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Atualmente, existem diferentes experiências de ampliação do tempo escolar, em níveis municipal, estadual e federal, que podem ser analisadas segundo duas vertentes, como propõe Cavalière (2009): a escola de tempo integral, que tende a investir em mudanças no interior das unidades escolares, e outra, o aluno de tempo integral, que prioriza a articulação com instituições e projetos da sociedade que ofereçam atividades aos alunos no período alternativo às aulas, não necessariamente no espaço escolar, mas também fora dele.

Optamos por apresentar um breve panorama dessas experiências por acreditarmos que conhecê-las permitirá ao leitor deste trabalho compreender melhor a situação atual e as tendências da ampliação do tempo escolar no Brasil. Para isso, utilizamos como referência a pesquisa sobre experiências com jornada ampliada patrocinada pelo MEC (BRASIL/MEC, 2009), o mapeamento realizado por Santos na sua dissertação em 2009 e os livros organizados por Coelho (2009) e por Moll (2012). Para maiores informações sobre o tema, sugerimos a leitura desses trabalhos. Segundo a pesquisa nacional realizada pelo MEC em 2009, existem atualmente quinhentos municípios brasileiros que, de alguma forma, apresentam uma jornada escolar ampliada. Responderam a pesquisa 2112 cidades brasileiras.

De acordo com essa pesquisa, os estados com maior número de municípios com experiências de jornada ampliada são: Rio de Janeiro, Ceará, Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Pernambuco. Por outro lado, Amazonas, Pará, Tocantins e Sergipe foram os que apresentaram menor quantidade.

A pesquisa (BRASIL/MEC, 2009) aponta também que 1,1 milhão de alunos em todo o país estão em jornada ampliada, o que significa cerca de 2 % do total dos alunos da educação básica. Em relação à carga horária, 55,5% das experiências ocorrem em períodos de sete horas diárias ou mais, o mínimo estabelecido por lei. A grande maioria

18 das experiências está sendo realizada no turno contrário ao reservado para o currículo regular (ensino básico). Somente em 10,9% dos casos as aulas eram mescladas com as aulas regulares (BRASIL/MEC, 2009).

A pesquisa (BRASIL/MEC, 2009) também investigou quais atividades estavam sendo desenvolvidas durante o período de jornada ampliada. As duas principais modalidades estão relacionadas à prática de esporte (65%) e às aulas de reforço (61%).

Santos (2009), em seu mapeamento sobre as experiências de ampliação de jornada em andamento, constatou que os projetos municipais são mais recentes que os das redes estaduais, implantados a partir de 2005, e que apresentam uma particularidade em relação às redes estaduais: grande parte dos projetos utiliza outros ambientes (fora da escola) para disposição das atividades complementares, envolvendo outros espaços, outras instituições e outros profissionais. Segundo a autora, isso ocorre com Belo Horizonte/MG, Recife/PE, Porto Alegre/RS, São Paulo/SP e Vitória/ES.

Em São Paulo, essa concepção se faz presente através do projeto “São Paulo é uma escola”. As Diretorias Regionais de Educação firmam convênios com entidades sem fins lucrativos para oferecer oficinas. Os alunos também participam de atividades externas, que têm como objetivo a apropriação dos espaços públicos e o enriquecimento cultural. A partir dessa integração entre os vários setores da sociedade, São Paulo tornou-se uma cidade educadora (Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, 2008, apud Santos, 2009).

O movimento das cidades educadoras foi inspirado em um documento central – Carta de Barcelona – que considera que a educação não é responsabilidade somente da escola (GADOTTI, 2009). Nesse sentido, diluem-se as barreiras entre educação formal e não formal e incorpora-se o entorno da escola como espaço educativo.

Concordamos com Santos (2009) ao comentar que tanto nas propostas estaduais como nas municipais há uma tendência para menor responsabilidade dos Estados frente às questões educacionais. Os convênios com instituições privadas e com as comunidades para oferecimento de oficinas fora da escola são elementos dessa tendência.

Para compreendermos melhor esses projetos, é preciso conhecer o programa do governo federal voltado para ampliação da jornada escolar, o Programa Mais Educação, que oferece recursos financeiros para manutenção dos projetos atuais de ampliação da jornada escolar.

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1.4.1 Programa Mais Educação

O Programa Mais Educação foi criado em abril de 2007, através de Portaria Normativa Interministerial (BRASIL, 2007 b), envolvendo os ministérios da Educação, da Cultura, do Esporte, da Ciência e Tecnologia, do Meio Ambiente, do Desenvolvimento e Combate à fome e a Secretaria Nacional da Juventude da Presidência da República. Como resultado dessa articulação, criou-se o Fórum Interministerial Mais Educação, de caráter normativo, deliberativo, articulador e resolutivo.

De acordo com essa Portaria, o Programa se concretiza no apoio à realização em escolas e em outros espaços de “ações socioeducativas no contraturno escolar”: Segundo esse documento, o objetivo central do Programa é:

Contribuir para a formação integral das crianças, adolescentes e jovens, por meio da articulação de ações, de projetos e de programas do Governo Federal e suas contribuições às propostas, visões e práticas curriculares das redes públicas de ensino e das escolas, alterando o ambiente escolar e ampliando a oferta de saberes, métodos, processos e conteúdos educativos. (BRASIL, 2007 b).

As finalidades do Programa são:

• Apoiar a ampliação do tempo e do espaço educativo e a extensão do ambiente escolar nas redes públicas de educação básica de Estados, Distrito Federal e Municípios, mediante a realização de atividades no contraturno escolar, articulando ações desenvolvidas pelos Ministérios integrantes do Programa; • Contribuir para redução da evasão escolar, da reprovação e da distorção

idade/série;

• Oferecer atendimento educacional especializado às crianças, adolescentes e jovens com necessidades educacionais especiais;

• Prevenir e combater o trabalho infantil;

• Promover a formação da sensibilidade, da percepção e da expressão nas linguagens artísticas, literárias e estéticas;

• Estimular uma interação efetiva em torno de práticas esportivas educacionais; • Promover a aproximação entre a escola, as famílias e as comunidades;

• Prestar assistência técnica e conceitual aos entes federados de modo a estimular novas tecnologias.

20 O Programa está situado no âmbito do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), do Plano de Ações Articuladas (PAR), e é coordenado pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC), em parceira com a Secretaria da Educação Básica (SEB/MEC) e com as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação. Sua operacionalização é feita por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

A área inicial de atendimento, em caráter prioritário, são as escolas que apresentam baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), situadas em capitais e regiões metropolitanas. Percebe-se, assim, uma preocupação com a população em situação de vulnerabilidade social. No entanto, em função disso, como aponta Cavalière e Maurício (2011), o Programa não atende a todas as escolas e nem a todos os alunos, que são definidos pelos critérios mencionados anteriormente. Segundo essas autoras, a destinação do Programa somente para alguns alunos pode gerar estigmatização de indivíduos e grupos.

São características do Programa a ideia de intersetorialidade e a noção de territorialidade, visto que as atividades devem ser estabelecidas em parcerias com as diferentes secretarias ou com órgãos da iniciativa privada. Essas atividades podem ser realizadas na escola ou em outros espaços da comunidade, sendo geralmente ministradas por diferentes agentes educativos, como monitores da comunidade ou estagiários, trazendo uma nova configuração e novas questões para o ambiente escolar, como apontam Coelho e Hora (2011):

Situados do outro lado (o da educação integral radical) e cientes da realidade de ampliação da jornada escolar, vimos que o gestor, como nós pesquisadores, se vê imerso em um contexto de conflitos de interesses individuais e de grupos; entre os dilemas de atendimento às concepções e princípios norteadores de educação de qualidade e as condições materiais concretas de sua realização, necessitando gerir os projetos com os profissionais que se encontram em desigualdade de salários, de papéis e de funções, mesmo admitindo “a necessidade seja professor no turno ou no contraturno”. (Secretaria Municipal de Educação de Olímpia/SP, apud COELHO; HORA, 2011, p. 12).

Segundo o Portal do MEC, em 2008, o Programa contou com a participação de 1380 escolas, em 55 municípios e nos 27 estados para beneficiar 386 mil estudantes. Em 2009, houve a ampliação para cinco mil escolas, em 126 municípios, de todos os estados e no Distrito Federal, com o atendimento previsto a 1,5 milhão de estudantes.

21 Em 2010, a meta era de atender a 10 mil escolas e beneficiar três milhões de estudantes. No site do MEC não há informação se essa meta foi atingida3.

Segundo Santos (2009), com a consolidação do Programa Mais Educação em todo o país, os projetos de ampliação de jornada em andamento nas redes estaduais e municipais tendem a ser modificados e incorporados ao Programa. Essa tendência se explica pela possibilidade de as escolas que já funcionam em tempo integral poderem receber as verbas destinadas a esse Programa.

No Estado de São Paulo, por exemplo, essa tendência pode ser constatada através da publicação de um documento elaborado pela CENP (SP/SEE/CENP, 2011)), em setembro de 2011, intitulado Educação Integral – Escola de Tempo Integral/Aluno de Tempo Integral, que revela essa tendência.

Segundo esse documento: “o Projeto Escola de Tempo Integral vive um momento delicado, sendo necessário passar por uma reorganização, pois se observa a existência de duas escolas: a regular (currículo básico) e a de jornada ampliada (oficinas curriculares)” (SP/SEE/CENP, 2011, p.7). Nesse sentido, o documento propõe a existência de duas estruturas organizacionais possíveis: a escola de tempo integral e o aluno de tempo integral. A ideia, segundo o documento, não é abolir o modelo existente, mas oferecer mais um modelo com o objetivo de contemplar a demanda de cada escola.

Finalizando esse percurso do histórico ao contemporâneo, constatamos as influências e os novos caminhos que estão surgindo para a ampliação do tempo escolar, caminhos esses que devem ser trilhados com muita cautela para que essas experiências possam realmente contribuir para a melhoria da educação brasileira, ampliando efetivamente o tempo de permanência do aluno na escola, através de uma perspectiva de educação integral, que possibilite a formação da criança nas diferentes dimensões humanas.