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1. Organizações Museais e Emancipação: uma aproximação conceitual

1.3. Caminho traçado para o estudo e outras premissas

1.3.1. Encadeamento de Argumentos

a) Arranjo Argumentativo 1:

A partir de um estudo aprofundado com foco na contradição entre (1.1) o desafio posto pelos museólogos de que as pessoas não vão aos museus6, (1.2) da percepção visual/experencial das pessoas indo aos museus e (1.3) do esforço político e econômico de construir ou revitalizar museus em pontos a serem valorizados nas cidades proponho compreender como se dá essa contradição.

Da resposta a essa pergunta pretendo conseguir propor caminhos para o entendimento de qual é o papel dos museus hoje, ou, administrativamente falando, qual a razão de ser dessa organização hoje, visto que pelo menos em uma primeira observação superficial há contradição aparente entre essas razões e funcionalidades.

Entendendo como o museu se ressignificou na sociedade, ou, qual a razão de ser dessa organização, baseada em suas funcionalidades contemporâneas espero poder, a partir da teoria de Estudos Organizacionais elegida indicar qual é

6 Diálogos gravados em conversas no Seminário Internacional Arte Ação Ambiental: encontros

a racionalidade que deve embasar as ações e decisões administrativas para que essas organizações sejam coerentes com sua razão de ser.

b) Arranjo Argumentativo 2:

A partir da proposta dos museus em (2.1) oferecer a sociedade ações extramuros de cunho social, (2.2) da percepção visual da existência dos muros (cercas e demais equipamentos de segurança ostensivos) e (2.3) da alocação desses espaços como espaços de embelezamento, ícone e alavancagem do processo de revitalização das cidades proponho compreender como se dá essa contradição.

Da resposta a essa segunda pergunta pretendo conseguir propor caminhos para o entendimento de qual é o papel dos museus hoje, ou, administrativamente falando, qual a razão de ser dessa organização hoje, visto que pelo menos em uma primeira observação superficial há contradição aparente entre essas razões e funcionalidades.

Entendendo como o museu se ressignificou na sociedade, ou, qual a razão de ser dessa organização, baseada em suas funcionalidades contemporâneas, espero poder, dentro dos Estudos Organizacionais indicar qual é a racionalidade que deve embasar as ações administrativas para que essas organizações sejam coerentes com sua razão de ser.

Para a análise principalmente dos primeiros níveis, me utilizarei da construção de narrativas (CRESWELL, 2013) porque acredito que assim conseguirei engajar melhor o leitor no texto, introduzir melhor o objeto de estudo e explicar o seu contexto. Creswell (2013) fala que a pesquisa narrativa tem diversas formas de práticas analíticas e usos. Narrativa pode ser o fenômeno a ser estudado ou o método usado para analisar estórias contadas. Eu estou usando como método. O método conta história de indivíduos, suas experiências e pode enaltecer identidades dos indivíduos ou seu próprio ponto de vista, usa diferentes fontes de dados, obedece a uma ordem cronológica, ocorrem em espaços ou lugares específicos, têm interrupções ou tensões no “enredo”. As fontes de dados usadas para construção deste ensaio teórico foram a observação in loco, a observação de fotos (retiradas aleatoriamente da internet neste primeiro momento), as comunicações

orais gravadas em encontros ou seminários (comunicações “naturais”) e pesquisa bibliográfica.

Ainda acerca da análise pela narrativa, ela pode ser: temática (sobre o que foi dito); estrutural (sobre a natureza de contar a história) ou dialógica (ou performance, que foca em para quem a estória é contada), segundo Creswell (2013), e nesse caso foi usada a temática. As narrativas funcionam bem para capturar estórias detalhadas de experiências de vida de uma única pessoa ou de um pequeno grupo. Na análise, o pesquisador pode ter participação ativa, reescrevendo e re-emoldurando a história7 como eu faço no presente artigo. Então, é o pesquisador que provê a narrativa com uma ligação causal e por isso meu ponto de vista fica evidente ao leitor. Eu tento no enredo incluir as três dimensões propostas por Creswell (2013): a interação (pessoal e social); a continuidade (passado, presente e futuro); a situação (lugar), com menor ênfase na continuidade nesse momento, já que o objetivo do ensaio é discorrer sobre o fenômeno contemporâneo e o recurso da narrativa é usado apenas para melhor descrever e analisar o objeto (ou participante) e os argumentos que dele emergiram, em justaposição ou contraposição com o meu próprio pensamento e principalmente com a teoria utilizada.

Creswell (2013) afirma que na perspectiva narrativa, tanto participantes quanto pesquisador aprendem e negociam o sentido ou o significado das estórias. Esse processo de negociar, ir e vir, que é um processo riquíssimo da análise eu não faço neste primeiro momento que é o da organização do ensaio teórico. Pretendo dar continuidade retornando essa primeira impressão (em forma de ensaio) ao campo e agregando outros métodos de coleta como entrevistas semi-estruturadas e refazendo as análises. Esse processo de dialogar, de envolver todos os participantes é também muito útil para mim especialmente porque parte relevante do referencial teórico e motivador desse estudo que é bem maior e mais antigo do que este ensaio está embasado em Paulo Freire. E esse processo dialogado, participativo é muito próximo ao que Freire (2002) sugere como comunicação, se a ele agregarmos o engajamento político e o compromisso com a transformação do mundo em um mundo melhor.

Os desafios principais do método apontados por Creswell (2013) são: a necessidade de informações muito extensivas (de diferentes fontes) acerca do

participante8 e a necessidade de entender bem seu contexto para não distorcer as interpretações. Tais desafios podem ser suprimidos pela triangulação de fontes, o que foi usado aqui, e pelo contato e convivência com o meio, o que também tem sido feito ao longo dos últimos quatro anos por mim, ainda que como pesquisadora não-participante. Outra forma de enriquecer os dados é retornar com as análises parciais ao campo, como foi explicado no parágrafo anterior e isso será feito em um estudo posterior.

O autor sugere a criação de códigos e temas para a análise dos dados, de acordo com a sequência: descrever, classificar e interpretar os dados. A descrição desempenha papel principal neste ensaio. O processo de codificação9 implica em agregar textos e imagens em pequenas categorias de informação e eu faço isso organizando os dados expostos nas narrativas principalmente nos níveis 1 do primeiro e do segundo arranjo argumentativo.

A análise dos níveis 2 e 3 é argumentativa utilizando o fruto da análise dos dados dos níveis imediatamente anteriores e comparando com as teorias utilizadas a partir do referencial adotado. Ao longo das análises e dos argumentos procurei grifar em negrito partes do texto que serviriam para a construção das categorias organizadas nos esquemas que encerram parcialmente cada etapa da análise.

Acredito, ainda, ser possível, a partir da racionalidade fundamental que deve embasar essas organizações, confrontar finalmente essa conclusão parcial à proposição teórica defendida anteriormente de que os museus são organizações privilegiadas para sediar o processo emancipatório na contemporaneidade (CASTRO, 2012). O esquema desses arranjos está graficamente representado na figura 1.

8 Não se usa a palavra “objeto” de pesquisa, e sim “participante” neste método.

Nível 1

•Como se dá a contradição entre:

•a assertiva dos gestores de que as pessoas não vão aos museus •a presença das

pessoas nos museus •o esforço político/econômi co para construir museus em locais de interesse Nível 2

• Com base nas contradições, qual a razão de ser da organização "museu" hoje? Nível 3 •Qual racionalidade deve embasar as ações administrativas para que a organização seja coerente com sua razão de ser? Nível 1 •Como se dá a contradição entre: •a existência de ações extra- muros •a existência de muros nos museus •o interesse privado e coletivo para revitalizar a cidade Nível 2

• Com base nas contradições, qual a razão de ser da organização "museu" hoje? Nível 3 •Qual racionalidade deve embasar as ações administrativas para que a organização seja coerente com sua razão de ser? A rr anj o A rgum e nta tiv o 1 A rr anj o A rgum e nta tiv o 2

Tese em prova:

Os museus são

lócus privilegiado

para o processo

emancipatório

contemporâneo?

De acordo com Whetten (2003), condições referentes a quem, onde e quando impõem limitações aos modelos teóricos como o que busco desenvolver. Assim, a opção por privilegiar autores brasileiros pode se constituir em uma limitação em relação à generalização do modelo. No entanto isso não deve comprometer o esforço teórico se o leitor compreendê-la a partir da perspectiva mais genérica de que o novo papel dos museus está voltado para o desenvolvimento, e que o desenvolvimento que a literatura que uso defende que deve ser intrínseco e emanado de cada cultura. Dessa forma, é possível que essa proposta teórica não seja considerada como uma teoria no sentido amplo já que não é abrangente o suficiente para todos os museus do mundo, mas de acordo com essa visão de desenvolvimento, uma teoria que seja aplicada apenas a algumas realidades é mais relevante porque tem mais poder de transformação daquela realidade específica, e nesse caso, como pesquisadora brasileira, é a realidade brasileira a que me é mais cara.

No tocante a quem, outro fator limitante proposto por Whetten (2003), acredito que diferentes tipos de museus, mesmo dentro da realidade brasileira, estão em diferentes condições de se utilizarem da teoria, e têm diferentes propósitos, sendo possível que para alguns a questão mercadológica se sobreponha de tal forma que a teoria aqui desenhada não fará sentido. Entendo, que, para um museu de arte, por exemplo, a própria aquisição, empréstimos e conservação das obras pressupõem um emaranhado de serviços como seguros, restauradores, transportes especializados, entre tantos outros e, que são tão caros que às vezes a organização deve decidir entre manter ou adquirir essas obras (salvaguardando o patrimônio) ou usar seu orçamento para outros fins.

No entanto, seguindo a tendência mundial, proposta pelos órgãos internacionais, e mais especificamente a tendência Latino-Americana em redesenhar os papéis dos museus dando ênfase especial ao papel de educação para o desenvolvimento desses países, acredito que esta teoria se adéqua perfeitamente e que teríamos que tomar os casos de museus com outro enfoque a partir de outras perspectivas, entendendo que organizações com fins diferentes coexistirão nesse momento de transição, mas que é possível que um modelo se sobreponha ao outro ou que elas tomem rumos cada vez mais diferentes.

A temporalidade, como a última condição proposta por Whetten (2003), tal como o objeto e o espaço, naturalmente impõem limites a qualquer esforço teórico, e por isso

proponho que este esforço teórico sirva aos museus contemporâneos, não havendo nenhuma pretensão de generalização no tempo. Certamente ela não se adéqua ao papel que os museus desempenharam no passado no Brasil, e em tantos outros lugares, que foi o de manipulação da cultura; mas acredito que estudos empíricos futuros como os que devem acontecer na sequencia dessa pesquisa podem oferecer indícios de como ela poderia se aplicar deste momento para os vindouros, acompanhando as mudanças de época e de contexto.

Ainda é importante destacar que a opção pelo ensaio teórico não quer dizer que não houve, em momento algum, visita ao campo, mas sim que não houve pesquisa de campo propriamente dita. Em consonância com a ideia de práxis que se defende não se poderia abrir mão da relação indissociável entre teoria e prática, logo as visitas a campo contaram com observações e entrevistas, mas estas se restringiram apenas a “explorar o campo”, seguindo apenas essa parte da metodologia proposta por Quivy e Campenhoudt (1998) com vistas a refinar aspectos contidos na teoria para a análise. O resultado desse contato com o campo não será utilizado como dado, portanto, e serviu tão somente para oferecer mais subsídios nessa primeira etapa do processo.