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A nova Ponte sobre o rio Potengi foi, como já visto, recomendada no Plano Estratégico Natal Terceiro Milênio (FIERN, 1999) dentro de um amplo planejamento de reestruturação viário para Natal e RM, e é a única das construções analisadas nesta pesquisa prevista nos planos estratégicos para Natal citados neste estudo. Foi recomendada, também, no Plano Natal Metrópole 2020 (GOVERNO DO ESTADO DO RN, 2006) como um importante projeto de infraestrutura no espaço metro- politano num horizonte de médio prazo. De acordo com o jornal Tribuna do Norte (24 de junho de 2006), o processo de construção da Ponte teve início na gestão do

39 Disponível em: http://www.construbase.com.br/areas-de-atuacao/construcoes/ponte-re- dinha.php.

prefeito Aldo Tinôco, em 1995, sendo a ideia, portanto, anterior a qualquer dos planos elaborados para Natal, dentre os citados nesta pesquisa.

O Plano Estratégico Natal Terceiro Milênio (FIERN, 1999) apresenta o projeto “Novas Vias e Melhorias” com propostas para a malha viária de Natal, tendo em vista a perspectiva de crescimento populacional da cidade e da sua RM, bem como a dinamização da atividade turística e o crescimento da economia. Apresenta estudo para a “nova ponte”, no mesmo sítio no qual foi edificada a Ponte Newton Navarro, dentro de um contexto de reorganização viária da capital, não havendo qualquer referência aos aspectos da monumentalidade, da atração turística ou plástico-formais da nova estrutura. Deveria ser, portanto, uma construção fun- cional que promoveria, de acordo com o autor do seu projeto, o desenvolvimento econômico da cidade e, especialmente, das novas regiões de grande valor natural e turístico, agora atendidas pela nova obra viária (MIRANDA, M., 2008, p. 40).

Essa abordagem viria a mudar, nos anos seguintes, quando houve a opção pela espetacularização da Ponte e a apropriação política da imagem monumental da construção. O governo estadual, à época da sua inauguração,tratou de se apropriar da obra como uma marca do seu espírito empreendedor, o que fica claro no discurso de inauguração proferido pela governadora Wilma de Faria (2003 a 2010), que afirmou: “estou com um sentimento de emoção de ver o sonho se realizando, o desejo do povo, o apoio popular presente, numa obra que não é por ser mais cara, que nós temos obra de saneamento, drenagem, mas é a obra mais emblemática do nosso Governo” (TRIBUNA DO NORTE, 21 de novembro de 2007). Antevendo a promoção da cidade, que viria a ser feita tendo a Ponte como uma das suas imagens mais reconhecidas, e buscando promover a estrutura à condição de ícone, a governadora afirmou ainda ter tido muita coragem e ousadia “[...] para construir a obra que será o cartão postal do Rio Grande do Norte e vai gerar empregos para a população de toda região do polo Costa das Dunas, por isso mesmo tem o lado social e econômico [...]”.

Manifesta-se, desta forma, e nos moldes do discurso político/populista tão em voga por estas paragens, o “Efeito Bilbao”, difundido pelo mundo afora e, agora, pro-

duzido em terras natalenses40. Conforme Valença (2014, no prelo), a expressão “Efeito

Bilbao”, cunhada por Charles Jenks, se refere ao uso de uma edificação marcante para a promoção da cidade, com vistas ao seu desenvolvimento econômico, agindo como

40 Bilbao vivia uma forte crise política e econômica nos anos 1980 quando apostou na adoção do modelo Barcelona de PE e city marketing como salvação para a economia local, o que viria a resultar, em última instância, na construção do Museu Guggenheim, projetado pelo estrelado arquiteto Frank Gehry (ARANTES P., 2012). Natal, ao contrário, vivia um verdadeiro boom turístico internacional na época da construção e inauguração da Ponte Newton Navarro. De acordo com o Anuário Natal 2013 (2013, p. 332), em 2004, ano da assinatura da ordem de serviço para construção da nova Ponte, a cidade recebeu 226.915 turistas oriundos do exterior. Em 2005, a visitação atingiu seu ápice com a chegada de 269.664 visitantes estrangeiros.

um catalizador para toda a economia. Tal qual a cidade espanhola, Natal também buscava a redenção pela arquitetura e a construção do seu totem midiático como símbolo e promessa da prosperidade econômica e social, sob a forma dos cabos de aço e das colunas e vigas de concreto. A obra de arquitetura e engenharia assumia, desta forma, ou seja, mediante o discurso político, um novo valor de uso por meio da representação dos anseios pela diferenciação da cidade no jogo competitivo. Entende-se que a venda da cidade apresenta-se como uma atribuição dos governos locais, dentro de uma perspectiva de “comercialização” promovida pela construção e divulgação de atributos valorizados pelo capital transnacional.

Corroborando o discurso político, percebe-se que, de fato, a Zona Norte de Natal teve forte crescimento nos últimos anos, impulsionado, também, pela construção da Ponte, além da contribuição de outros fatores, tais como: a migração no sentido interior do estado para Natal e a expansão do poder aquisitivo da popu- lação de um modo geral, entre outros. Dentre as consequências desse crescimento, podem ser citadas: o incremento no comércio e na oferta de serviços na Zona Norte de Natal, que teve como forte contribuição a inauguração do Norte Shopping, em 2007, primeiro estabelecimento do tipo naquela região, além da instalação de escolas, supermercados e clínicas médicas; o surgimento de mais uma opção de tráfego ligando os bairros do centro antigo da cidade aos bairros novos ao norte de Natal, o que permitiu uma redução do tráfego na segunda ponte, a Ponte de Igapó, construída nos anos 1970 e duplicada nos anos 1980; e as repercussões no mercado imobiliário, principalmente no que se refere à valorização fundiária e aos lançamentos de condomínios residenciais.

Observados os números relativos aos Habite-se concedidos às edificações nos 05 bairros da Zona Norte, verifica-se um importante incremento deste diploma legal a partir de 2009, dois anos após a inauguração da Ponte Newton Navarro. Se em 2007 foram expedidos apenas sete Habite-se, e em 2008, seis, em 2009 foram 21 e em 2010, 25. O Habite-se é uma importante referência para que se estime o incremento na construção de imóveis novos e revela o ritmo em que ocorrem essas construções. Nos números apresentados acima, são considerados todos os tipos de imóveis e não há diferenciação entre residências unifamiliares e multifamiliares, por exemplo.

Além disso, a Ponte se tornou um cartão postal da cidade explorado por empreendedores dos setores imobiliário e turístico, configurando-se numa nova forma de apropriação da paisagem urbana pelo capital privado e numa nova abordagem mercadológica que se associa ao binômio sol e mar. Para Silva, E. (2012), que estuda a valorização imobiliária promovida pelos ícones urbanos, especifi- camente nas proximidades dessas construções, a Ponte Newton Navarro trouxe importantes mudanças nessa dinâmica, principalmente no que diz respeito aos lançamentos de imóveis novos. Afirma o autor que:

Para certo grupo de empresários, além de dar fluidez ao trânsito entre a Zona Norte e o restante da cidade, a nova ponte aparece como uma alternativa para as classes de menor renda que não podem adquirir o seu primeiro imóvel nas áreas mais valorizadas da cidade e passam a comprar imóveis com preços mais baixos na Zona Norte, tendo em vista que a ponte “aproximou” essa área do restante da cidade. (SILVA, E., 2012, p. 104).

Essa nova abordagem assume a forma de um marketing que muitas vezes tenta incorporar um cenário fictício ao mundo real, como pode ser visto no cartaz abaixo de lançamento do condomínio Bela Vista da Construtora Ecocil. Percebe-se na figura que a paisagem urbana é candidamente desenhada como se fosse um grande parque temático – o desenho, provavelmente, foi inspirado em cartazes de promoção do Walt Disney World pela composição e disposição dos equipamentos no cenário – numa tentativa de alhear o provável comprador das dificuldades da vida urbana. Nesta cena, os ícones estão próximos ao empreendimento, a malha viária aparece sutilmente e perfeitamente interligada, as aproximações são forçadas para acentuar a “localização privilegiada” e, certamente, os 10 minutos que distanciam o empreendimento do Centro da Cidade, fazem referência ao percurso pela Ponte Newton Navarro, já que de outra forma, o tempo percorrido seria bem maior. Observa-se ainda a nada sutil oferta de “uma vista incrível da cidade”, embora o condomínio esteja de costas para a Zona Norte de Natal (ver Figura 4).