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4 PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE PSICOLOGIA: AS REPRODUÇÕES E RUPTURAS EM TELA

4.1 O PPC entre imobilidades e reformulações

A primeira versão do PPC é de 2005 (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, 2005), logo, já segue as Diretrizes Curriculares Nacionais. Salienta-se que a referida versão é resultado do trabalho de docentes do curso de Psicologia da UFAL de Maceió, com a colaboração de uma docente de Serviço Social do mesmo Campus. Também é digno de nota que, cientes da dificuldade de determinar definições para um curso ainda não iniciado e do qual não fariam parte, essa equipe buscou deixar registrada a possibilidade de mudanças, especialmente quanto às ênfases curriculares assumidas no projeto. Entretanto, a despeito das orientações dessa equipe, a proposta pedagógica para os campi interiorizados inseriu

elementos que não puderam ser alterados quando a comunidade acadêmica de Palmeira dos Índios começou a se formar e se iniciaram as primeiras reuniões para reformular os PPCs de Psicologia e de Serviço Social.

Isto porque, como mencionamos no capítulo anterior, o documento original do PPC de Psicologia, assim como de outros cursos que compõem o Projeto de Interiorização da UFAL, é resultado de uma proposta acadêmica e administrativa considerada inovadora, experimental e flexível (UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS, 2015a) por seus idealizadores. Em relação à dimensão pedagógica, tal projeto divide a matriz curricular de todos os seus cursos interiorizados em três troncos: 1- o Tronco Inicial, cujas disciplinas compõem o primeiro período de todos os cursos da UFAL que estão em cidades interioranas: “Sociedade, natureza e desenvolvimento: relações locais e globais”, “Produção do Conhecimento: ciência e não- ciência”, “Lógica, informática e comunicação” e “Seminário Integrador 1”. 2- o Tronco Intermediário é correspondente ao segundo período, em que a oferta das disciplinas varia conforme o Eixo em que o curso está situado. Assim, Psicologia e Serviço Social formam o Eixo Humanidades e têm em comum as disciplinas do segundo período: “Introdução à Psicologia”, “Introdução à Filosofia”, “Introdução à Antropologia”, “Introdução à Sociologia”, “Pesquisa em Ciências Sociais” e “Seminário Integrador 2”. 3- o Tronco Profissionalizante que, a partir do 3º período, oferece as disciplinas consideradas específicas de cada graduação.

No entanto, se, por um lado, a proposta dos troncos teria o intuito de flexibilizar e permitir a mobilidade acadêmica, por outro, vetou possibilidades de mudanças no Tronco Inicial, revelando uma faceta deveras inflexível. As tentativas de modificá-lo ou de discuti-lo sempre esbarraram em explicações da Direção Acadêmica e da Pró-Reitoria de Graduação – PROGRAD – de que, caso o projeto se distanciasse de sua versão original, poderia ocorrer o descredenciamento do curso, além do que feriria o princípio da mobilidade. Como dissemos, atual gestão da UFAL vem propiciando aos cursos a liberdade para pensar sobre o sistema de troncos, bem como sobre reformulações na matriz curricular.

Essas características foram e são alvo de constantes críticas de membros da comunidade acadêmica, que defendem a necessidade permanente de avaliação do nominado projeto inovador. Lusa (2012, p. 259) pondera que

Se por um lado este modelo de formação universitária possibilita a todos discentes de graduação a apropriação de referenciais comuns, independente

da área de atuação profissional, como por exemplo, as especificidades do estado e da região, por outro lado ela interfere na proposta curricular regulamentada para cada área do saber, retirando certa margem de autonomia para a proposição de disciplinas pelas equipes de cada curso.

Além disso, a posição do Tronco Inicial também é alvo de críticas nos cursos: como não pertence ao núcleo profissionalizante, ele não está vinculado diretamente à coordenação dos cursos, tendo uma coordenação própria que reúne os docentes e demandas dessas disciplinas de todo Campus Arapiraca. Há, aqui, uma dificuldade recorrente de comunicação entre ambas as coordenações e uma impossibilidade de gestão das coordenações dos cursos quanto aos assuntos do Tronco Inicial. Por exemplo: não é possível ao coordenador do curso visualizar ou inserir a oferta dessas disciplinas no sistema acadêmico38. Os próprios

professores das disciplinas ficam, às vezes, sem saber a quem responder e muitos queixam-se de falta de identificação ou de vinculação com algum curso.

Há também críticas provenientes do corpo estudantil. Em documento intitulado “Pioneiros ou Cobaias?”, em que solicitavam a reformulação do Curso de Psicologia, os estudantes assim pontuavam suas preocupações:

O primeiro período de um curso superior deveria ser a base da discussão para que o discente entrasse em contato com o universo acadêmico, bem como, com sua área de atuação. Porém, o ingresso na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) via Campus Arapiraca tem sido frustrante para não dizer decepcionante. Das quatro disciplinas ofertadas, no primeiro semestre, nenhuma é específica da área ou faz algum tipo de alusão a mesma. Antes que levantem-se vozes a dizer “a culpa está nos professores que não fazem uma integração entre suas disciplinas e os respectivos cursos”, vale salientar que a própria estrutura trata de separar o tronco inicial do restante do curso, uma vez que, há uma coordenação só para este (CENTRO ACADÊMICO AFONSO LISBOA, 2008, p. 1).

A despeito dos obstáculos, algumas mudanças foram realizadas ao longo desses onze anos e outras estão em curso através da ação do NDE, em especial no ano de 2016, com a flexibilização do sistema de troncos, o que propiciará mudanças mais aprofundadas na matriz curricular. De todo modo, a versão atual do PPC de Psicologia ainda traz a rigidez dos troncos e é fruto de uma revisão que ocorreu no segundo semestre de 200839, sendo esta a maior e os

acontecimentos que a sucederam mais conflituosos. Ocorre que na segunda metade daquele 38 Informação verbal obtida na Coordenação do Curso de Psicologia, em 2016, Palmeira dos Índios/AL.

39 Importante registrar que antes da revisão de 2008, uma outra reformulação já havia sido empreendida, em 2007, quando foram alteradas disciplinas especialmente no Tronco Intermedário.

ano, o colegiado formou uma comissão composta por três professores, sendo um substituto e duas docentes efetivas, uma técnico-administrativa e uma estudante para elaborar uma proposta de reformulação do PPC. O trabalho estendeu-se somente no referido semestre, pois havia a consideração da comissão de que outras modificações mais profundas só seriam possíveis quando o curso tivesse completado seu quadro de docentes40.

Apesar disso, as reformulações foram amplas e se estenderam por praticamente todos os períodos da formação. Salienta-se que estas se deram essencialmente no tocante ao conteúdo e à organização disciplinar, seguindo praticamente inalterados os textos iniciais, que trazem os fundamentos do PPC e finais, com as atividades práticas. Segue um breve resumo das mudanças propostas: 1- como não havia a possibilidade de alterar o intocável Tronco Inicial, a comissão inseriu ao menos uma disciplina eletiva já buscando introduzir conteúdos específicos da Psicologia; 2- foram incluídas novas disciplinas, a saber: Psicologia e Políticas Públicas, Inclusão Escolar de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais e Seminário de Pesquisa em Psicologia, sendo a primeira do 5º período e as demais do 8º semestre; 3- houve alteração do período de ofertas de algumas disciplinas, por exemplo, Psicopatologia 1 estava no 7º semestre e foi inserida no rol do 4º período; 4- nomenclaturas, ementas, bibliografias e cargas horárias também foram modificadas.

As mudanças foram, pois, realizadas e, com a anuência do colegiado, a então coordenadora do curso reuniu-se com a PROGRAD para discutir a nova proposta. Todavia, representantes da pró-reitoria foram contrários à maioria das alterações, alegando que, segundo normativas do MEC, como a primeira turma ainda estava finalizando o quinto período, aquelas disciplinas que eles já haviam cursado não poderiam ser alteradas. Isso só seria possível após a primeira formatura do curso. Assim, esboçou-se duas opções ao colegiado: 1- manter a versão de 2007; 2- aceitar uma reformulação parcial do PPC, em que só seriam acatadas as mudanças a partir do 6º período41.

Tal proposta foi exposta pela coordenadora ao colegiado, com a solicitação de que seus membros se posicionassem. Destarte, embora reconhecendo a existência de um projeto em pedaços, remendado e desestruturado, o grupo aceitou a segunda opção. A argumentação prevalecente era de que seria melhor ter um projeto remendado, com avanços em alguns temas, do que um outro defasado e com diversas ausências. Então, em 2009, a turma do 6º 40 Naquele período, só havia três professoras efetivas que faziam parte do Tronco Profissionalizante (sendo que

uma estava em licença-maternidade), os demais eram substitutos e os outros efetivos compunham o quadro de docentes dos Troncos Inicial e Intermediário.

período já iniciava o semestre com a nova oferta curricular. Essa é a versão do PPC mais atual, publicada em abril de 2009, que foi por nós analisada. Vale registrar que, ao longo dos anos subsequentes, ela sofreu pequenas modificações, como pré-requisitos e inserção de disciplinas eletivas, mas sua matriz curricular permanece inalterada.

Passaremos a discutir esse PPC em maiores detalhes, abordando as análises que efetuamos do referido documento e as reflexões suscitadas nesse processo. Antes, porém, apresentamos os procedimentos analíticos. A análise do PPC teve o objetivo de conhecer a formação a partir do que é preconizado como Psicologia, a forma de articular temas e a preocupação com o perfil do egresso, sua confluência com as DCNs e como as disciplinas contemplavam tais discussões. Também possibilitou conhecer as particularidades do curso em suas histórias e estrutura, o entendimento oficial do que seria o perfil do profissional a ser formado, os fundamentos filosóficos, teóricos e pedagógicos que norteiam o curso, as relações entre os componentes teóricos e práticos, dentre outros, os quais compõem um relevante desenho do curso e permitem tecer relações com as representações sociais aí produzidas.

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