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Evangelho Social

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1 UMA UNIDADE COM RACHADURAS EXPOSTAS

1.2 AS TRÊS TEOLOGIAS DA MISSÃO SEGUNDO DONALD A McGRAVAN

1.2.3 Evangelho Social

Essa teologia para McGravan constitui um grande perigo para a igreja, visto que, conforme suas próprias palavras, “ela traz confusão em teoria, teologia e prática de missão, e conduz erroneamente jovens igrejas na grande pletora de bons atos a fazer” (McGRAVAN, 1990: xvii). Uma de suas grandes insatisfações em relação a esse pensamento está no fato, como declara, que 80% das atividades de missão em seu tempo são organizadas em atos de bondade e ações sociais, o que faz a evangelização da mensagem de Cristo ser colocada em segundo plano.

Ocorre aqui uma divisão de escolas de pensamento sobre missões, segundo McGravan, a primeira escola que prioriza os “ministérios sociais cristãos” (McGRAVAN, 1990: 22) e outra escola que prioriza o “evangelismo” (a persuasão de homens e mulheres a se tornarem cristãos e membros engajados de uma igreja). Em sua análise, o autor traça uma distinção que é fundamental na construção de seu posicionamento:

“that mission is a divine finding, vast and continuous. The chief and irreplaceable purpose of mission is church growth. Social service pleases God, but it must never be substituted for finding the lost. Our Lord did not rest content with feeding the hungry and healing the sick. He pressed on to give his life a ransom for many and to send out his followers to disciple all nations. Service must not be so disproportionately emphasized at the expense of evangelism that findable persons are continually lost.” (McGRAVAN, 1990: 22)

Para o fundador do Movimento de Crescimento de Igrejas, não só há uma separação entre serviço e evangelismo, mas o último tem prioridade sobre o primeiro, visto que é parte do próprio desejo de Deus de encontrar quem está perdido. Portanto, não se deve dar tanta atenção para o serviço, e sim, para a proclamação do que o movimento entende ser a mensagem do evangelho, ponto tratado na “teologia da semeadura”, da qual se pode perceber alguns pressupostos teológicos da ortodoxia protestante, já na citação acima, como a concepção de salvação por meio do pagamento de um resgate através da morte de Jesus Cristo na cruz.

Além de considerar o evangelho social de segunda importância em relação à evangelização nas práticas da igreja, o autor expõe que a atuação social para um bem-estar comum é uma consequência da cristianização de pessoas e, por isso, ocorrerá naturalmente se a igreja priorizar a evangelização: “(...) It maintains that Christianizing the social order is a fruit of new life in Christ and church multiplication and must, therefore, receive a lower priority” (McGRAVAN, 1990: 22). Um de seus seguidores, George Hunter12, faz a seguinte declaração categórica, que segue a mesma linha de seu pensamento: “Our social causes will not triumph unless we have great numbers of committed Christians”. Este tratamento condicional para a mudança da ordem social permeará o pensamento de todos os adeptos do movimento de crescimento de igrejas.

Um dos principais seguidores de McGravan, apoiador de seu trabalho, propagador de suas ideias, e que o substituiu na cadeira de Crescimento de Igrejas da Escola Mundial de Missão do Seminário Fuller, Peter Wagner, declara sua insatisfação com um movimento que se propaga mundialmente: o cristianismo liberal, tal qual nomeia, e demonstra a sua preocupação com o perigo que este movimento representa para a igreja, para a evangelização e para missões, conforme declara abaixo:

“Back when The Bridges of God was published, liberal Christianity was having a heyday. The social gospel was in, and a massive effort had been mounted to redefine the terms "mission" and “evangelism.” Mission meant fulfilling the cultural mandate. Evangelism meant giving a cup of cold water in the name of

12“George G. Hunter III é professor emérito do Seminário Teológico da Escola de Missão e Evangelismo de Asbury,

onde trabalhou como Deão por 18 anos e como distinto professor por 10 anos. Ele trabalhou como Deão fundador da Escola E. Stanley Jones de Missão e Evangelismo de Asbury” http://www.abingdonpress.com/george_g_hunter

Jesus and helping Muslims or Buddhists become better people. Advocating conversion to Christianity was regarded as distasteful, something akin to coercion or manipulation. The World Council of Churches13 had been organized, and this kind of thinking had already begun to surface in its theological outlook. Donald McGavran, who himself had once advocated these positions, now saw their spiritual emptiness. He launched a thirty-year crusade to bring the meanings of mission and evangelism back to their classic, biblical moorings.” (WAGNER, 2013: 10)

A partir da fala de Wagner fica evidente a ruptura entre o que ele considera Evangelho social (um evangelho subjugado pela cultura) e Evangelho bíblico (anúncio da salvação eterna por meio da morte e ressureição de Jesus Cristo, que realizou o pagamento eterno dos pecados da humanidade).

A Escola de Fuller14 vai procurar contra-argumentar o posicionamento do dito “Evangelho social” afirmando que a primazia do crescimento de igrejas na prática da missão é algo que advém do próprio Deus, pois em primeiro lugar, a missão pertence a Deus (apropriam-se do conceito de missio Dei), que tomou bastante força no Século XX: “In this world, mission must be what God desires. It is not a human activity but missio Dei, the mission of God, who himself remains in charge of it”. (McGRAVAN, 1990: 20). Entretanto, o fato da missão ser divina não contribui em nada para o argumento do crescimento de igrejas, por isso é preciso definir a missão, sobre o que discorreremos mais adiante.

Em segundo lugar, a Escola de Fuller afirma que o crescimento de igrejas é desejo divino (McGRAVAN, 1990: 6, 9) e que tal fato se dá pela salvação das pessoas da condenação eterna por meio da proclamação do evangelho de Jesus Cristo: “Anyone who would comprehend the

13 “O Conselho Mundial de Igrejas é uma organização que visa à comunhão de igrejas que confessam o Senhor Jesus

Cristo como Deus e Salvador, em concordância com as escrituras, e, portanto, procura cumprir juntos o chamado comum para a glória do único Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. É a maior e mais inclusiva das diversas expressões organizadas do movimento ecumênico moderno, um movimento cujo objetivo é a unidade cristã. Foi fundada em 1948, possui sede em Genebra na Suíça e conta com mais de 345 denominações cristãs”. [Tradução livre feita de informações retiradas do próprio site da organização] http://www.oikoumene.org/en/about-us

14 Toma-se a liberdade de utilizar o termo Escola Fuller (“Fuller School”) para a designação do pensamento sobre Movimento de Crescimento de Igreja da Escola de Mundial de Missão do Seminário Teológico Fuller. Esta designação foi utilizada por Ebbie C. Smith do Southwestern Baptist Theological Seminary, em 1984 no Balanced Church Growth: “I use the terms, Church Growth Movement or Church Growth Theory, to refer to the body of

teaching associated with the approach of Donald A. McGavran, Alan R. Tippett, C. Peter Wagner, Win Arn and others of the so-called “Fuller School.”

growth of Christian churches must see it primarily as faithfulness to God. God desires it (...) faithfulness to God implies doing our part, empowered by the Holy Spirit, to persuade all men

and women to become disciples of Jesus Christ and responsible members of his church”. (grifo

nosso), ou seja, sua não observância é um ato de infidelidade e indiferença a Deus. Além disso, acrescentam que é algo que agrada o próprio Deus: “Nevertheless, God´s obedient servants seek church growth not as an exercise in improving humanity, but because the extension of the church

is pleasing to God. Church growth is faithfulness” (McGRAVAN, 1990: 6). (grifo nosso),

portanto, a indiferença ao crescimento de igrejas é um desagravo ao próprio Deus. E por último, destacam que o crescimento da igreja é algo que Deus requer dos cristãos (McGRAVAN, 1990: 8): “Church growth is basically a theological stance. God requires it. It looks to the Bible for direction as to what God wants done”. (grifo nosso). Por conseguinte, não ter o foco no crescimento de igreja é desobedecer a Deus e ao seu mandamento, é descumprir algo da parte de sua volição. Isto posto, não ter o crescimento de igreja como foco da missão é estar em oposição ao próprio Deus cristão, pois se atua contra o seu desejo, contra o seu agrado, contra a sua vontade.

Neste ponto específico da argumentação da Escola de Fuller, gostaria de abrir um parêntese para expressar que em cada um dos argumentos do parágrafo anterior exposto falta uma premissa para o embasamento da argumentação, alguma relação de causalidade na lógica estabelecida. São expressas afirmações autodeclaratórias, não factíveis de comprovação ou argumentação dentro de sua própria expressão. Tal fato traz uma dificuldade para o debate e não contribui para a solução da questão posta entre as duas escolas.

Assim, um quadro de grande oposição se estabelece e fronteiras são demarcadas sobre o conceito de missão e evangelização. As tentativas da Escola de Fuller são claras e de contraposição à ala mais progressista da igreja que traz uma ênfase à necessidade de mudança social e da relevância da igreja no mundo contemporâneo, bem como de reação da ala ortodoxa da igreja protestante que se vê, segundo eles, paralisada diante da expansão do pensamento mais imediato da realidade do evangelho.

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