• Nenhum resultado encontrado

2 EU NO CAMPO: PERCURSO EPISTEMO-METODOLÓGICO

2.1 Etnografia no grupo de discussão pela humanização do

2.1.2 Encontros e eventos

Como já me referi no item anterior, comecei a frequentar o grupo de apoio à gestação e ao parto participante desta pesquisa na ocasião de minha primeira gravidez, em 2010. Quando decidi realizar minha pesquisa de campo nele, consultei uma das coordenadoras, que não me deu uma resposta de imediato, recomendou que eu enviasse um e-mail para as coordenadoras locais, para que elas pudessem discutir o assunto com as administradoras do grupo nacional, mas já adiantou que achava que não teria problema nenhum (notas de campo, 2010). O cuidado em consultar as administradoras do grupo nacional se deve ao fato de que o grupo virtual também seria acompanhado durante a pesquisa e nele as participantes de todo o Brasil se expõem. Esta resposta demorou um pouco a vir, e talvez não tenha vindo claramente, com uma afirmativa. Eu simplesmente passei a me apresentar nas reuniões como, além de grávida, pesquisadora, estudante numa pós-graduação em Antropologia, interessada em experiências de parto.

Talvez o marco para a permissão de minha pesquisa, de forma mais evidente, tenha sido a decisão posterior das coordenadoras locais, em discussão com as administradoras nacionais, de manter o anonimato do grupo, após outra consulta minha, quando (re)expliquei minhas intenções de pesquisa e possíveis linhas de análise. Este processo também não foi rápido. Entre minhas primeiras consultas com as coordenadoras locais, o envio de meu e-mail com maiores explicações, a discussão entre as coordenadoras locais e administradoras do grupo nacional e a resposta final chegar até mim, posso dizer que levamos quase todo o primeiro semestre de 2012.

Nesta circunstância, minha presença no grupo enquanto pesquisadora já estava firmada. A cada encontro que compareci, nos anos de 2010, 2011 e 2012, após definido que meu estudo seria realizado nele, me apresentei, na rodada de apresentação que ocorria no início de cada reunião, como pesquisadora, doutoranda em Antropologia, abordando as experiências de parto de mulheres que participaram                                                                                                                

19 Como forma de diferencia-los e destacá-los do restante do texto, optei por incluir os trechos das notas de campo, dos e-mails do grupo de discussão virtual e das transcrições das entrevistas em itálico.

deste grupo de discussão pela humanização do parto e do nascimento. Além disso, como participante, relatei em algumas circunstâncias minhas experiências de gravidez, parto e amamentação. O lugar de pesquisadora foi reforçado ainda quando sugeri e encontrei bastante receptividade entre as coordenadoras locais, que um dia da reunião fosse dedicado à exposição de algumas ideias vinculadas a minha pesquisa.

Isto aconteceu em 20 de outubro de 2012. Para este dia, preparei uma apresentação nos moldes da academia, com meus objetivos de pesquisa, principais referências conceituais, técnicas para a construção das informações no campo e algumas reflexões preliminares. Os presentes estavam muito atentos, mas também silenciosos, o que me gerou um incômodo que me fez abandonar a apresentação formal e expor minhas ideias de maneira mais dialógica, relacionando-as com as experiência de campo e pessoais, que eram também partilhadas pelas pessoas que ali estavam. Isto fez com que a mulheres e homens presentes passassem a participar mais, trazendo situações vivenciadas por elas/es, que puderam ser relacionadas por mim, de maneira mais sutil, às dimensões teóricas. Ao final, avaliei como positivo o debate e o interesse demonstrado pelos presentes.

Nos encontros regulares do grupo, descritos no item anterior, me posicionava como qualquer outra/o participante, sentada no chão, como parte da roda. Falava pouco, não no intuito de assumir uma postura de pesquisadora que interfere pouco no campo, mas sim por uma característica de personalidade. Independente de estar no grupo como pesquisadora ou como gestante, sempre falei pouco.

Figura 02: Disposição circular do grupo.

Fonte: http://1.bp.blogspot.com/-

Mantinha meu caderno sempre ao meu alcance. Por vezes, com receio de perder alguma informação avaliada por mim como muito importante e na ânsia de registra-la o mais integral possível, fazia anotações durante o encontro. Mas, em geral, dava preferência por construir o texto sobre o encontro depois, em casa. Apesar de ter chegado atrasada algumas vezes, tentei constantemente não sair do local onde o grupo era realizado antes que a maioria das/os participantes se dispersasse. Estes momentos finais, as conversas que nele aconteciam, me pareciam importantes indicadores das expectativas das mulheres e familiares e do cenário que encontravam para tornar estas expectativas em possibilidades reais ou fontes de ansiedade e frustração.

Com a observação das reuniões presenciais do grupo, puderam ser percebidos os direcionamentos dados às discussões coordenadas, as intenções e expectativas das mulheres ao buscarem o grupo, as possíveis transformações nestas expectativas, bem como outros eventos considerados relevantes para a compreensão dos valores atribuídos às diferentes experiências de parto e os lugares assumidos pelas mulheres a partir de suas experiências. Nestes momentos, puderam ser verificadas com mais clareza as posições de liderança, de exemplo a ser seguido, de informante chave, dentre outras posições de destaque, em relação com as experiências de parto que as mulheres ocupantes de tais posições tiveram.

Durante o período da pesquisa de campo, participei também de outros eventos relacionados ao grupo pesquisado sem que fizessem, necessariamente, parte das atividades promovidas por ele, mas que me ajudariam a compreender as relações dos componentes do grupo entre si, do grupo e de seus componentes com os outros grupos existentes, com alguns profissionais de referencia, bem como os principais paradigmas que o guiavam. Estive, portanto, em chás de bebê, comemorações, mobilizações, palestras, relatos de parto, audiência pública e nos dois primeiros cursos de doula promovidos pelo grupo em parceria com outras entidades. Além destes eventos, encontros informais em consultórios pediátricos, bares, shows infantis, clínica de ultrassografia e no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP)20 se constituíram em boas oportunidades de conversas bastante esclarecedoras para a pesquisa. Estive no IMIP para minha aula                                                                                                                

20 O Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira é uma entidade filantrópica, composta por um complexo hospitalar, que atua nas áreas de assistência médico-social, ensino, pesquisa e extensão comunitária. É uma referência na atenção humanizada ao parto e à gravidez de alto risco. Para mais informações, acessar: http://www1.imip.org.br/cms/opencms/imip/pt/conheca/

prática do primeiro curso de doula que acompanhei e também para encontrar as obstetras que me acompanharam durante minha segunda gravidez, em 2012.

2.2 Etnografia no grupo virtual de discussão pela humanização do parto e do