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1. ESTRUTURA REGULATÓRIA PARA O PLANEJAMENTO DA EXPANSÃO DA

1.2 Quadro Institucional

1.2.4 Empresa de Pesquisa Energética (EPE)

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), cujo objetivo precípuo é o planejamento do setor energético brasileiro, constitui-se como uma empresa pública dependente, vinculada diretamente ao MME.

Instituída pela Lei n. 10.847/2004, e regulamentada pelo Decreto nº 5.184/2004, de 16 de agosto de 2004, a EPE se apresenta como responsável pelo planejamento de longo prazo do setor energético brasileiro no país, com o dever de elaborar uma série de estudos que auxiliem nas decisões governamentais.

Nas palavras da própria EPE, a empresa “funciona ora como assessoria para a tomada de decisões, ora como órgão executivo”, sendo uma “uma instituição eminentemente técnica, que cumpre um papel institucional do Estado”.41

O artigo 2º do Decreto nº 5.184/04 dispõe expressamente que a finalidade da EPE é a prestação de serviços na área de estudos e pesquisas destinados a subsidiar o planejamento do setor energético (energia elétrica, petróleo e gás natural e seus derivados, carvão mineral, entre outros).

As competências da EPE estão mais bem detalhadas no artigo 6º do Decreto 5.184/04; como exemplo, a realização de estudos e projeções da matriz energética brasileira; a identificação e quantificação dos potenciais de recursos energéticos; a realização de estudos para a determinação dos aproveitamentos ótimos dos potenciais hidráulicos; a obtenção da licença prévia ambiental e a declaração de disponibilidade hídrica, necessárias às licitações que envolvem empreendimentos de geração hidrelétrica e de transmissão de energia elétrica selecionados; e a elaboração de estudos necessários para o desenvolvimento dos planos de expansão da geração e transmissão de energia elétrica de curto, médio e longo prazos; entre outras.

A própria EPE trata de destacar sua função executiva, dando como exemplo:

41 BRASIL. EPE. Nossa História. 2016. Livro Digital. Disponível em: http://www.epe.gov.br/Paginas/EPE

[...] o empenho em realizar inventários hidrelétricos de bacias hidrográficas, avaliações ambientais integradas de bacias, estudos de viabilidade técnica e econômica e de impacto ambiental de usinas hidrelétricas. Isso inclui ainda toda uma interação com o Tribunal de Contas da União (TCU) na viabilização da licitação de usinas.42

Cabe aqui, durante a análise das competências dos órgãos diretamente envolvidos com o Setor Elétrico, apontar uma primeira possível dificuldade no desenvolvimento das atividades de planejamento, especificamente de expansão do setor: como compatibilizar os diagnósticos ambientais, especialmente os negativos, apontados pela EPE em suas avaliações e estudos ambientais, com a sua participação direta em outros órgãos, por exemplo no CMSE, que tem entre suas atribuições a identificação de dificuldades e obstáculos de caráter ambiental, além de outros que possam afetar a expansão do setor elétrico.

Deve ser destacado que cabe ao CMSE não somente identificar prováveis problemas à expansão do setor, mas também elaborar propostas de ajustes, soluções e recomendações de ações preventivas ou saneadoras de situações observadas em decorrência da identificação dos obstáculos e dificuldades acima referidos (incisos IV e V do Decreto nº 5.175/04).

Em outras palavras, poderia haver, com a elaboração de estudos não só ambientais por meio da EPE, mas também técnicos, como o cálculo de garantia física de energia do empreendimento hidrelétrico43, perda de deferência técnica ao considerar a participação desta mesma empresa em órgãos que têm como missão planejar e providenciar a expansão da geração de energia elétrica, afastando, quando possível, os obstáculos a tal desígnio, incluindo os de caráter ambiental? Ou as disposições legais que preveem o dever dos órgãos institucionais de assegurar, no setor elétrico, um funcionamento eficiente e harmônico da gestão socioambiental, tal como ocorre com artigo 7º, do Decreto n.º 7.798/2012 ao tratar das competências da Assessoria Especial em Gestão Socioambiental do MME, seriam suficientes para resguardar o respeito às decisões técnicas assumidas por estes mesmo órgãos?44

42 BRASIL. EPE. Nossa História. 2016. Fls. 6- 7. Livro Digital. Disponível em:

http://www.epe.gov.br/Paginas/EPE contasuahist%C3 %B3riaemlivrodigital.aspx. Acesso em: 18/12/2016.

43 Em 18 de fevereiro de 2014, a EPE disponibilizou a Nota Técnica EPE-DEE-RE 110/2013-r0, de 28 de

outubro de 2013, descrevendo o processo de cálculo da Garantia Física de Energia da UHE São Manoel (realizado segundo metodologia estabelecida na Portaria MME nº 258, de 28 de julho de 2008).

44 Sobre a possível ausência de mecanismos de controle e enforcement: “No entanto, para relação mapeada acima

não existe um órgão no Estado brasileiro que exerça a figura de centro estratégico na coordenação dos agentes (órgãos licenciadores, empreendedores e, por vezes, atores da sociedade civil). O ente público que mais se aproxima desse papel é a EPE, mas sem possuir os mecanismos de controle e enforcement necessários a um centro estratégico. Essa ausência de coordenação, conforme será visto, ocasiona atrasos nos prazos para a emissão das licenças ambientais e, também, conflitos com relação à qualidade dos estudos ambientais realizados”. CYPRIANO. Juliana Jonas. O papel do estado na coordenação de estruturas híbridas: estudo do setor de geração hidrelétrica brasileiro. 2014. 147 f. Dissertação (Mestrado em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento) ‒ Instituto de Economia da UFRJ, UFRJ, Rio de Janeiro, 2014.

Essa questão aparenta difícil solução, tendo em vista a composição do organograma dos órgãos de planejamento, que, nos termos das leis já citadas, entrelaçam as competências dos órgãos envolvidos na expansão da geração de energia com o dever de apontar o aproveitamento ótimo em determinada bacia hidrográfica.

Pode-se, contudo, observar que a EPE tem sido vista pela sociedade (incluindo-se neste conceito: MP, ONGs, representantes do meio acadêmico) não como órgão público imparcial na busca pela melhor solução, que pode, inclusive, indicar pela impossibilidade técnica ou ambiental de implantação de determinado empreendimento, mas sim como empreendedor que, a despeito da ausência de interesses econômicos na construção dos empreendimentos hidrelétricos, está comprometido tão somente com a agenda e diretrizes do governo. Este discurso pode, inclusive, ser encontrado em peças processuais das ações judiciais que serão examinadas no Capítulo 3 deste trabalho.

Mais uma vez é preciso chamar a atenção para a importância da compreensão da composição dos órgãos de controle e planejamento do setor elétrico, bem como da linha tênue que divide o dever de seguir, respeitar e procurar a realização das atividades que estejam afinadas com a linha de atuação proposta pelo governo sobre expansão de energia, seja ela qual for (preferência por hidrelétricas, energia solar ou eólica, por exemplo), e o dever, também imposto por lei, de assegurar a escolha de aproveitamentos hidrelétricos ótimos que apresentem viabilidade ambiental.

Garantir a excelência dos resultados obtidos pelos instrumentos à disposição de órgãos públicos e, principalmente, sua independência técnica, é indispensável não só para o controle das atividades desenvolvidas, como também para assegurar a deferência técnica esperada destes mesmos estudos.

Contudo, tal como ocorre com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a EPE, como empresa estatal dependente, conta exclusivamente com os recursos oriundos da União por meio do orçamento público, aprovado ou rejeitado ao alvedrio da empresa, como ocorre usualmente na Administração Pública.

Sobre o tema importa noticiar que, em meados de janeiro de 2017 foi publicado o Decreto 8.961/2017 que trata da execução orçamentária para 2017. Nesse Decreto, em relação a EPE, foi fixada a liberação de apenas 1/18 do orçamento previsto para os meses de janeiro, fevereiro e março.

No mesmo decreto ficou definida ainda uma avaliação da evolução da receita no primeiro bimestre que orientará as liberações de limites para os meses seguintes, situação que gera severa restrição de recursos com graves impactos nas despesas de funcionamento da

Empresa e mesmo no custo de operações que digam respeito diretamente ao objeto da empresa: planejamento de longo prazo da expansão do setor energético brasileiro.

Resta então a dúvida: como sustentar a realização do planejamento ótimo do setor elétrico, se nem mesmo as despesas básicas da empresa encontram-se cobertas pelo orçamento que lhe é dedicado pelo Poder Concedente?

Registre-se, desde já, a necessidade de fortalecimento dos órgãos públicos dedicados à elaboração de estudos destinados ao planejamento do setor elétrico, como é o caso da EPE. Defende-se a reavaliação do papel desempenhado pela Empresa de Pesquisa Energética, o qual se mantém praticamente intacto desde a criação da entidade, no ano de 2004.

Para que tal fortalecimento gere reais benefícios à expansão do setor elétrico, esta dissertação defende a ideia de que um dos caminhos a serem trilhados consista em assegurar a total independência técnica dos empregados da EPE perante os técnicos dos demais órgãos públicos, ainda que diretamente superiores, como é o caso da ANEEL; e o segundo caminho consista em viabilizar a real independência financeira das entidades, para que à empresa e à sociedade em geral seja viabilizada a melhor escolha naquele momento em especial.