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2.2 Principais conceitos

2.2.3 Integração afetivo-cognitivo-motora

Para Wallon, o desenvolvimento da pessoa se dá na relação entre os fatores orgânicos e sociais e na relação entre os conjuntos funcionais, afetivo, cognitivo, motor e um quarto conjunto, a pessoa, que expressa essa integração. É um processo em aberto, no qual a existência social e individual está em constante transformação, marcada pela situação histórica concreta em que acontece.

Wallon salienta que a divisão em conjuntos é um artifício que tem por objetivo facilitar a compreensão do fenômeno, a construção da pessoa.

As exigências da descrição obrigam a tratar de forma distinta alguns grandes conjuntos funcionais, o que certamente não pode ser feito sem certa artificialidade, sobretudo no ponto de partida, quando as atividades, ainda são pouco diferenciadas (WALLON [1941] 2007, p.113).

Sobre a integração dos grandes conjuntos, Mahoney (2009) explica de forma clara:

O motor, o afetivo, o cognitivo, a pessoa, embora cada um desses aspectos tenha identidade estrutural e funcional diferenciada, estão tão integrados que cada um é parte constitutiva dos outros. Sua separação se faz necessária apenas para a descrição do processo. Uma das consequências dessa interpretação é de que qualquer atividade humana sempre interfere em todos eles. Qualquer atividade motora tem ressonâncias

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afetivas e cognitivas; toda disposição afetiva tem ressonâncias motoras e cognitivas; toda operação mental tem ressonâncias afetivas e motoras. E todas elas têm um impacto no quarto conjunto: a pessoa, que, ao mesmo tempo em que garante essa integração, é resultante dela (MAHONEY, 2009, p. 15).

O conjunto ou domínio motor está relacionado à possibilidade de deslocamento do

corpo no tempo e espaço, as reações posturais que garantem o equilíbrio corporal, bem como o apoio tônico para as emoções e sentimentos se expressarem (MAHONEY; ALMEIDA, 2005). É considerado por Wallon um importante recurso de sociabilidade, pois possibilita a expressão da emoção, que permite o contato com os outros e a própria sobrevivência humana. Além disso, o ato motor é também um recurso privilegiado para o desenvolvimento cognitivo, pois as percepções são retidas somente quando a criança é capaz de reproduzi-las por meio de gestos. Wallon esclarece essa relação entre motricidade e cognição:

Como os mecanismos da ação são ativados antes dos da reflexão, quando quer imaginar uma situação não consegue fazê-lo se antes não se envolver de alguma forma com ela por meio de seus gestos. O gesto precede a palavra, (...). A criança mostra, depois conta, antes de conseguir explicar. Não imagina nada sem encenação. Ainda não cindiu dela mesma o espaço que a rodeia. É o campo necessário, não só de seus movimentos, mas de seus relatos (WALLON [1941] 2007, p. 157-158).

O conjunto ou domínio cognitivo oferece um conjunto de funções que possibilitam a

aquisição e a manutenção do conhecimento através de imagens, ideias e representações. Como já mencionamos, o desenvolvimento cognitivo está atrelado ao desenvolvimento motor e ao afetivo. No primeiro ano de vida, a atividade cognitiva se encontra latente e ainda indiferenciada da atividade afetiva, mas seu desenvolvimento possibilitará à criança, por volta dos dois anos, novas conquistas, que permitirão o desenvolvimento da inteligência prática, característica do estágio sensório-motor e projetivo. Quase que simultaneamente, a função simbólica e a aquisição da linguagem se apresentam como aquisições fundamentais para o desenvolvimento do pensamento e da inteligência, que parte do sincretismo ao pensamento categorial, que permitirão à criança uma nova compreensão do mundo e de si mesma.

Desse modo, como afirma Mahoney (2004) o conjunto cognitivo “permite a criança fixar e analisar o presente, registrar, rever, re-elaborar o passado e projetar futuros possíveis e imaginários” (p. 18).

50 Em função do objetivo da nossa pesquisa, daremos maior destaque ao conjunto ou

domínio afetivo, que está relacionado às funções responsáveis pelas emoções, pelos

sentimentos e pela paixão. Considera Wallon que as manifestações fisiológicas da emoção constituem o ponto de partida do psiquismo.

Para Wallon, a afetividade é constitutiva do ser humano e é um dos conjuntos funcionais que integram a pessoa estando presente desde o nascimento. Como conjunto funcional, predomina nas fases de desenvolvimento nas quais a pessoa se encontra mais voltada para si, como na fase impulsiva emocional, no personalismo e na puberdade e na adolescência.

Segundo ele, a afetividade apresenta três momentos de evolução: emoção, sentimentos e paixão. Dér explica como se dá essa evolução:

A afetividade é um conceito amplo que, além de envolver um componente orgânico, corporal, motor e plástico, que é a emoção, apresenta também um componente cognitivo, representacional que são os sentimentos e a paixão. O primeiro componente a se diferenciar é a emoção, que assume o comando do desenvolvimento logo nos primeiros meses de vida; posteriormente, diferenciam-se os sentimentos e, logo a seguir, a paixão (DÉR, 2004, p.61).

Segundo Wallon, as emoções são manifestações de estados subjetivos, mas com componentes orgânicos. Durante os três primeiros meses de vida é a emoção que permite ao ser humano a sobrevivência, em função da sua característica de contágio e expressão.

A emoção também se faz presente durante as diferentes fases do desenvolvimento, expressando-se pelo corpo por meio dos movimentos do tônus muscular. Possibilita respostas a situações que causam medo, alegria, vergonha, etc.

É através da afetividade que o indivíduo acessa o mundo simbólico, originando a atividade cognitiva e possibilitando o seu avanço. A emoção e a atividade intelectual caminham juntas na evolução da pessoa, mas há uma relação de antagonismo entre elas. Quanto maior a compreensão cognitiva da situação vivenciada, maior possibilidade da pessoa controlar as reações emocionais. Sobre isso, Dantas (1990) afirma: “ a razão nasce da emoção e vive da sua morte.”

Em relação ao sentimento, Wallon o considera como a expressão representacional da emoção. Pode ser expresso pela mímica ou pela linguagem. Segundo Mahoney e

51 Almeida (2005), o adulto tem maiores recursos de expressão de sentimentos: observa, reflete antes de agir, sabe onde e quando expressá-los, traduz intelectualmente seus motivos e circunstâncias.

No ambiente escolar cabe ao professor, adulto da relação, canalizar a afetividade para produzir conhecimento. Segundo Almeida (2004), a mediação do professor será mais eficaz à medida que ofereça diferentes linguagens, possibilitando à criança canalizar seus sentimentos e emoções em favor do pensamento.

A paixão revela o aparecimento do autocontrole para dominar uma situação, tentando para isso silenciar a emoção. Caracteriza-se por ciúmes, exigências e exclusividade. Não aparece antes do estágio do personalismo, explica Wallon:

A paixão pode ser intensa e profunda na criança. Mas com ela aparece a capacidade de tornar a emoção silenciosa. Portanto, para se desenvolver pressupõe o autocontrole da pessoa e não pode vir antes da oposição claramente sentida entre si mesmo e o outro, cuja consciência não se dá antes dos 3 anos (WALLON, [1941] 2007, p. 126).

Sintetizando a conceituação de afetividade, ressaltamos a contribuição de Mahoney e Almeida (2005), a afetividade “refere-se à capacidade, à disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo e interno por sensações ligadas a tonalidades agradáveis e desagradáveis” (p.19).

O conjunto pessoa é o quarto conjunto funcional, expressa a integração da pessoa em

todas as suas possiblidades. Wallon ([1941] 2007) ressalta que a pessoa se forma durante todo o desenvolvimento humano da criança e suas transformações têm importância e ritmos acentuados, sendo que a origem dessa evolução ocorre nos primórdios da vida psíquica, período predominantemente afetivo. Durante todo o desenvolvimento da criança, que ocorre de forma contínua, novas aquisições contribuem para a formação da pessoa.

Mahoney (2004) comenta:

A pessoa é a unidade do ser. Cada indivíduo tem uma forma própria e única, que caracteriza sua personalidade em movimento contínuo que vai desde a pessoa orgânica (...) até a pessoa moral (adolescência – predomínio do afetivo), passando pelo sensório- motor e categorial. Existem, então, infinitas possibilidades de personalidades, só limitadas pela cultura (MAHONEY, 2004, p. 19).

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