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Lopes (1998) refere-se às origens do planejamento público dentro do contexto da compreensão da evolução tecnológica e científica como ferramenta aplicável ao desenvolvimento das sociedades. Com base nos estudos do professor John Friedmann, relaciona quatro escolas de pensamento de formulação de teorias do planejamento. São elas: a Análise Política; o Aprendizado Social; a Reforma Social; e a Mobilização Social. Conforme o autor, ao longo do século XX, as transformações da sociedade no mundo globalizado exigiram a elaboração do planejamento além do que as escolas citadas eram capazes de abranger. “A evolução futura da sociedade passou a necessitar uma visão mais abrangente, em meio a graus de liberdade e uma aceleração do tempo, nunca vistos” (LOPES, 1998, p.78).

Em paralelo a essas transformações e a novas formulações dos instrumentos de planejamento, surgiu o PE originado nos meios militares, mas que migrou para a administração empresarial e, posteriormente, para a administração pública. O autor considera este aspecto como uma evolução da teoria do Aprendizado Social, relacionada nos estudos do professor Friedmann, como visto anteriormente. Cabe aqui ressaltar que essa teoria, nas palavras de Lopes (1998, p. 77),

[...] tem como objetivo suplantar as contradições entre a teoria e a prática, entre o saber e a ação, buscando enriquecer o conhecimento com lições derivadas da expe- riência. [...] Assim, a sociedade pode ser conduzida por um planejamento definido

por um processo de experimentos sociais, observação cuidadosa dos resultados e o desejo de estabelecer novos objetivos e metas a partir desse aprendizado.

Em decorrência desse novo enfoque adotado pelas empresas e administrações públicas surgiram várias escolas de PE, todas com origem no modelo desenvolvido pela Harvard Business School desde os anos 1920. De acordo com as pesquisas dos professores John Bryson e William Roering, os modelos podem ser classificados da seguinte forma, conforme Lopes (1998, p. 80):

Aspecto visão:

Modelo de Harvard; o Sistema de PE; e a Administração de Participantes. Por tipo de conteúdo:

Método de Portfólio; a Análise Competitiva; e a Administração de Questões Estratégicas.

Processo estratégico:

Negociação Estratégica; o Incrementalismo Lógico; e o Arcabouço para Inovações.

Todos estes modelos têm influências recíprocas, podendo seus aspectos serem adotados em parte no desenrolar da existência das organizações. Conforme Lopes (1998, p. 84), a partir dos anos 1980, o PE passou a ser utilizado para o planejamento das cidades, tendo como base “[...] o Modelo de Harvard, inserido no modelo de Administração de Participantes, dentro da moderna teoria do planejamento de Prática Comunicativa”. Para melhor entendimento dos fundamentos aqui apre- sentados, faz-se necessária a conceituação de cada um dos elementos colocados, de acordo com Lopes (1998, p. 81-88).

No que diz respeito à Administração de Participantes, entende-se que a técnica procura o entendimento e a concordância dos participantes internos e externos de uma organização. Busca o consenso entre os diversos atores e a correta identificação destes, como condição importante para a sua implementação.

Quanto ao Modelo de Harvard, o autor afirma que este busca a inserção de uma organização em seu meio ambiente, em seu universo, definindo os pontos Fortes e Fracos dessa organização diante das Ameaças e Oportunidades externas,

ou seja, lançam mão da matriz FOFA7.

7 O sistema “FOFA” é um instrumento metodológico para análise de projetos, organizações empresariais ou de ação social, que planeja e diagnostica a situação destas, buscando propostas para ações estratégicas. Constitui os fundamentos da maioria dos sistemas de Planejamento Estratégico. “A idéia, [...] é que as instituições devem minimizar suas fraquezas maximizar suas forças, de modo a aproveitar as oportunidades e enfrentar as ameaças que caracterizam o ambiente no qual elas estejam inseridas”. (LIMA JÚNIOR, 2010, p. 68). A Matriz FOFA em português significa: Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças. No original em inglês é SWOT: Strength, Weakness, Opportunities and Threats.

Já a Prática Comunicativa busca qualificar e democratizar o debate, na construção de uma racionalidade socialmente elaborada, sem imposições, mas por meio do discurso. “Em termos de teoria, o Planejamento Estratégico de Cidades se desenvolve de forma abrangente nas ideias da Prática Comunicativa, como arca- bouço básico de seu processo, formulação, elaboração e implementação” (LOPES, 1998, p. 87). É fundamental que neste arcabouço seja estabelecida a cooperação público-privada, que deve ter como objetivo a coordenação de ações comunitárias ou de indivíduos, para a busca e implantação de metas consensuais. É o despertar de uma consciência que aponta a construção da cidade como tarefa da sociedade, que atua por intermédio de seus governantes, entidades, empresas e instituições.

Essa mudança de atitude resulta em ações ativas e não mais passivas em relação ao desenvolvimento das cidades, em busca “[...] do atendimento das demandas locais da sociedade, dentro de um enquadramento maior na geometria variável do mundo globalizado” (LOPES, 1998, p. 88). Portanto, o plano é político em suas escolhas e direcionamentos por buscar apoio nos atores políticos da comunidade, essenciais ao seu sucesso.

Quanto à técnica a ser utilizada, Lopes (1998, p. 89) informa que não há uma técnica específica para sua implementação nas cidades, o que se deve às carac- terísticas de cada localidade, inclusive no que dizem respeito à organização, aos recursos, ao estágio de desenvolvimento e ao posicionamento no espaço de fluxos. Na verdade, impõe-se a combinação de diversas técnicas que devem considerar a complexidade do espaço urbano; que resultem num documento que estabeleça um processo que formule, adote e implemente estratégias e políticas, pertinentes a uma evolução na qualidade dos ambientes urbanos dentro de uma expectativa consensual de um futuro previsível; e que resultem em ganhos de competitividade no mundo globalizado, na melhoria de vida dos cidadãos e na construção de uma cidade desejada de forma continuada à revelia das vontades e humores da política.

A receita

Dessa forma, Lopes (1998) estabelece os preceitos básicos que guiam os planos estratégicos, respaldando os diversos autores referenciados neste estudo. Lima Júnior (2010, p. 185) reitera que estes preceitos são “[...] relacionados à perspectiva de que as cidades competem pelas oportunidades no mundo globalizado”. Ou seja, o plano é construído mediante um planejamento para as cidades que:

a. Identifique pontos positivos e negativos de uma organização ou cidade; b. Perceba as ameaças e oportunidades para as organizações e cidades; c. Busque o consenso entre os diversos atores envolvidos no processo;

d. Considere as peculiaridades de cada localidade;

e. Estabeleça bases democráticas para sua elaboração e implementação por meio da participação da comunidade;

f. Promova a qualidade de vida sustentável nas cidades;

g. Construa um modelo de cidade desejada, exequível, resultante do consenso dos diversos participantes representantes da sociedade.

O PE pode constituir-se, assim, numa ferramenta importante para o pla- nejamento do futuro das cidades, direcionando o desenvolvimento dentro de um mundo globalizado e em rápida transformação. O sucesso ou fracasso do planejamento depende de uma mobilização de grande monta que reúne técnicos, cidadãos, políticos, empresários e toda sorte de atores urbanos. Deve considerar as características do local, sua história e seus aspectos de desenvolvimento, conhecimento e informação. Sua realização, portanto, é de difícil execução dadas as variáveis envolvidas. Variáveis também são as consequências da implementação desse tipo de planejamento, nas diversas cidades que assumiram esse desafio.

Essa abordagem traz consequências objetivas às cidades, que costumam investir recursos fortemente em projetos de grande repercussão, tais como os viários, por exemplo, que podem beneficiar as localidades. Lima Júnior (2010, p. 185) acrescenta ainda que:

Como método, o Planejamento Estratégico incorpora princípios e preceitos relacio- nados à perspectiva de que as cidades competem pelas oportunidades do mundo globalizado. Reitera, assim, uma forma de representar a realidade e autoriza ações de acordo com essa representação. Nesse sentido, sua adoção não se tratou apenas de uma forma de responder a desafios, mas de reelaborá-los, de os constituir como tais, enfim, de fazer ver o mundo de um modo particular e de fazer agir segundo esse modo de ver.

Trata-se do caráter simbólico do planejamento, que reifica a cidade e a apresenta como mercadoria, numa mudança de perspectiva quanto à realidade na qual está inserida. É uma reelaboração do que se considera como destino inevitável, uma forma particular de enxergar o futuro e uma validação das decisões tomadas em busca de um lugar para a cidade no mundo competitivo.