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7.4 REAÇÕES DA COMUNIDADE ESCOLAR AO PROJETO

7.4.4 Perspectivas dos gestores

Com os gestores da escola também foi utilizada a técnica de entrevista semiestruturada, com utilização da gravação. Fizeram parte desta pesquisa seis gestores, a diretora, o assistente pedagógico (supervisor), o assistente administrativo e os três coordenadores (dois dos 1º, 2º e 3º anos e um do 4º e 5º anos), todos do sexo feminino.

Não houve dificuldade com relação à realização das entrevistas, todos sem exceção se dispuseram a colaborar e contribuir na realização do estudo. A realização das entrevistas repercutiu na confecção de questionário para verificação da convivência na escola e do relacionamento com a família, também na busca de soluções para problemas do próprio estabelecimento com relação a alunos vítimas e agressores. Os gestores se conscientizaram da importância de se trabalhar o tema bullying com os alunos e professores e das suas consequências para o aluno e a escola como um todo.

Todos os entrevistados possuem muitos anos de profissão, a maioria mais de 11 anos. Na escola os coordenadores tinham bastante tempo, 11 anos e 21 anos. A equipe da direção, entretanto era recente: a diretora com 11 meses e outros membros da equipe, sete meses ou menos. A direção da escola foi indicada pela Diretoria Regional de Ensino em janeiro em ocasião quando da desistência da diretora eleita, em virtude de aposentadoria.

Todos os gestores conheciam o conceito de bullying, trataram das ações, das consequências, como a pessoa se sente e a importância da família neste processo. Para eles é uma violência, uma transgressão que discrimina, marca e afeta, uma forma de agressão que se torna “doença” [...]

Um membro da equipe diretora comparou o bullying, às zombarias da Idade Média, o chamado Charibau, o riso ofensivo.

Riam da pessoa até ela se mudar da cidade. Hoje, quando a pessoa foge da norma, zombam e riem dela até excluí-la. Bullying é a forma mais agressiva e mais forte de riso e membro da zombaria. Quando passa a uma ofensa continuada, constante é

bullying (Membro da Equipe diretiva).

Não houve consenso, quanto à situação comparativa da escola, dois avaliaram como boa, dois como regular e dois consideraram ruim. Os que disseram que era boa, porque pode melhorar no sentido de se tornar ótima no futuro; regular porque já esteve em situações bem piores e, com o projeto, a situação tem melhorado; ruim na medida em que a agressividade entre as crianças é ainda muito ocorrente.

Com relação à preparação para lidar com a situação de violência quase todos disseram sim, tendo havido restrições devido às situações cada vez mais adversas e à própria complexidade do mundo atual. A cada dia surgem mais tipos de agressões de um nível mais alto de violência e também novas formas de bullying.

Alguns pesquisados declararam se sentir preparados pelo próprio projeto e cursos realizados. Contudo, em muitos casos esta preparação ocorreu na prática, no dia a dia, à medida que as situações iam acontecendo e necessitavam de providências. Seria necessário na formação do professor abordar estes temas atuais:

“Eu acho que a educação vem mudando a sociedade e a gente tem aprendido, eu pelo menos, tenho aprendido muito assim, na hora, na prática. A gente não tem tido muito preparo de como fazer, como agir, de cursos, isso a gente não tem, aprende na marra, vai aprendendo, fazendo” (Membro da gestão escolar).

Um membro da equipe já havia feito vários cursos: de mediação, de trabalhar com a emoção e outros. Ressaltou que “conseguia lidar com várias situações de violência, mas que, para outras, continuadas, apesar dos cursos, sente dificuldade [...] Talvez seja a necessidade de efeitos imediatos, o que não acontece com a violência, o processo é a longo prazo”. Disse já ter trabalhado em outras escolas e acha o nível de agressividade das crianças bem elevado para a idade, em relação às outras escolas por onde passou: “Existem crianças que batem o tempo todo, que xingam o tempo todo, existe uma hostilização generalizada. A mesma criança ofende dez crianças no dia”, atribuindo os fatos: 1º) ao mundo, aos pais, a televisão, há “um monte de fatores” que interfere na violência; 2º) aos jogos virtuais com muito realismo, onde as crianças não sabem separar a realidade da ficção; 3º) à forma de educação ou os problemas emocionais que a família carrega, que fazem com que a criança tenha um

comportamento muito agressivo; 4º) o próprio ambiente da escola, em que a criança percebe conflitos.

As sugestões dos gestores consideraram que o professor precisa buscar, procurar, informar-se, não ficar esperando as coisas virem até ele e que, apesar da escola já trabalhar com o projeto, deve buscar aprender mais.

Todos exaltaram os pontos positivos. O projeto, segundo sua avaliação conseguiu atingir a todos e, principalmente, os alunos. Foi visível a redução da violência na escola, observada no recreio, nas salas de aula, na mudança de atitude dos alunos, que hoje falam com propriedade do assunto. Têm argumentos para se defender. Essa tranquilidade era praticamente impossível no início do ano. A todo momento havia alunos na direção, era dificílimo sair da direção e ir à sala dos professores após o intervalo, tal a complexidade de conflitos a serem resolvidos. Agora já se consegue realizar outras atividades, pois a escola “agora está dentro dos padrões de agressividade aceitáveis para a idade”:

No início do projeto foi um horror, a todo o momento os alunos compareciam à direção e diziam: “Eu sofri bullying! Eu sofri bullying! “Parecia que havia gerado pânico. Eles estavam se apropriando da informação. Aos poucos, foram internalizando as informações, começando a se defender e a escola acalmou, mas o projeto tem que continuar, aliado a outras ações inclusive com a família” (Membro da Equipe diretiva).

O ponto mais marcante na opinião dos gestores foi o teatro, porque deu para perceber que as crianças ficaram realmente tocadas. Às vezes tem teatro na escola com pessoas especializadas, mas as crianças não ficam tão emocionalmente envolvidas como ficaram com a peça: “Foi maravilhoso ver o trabalho de cada turma na cerca, cada fitinha da arca que o aluno montou, pintou, havia um trabalho deles. Acharam ótimo a sala sensorial, os cartazes, as apresentações, tudo”.

Na opinião dos gestores, o projeto deve continuar, ser parte integrante do Projeto Político Pedagógico, com ações para o ano todo, divididas por bimestre. Continuar fazendo, não cair no esquecimento:

“continuar falando em sala de aula, conscientizando os alunos, falar nas reuniões de pais, bater sempre na mesma tecla que tem que respeitar o próximo, não parar, porque, se deixar cair no esquecimento, volta tudo, tem que ser um processo constante a longo prazo, e continuar no ano que vem, porque todos os anos a escola recebe novos alunos de outras escolas, está sempre chegando aluno novo, tem que continuar, não parar, incluindo os pais também”. (Membro da Equipe diretiva).

Na perspectiva de um dos componentes da equipe, é preciso ter uma parte de ação mais concreta, para a criança visualizar uma forma de ajudar, não só saber o que é errado, mas

também saber como fazer diferente: “Trabalhar a ajuda mútua, o respeito, a corrente do bem, o bem que eu faço volta pra mim, várias formas da criança perceber este ambiente de uma forma diferente. Assim, construir uma cultura de paz”. É preciso ter mais palestras, incluir os pais nesse ciclo, envolver os pais, fazer momentos com os pais (um chá, encontros mais atrativos), trazer psicólogos, uma pessoa importante para falar sobre violência, isto reduziria o nível de agressividade dos pais com relação à escola, porque o pai acredita que o espaço é dele, ele precisa respeitar o espaço da aprendizagem, respeitar o professor.

Além disso, conforme declarações, é necessário melhorar o recreio, procurar atividades para as crianças, não deixar as crianças muito ociosas, contar com mais brinquedos e atividades, criando um recreio divertido. É preciso valorizar a autoestima da criança:

Trabalhar o que está por trás da criança, que faz com que ela se sinta muito fraca, porque tem a criança que sofre bullying, ela não se sente tão forte e a outra criança sente de forma profunda, então a criança que sente de forma profunda é porque tem a autoestima fragilizada, é necessário fortalecer esta autoestima, então o bullie não exercerá tanto poder sobre ela. Assim, saberá se defender, buscar ajuda. (Membro da Equipe diretiva).

A equipe diretiva indicou ainda a necessidade de ampliar ações no Projeto Político Pedagógico, com a participação da sala de recursos, da Orientação Educacional nas palestras e informação, com um trabalho maior na sala de aula, a construção de ações práticas com os alunos na sala de aula e na direção, em todas as frentes da escola. Assim, “aprenderão a se respeitar, ver melhor o ambiente, se defender, colaborar, ser solidários, construindo e consolidando a consciência do cidadão para a paz”. Consequentemente, o aluno seria bem sucedido na aprendizagem e em outros aspectos da sua vida social e familiar.

Com efeito, a escola que todos desejam não deve ser uma utopia, mas a realidade democrática e de qualidade, organizada para atender às características diferenciadas de crianças, jovens e adultos com materiais e equipamentos suficientes. A proposta pedagógica deve valorizar a cultura do sucesso no ensino e aprendizagem e na vida profissional, social e familiar (SANTOS, 2002, p. 20).

Em síntese, os gestores acharam o projeto válido, devendo ser planejado com ações durante todo o ano, como um projeto norteador de todos os outros e sendo inserido no Projeto Político Pedagógico da escola. Suas ações deveriam ser avaliadas e acompanhadas com constância, tendo ações práticas voltadas para os alunos vítimas e agressores, auxiliando na superação do fenômeno bullying e outras violências, tendo em vista a internalização de uma cultura de paz que se constrói a longo prazo, através de mudanças de atitudes, valorização e respeito a si mesmo e ao outro como iguais.