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5.2 SOCIEDADES DAS INCERTEZAS E INSEGURANÇA

5.2.2 Escola x Sociedade da insegurança

A escola, como não podia deixar de ser, reflete a sociedade, ela sofre as influências externas e internas. Todas as transformações sofridas pela ‘sociedade, da insegurança’ são vivenciadas pela escola. O medo, a violência, a competitividade, a perda de valores, a rapidez das informações, a insegurança não passam despercebida.

Debarbieux e Blaya (2002) mencionam que é acalorado o debate entre os que são de opinião que as escolas deveriam ser transformadas em fortalezas e protegidas contra a influência da ‘contaminação’, vinda da comunidade externa e os que afirmam que não faz sentido isolar as escolas, que elas são um reflexo do que ocorre na cidade, já que tudo o que ocorre fora da escola costuma ser trazido para dentro dela. Boa parte do que é chamado de ‘crime nas escolas’ é, na realidade, um crime cometido por jovens que, coincidentemente, encontram-se matriculados numa escola ou que, incidentalmente, cometem crimes no caminho para escola, ou da escola para casa:

Encarar a violência na escola como um problema exclusivamente externo significa acreditar que a escola pouco possa fazer quanto a esse fenômeno.

[...] encará-la como um fenômeno unicamente interno significa estigmatizar as escolas e os professores, responsabilizando-os por aquilo que talvez seja um problema de comunidade ou sociedade (DEBARBIEUX; BLAYA, 2002, p. 82).

Na verdade, a escola deixou de ser um espaço protegido e tornou-se um local que reproduz as violências que acontecem na nossa sociedade, em nível macro e ao mesmo tempo, devido às suas especificidades como instituição, que fomenta e constrói múltiplos e variados tipos de violência. A escola pode ser vítima, mas também autora de vários processos de violência.

A escola, diferente do que se pensava anteriormente, não é uma redoma de vidro. Ela é um organismo vivo que age e interage com seu meio. Portanto, precisa ajudar os seus alunos a compreenderem esta sociedade e a se tornarem cidadãos que ajudam na construção de um

mundo melhor, de paz, de amor e solidariedade. Precisa realizar uma ‘ponte de solidariedade’, do futuro. Um futuro melhor, sem drogas, violências, guerras, fome, abandono e exclusão.

A Declaração do Milênio entrelaça e atualiza os valores essenciais ao relacionamento internacional no séc. XXI, selecionando como fundamentos a liberdade, a igualdade, a solidariedade, a tolerância, a respeito pela natureza e a responsabilidade compartilhada pelo desenvolvimento econômico e social, pela paz e pela segurança (GOMES, 2001).

A escola é um espaço para a construção da cidadania. Desenvolvendo um convívio harmonioso, deve ser capaz de garantir os direitos dos alunos e educar no sentido de evitar as manifestações de qualquer espécie de violência seja física, simbólica, psicológica ou estrutural. Cada aluno, um ‘ser’, necessita ser tratado como um tesouro, que a escola deve descobrir, um diamante raro, a ser ‘esculpido’ e ‘lapidado’ com carinho, amor, atenção, disciplina, dedicação, zelo e, acima de tudo, respeitado como ser único, sem distinção de cor, credo, classe social. Um direito garantido na Constituição.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu artigo 205, trata deste assunto: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988, p. 67).

O acesso à educação significa, segundo Delors et al. (2000), a possibilidade de um desenvolvimento humano mais harmonioso, de fazer recuar determinados níveis de pobreza, de combater certas exclusões, de entender os processos e mecanismos de incompreensão, racismo, homofobia e opressão. A escola é crucial tanto para a construção de identidades quanto para o desenvolvimento da autonomia, da capacidade crítica e da busca da emancipação.

Para Gadotti (1998) a escola passa por uma crise paradigmática que implica à busca incessante de estratégias reflexivas sobre seu papel social. Se a escola pública e gratuita é considerada uma instituição fundamental na constituição de uma sociedade mais igualitária, democrática e justa, supostamente operando como fator de mobilidade social para os mais diversos grupos, inclusive os menos favorecidos, a escola pode ser também um espaço reprodutor de desigualdades socioeconômicas e de exclusões (BOURDIEU, 1992).

Para Sawaya (1999, p. 17) “excluídos são todos aqueles que são rejeitados de nossos mercados materiais ou simbólicos, de nossos valores”. Existem valores e representações do mundo que acaba por excluir as pessoas. Os excluídos não são simplesmente rejeitados, fisicamente, geograficamente ou materialmente, não apenas do mercado e de suas trocas, mas

de todas as riquezas espirituais. Seus valores não são reconhecidos, ou seja, há também, uma exclusão cultural.

Segundo Casassus (2002), a educação não é algo que acontece num vazio abstrato. O contexto cultural e social, no qual ocorre é importante e afetam os resultados dos alunos que são determinados por condicionamentos sociais e culturais. Em concordância com Debarbieux e Blaya (2002), Abramovay (2003), Fante (2005) entre outros há muito que as escolas podem fazer para influenciar, evitar e lidar com os comportamentos agressivos e violentos. Os padrões éticos da escola exercem influência na atmosfera geral e maneira como os alunos lidam com o outro. Se forem tratados com respeito, valorizados, diminui a incidência de vários tipos de violência e podem implicar uma visão mais positiva ou negativa do estabelecimento. Os projetos trabalhados pela escola, tais como plano antibullying, aconselhamento entre pares, ‘cultura de paz’, ‘escola aberta’, entre outros; bem como suas práticas de ensino, projeto pedagógico, forma de disciplina, são fatores importantes e relevantes. Foram realizadas, varias pesquisas tanto na França, quanto em vários países do mundo e mesmo no Brasil sobre o clima ou a ‘atmosfera da escola’, ressaltando os aspectos evidenciados.

Existem escolas e não a ‘Escola’ segundo Abramovay, Cunha e Calaf (2009). Não há um modelo único, ou seja, não há uma maneira geral de ensinar, nem uma arquitetura para todos ou uma única forma de ser diretor, professor e aluno. É nesse contexto que as visões e percepções variam tanto para adultos como para jovens, adolescentes e mesmo crianças. A imagem de uma determinada escola pode depender de vários fatores, desde os professores e sua relação com os alunos e vice-versa, passando pela qualidade da educação oferecida e pela interação que os alunos vão estabelecendo com o saber, até as questões de infraestrutura e a sensação da insegurança no espaço escolar:

Meu dia-a-dia é bom na escola eu brinco muito, mas eu queria falar a respeito do lanche ruim e pobre, eu mesmo comi, mas eu sei como vocês podiam ajudar a escola. Se ajudarem, aproveitem e arruma o muro da escola.Tem dois buracos também os meninos que matam aula. E assim essa escola. UAAAAAA !!!!! Eu tenho medo do X, ele é um negão forte da escola, mas ele não bate em ninguém e é isso. Redação de aluno do Ensino Fundamental (ABRAMOVAY, 2009, p. 90).

À medida que o aluno e a comunidade se envolvem no processo educativo como sujeitos, ‘cidadãos’, ativos, pensantes, respeitados como tal, se sentem parte da escola e passam a respeitar as pessoas, a colaborar, ajudar e cuidar como um bem precioso. A escola é parte de todos, cada um faz parte deste todo:

À medida que todos forem envolvidos na reflexão sobre a escola, sobre a comunidade da qual se originam seus alunos, sobre as necessidades dessa comunidade, sobre os objetivos a serem alcançados por meio da ação educacional, a escola passa a ser sentida como ela realmente é: de todos e para todos (BRASIL, 2011, p. 20).

A violência escolar aparece como expressão de um processo de desinstitucionalização, em que a escola vem perdendo progressivamente sua capacidade socializadora, ou seja, sua capacidade de inserir indivíduos numa determinada ordem social (DUBET, 1998):

A desigualdade social, econômica política na sociedade brasileira chegou a tal grau que se torna incompatível com a democratização da sociedade. Por decorrência, tem se falado na existência da apartação social. No Brasil a discriminação é econômica, cultural e política, além de étnica. Esse processo deve ser entendido como exclusão [...] impossibilidade de poder partilhar [...] uma exclusão privação coletiva é que se está por exclusão social. Ela inclui pobreza, discriminação, subalternidade, não equidade, não acessibilidade, não representação pública (SPOSATI, 1987, p. 17).

A escola do futuro tem que superar certos desafios, segundo Gomes (2001), para atender às exigências deste século. São eles:

1) Déficit de socialização das novas gerações; falta de coesão social; debilidade da escola ante os meios de comunicação de massa;

2) Mundialização: aumento das disparidades e exclusão sociais, maior interdependência em escala mundial;

3) Aumento de conflitos regionais, locais, interétnicos e outros; 4) Novas tecnologias da informação, pletora de informações; 5) Desemprego, desqualificação, inflação educacional.

A escola do futuro estaria orientada para todos os grupos de idade, realizando-se dentro ou fora dos seus muros. Responderia às necessidades de aprendizagem, reconhecendo todo o tipo de conhecimento. Seria dinâmica, diversificada e orientada pelas necessidades dos estudantes, famílias e exigências sociais. Seria responsabilidade do Estado e de toda a cidadania, necessitando de competência ética, técnica e política para formar em seus alunos estas competências. Ética por estar fundada em valores. Técnica para ser capaz de oferecer os frutos esperados pelos indivíduos e sociedade. Política pelo sentido de cidadania de que a educação deve estar apoiada nos quatro pilares distinguidos pelo Relatório Delors (2000): aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser (GOMES, 2001):

[...] Se o objetivo é formar um indivíduo democrático, é necessário proporcionar- lhes oportunidades de praticar a democracia, de falar o que pensa e de submeter suas ideias e propostas ao juízo de outros. Se o objetivo é que o respeito próprio seja

conquistado pelo o aluno, deve-se acolhê-lo num ambiente em que se sinta valorizado e respeitado. Em relação ao desenvolvimento da racionalidade, deve-se acolhê-lo num ambiente em tal faculdade seja estimulada. A escola pode ser esse lugar. Deve sê-lo (BRASIL, 1997, p. 86 e 87).