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2.2 Principais conceitos

2.2.2 Estágios do desenvolvimento humano

Para melhor descrever o desenvolvimento, Wallon propõe a existência de estágios ou períodos, marcados por características e conflitos específicos, que dependem da relação entre os fatores orgânicos e sociais, ou seja, entre a relação organismo-meio, conforme apresentamos no tópico anterior. Explica Wallon:

A psicogênese encontra-se estreitamente ligada aos modos sucessivos das relações com o meio: meio humano e meio físico. Estas relações assentam nos meios de que dispõe cada idade, e têm como consequência os estádios sucessivos da personalidade ( WALLON [1956] 1979, p. 60).

A solução do conflito é que propicia a passagem para um novo estágio do desenvolvimento. Essa mudança de estágio parece ocorrer de modo descontínuo, gerando uma crise que pode afetar visivelmente a conduta da criança. Afirma Wallon que alguns desses conflitos são característicos da espécie e são superados pelo próprio desenvolvimento, outros dependem da solução encontrada por cada indivíduo e deixam em cada um a sua marca.

Sobre a psicogênese da criança, Wallon esclarece:

De etapas em etapas a psicogênese da criança mostra, pela complexidade dos fatores e das funções, pela diversidade e oposição das crises que a pontuam, uma espécie de unidade solidária, tanto dentro de cada uma como entre todas elas. É contrário à natureza tratar a criança fragmentariamente. Em cada idade, ela é um todo indissociável e original. Na sucessão de suas idades, é um só e mesmo ser sujeito a metamorfoses. Feita de contrastes e de conflitos, sua unidade é por isso mesmo mais suscetível de ampliações e novidades (WALLON [1941] 2007, p.198).

O processo de desenvolvimento é uma construção progressiva, regulada pelas seguintes leis:

• Lei da alternância funcional – indica a alternância de direções opostas entre os estágios: o movimento predominante poderá ser para fora, ou seja, para o conhecimento do mundo ou para dentro, voltado para o conhecimento de si;

45 • Lei da predominância funcional – está relacionada ao predomínio em cada

estágio de cada conjunto funcional (afetivo, motor e cognitivo);

• Lei da integração funcional – o desenvolvimento se inicia com atividades mais simples, que vão sendo integradas às mais complexas dos estágios posteriores, conforme as possibilidades do sistema nervoso e do meio ambiente.

Wallon, através da análise de suas observações, comparando as diferenças e semelhanças no desenvolvimento de crianças normais e patológicas, entre crianças e adultos, extraiu os processos reguladores do desenvolvimento, identificando vários estágios.

O primeiro estágio é o impulsivo emocional, que compreende o período do nascimento ao primeiro ano de vida. É marcado pela total dependência do bebê ao outro e pelo predomínio das emoções. Os movimentos do bebê são inicialmente desordenados, mas através do contato com o outro, vão sendo selecionados a fim de garantir o atendimento das suas necessidades. Comenta Wallon:

É-lhe (a criança) indispensável uma assistência de todos os instantes. Ele é um ser cujas reações precisam de ser completadas, compensadas, interpretadas. Ele próprio incapaz de fazer qualquer coisa, é manipulado pelos outros, e atitudes vão tomar forma (WALLON, [1946] 1986, p. 161).

No início, os movimentos são desordenados, mas gradualmente em função dos efeitos que causam nos outros passam a ser intencionais. São esses primeiros movimentos intencionais que marcam os primeiros sinais de cognição e estão relacionados à afetividade. Nesse período, na interação com os cuidadores mais próximos, a criança iniciará a construção da sua identidade, por Wallon chamada de personalidade.

Em oposição ao estágio anterior, o estágio sensório-motor e projetivo é caracterizado pela investigação e exploração da realidade exterior, assim como pela aquisição da atividade simbólica e início da representação. Esse estágio ocorre no período do primeiro ao terceiro ano. Há predomínio das relações cognitivas com o meio, marcadas pela aquisição da linguagem. O reconhecimento da imagem diferenciada do seu corpo também ocorre nesse estágio.

No estágio do personalismo, que compreende o período dos três aos seis anos, a tarefa central é o processo de formação da personalidade. A consciência corporal, que já ocorreu no estágio anterior é condição fundamental para tomada da consciência de si,

46 para o processo de diferenciação eu-outro, que agora vai ocorrer de forma completa. Há um retorno do predomínio da afetividade, pois a consciência de si se dá nas relações com os outros, dos quais procurará se diferenciar, através de atividades de oposição, de sedução e de imitação.

Estágio categorial se inicia por volta dos seis anos. A consolidação da função

simbólica e da diferenciação entre o eu e o outro permite novos avanços. Nesse período a criança dirige seu interesse para as coisas, para o conhecimento e para as conquistas do mundo exterior.

Apresentaremos este estágio mais detalhadamente, pois a presente pesquisa foi realizada em classes de 4a série, com crianças de nove a 10 anos, que se encontram predominantemente nesse estágio.

Wallon explica que, apesar do predomínio das atividades cognitivas, a criança continua a se desenvolver também no plano afetivo e motor, pois o desenvolvimento é um processo integrado. Nesse período, a criança aprende a se conhecer como pessoa e amplia as suas relações com diversos grupos. É geralmente o período de ingresso escolar, conforme comenta Wallon:

Vem então a idade escolar, a idade em que as relações da criança com o meio podem se tornar mais diversas, mais facultativas, mais abertas, em que ela pode entrar em grupos de composição mais variável, em que o seu lugar nestes grupos depende mais dela, das suas preferências ou dos seus méritos, e não é irrevogável. Adquire gradualmente o sentimento de que sua personalidade é polivalente, por conseguinte, mais livre (WALLON [1956] 1979, p.65).

Organiza-se uma nova estrutura mental, podendo o período categorial ser compreendido por duas etapas. A primeira vai até por volta dos nove anos, caracterizada pelo pensamento pré-categorial, pensamento ainda marcado pelo sincretismo, no qual os conceitos ainda se encontram confusos. Na segunda fase, que ocorre entre nove/10 anos, o pensamento passa a se organizar através de categorias utilizadas para ordenar a realidade, possibilitando também à criança uma compreensão mais nítida de si mesma. Esse pensamento é característico da inteligência discursiva, que inicialmente é marcada pelo sincretismo infantil. Conforme descreveu Wallon a partir de pesquisas que empreendeu com crianças, o pensamento no início dessa fase tem uma estrutura binária, ou seja, é caracterizado por pares de ideias, como explica Wallon:

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O pensamento existe apenas pelas estruturas que introduz nas coisas. Inicialmente há estruturas muito elementares. O que é possível constatar desde o início é a existência de elementos que estão sempre aos pares. O elemento de pensamento é essa estrutura binária, não os elementos que o constituem (WALLON, [1945] 1989, p.30).

Wallon nessa pesquisa descobriu que o vínculo entre os pares ocorria de diferentes modos: analogia, complementaridade, combinação circular etc. A dupla é uma estrutura fechada, um terceiro termo pode desfazer a dupla.

Segundo Amaral (2009), no pensamento pré-categorial as crianças não conseguem pensar exclusivamente uma unidade por vez, um objeto, um fato ou uma situação. Eles só podem existir em seu pensamento em relação a outro que lhe dê identidade. O pensamento por pares se caracteriza por uma percepção global na qual a criança não consegue estabelecer relações, as imagens que a criança vai apreendendo dos objetos, coisas, pessoas ou acontecimentos ligam-se umas às outras por justaposição, sem nenhum nexo lógico que estabeleça uma unidade.

Aos poucos, o pensamento sincrético dá lugar ao pensamento categorial, o que permite à criança a identificação, a análise, a definição e a classificação dos objetos e das situações. Essa capacidade possibilita novas conquistas: a noção de tempo, de espaço e de causa.

Durante esse estágio, Wallon menciona também outra aquisição importante para o ambiente escolar: a autodisciplina mental, conhecida comumente como atenção, decorrente da maturação biológica. Essa capacidade torna possível à criança permanecer atenta mais tempo em uma mesma atividade.

No plano motor, explica Amaral (2009), os gestos vão se tornando mais precisos e localizados, de modo que a criança já consegue selecionar o gesto adequado para o que pretende realizar. Pode também planejar mentalmente o movimento e prever etapas e consequências do deslocamento, o que garante uma desenvoltura maior na exploração do ambiente e nas atividades de conquista do mundo objetivo.

Vale ressaltar que para Wallon todas as aquisições ocorrem de modo integrado; uma nova aquisição motora proporcionará transformações na afetividade, no conhecimento, na pessoa, que será influenciada pelo seu desenvolvimento biológico e pelas condições sociais presentes naquele momento histórico-cultural.

48 Mahoney e Almeida (2005) alertam que esse desenvolvimento é um processo longo e constante, sendo importante o professor considerar o que o aluno já sabe para poder avançar no conhecimento, propondo exercícios necessários e formas de avaliação mais adequadas ao desempenho, pois isso afetará os alunos, favorecendo ou não sua descoberta do mundo.

Outro ponto que essas autoras apontam, é saber aceitar que todo conhecimento novo, não familiar implica, na sua aprendizagem, um período de imperícia, resultado de um sincretismo inicial. À medida que evolui, a imperícia poderá se transformar em competência.

Estágio da puberdade e adolescência é uma fase predominantemente afetiva, voltada

a si mesmo, direcionada à construção de uma identidade autônoma, através de atividades de confronto, autoafirmação e questionamentos. Há domínio de categorias cognitivas de maior nível de abstração.