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EDUCAÇÃO PARA A ERA PLANETÁRIA

2. Processos e formas de globalização

3.3 Políticas multiculturais

O modo como as culturas se influenciam é variado, tendo este fenómeno multicultural sido tratado, de acordo com uma lógica de resposta multidimensional, a partir de quatro grandes posturas ideológicas: assimilacionista, integracionista, pluralista ou multiculturalista, interculturalista (cf. Pereira, 2004; Peres, 1999; Perotti, 1997).

A primeira postura – assimilacionista – entende a diversidade e a diferença como ameaças à coesão da sociedade de acolhimento, logo como uma ameaça à sua cultura considerada como dominante e dominadora. O assimilacionismo pode ser considerado um modelo assente na monoculturalidade. Assim, de acordo com Pereira (2004:21), ―este modelo traduz um processo social conducente à eliminação das barreiras culturais entre populações pertencentes a minorias e à própria maioria. Por este processo os indivíduos pertencentes às minorias adquirem traços culturais do grupo dominante, ainda que isso exija o afastamento da cultura materna‖. A concepção assimilacionista de cidadania existiu na maioria das democracias ocidentais antes do surgimento dos movimentos revitalizadores étnicos dos anos 60 e 70. Esta visão pretendia que os grupos étnicos e de imigrantes abandonassem a sua cultura e língua de origem para participarem plenamente na ―cultura da nação‖ (Banks, 2004). Na segunda postura – integracionista - afirma-se a igualdade de direitos para todos os cidadãos. O modelo integracionista preconiza uma escola na qual as minorias têm liberdade

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para afirmar a sua própria identidade cultural, ―na medida em que tal não entre em conflito com a identidade cultural do grupo dominante‖ (Pereira, 2004:23). Traduz-se, de acordo com Pereira (2004), na aceitação de alguns aspectos da cultura minoritária e na rejeição de aspectos que não sejam adaptáveis à cultura dominante, os quais podem revelar-se um risco para a cultura dominante.

A terceira postura – pluralista ou multiculturalista - assume-se como respeitadora das diferenças culturais e entende-as como sendo positivas. Esta posição defende a coexistência das culturas dos diversos grupos étnicos na sociedade, em que os indivíduos mantêm as suas identidades culturais e têm plena liberdade para participar numa vida cultural e social própria. No entanto, segundo Sácristán (2003: 224),

―A aceitação do multiculturalismo tem consequências diversas que podem oscilar desde o ―separatismo‖, a balcanização ou tribalização beligerante entre culturas individualmente percebidas como diferentes e incomunicáveis (sabemos que todas são híbridas) até à convivência permissiva e aberta aos intercâmbios entre as culturas dentro de uma organização social e política democrática no plano nacional e internacional‖.

Na visão de Banks, a educação multicultural possui carácter reformador e deve realizar profundas mudanças no sistema educacional, de facto ―la education multicultural debería ayudar a los estudiantes a desarrollar conocimentos, actitudes y habilidades para participar en una sociedad democrática y libré, asi como también deberia promover la libertad las capacidades y las técnicas para superar brechas étnicas e culturales, y participar en otras culturas y grupos‖ (Banks in Essomba, 2006: 59).

Em Banks, educação multicultural aparece definida em cinco dimensões: a integração de conteúdos de diferentes culturas nas diversas áreas do currículo de forma global; os processos de construção do conhecimento a partir da experiência subjectiva de todos os alunos; uma redução dos preconceitos; a implementação de uma pedagogia da equidade para facilitar o êxito académico para todos os alunos; uma cultura escolar e uma estrutura social baseadas numa dinâmica organizadora que confira um estatuto similar a alunos de diferentes grupos raciais, culturais, linguísticos ou étnicos (Banks in Essomba, 2006: 59).

A quarta e última postura ideológica – intercultural – considera que a relação entre culturas diferentes, entendidas como contextos complexos, produz encontros, confrontos, visões do mundo que por vezes se contrapõem. Entende que a interacção entre culturas pode possibilitar a instituição de modos híbridos, polifónicos, dialógicos de produzir

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subjectividades, como também de perspectivar a realidade e a acção sobre ela de modo mais complexo. Esta postura aceita e valoriza a diferença, permitindo o encontro entre culturas, sendo intercultural (espaço da diferença entre as culturas) não teme a miscigenação, promove a igualdade de direitos, valoriza uma visão crítica das culturas, compreende e analisa uma cultura dentro dos seus padrões culturais, em suma, assume como axioma o facto de que todos os seres humanos são iguais em essência e diferentes em existência (cf. Martins, 2008: capítulo 2; Duarte & Sanches, 2004).

Neste sentido, o interculturalismo pressupõe a deliberada inter-relação entre diferentes culturas. O prefixo inter assinala

―uma relação entre vários elementos diferentes: marca uma reciprocidade (interacção, intercâmbio, ruptura do isolamento) e, ao mesmo tempo, uma separação ou disjuntiva (interdição, interposição, diferença). Este prefixo não corresponde a um mero indicador retórico, mas refere-se a um processo dinâmico marcado pela reciprocidade de perspectivas. Estas perspectivas são representações sociais construídas em interacção. O prefixo refere-se à interacção, mudança e solidariedade objectiva. Caracteriza uma vontade de mudança, de acção no contexto de uma sociedade multicultural‖ (Muñoz- Sedano, 1997:119).

A interculturalidade pode, então, assumir-se como princípio normativo quer a nível pessoal quer a nível social. Assim, a nível individual, pode promover o diálogo, no interior de cada indivíduo, entre as diversas influências culturais que o configuram e a que está exposto, às vezes em conflito ou nem sempre em harmonia.

Deste modo, a abordagem intercultural que privilegiamos aproxima-se do multiculturalismo crítico e revolucionário de MacLaren (1997), que parte da afirmação de que o multiculturalismo tem que ser situado a partir de uma agenda política de transformação, sem a qual corre o risco de se reduzir a outra forma de acomodação à ordem social vigente. Esta abordagem entende as representações de etnia, género e classe como produto de lutas sociais sobre signos e significações; privilegia a transformação das relações sociais, culturais e institucionais em que os significados são gerados; recusando a ver a cultura como não conflitiva, argumenta que a diversidade deve ser afirmada ―dentro de uma política crítica de compromisso com a justiça social‖ (McLaren, 1997:123).

Para além de uma proposta idealista de convivência pacífica, a interculturalidade coloca-se como proposta pedagógica de produção quotidiana de espaços de encontro de subjectividades múltiplas. De facto, nas escolas convivem simultaneamente diversas culturas de acordo com diferentes gerações, géneros, classes, etnias, línguas, pertenças regionais,

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capacidades físicas e mentais, entre outras. Esta realidade implica a assunção de uma perspectiva relacional com o outro.

A educação intercultural pretende fazer frente à globalidade das dimensões que impliquem a desigualdade por motivos relacionados com a diversidade cultural. Os princípios que a sustentam apontam para uma tentativa de contextualizar os valores ligados às noções de democracia, pluralidade e heterogeneidade, factores determinantes na nossa sociedade. Neste contexto, torna-se fundamental transformar as práticas educativas no sentido de promover a formação para a diversidade, pela realização de práticas de educação para uma cidadania multidimensional e transformadora (cf. Tomaz, 2007).

Com o intuito de representar de forma dialéctica a interacção entre os grupos maioritários e minoritários e os diferentes posicionamentos, elaborámos o diagrama que se segue:

Figura 4 – Posicionamentos face à cultura (construído a partir de Peres, 1999 & Santos, 1997).

Em suma, a integração, que na nossa perspectiva se quer como inclusão, nunca poderá ser perspectivada como sendo unidireccional, mas sim pluridireccional, de facto a integração é um processo conjunto assente em modelos abertos e plurais, acolhedores da diversidade.

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Encaramos a integração como uma possibilidade de através de, projectos concretos, possibilitar o caminho para uma pedagogia sustentada na diversidade. Para isso, é necessário investir em todas as modalidades de formação formal, não formal e informal numa perspectiva de educação para a era planetária, cujos valores estão enraizados numa visão intercultural, que fomenta a inclusão de todos os alunos, independentemente da sua pertença social, cultural, linguística ou outra (cf. CDL - MIN (2006)0055, entre outros documentos do Conselho de Europa).