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3 ANÁLISE DO CONTEXTO POLÍTICO E DAS CONDIÇÕES

3.2 Base teórico-ideológica do PAA

3.2.1 Estruturas de comercialização

Acerca da história da econômica brasileira, Rangel desenvolveu o contexto em que busca explicar as transformações que interferiram na economia (processo de industrialização e o começo do capitalismo brasileiro) e suas inferências no surgimento da inflação. Seguindo essa lógica, explica o autor como a agricultura brasileira tem participação nesse sistema, estabelecendo a relação inicial entre o mercado externo e o interno de bens agrícolas – esse sempre desmotivado se comparado a produção exportadora.

Explica Rangel (1963, p. 91) que a “comercialização dos produtos agrícolas obedece, no Brasil, a dois critérios bem diferenciados: se se trata de produtos de exportação, ou de produtos para o mercado interno”, para os primeiros, existiam condições estimulantes e, para os segundos, depressivas. A falta de estímulos ao mercado interno acabava afetando a produção e o consumo. Produtores independentes – pequenos e médios produtores de bens agrícolas – não conseguiam financiamento necessário para produzir, nem encontravam mercado de consumo para seus produtos a preços justos; desestimulando, assim, a produção e reduzindo os produtos agrícolas no mercado, o que acabava afetando o preço e o encarecendo ainda mais.

Em A Inflação Brasileira (1963), Rangel explicava que, com o ingresso do capitalismo no meio rural, agravou-se a crise no campo que se iniciou no Brasil com o processo de industrialização – feita sem remodelar as relações de produção na agricultura. Essa remodelação seria necessária na fase de transição que o Brasil se encontrava. Contudo, por fatores políticos e econômicos, iniciou-se um capitalismo com os resquícios do sistema feudal. Esse fato fez surgir dois problemas que exprimiam essa crise: a superprodução agrícola – havia um superávit de produtos agrícolas sem um mercado para escoar – e a superpopulação rural – ou seja, mão de obra em demasia sem previsão de empregos para absorvê-la. Essas circunstâncias acabaram agindo como fatores de perturbação do mercado de trabalho, criando um ambiente propício para a elevação da taxa de exploração e até de justificação para a inflação.

Quanto ao mercado de trabalho, explica Rangel (1963, p. 28) que esses fatores importam em oferta de mão-de obra excessiva, o que dificulta o poder de barganha dos trabalhadores por melhores salários, resultando em um excedente de mão de obra que culmina numa elevada taxa de exploração do sistema. Assim, com o desemprego no campo, houve o êxodo rural, migrando as massas para os centros urbanos em busca de emprego nas indústrias e, esse excesso de mão de obra, fez com que a população aceitasse subsalários em face da

necessidade de subsistência. Ademais, a desorganização política e econômica do campo relegou os direitos dos trabalhadores rurais até o advento da Constituição Federal de 1988.

Soma-se a isso o fato de que a estrutura de comercialização levou a fixação do valor de venda dos produtos dos agricultores a preços baixos, mas para o consumidor final era alto, ficando o lucro somente com os atravessadores – o que influenciava os preços da matéria-prima das indústrias e, consequentemente, atuava como fator decisivo no processo inflacionário. Isso se dava, pois, as estruturas de comercialização da produção agrícola no Brasil era dominada por uma pequena quantidade de empresas que formavam monopsônios1 ou oligopsônios2. Essas empresas compravam a produção a preços baixos e as revendiam a altos preços.

Desenvolvendo esse ponto de vista, observa-se que nos oligopsônios-oligopólios a comercialização dos produtos agrícolas para o mercado interno “apoia-se (de um lado) na baixíssima elasticidade-preço e renda da demanda dos produtos que supre; de outro, na elevada elasticidade-preço da oferta dos mesmos produtos” (RANGEL, 1963, p. 91-92). Em outros termos, os produtores rurais vendiam sua produção a preços baixos aos intermediadores (que, por vezes, eram vários na cadeia produtivo) que a revendiam ao consumidor final a preços altíssimos sob a alegação de baixa oferta – dessa forma, os produtos chegavam aos supermercados, para o consumidor final, com pouca quantidade e qualidade e altos preços. Contudo, a produção, nessas circunstâncias, é baixa devido aos desestímulos dos preços baixos pagos, ou seja, nessa situação há manipulação dos preços quando se:

[...] deprime e desorganiza continuamente a produção tornando-a escassa; apoiado nessa escassez por ele mesmo induzida, aproveita-se da inelasticidade da demanda, a qual, deixa indefeso o público consumidor, para impor a este preços extorsivos, perenemente em alta, arrastando em sua esteira todo o sistema nacional de preços (RANGEL, 1963, p. 92).

O Estado, sabendo disso e compreendendo que esses oligopsônios-oligopólios não derivavam de ordem/imperativos técnicos ou econômicos, deveria desmantelá-los. Contudo, isso não ocorreu. Na prática, o Estado acabou se empenhando em conservá-los e fortalecê-los, sob o pretexto de discipliná-los (eram os monopólios pré-capitalistas nos dizeres de Rangel).

A única explicação possível para essa anomalia – peça importantíssima do mecanismo institucionalizador da inflação, como vimos – está no apoio que o Estado dá ao oligopsônios-oligopólio de bens agrícolas. Sob o pretexto de submeter os preços agrícolas a tabelamento, criou-se um esdrúxulo aparelho [...] cujo verdadeira função

1 [Economia] Mercado em que há apenas um comprador para os produtos de vários vendedores (MONOPSÔNIO, 2020).

2 [Economia] Mercado em que há apenas um pequeno número de compradores para os produtos de vários vendedores (OLIGOPSÔNIO, 2020).

consiste em reunir os intermediários para tomar suas decisões coletivas, as quais, a seguir, confere sanção legal (RANGEL, 1963, p.92).

Apesar disso, os pequenos e médios produtores, que antes prestavam esses serviços em condições precárias e feudais (condições essas já superadas), já possuíam condições de concorrerem no mercado por si mesmos, sem a interferência desses oligopólios. No entanto, estes grupos ainda apresentavam extraordinário poder de influência, controlando os grandes centros consumidores. E o Estado, ao invés de intervir, desmantelando esse sistema, mantinha a unidade dele, impedindo a competição e consolidando o monopólio, por meio da sanção legal e outras intervenções não legais, de âmbito municipal, que dificultam a comercialização e a competição, dando eficácia as decisões do grupo. Como resultado, formaram-se verdadeiros cartéis que ditavam os preços e dividiam o mercado.

Para tentar resolver esse problema, Rangel cita como soluções: a atuação do Estado no desmantelamento desses quase-monopólios e o estabelecimento de preços mínimos eficazes ao produto agrícola como principal instrumento para desarticulação dos oligopólios. Para Rangel (1963, p. 94), “ao tentar destruir o poder do oligopólio de suscitar a escassez, estaremos privando-o, implicitamente, do poder de impor seus preços ao consumidor”.

Quando Rangel desenvolveu sua teoria, o processo de correção dessa anomalia já se encontra em andamento, por meio do surgimento de formas modernas de capitalismo. Essas formas capitalistas modernas assumiam duas formas novas de organização da comercialização de produtos agrícolas, quais sejam, ou “os grandes produtores agrícolas e pecuários que se organizam para chegar diretamente com o seu produto ao consumidor, ou são os grandes distribuidores que se organizam e se aproximam das fontes” (RANGEL, 1963, p.94), no caso, se aproximavam dos produtores originários.

Isto posto, começava a fragmentar o oligopólio tradicional, com a tendência a superprodução e expansão do mercado interno, não sendo mais possível criar uma escassez fictícia, desestimulando a produção, para impor a alta de preços ao consumidor. Nesse sentido, as primeiras organizações de produtores surgem, como também as primeiras políticas públicas que visam incentivar e amparar os pequenos e médios produtores rurais.

Por conseguinte, observa-se que o problema da agricultura brasileira não era de base estrutural ou incapacidade para o desenvolvimento, mas sim resultava dos oligopsônios e monopsônios de uma agricultura com resquícios do sistema feudal que não foi reestruturada para a nova realidade que o Brasil enfrentava – o capitalismo. As consequências econômicas desse processo geram uma estrutura de comercialização deficitária para o pequeno produtor e para o consumidor final.

Furtado, por sua vez, ao explicar as estruturas da economia brasileira, corroborava com o pensamento de Rangel, ao afirmar que o foco da agricultura brasileira sempre foi a exportação, por meio da exploração. Aliás, nos dizeres desse autor, o comércio exterior foi a razão de ser da ocupação do solo brasileiro. Nesses termos Furtado (1972, p. 91) explica que:

a abundância de terras, o clima tropical ou subtropical e a quase inexistência de mão- de-obra local na fase inicial de ocupação, fizeram que a grande unidade de exploração se impusesse como forma predominante e quase exclusiva de organização. A exportação sendo a raison d’être da ocupação territorial, a forma de organização mais econômica no setor de exportação tenderia sempre a predominar.

Segundo esse autor, o Brasil era “[...] o único país das Américas criado, desde o início, pelo capitalismo comercial sob a forma de empresa agrícola” (FURTADO, 1972, p. 93). A busca por produtos agrícolas – especiarias – foi o motivo que levou a descoberta do Brasil e, posteriormente, sua exploração. Desse modo, diferentemente das outras colônias de povoamento da América, o Brasil possuía foco estritamente no comércio exterior, tornando-se o comércio interno pouco desenvolvido e esquecido na conjuntura em que se encontrava o país. “A importância da empresa agro-mercantil, no Brasil, está em que ela marcará decisivamente a estrutura da economia e da sociedade que se formarão no país” (FURTADO, 1972, p. 94).

Daí resultou um Brasil em que uma pequena minoria detém grandes propriedades de terras e a vasta população se resumia a mão de obra a disposição dos grandes produtores, ou para o cultivo de minifúndios com plantações de subsistência. O pouco do excedente que esses pequenos produtores conseguiam gerar era vendido a preços baixíssimos aos grandes proprietários de terra. Essa concentração acabou gerando consequências econômicas, sociais e políticas que repercutem até os dias atuais. Conclui-se, dessa forma, que “[...] o controle da propriedade da terra por uma minoria impediu que frutificasse todo ensaio de atividade agrícola independente da empresa agro-mercantil” no Brasil (FURTADO, 1972, p. 98)

Nesse sentido, Furtado (1968, p. 15) acaba afirmando que a estrutura agrária brasileira se constituiu numa “[...] segunda face deformada do sistema econômico desse país”. Pois, havia um enorme desperdício de mão de obra e uma baixa eficiência do uso do capital que estavam implícitos na organização da agricultura brasileira. Para os trabalhadores rurais ou pequenos produtores, segundo Furtado (1972, p. 117) só poderia haver 3 opções:

a) a frente dos minifúndios, quando o trabalhador tem acesso a essa forma precária de propriedade da terra, onde sub-utiliza sua capacidade de trabalho e está praticamente impossibilitado de capitalizar e melhorar seu nível técnico;

b) a fronteira móvel sem apoio logístico ou financeiro onde se dedica a abrir terras com técnica primitiva, sem qualquer possibilidade de fixar-se e ascender à situação de proprietário; e

trabalhador assalariado, etc., ou mediante a combinação de mais de uma dessas relações de trabalho; sua capacidade de trabalho é mais amplamente utilizada, se bem que as práticas sejam igualmente rudimentares.

Nenhuma das três opções acima descritas era favorável para o pequeno agricultor. Outra crítica que Furtado aduz acerca da agricultura é que, mesmo com o desenvolvimento e a industrialização, a produção agrícola continuava arcaica, ou seja, o problema da agricultura brasileira era de base estrutural, faltava modernização para o crescimento – o que diferenciava do pensamento de Rangel, o qual afirmava que o problema eram as estruturas de comercialização. À vista disso, o Brasil estaria sendo retratado como “[...] uma economia que se desenvolve com base em uma agricultura tradicional, ou seja, uma agricultura que praticamente não absorve progresso técnico” (FURTADO, 1972, p. 109).

Contrapondo-se à industrialização, que estava se desenvolvendo aos poucos, a agricultura no Brasil continuava subdesenvolvida e atrasada. Efetivamente, as indústrias e o setor de manufaturas que se modernizavam seriam, possivelmente, “o mais diversificado e mais amplo parque industrial do chamado Terceiro Mundo, ao mesmo tempo que sua agricultura, fonte de emprego de metade da população, apresenta baixíssimos índices de produtividade” (FURTADO, 1972, p. 7). As causas dessa baixa produtividade seriam a falta de atualização e de progresso. Ademais, outro problema do país, explicitado pelo autor, na época, seria a geração de emprego para essa crescente população – que acabava relegada a setores urbanos marginalizados ou à agricultura de subsistência.

A concentração fundiária impunha certas formas de distribuição de renda, assegurando mão de obra barata à empresa mercantil, induzindo esta ao uso extensivo das terras e perpetuando práticas agrícolas rudimentares, as quais constituíam uma forma mais econômica de usar a mão-de-obra (FURTADO, 1972, p. 108). No entanto, esse método de exploração, desvalorizava o trabalhador rural e o aprisionava nesse sistema, impedindo-o de se tornar autossuficiente. Para os proprietários do agronegócio, “enquanto a destruição da fertilidade dos solos de certas áreas puder ser compensada pela abertura de novas terras, continuará a prevalecer a agricultura itinerante, fechando-se a porta a uma ampla e efetiva penetração do progresso técnico na agricultura” (FURTADO, 1972, p. 114), ou seja, enquanto puder explorar a mão de obra e os pequenos produtores rurais e extrair o máximo da terra, o agronegócio não terá interesse em se modernizar ou melhorar as técnicas de exploração da terra.

Fazendo um apanhado desses autores, Guido Mantega explica os modelos da economia política que surgiram com o avanço da acumulação capitalista no Brasil. Para Mantega, os produtos agrícolas eram preferência dos assalariados e, apesar dos preços elevados,

eram considerados gêneros de primeira necessidade. Assim, era preferível gastar um pouco mais que abrir mão desses produtos. Dessa forma, “o forte setor de intermediação perpetuava seus privilégios ao pagar preços muito baixos aos produtores, não estimulando o crescimento da oferta, e podendo jogar com a escassez de mercadorias para manter elevados os preços de venda ao consumidor” (MANTEGA, 1992, p. 104).

No que concerne ao setor industrial, o somatório da capacidade ociosa – mercadorias não vendidas – com o alto custo das matérias-primas agrícolas fazia com que a indústria operasse “[...] com preços elevados para ressarcir-se dos encalhes de mercadorias ou para compensar os custos fixos, contribuindo, juntamente com os altos preços agrícolas, para criar uma espiral inflacionária que vinha acompanhando os passos da economia brasileira” (MANTEGA, 1992, p. 104).

Assim, Mantega explica que a inflação se dava por diversas razões, e uma delas era o modelo de comercialização da agricultura brasileira. Nela, os oligopsônios e monopsônios de comercialização justificam os altos preços das matérias-primas e dos alimentos agrícolas. Para ele, “caso os estímulos dos altos preços chegassem às mãos dos produtores, estes reagiriam elevando a oferta e cumprindo a contento as necessidades da acumulação industrial” (MANTEGA, 1992, p. 118). Contudo, havia os intermediadores que ficavam com os maiores lucros, encarecendo os produtos agrícolas e consequentemente os custos do setor industrial.

O autor, apoiando o pensamento de Furtado, acrescenta ainda que a deficiência da economia brasileira também poderia ser justificada pela estrutura agrária que era considerada arcaica e pouco eficiente, aprisionando parte da população em condições miseráveis de vida e apresentando características monopolistas. Nesse aspecto, os problemas agrários brasileiros residiam na

[...] influência política das classes conservadoras, que mantinha a estrutura agrária brasileira operando com técnicas rudimentares de cultivo, provocando a exaustão da fertilidade da terra e exercendo um baixo aproveitamento das áreas rurais, tudo isso convergindo para o alto custo dos produtos agrícolas e para o baixo nível de vida da população. Se não se criava um mercado de base industrial, pouco se podia esperar, naquelas condições, da demanda do setor agrícola, ainda mais débil do que a dos centros urbanos (MANTEGA, 1992, p. 85).

Para o autor, a solução para esse problema residia na necessária intervenção do Estado. Dessa forma, o Estado agiria como planejador da economia, orientando e regulando os interesses da população, transformando a estrutura agrária, elevando a produtividade, melhorando o aproveitamento das terras e proporcionando a melhoria do nível da população rural miserável.

A principal divergência entre os pensamentos defendidos por Rangel e por Furtado consistia nas razões que levavam a incapacidade da agricultura brasileira – para Rangel o motivo da deficiência do setor agrícola eram os oligopsônios/monopsônios; enquanto que para Furtado a justificativa era puramente de base estrutural. Conforme Mantega (1992, p 104), boa parte dos pensadores de esquerda imputavam o subdesenvolvimento agrário a “uma incapacidade estrutural de cumprir sua parte na expansão do capitalismo no Brasil, isto é, fornecer matéria-prima e alimentos baratos e em grande quantidade”. Rangel, todavia, atribuía o atraso da agricultura brasileira mais ao setor de comercialização do que às estruturas agrárias, devido as anomalias de formação de preço já mencionadas.

Observa-se, dessa forma, que a intervenção do Estado é uma medida necessária para efetivar a redução das desigualdades geradas no campo em anos e anos de colonização e para uma tentativa de quebra dessas estruturas de comercialização que vinham sendo propagadas no Brasil. O Programa de Aquisição de Alimentos seria, também, uma resposta as reivindicações de Furtado, pois, de certa forma, o Estado estaria intervindo e buscando regular os interesses da população miserável do campo, visando sua melhoria de qualidade de vida.

Atualizando os discursos de Rangel e de Furtado, Dowbor (2017, p. 96) aborda acerca da desintermediação e de como se pode melhorar as condições de comercialização dos bens agrícolas para os produtores e os consumidores. Nesse sentido, ele tenta esclarecer que

a lógica da desintermediação, naturalmente, é de se reduzir os lucros gerados pelo pedágio, redistribuindo esta apropriação do excedente entre o produtor, que poderá produzir mais e melhor, e o consumidor, sob forma de preços mais baixos, o que permitirá um consumo maior e a compra de mais produtos. O intermediário inclusive poderia ganhar menos sobre um volume maior, e voltaria a ter sua parte do bolo sem prejudicar a cadeia produtiva.

Acrescenta, ainda, Dowbor (2017, p. 95) que o desestímulo à produção agrícola fica patente quando se observa a diferença discrepante de valores pagos para os produtores e os intermediários; e isso acaba deixando clara a “[...] deformação da lógica de remuneração dos fatores e dos agentes econômicos, uma diferença de 1 para 300. Produzir rende pouco. O que rende é intermediar a produção dos outros”.

No mesmo sentido, Silva (1981 apud SIQUEIRA et al., 2013, p. 99) explica que o processo de comercialização dos produtos da agricultura familiar sempre foi um dos maiores entraves ao desenvolvimento desse cultivo. Em termos históricos, os agricultores familiares encontravam-se, em relação aos compradores de seus produtos, nos canais de venda indireta, em posição subordinada. Os agricultores perdiam grande parcela dos valores pagos pelos

consumidores finais, que eram apropriados pelos diversos agentes que atuam na cadeia de intermediação.

Esses fatos acarretam consequências que Dowbor (2017, p. 96) busca explicar ao descrever que:

Do lado do produtor, o lucro é insuficiente para desenvolver, ampliar ou aperfeiçoar a produção, e em consequência a oferta não se expande. Do lado do consumidor, o preço é muito elevado, o que faz com que o consumo também seja limitado. Quem ganha é o intermediário, com margens muito elevadas sobre um fluxo relativamente pequeno de produto. E os intermediários, cada vez mais, são imensas redes de comercialização que passam a ditar preços, com ganhos financeiros de oligopólio, economia de pedágio.

Assim, as grandes empresas transnacionais concentram tecnologia e monopolizavam a produção agrícola sob a alegação de produzir em maior volume e em melhor qualidade, podendo combater a fome no mundo. Em nome dessa produtividade, plantam monoculturas, com excesso de agrotóxicos e, muitas vezes, desmatam grandes áreas – tudo com o apoio de políticas subsidiadas pelo Governo. Nesse aspecto,

En los últimos 30 años, el avance tecnológico ha significado uma cierta ventaja para la humanidad, porque se trata de mejorar y facilitar la producción agrícola; sin embargo, las nuevas tecnologias están en mano de grandes empresas transnacionales que han acumulado y concentrado la cadena de producción y distribución de alimentos en el mundo: una monopolización que se defiende bajo la publicidad de combatir el hambre en el mundo. Una gran mentira, aunque los medios masivos de comunicación no lo muestren, el hambre ha aumentado. Las corporaciones del agronegocio, en nombre del productivismo, han destruido millares de hectáreas de bosques, montes, montañas; han desplazado familias campesinas indígenas enteras, han desviado ríos, para así imponer sus monocultivos de organismos genéticamente modificados (OGM) a base de agrotóxicos. [...] Estas empresas, con su poder económico, no solo publicitaban sus falsas soluciones, sino que también han dominado espacios nacionales e internacionales para incidir en las decisiones de organismos multilaterales a favor de ellas mismas, invisibilizando y despreciando las formas de