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Sensibilização à diversidade linguística e cultural pressupostos e dimensões

SENSIBILIZAÇÃO À DIVERSIDADE LINGUÍSTICA E CULTURAL PARA UMA INSERÇÃO CURRICULAR

1. Da biodiversidade à diversidade linguística e cultural algumas considerações

2.2 Sensibilização à diversidade linguística e cultural pressupostos e dimensões

Tendo como ponto as considerações que tecemos nos pontos anteriores, verificamos a existência de uma vontade política para a criação de condições, em termos curriculares, de uma crescente valorização das línguas e culturas e, naturalmente, para a importância da sensibilização à diversidade linguística e cultural (SDLC). Nesta linha, o desenvolvimento da competência plurilingue para um diálogo intercultural tem-se assumido como um dos vectores essenciais das políticas educativas europeias e nacionais, ganhando especial relevo nos contextos formais de aprendizagem, quer teóricos quer práticos. De facto de acordo com Byram & Planet (2000: 12), ―la communication n‘est pas seulement une question d‘échange d‘informations. Elle implique également une interaction avec d‘autres individus, la compréhension de leur mode de vie, de leurs croyances, de leurs valeurs et de leur comportement‖.

Neste contexto, a sensibilização à diversidade linguística e cultural pode ser um factor positivo no reforço da imagem da diversidade, procurando que os alunos adquiram interesse e curiosidade por outras línguas e culturas.

Neste sentido, Hawkins (1999) apresenta uma maneira de abordar o estudo das línguas que denomina por language awareness, que incide sobre a consciência linguística, na importância de desenvolver nos alunos saberes sobre a língua, saberes que são mobilizados no contacto e comparação do sistema linguístico do aluno com outros sistemas linguísticos. O autor propõe actividades linguísticas em cinco domínios: a comunicação (descobrir o que faz especificamente a linguagem humana); a diversidade e evolução das línguas assim como o seu funcionamento (normas gramaticais); o seu uso (variedades geográficas, sociais,…); a língua falada e a língua escrita (os diferentes sistemas de leitura e escrita); e a aprendizagem das línguas.

Por seu turno, Candelier defende uma sensibilização à diversidade linguística, que denomina por éveil aux langues, no seguimento de Dabène (1994), defenindo-a como uma via de realização de uma abordagem pluralista,

―An awakening to languages is when part of the activities concerns languages that the school does not intend to teach (which may or may not be the mother tongues of certain pupils). This does not mean that

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only that part of the work that focuses on these languages deserves to be called an awakening to languages. Such a differentiation would not make sense as normally it has to be a global enterprise, usually comparative in nature, that concerns both those languages, the language or languages of the school and any foreign (or other) language learnt‖ (2004:19).

Assim, nesta abordagem pluralista, promove-se a realização de actividades com diversas línguas e valoriza-se a comparação entre a língua da escola, línguas ensinadas na escola, línguas maternas dos aprendentes e outras línguas a mobilizar. Visivelmente, o foco da atenção está na promoção de um contacto com as línguas em geral, com o intuito de consciencializar o aprendente para a diversidade, característica das sociedades actuais, e torná- lo num indivíduo disponível para outras experiências linguísticas no futuro.

Neste sentido, Ferrão Tavares refere que ―o contacto com as línguas antes da sua aprendizagem formal (…) favorece uma educação linguística‖, para a qual poderão ser definidos como objectivos:

- ―criar, através da exposição à língua-cultura, o desejo de conhecer o outro; - criar uma atitude positiva em relação à língua e à cultura;

- contribuir para a confiança da criança em si mesma; - contribuir para despertar a curiosidade;

- despertar a vontade de participar; - solicitar o imaginário;

- desenvolver a flexibilidade mental, permitindo a passagem de uma série de símbolos a outra série de símbolos;

- desenvolver a sensibilidade estética;

- desenvolver a vontade de ―viver‖ com os outros ‖ (2007:24-25).

Segundo a autora, esta visão de educação linguística traduz-se na legislação portuguesa segundo uma perspectiva de sensibilização, o que ―implica a diversificação no contacto com diversas línguas e diferentes tipos de linguagens‖ (ibidem).

De acordo com esta abordagem de SDLC é desenvolvido um conjunto de actividades, muitas de natureza comparativa e contrastiva, relacionadas com as línguas, sem se pretender necessariamente o seu ensino. O âmago desta abordagem é possibilitar aos alunos o contacto com sonoridades e sistemas de escrita diferentes, mundos diferentes, visões e modos de vida diferentes, procurando o desenvolvimento de uma atitude positiva capaz de encaminhar para uma consequente competência plurilingue. Esta abordagem evidencia um caminho no sentido da pluralidade, traduzido numa linha de actuação integradora e desenvolvendo competências comunicativas, procurando estimular a curiosidade pelas línguas e culturas.

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Importa, então, referir que nas actividades de sensibilização à diversidade linguística está integrada de igual modo a diversidade cultural, pois a dimensão intercultural está estreitamente relacionada com a dimensão linguística. Assim, para Candelier (2004: 18)

―This preparation aims to develop an interest in and stimulate curiosity for languages and cultures, to develop the learner‘s confidence in his or her own learning abilities, his or her skills in observing/analysing languages, whatever they may be, the ability to rely on an understanding of a phenomenon in one language to understand more fully – through similarity or contrast – a phenomenon in another‖.

Nesta linha de pensamento, Batley et al., expõem que

―In the face of the needs resulting from the multiplication of interlinguistic and intercultural contacts, it is necessary for the responsible persons in the educational systems to foresee in each country the introduction at primary school level, or at nursery stage if possible, of teaching or activities intended to provide pupils access to linguistic and cultural areas other than their native ones‖ (1993:26).

Assumimos, então, o pressuposto que as crianças só têm a beneficiar da aprendizagem de línguas e da SDLC nos primeiros anos na escola, uma vez que “Learning together and from one another represents the educational answer that should be given to the existence of multicultural societies‖ (Candelier, 2004: 21). Vários autores têm vindo a focar a sua atenção na necessidade da promoção do contacto com diferentes línguas, mencionando que é importante motivar as crianças desde os primeiros anos de escolaridade para a aprendizagem das línguas e para o desenvolvimento de atitudes de respeito e abertura ao Outro, à sua língua, e à sua cultura (Martins, 2008; Andrade & Martins, 2007; Sá, 2007; Candelier, 2004; Ferrão- Tavares, 2001; Strecht-Ribeiro, 1998).

Para Candelier (2000), a SDLC procura desenvolver efeitos positivos em três grandes dimensões, as quais, no nosso ponto de vista e tal como outros autores têm vindo a sublinhar (Martins, 2008; Sá, 2007) entretanto, se devem assumir como a base de uma educação para a diversidade:

- a dimensão das representações e atitudes face às línguas;

- a dimensão das capacidades de ordem metalinguística e metacognitiva (capacidades de observação e raciocínio);

- a dimensão do desenvolvimento de uma cultura linguística (saberes sobre as línguas). Relativamente às representações e atitudes face às línguas, Candelier & Hermann- Brennecke (1993) referem que o contacto escolar com a língua estudada influencia de maneira

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geralmente positiva as representações da língua e dos seus falantes. Contudo, de acordo com os mesmos autores, estas representações poderão ser alteradas consoante o grau de pertinência que os alunos atribuam à língua que aprendem. Andrade & Araújo e Sá, por seu turno, sublinham que as análises de experiências pedagógico-didácticas de SDLC demonstram que os alunos alteram a sua atitude em relação às línguas e aos povos que as falam, revelando-se mais interessados em relação às línguas e culturas em geral e com capacidade para melhorar os resultados escolares (2001).

Espera-se então que, com as actividade de SDLC, os alunos (re)construam representações linguísticas e culturais, favorecendo a criação de imagens positivas face às línguas e culturas e despertando a curiosidade, interesse e vontade de aprender línguas. Desta forma, as línguas constituem-se como um espaço propício ao desenvolvimento de competências pessoais e sociais fulcrais para o exercício de uma cidadania multidimensional e planetária (cf. Tomaz, 2007).

No tocante às capacidades de ordem metalinguística e metacognitiva, convém referir que, nos primeiros anos de escolaridade, a reflexão sobre a estrutura e o funcionamento da língua deve assumir-se como um instrumento auxiliar no desenvolvimento das capacidades do uso da língua e de aprendizagem da leitura e da escrita. Para Sá (2007: 78), as capacidades mencionadas ―constituem um fenómeno muito vasto, característico dos falantes e aprendentes de uma língua, e consistem na capacidade que os sujeitos têm de reflectir sobre a língua, seja a língua materna ou a língua estrangeira, de verbalizar essa recepção e de agir sobre essa língua, tendo em conta o conhecimento das suas regras de funcionamento‖. Desta forma, o desenvolvimento das capacidades metalinguísticas e metacognitivas pressupõe, concomitantemente, o desenvolvimento das capacidades de observação e de raciocínio.

Neste sentido, as actividades de SDLC podem provocar ―une réflexion métacognitive de la part des apprenants tout en conférant à l'enseignant des outils d'ajustement de ses interventions au cours d'interactions avec le groupe. En effet, la comparaison de tous les éléments constitutifs de la langue est une démarche interculturelle globale où l'enseignant soumet à ses élèves des images de l'Autre et des images du Même‖ (Catroux, 2009: 65).

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Tal significa que a SDLC estimula o contacto com diferentes línguas e que este contacto poderá levar a que a criança recorra às capacidades que possui em língua materna e noutras línguas que conhece para descodificar sons, palavras e estruturas desconhecidas, mobilizando assim capacidades inerentes sobretudo à língua materna para a aprendizagem de outras línguas.

Finalmente, em relação à cultura linguística, esta inclui o conhecimento relativo às línguas, que terá a dupla função de ―1) underlie or support some components of the above attitudes and skills; 2) constitute a group of references that help to the comprehension of the multilingual and multicultural world in which the pupil is living‖ (Candelier, 2001:3). Assim, Candelier interrelaciona, sem fazer coincidir, os conceitos de cultura linguística, atitudes, capacidades, destacando a sua importância na formação dos alunos num mundo plural e complexo.

Para Simões (2006), no conceito de cultura linguística existem três dimensões: cognitiva, representacional/imagética e de práticas com as línguas, que se encontram relacionadas entre si. De facto, segundo a autora, ―a cultura linguística nunca é estática, definitiva, fixa e inalterável, visto que se caracteriza pelo seu carácter evolutivo e dinâmico‖ (2006:148).

Em síntese as três dimensões da SDLC contribuem para o desenvolvimento de capacidades cognitivas, estéticas, sociais e afectivas, uma vez que as línguas podem contribuir para a aquisição de saberes e para o desenvolvimento e promoção de atitudes valorativas do Outro. Neste sentido, Abdallah-Pretceille sublinha que ―apprendre une langue étrangère ou des langues étrangères c'est aussi apprendre à percevoir l'environnement physique et culturel à travers une grille de perception différente; c'est apprendre à structurer le réel selon une autre perspective; c'est apprendre à voir et à reconnaître autrui‖ (1997:124).

Face ao exposto, verificamos que em contexto educativo a SDLC pode ser um factor positivo no reforço da imagem da diversidade, procurando que os alunos adquiram interesse e curiosidade por outras línguas e culturas, potenciando o desenvolvimento de competências plurilingues e intercuturais, comungando da opinião de Byram (2006: 111) ―that plurilingual competence of some kind is crucial‖.

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