das atividades ligadas às compras, e implica uma extensão, de forma sistematizada, das políticas de compras aos mercados internacionais. Com base em nove estudos de caso levados a cabo em empresas sediadas na Alemanha, aquele autor chegou à conclusão que podem ser definidos três modelos organizacionais distintos para o global sourcing, consoante as características da empresa e que correspondem a diferentes graus de centralização:

1) Modelo de compras centralizado – útil para empresas com atividade reduzida ao nível do global sourcing; nestes casos, uma estrutura de compras centralizada ajuda a potenciar economias de escala nos fornecimentos;

2) Modelo de coordenação – este modelo também faz uso das economias de escala, mas através da cooperação entre as várias unidades de negócio;

3) Modelo de subcontratação – este modelo faz sentido em empresas altamente descentralizadas, mas com forte orientação internacional.

Será importante referir que os dois estudos anteriores chegam a conclusões de certo modo contraditórias; por um lado Arnold (1999) defende que o modelo de compras centralizado se adequa a empresas com atividade internacional reduzida, e por outro Giunipero e Monczka (1990) dizem que a tendência para uma estrutura de compras centralizada emerge à medida que as empresas intensificam as suas atividades de global sourcing. Esta discrepância nos resultados pode ser consequência dos diferentes contextos de estudo, bem como das áreas de atividade das empresas envolvidas. Do estudo de Giunipero e Monczka (1990) parece resultar ainda a constatação de que as empresas tendem a replicar para o mercado internacional a estrutura organizacional já utilizada para a atividade de compras no mercado doméstico.

Mais recentemente, Hartmann, Trautmann e Jahns (2008) estudaram igualmente as implicações do global sourcing no design organizacional, estudo que incidiu também em empresas multinacionais. Segundo aqueles autores, um dos maiores desafios que as empresas multinacionais enfrentam é saber como organizar o departamento de compras tendo em conta a estratégia da empresa, de modo a conseguirem gerir eficazmente o global sourcing. Os resultados do estudo efetuado por Hartmann et al (2008) revelaram que as empresas podem ser classificadas em duas categorias, de acordo com a sua orientação estratégica a nível internacional. O primeiro tipo de empresas são as designadas empresas globais, com várias subsidiárias espalhadas em vários pontos do globo, com baixa interdependência entre si, mas com elevada dependência da empresa sede em que esta tem um papel dominante no que concerne ao

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controlo e coordenação das atividades de global sourcing; trata-se portanto de um tipo de empresa com uma estrutura de controlo mais centralizada. O segundo tipo de empresas é designado de empresa transnacional, cujo modelo organizativo assenta na descentralização de responsabilidades no que toca ao global sourcing. A conceptualização subjacente às empresas transnacionais é de uma rede integrada de compras em que as responsabilidades estão divididas equitativamente entre as várias subsidiárias e em que a empresa sede não desempenha um papel dominante no controlo das compras; o seu papel consiste fundamentalmente em manter a coesão entre a rede de filiais e em que cada uma delas representa uma fonte de vantagem competitiva.

Independentemente da configuração organizacional adotada, ressalta desta análise que existe uma necessidade por parte das empresas de implementar mecanismos de controlo e de processamento de informação eficazes, no sentido de bem gerir e coordenar o global sourcing. Além disso, qualquer uma das configurações acima descritas pressupõe uma elevada maturidade das empresas ao nível das compras, considerando a definição apontada por Schiele (2007), em que aquela é definida como sendo o nível de profissionalismo na atividade da função compras. Com efeito, tanto as empresas globais como as transnacionais, cuja atividade de compras se estende a um nível mundial visando satisfazer as necessidades das respetivas redes de filiais, terão necessariamente que possuir uma elevada maturidade ao nível dos processos e gestão das compras internacionais se pretendem ser eficazes a atingir os objetivos a que se propõem.

A questão da existência de coordenação entre as diferentes subsidiárias, filiais ou centros de compras é, aliás, um tema recorrente na literatura quando é abordada a problemática da procura ou compras a nível global (Arnold, 1999; Faes et al, 2000; Hartmann et al, 2008; Trent e Monczka, 2003a; Trent e Monczka, 2005). Como já foi referido, várias são as motivações que podem levar as empresas a optar por uma estratégia de coordenação: seja para potenciar economias de escala (Arnold, 1999), para aproveitar o maior e melhor conhecimento dos mercados locais das diferentes subsidiárias (Hartmann et al, 2008) ou para a obtenção de sinergias que potenciem vantagens competitivas não só para algumas subsidiárias, mas eventualmente para toda a rede. De acordo com Faes et al (2000), para a implementação bem-sucedida de uma estratégia coordenada de global sourcing é preciso tempo, sendo aquele um processo gradual, com resultados a médio/longo prazo. Uma estratégia de coordenação só resulta eficaz se houver vantagens efetivas para todas as subsidiárias/filiais envolvidas. De uma forma geral, uma coordenação de sucesso, a nível do global sourcing, tem que ser baseada na comunicação aberta

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e franca entre os recursos humanos que coordenam as compras, os responsáveis pelas compras locais e os gestores das empresas (Faes et al, 2000).

Da literatura existente sobre o design organizacional para a gestão do IP/GS não ficam claras as razões pelas quais as empresas optam por uma determinada configuração. No entanto, fatores como o número de recursos disponíveis para as compras (Ogden, Rossetti e Hendrick, 2007), o nível de especialização e competências dos recursos humanos afetos às compras (Hartmann et al, 2008) e a estrutura e dimensão da própria empresa podem influenciar o design organizacional do IP/GS (Hartmann et al, 2008; Knudsen e Servais, 2007).

Além dos fatores referidos atrás, Oruezabala (2009) Adotou uma outra perspetiva para tentar perceber as razões que levam as empresas a adotar um determinado design organizacional no que concerne às compras nos mercados internacionais. No estudo levado a cabo por aquela autora, é investigada a questão do tipo de abordagem feito pelos gestores de compras nos mercados estrangeiros e qual a influência dessa abordagem no design organizacional do IP/GS e na forma como elas são geridas. De acordo com Oruezabala (2009), foram identificadas quatro categorias quanto ao comportamento dos gestores de compras num contexto internacional. Essas categorias são: (1) experimentalistas – que estão claramente focados em processos de compras/procura estandardizados em que o enfoque está nas variáveis tempo, qualidade e custo; (2) os reativos – que estão orientados para a procura de novos mercados e conseguem adaptar o seu comportamento perante situações inesperadas; no entanto, a procura de fornecedores estrangeiro só é feita se necessário; (3) os estrategas – que pretendem criar e manter relações de longo prazo com os fornecedores e que consideram a estratégia de compras como um contributo efetivo para a performance global da empresa e (4) os oportunistas – que põem o seu próprio interesse em 1º lugar e que consideram as relações com fornecedores de curto prazo podendo estes serem substituídos de acordo com as suas necessidades. Segundo Oruezabala (2009), o estudo daquela perspetiva comportamental pode ser muito importante no âmbito do IP/GS dado que o tipo de comportamento dos gestores de compras pode ter uma influência decisiva, não só nas relações cliente-fornecedor, mas também no potencial de competitividade do próprio processo de IP/GS.