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ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

1.1 Escala de Envolvimento de Leuven

Uma das mais importantes contribuições da Educação Experencial20 (EXE) foi a elaboração do conceito de envolvimento que suporta a análise da qualidade do contexto educativo, além de permitir que se discuta a intensidade das actividades realizadas pelas crianças, bem como a sua auto-implicação durante a realização (cf. Laevers, 2008).

O envolvimento é perspectivado como uma qualidade da actividade humana, que segundo Laevers:

―- can be recognised by: concentration and persistence;

- it is characterized by: motivation, fascination and implication; openess to stimuli and intensity of experience both at the sensoric na cognitive level; deep satisfation and a strong flow of energy at the bodily and spiritual level;

- is determined by the exploratory drive and the individual pattern of developmental needs the fundamental schemes reflecting the actual developmental level;

- indicates that development is taking place‖ (1994a:162).

No entanto, para que o envolvimento aconteça é imperativo que haja uma correspondência entre a capacidade da criança e o desafio colocado pela actividade. De facto, segundo Laevers (1994a), caso as actividades apresentem um nível de dificuldade demasiado baixo ou demasiado exigente, o envolvimento não ocorre. Recorrendo à teoria de Vigotsky sobre o desenvolvimento e a aprendizagem, o autor considera que o envolvimento só ocorre quando a criança se encontra a operar no limite das suas capacidades, isto é, na zona de desenvolvimento próximo. Nesse momento, a criança encontra-se num ―estado de fluxo‖ (Csikszentmihayli, in Pascal & Bertram, 1999: 23) ou ―num nível superior de envolvimento‖ (Laevers, ibidem), que lhe possibilita o desenvolvimento e a assimilação de uma profunda experiência de aprendizagem.

Assim, quando a criança está profundamente envolvida, demonstra alguns sinais comportamentais como a concentração, a persistência, a precisão, a mobilização de energia, a satisfação, uma determinada expressão facial, posturas características do envolvimento e a

20 Uma das ideias principais da Educação Experencial (EXE) é que a forma mais económica e determinante para

avaliar a qualidade educacional (a partir do nível pré-escolar à educação de adultos) deve concentrar-se em duas dimensões: o grau de 'bem-estar emocional' e o nível de 'envolvimento'.

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necessidade de comunicar verbalmente (Laevers, 1994a). A observação destes ―indicadores do envolvimento‖ é importante para se aferir sobre o nível de auto-implicação em que a criança se encontra.

A escala de envolvimento da criança (escala de Leuven), proposta por Laevers (1994a), tem como objectivo específico medir o nível de envolvimento da criança aquando da realização de uma actividade proposta ou que ela desenvolve por iniciativa própria.

A escala de Envolvimento da Criança, traduzida e adaptada da escala original The Leuven Involvement Scale for Young Children (Laevers, 1994a), engloba duas componentes:

- uma lista de indicadores característicos do envolvimento da criança, que são um conjunto de sinais comportamentais que ajudam o observador a ter uma maior compreensão e percepção da situação de envolvimento da criança;

- os níveis de envolvimento aferidos numa escala de 1 a 5 pontos, indo de um nível nulo até um nível superior de envolvimento.

Assim, o envolvimento enquanto indicador dos processos de desenvolvimento da criança e indicativo da qualidade de ensino pode ser obtido pela presença ou ausência de um conjunto de sinais de envolvimento descritos por Laevers:

- a concentração, quando a atenção da criança está orientada para a actividade que se encontra a realizar. A actividade absorve a atenção da criança, que dificilmente se distrai e, caso isso aconteça, é apenas momentaneamente. Esta profunda concentração pode ser acompanhada de alguns sinais de expressão corporal e verbal (olhos fixos no material, movimentos das mãos, conversas com adultos ou pares...);

- a energia, traduzida pelo interesse, dedicação, empenho e esforço que a criança investe na realização da actividade. A energia pode ser inferida através de algumas expressões faciais, do seu tom de voz, da realização das actividades num curto espaço de tempo e da pressão exercida sobre os objectos. Em actividades em que a energia física está presente, podemos ainda notar outros indicadores como a transpiração e a ruborização;

- a complexidade e a criatividade, representadas pela mobilização de todas as capacidades físicas e cognitivas da criança, numa actividade mais complexa do que

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uma simples acção de rotina. Quando as actividades se adequam à sua competência e a criança se encontra a operar no limite das suas capacidades (zona de desenvolvimento próximo), ela investe todas as suas potencialidades nessa actividade, imprimindo-lhe um toque pessoal de criatividade, algo que não era pedido ou estava previsto pelo professor;

- a expressão facial e a postura, são indicadores não-verbais muito significativos, quando se pretende apreciar o envolvimento da criança, que podem ser traduzidos quer em expressões faciais, quer em posturas corporais. Assim, se o observador estiver atento a estes sinais, pode distinguir um olhar brilhante e atento de um olhar vago e distante, uma postura corporal que traduz situações de contentamento, concentração e empenhamento, de uma postura que traduz desinvestimento e tédio. A postura corporal é muito significativa e pode ser constatada mesmo quando a criança está de costas para o observador;

- a persistência, relativa à extensão da concentração da criança. Quando a criança está profundamente envolvida, concentra toda a sua atenção e energia na actividade, não abandonando facilmente a actividade e empreendendo todos os esforços para a manter e concluir, dedicando-lhe geralmente mais tempo do que é habitual (de acordo com a idade e o nível de desenvolvimento);

- a precisão, quando a criança está atenta e concentrada demonstrando grande cuidado na realização do seu trabalho. A criança revela sensibilidade aos pormenores e mostra precisão nas suas acções, para que o trabalho fique perfeito. Pelo contrário, as crianças não envolvidas tendem a realizar o seu trabalho apressadamente e não dando importância aos detalhes;

- o tempo de reacção, quando a criança demonstra grande motivação e entusiasmo, reagindo rapidamente a um estímulo que a interessa. A resposta a este estímulo irá determinar o seu nível de envolvimento, que deve ser aferido por um conjunto de indicadores e não só pela sua reacção inicial;

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- a satisfação traduzida em expressões de alegria e contentamento, perante o percurso e os resultados obtidos com o trabalho realizado. Este sentimento de satisfação deve implicar uma resposta a estímulos (1994b: 6).

De forma a operacionalizar o conceito de envolvimento, adoptámos para o nosso estudo a escala proposta por Laevers para crianças do pré-escolar, que é composta por cinco níveis:

Nível 1 – ausência de actividade;

Nível 2 – actividade frequentemente interrompida; Nível 3 – actividade mais ou menos contínua; Nível 4 – actividade com momentos muito intensos; Nível 5 – actividade muito intensa (Laevers, 1994b: 7).

Esta escala não tem como objectivo formular juízos sobre os professores ou sobre os alunos mas fornecer indicadores de aspectos positivos e negativos das práticas pedagógicas, através do nível de envolvimento dos alunos nas actividades (Sá, 2008). Neste sentido e no entender de Oliveira-Formosinho & Araújo, o envolvimento é ―uma forma óptima de monitorização de processos/aprendizagens e de os investigar. Por inerência, é também um instrumento valioso para a salvaguarda de direitos substantivos das crianças‖ (2004: 92).

Para utilizar a escala de Nível de Envolvimento é necessário realizar certos procedimentos, nomeadamente: escolher a actividade a observar; identificar as crianças que estarão envolvidas nessa actividade; observar até um máximo de 12 crianças; observar as crianças três vezes por sessão em intervalos de dois minutos; videogravar as sessões de modo a facilitar a classificação do envolvimento da criança; e registar cada observação na Folha de Observação do Envolvimento da criança (FOEC). Para realizar os registos na FOEC existem alguns passos que devemos ter em consideração: registar o número de crianças e de adultos presentes durante a sessão de observação; escrever a data e a hora; descrever sucintamente o tipo de actividade e o período observado; inserir e comentar a decisão quanto ao nível de envolvimento predominante durante os dois minutos de observação (Pascal & Bertram, 1995; Sá, 2008).

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Embora a Escala de Envolvimento de Leuven seja dirigida a crianças em idade pré- escolar, pensámos ser pertinente utilizá-la com as crianças participantes do nosso estudo (com idades compreendidas entre os 8 e os 15 anos) a frequentar o 3º e 4º anos de escolaridade, uma vez que possibilita uma recolha de informação sobre a qualidade das práticas educativas que implementámos, através da análise do envolvimento dos alunos, descrevendo e analisando comportamento não-verbais. Acrescido a este facto, consideramos que esta escala nos ajuda a obter resposta às nossas questões de investigação e a averiguar se as nossas escolhas pedagógico-didácticas envolveram as crianças, contribuindo para o seu desenvolvimento. Face ao exposto, considerámos pertinente e enriquecedor para o nosso estudo utilizar, ainda que de modo adaptado, esta escala referenciando que também foi utilizada no contexto do 1ºCEB por Sá (2008) e com crianças até aos 8 anos por Pascal & Bertram (1993), no The Effective Early Learning (EEL) Project. Uma vez que esta escala foi utilizada nestes estudos com resultados positivos na sua aplicação, consideramos adequada a sua utilização no nosso estudo tendo em conta os objectivos que nos nortearam. De facto, ―In the field of primary education the logic of the original EXE-model has been maintained. This means that a wide variety of educational interventions have been explored that promote "wellbeing" and "involvement" (Bennett, Bettens & Buysse, 2008: 78).

Tendo descrito a relevância da utilização da Escala de Envolvimento de Leuven, iremos de seguida apresentar os instrumentos de tratamento de dados que construímos para o nosso estudo.