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Grupo focal: os movimentos dos grupos e suas articulações com as representações

PARTE II – SABERES EM MOVIMENTO

6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: RETRATANDO OS MOVIMENTOS REPRESENTACIONAIS

6.2 Grupo focal: os movimentos dos grupos e suas articulações com as representações

sociais

Nas pesquisas em representações sociais, o grupo focal vem sendo utilizado extensivamente (OLIVEIRA; WERBA, 1998; JOVCHELOVITCH, 2004), de modo que essa técnica vem se afirmando como uma estratégia de pesquisa tradicional na TRS. De forma geral, observa-se trabalhos voltados à identificação de representações sociais ou ao estudo de seus processos comunicacionais e interacionais, etc. (STENZEL; GUARESCHI, 2002; SILVA; SILVA, 2012; GALINKIN; ALMEIDA; ANCHIETA, 2012; SILVA; TRINDADE; SILVA JUNIOR, 2012; RIBEIRO; CRUZ, 2013). Esses trabalhos partem do entendimento de

que o grupo focal propicia a interação e a comunicação, o que favorece o acesso às representações sociais em seus conteúdos e processos.

Em acordo com essas considerações, partimos da defesa de que o grupo focal é uma estratégia de estudos que possibilita trabalhos que enfoquem a comunicação e a interação e, desse modo, propicia, em especial, investigações da representação social em sua sócio gênese, bem como nas relações com diferentes saberes, explicitando polifasias cognitivas. De acordo com Banchs (2005), os grupos focais permitem conhecer os conteúdos discursivos em torno dos quais estruturam as representações de um dado objeto e, ao mesmo tempo, estudar os processos sociais de construção dessas representações.

Além disso, por prover um espaço de comunicação, o grupo focal propicia atenção à epistemologia dialógica, cujas teorias, como afirma Marková (2006), fundamentam-se na mudança, na antinomia e na comunicação. Nessa perspectiva, é no movimento dialógico que se produzem conhecimentos sociais, os quais constituem realidades compartilhadas pelo grupo.

Partindo desse argumento, constatamos a relevância da estratégia para a pesquisa em tela, uma vez que intencionamos analisar as representações sociais dos estudantes sobre o psicólogo. Ao longo dos movimentos grupais, tais representações se evidenciam e dialogam com outros saberes trazidos pelos participantes e expostos em grupo e, nesse diálogo, são colocados em movimento processos de (re)constituição dessas representações.

Assim, essa estratégia faz-se relevante porque intenciona compreender não somente os conteúdos representacionais como também os processos de (re)constituição de uma representação social em um dado contexto, no qual estão inseridas as relações com outros saberes e a forma como esses processos estão vinculados aos movimentos de comunicação e interação em grupo. Acreditamos que esse cenário favorece a emergência de representações sociais e proporciona condições para relacionar as representações e os contextos em que foram forjadas.

Desse modo, o grupo focal permite acessarmos as representações sociais e suas relações com o grupo que as produziu. Nessa direção, essa estratégia também evidencia as relações de produção de conhecimentos sociais na medida em que capta a tensão dialógica que constitui tais relações, presentificadas pelos componentes: Alter, Ego e Objeto. Como explicado anteriormente, a tríade dialógica tem como marca a tensão, que está presente e demarca o diálogo, que movimenta a produção do conhecimento social. Nas palavras de

Marková (2006, p. 178, grifos da autora),

A teoria das representações sociais, como a teoria do conhecimento social, define o campo da psicologia social. […] Essa teoria do conhecimento social é baseada na dialogicidade. O conhecimento dialógico é gerado a partir do processo de três componentes do Alter-Ego-Objeto (representação social), em suas muitas manifestações e dinâmicas, ao invés do monológico Ego- Objeto. […]

Enfim, no grupo focal, circulam, entre Outros e Eus, posicionamentos sobre o Objeto, os quais constituirão movimentações das representações sobre tal Objeto. A comunicação do Eu sobre o Objeto é tensionada, ratificada e contraposta pelos Outros, que podem ser tanto os participantes do grupo, como os Outros que compõem a história de vida, os contextos socioculturais de cada membro, além de elementos da própria formação profissional. Devido ao caráter dinâmico e dialógico do grupo focal, não é difícil visualizar que as posições de

Alter e de Ego se modificam, substituem-se e se sobrepõem, visto que os membros do grupo

são Ego e, concomitantemente, são Alter diante de seus companheiros de diálogo.

Considerando a tarefa de definir grupo focal, deve-se evidenciar sua característica básica: o trabalho em grupo. Diante disso, há confusões nas definições dessa técnica e no uso de termos como entrevistas de grupo focal ou discussões em grupo focal. Há vertentes que consideram a técnica como uma entrevista em grupo, na qual há perguntas elaboradas pelos pesquisadores e que são coletivamente respondidas. Nesse caso, o foco são as respostas em si e não o processo de construção do consenso criado a partir da interação grupal (BARBOUR, 2008).

Destaca-se, pois, a necessidade de ir além da concepção de entrevista grupal, enfocando a interação como aspecto fundante da técnica. É o que destaca Morgan (1996, p. 130) em sua definição como “a research technique that collects data through group interaction on a topic determined by the researcher”52. O autor grifa nessa definição três elementos

essenciais: primeiro, estabelece que os grupos focais são um método de coleta de dados; segundo, localiza na interação do grupo a fonte de produção dos dados; terceiro, reconhece o papel ativo do pesquisador na criação do grupo de discussão. Enfim, em Morgan (1996), constata-se que essa técnica não pode ser considerada como mero somatório de indivíduos, há que se destacar o olhar para o grupo em suas interações e comunicações, seus consensos e 52 “uma técnica de pesquisa que coleta dados a partir da interação grupal sobre um assunto determinado pelo

dissensos. Nesse sentido, o pesquisador não deve manter uma postura neutra e distante, mas sim assumir uma participação ativa no processo.

Outras autoras, como Kitzinger (1994) e Kind (2004), também enfatizam a interação em um grupo focal. A primeira expõe que essa estratégia propicia insights sobre a dinâmica dos processos sociais na produção de conhecimentos. Já a segunda considera que a interação produz dados e insights que provavelmente não seriam acessados em uma ocasião fora do grupo. Para a autora, o processo grupal vai além da soma de opiniões e sentimentos dos indivíduos, devendo ser estudado em pesquisas de caráter qualitativo.

Em relação ao nosso estudo, é preciso evidenciar algumas escolhas metodológicas que nortearam a realização do grupo focal. Em primeiro lugar, cabe reforçar que combinamos o grupo focal com a análise de documentos e a TALP, com o intuito de favorecer a conciliação e a síntese das diferentes dimensões do estudo. Tais estratégias não foram consideradas de forma estanque, buscou-se trabalhar os dados advindos de seus procedimentos de modo integrado, em uma configuração de retroalimentação, permitindo, assim, a ampliação e complexificação do universo de análise. Ainda, o conjunto dessas estratégias sinaliza caminhos investigativos e interventivos, com ações que podem contribuir na consolidação do campo de formação do psicólogo.

Aspectos como o tamanho do grupo e o local onde ocorrerão os encontros, a quantidade e duração das reuniões, o papel do moderador também devem ser consideradas no desenho da pesquisa. Kitzinger, Marková e Kalampalikis (2004) explicam que as decisões sobre o grupo focal devem reforçar a interação entre os participantes e reconhecer a importância do contexto em que se deu a discussão. De fato, compreendemos que se deve evitar um receituário preestabelecido que norteie o funcionamento grupal, observando os objetivos da pesquisa e, no caso de estudos com a TRS, ressaltamos a necessidade de garantir a comunicação entre os participantes.

Em nosso caso, trabalhamos com 12 graduandos de Psicologia e as reuniões ocorreram em uma sala de multimídia da própria Unidade de Palmeira dos Índios, nas sextas-feiras, totalizando 05 encontros, com duração de cerca de 120 minutos cada. Dentre os 12 estudantes, havia dois representantes por turma e outros dois que estavam no fluxo individual, ou seja, estudantes que por algum motivo perderam disciplinas e não seguiram o mesmo fluxo de sua turma original.

momentos de sua formação. Tal escolha deu-se por meio de sorteio: dois representantes por turma e mais dois que estavam no fluxo individual. Após sorteio, conversamos com cada possível participante, convidando-o a compor o grupo. Em geral, não tivemos recusas ao convite, as únicas negativas vieram da turma do sétimo período devido, especialmente, à falta de tempo desses estudantes, na medida em que esse período é considerado um dos mais difíceis, por ser o início dos estágios, deixando os discentes dependentes dos horários de seus supervisores de campo e divididos com as aulas.

Optamos pelo sorteio para evitar possíveis enviesamentos na escolha, já que minha posição era de pesquisadora e de professora do curso. Essa questão foi fortemente discutida, visando evitar uma escolha tendenciosa, bem como uma adesão de discentes que, de alguma forma, sentissem identificação com as discussões propostas por mim ao longo da graduação.

Esse aspecto conduz a um dos tópicos mais amplamente debatidos sobre o grupo focal, que é o papel do moderador, cujas ações podem conduzir o grupo a discussões profícuas ou não. Morgan (1996) remete à existência de grupos mais estruturados ou menos estruturados a depender do nível de controle do pesquisador. Esse nível de estruturação depende dos objetivos do estudo, bem como das questões a serem debatidas, do número e do perfil dos participantes.

Kind (2004) explana que a tarefa essencial do moderador é manter a interação grupal ao longo da duração dos encontros. Características pessoais, estilos de moderação e experiências anteriores também devem ser consideradas nessa tarefa. A autora ressalta como características pessoais a considerar: a abertura para discussão, a postura de acolhimento, o distanciamento em relação ao tema e a consciência das intervenções verbais e não-verbais. Já o estilo de moderação refere-se à atitude e ao comportamento do moderador diante do grupo, lembrando que isso também depende do ritmo do grupo que pode impor determinado estilo ao investigador/moderador. Em relação à experiência e aos antecedentes, Kind (2004) destaca que um maior conhecimento sobre o tema pode levar a uma mediação mais fluida.

O moderador deve estar atento à fala dos participantes de modo a não permitir grandes desvios ou que algum assunto importante não seja discutido ou que as pessoas não consigam se comunicar. É preciso também evitar que tópicos importantes sejam explorados somente no final ou que outros sejam antecipados sem a devida preparação. Para tanto, Gondim (2002) pontua que o moderador deve colocar as perguntas e tópicos para debate. A autora reconhece a importância de um roteiro para nortear o grupo, mas adverte que este não deve ser confundido

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