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Evolução da Cultura do Castanheiro da Segunda Metade do Século

COMSUMIDOR RETALHISTA

1. Evolução da Cultura do Castanheiro da Segunda Metade do Século

O castanheiro europeu (Castanea sativa Miller) é cultivado há milénios, particularmente na Europa e na região Mediterrânica Oriental, sendo espontâneo na Europa Meridional, regiões da Ásia Menor, sul da Pérsia, Cáucaso, margens do mar Cáspio e Norte de África (Paiva, 1990:1). Esta árvore de grande porte e longevidade pertence à família das fagáceas, existindo em Portugal alguns exemplares famosos desta espécie milenária. É uma fruteira de crescimento lento, adquirindo por volta dos 50 anos o seu porte definitivo. Não há distinção taxonómica entre o castanheiro bravo e o castanheiro manso, mas o castanheiro bravo é mais aproveitado para madeira porque a castanha é menor e sem as qualidades do fruto do castanheiro manso (Paiva, 1990:6).

Segundo o mesmo autor, admite-se por hipótese, que a existência do castanheiro em Portugal remonte à era pré-romana, persistindo ainda hoje em todo o território nacional, incluindo Açores e Madeira, embora predomine no Interior Centro e Trás-os-Montes, particularmente no Nordeste. Além da espécie indígena da Europa Castanea sativa Miller, cultivam-se também as espécies asiáticas Castanea crenata Siebold & Zucc. originárias do

59 Japão e Coreia e Castanea molissima Blume, proveniente da China, sendo esta espécie mais rara no nosso país e sem grande interesse do ponto de vista comercial, pela fraca qualidade do seu fruto. Tem, no entanto, interesse dada a sua maior resistência à doença da tinta, à produção de frutos de maior calibre, à temporalidade e ao carácter marron.

Segundo alguns autores, o castanheiro na Europa chegou a ocupar uma área de 1 500 000 hectares (Guerreiro cit. in Paiva 1990:7). Após a elaboração da casta do castanheiro em 1952 concluiu-se que Portugal possue uma superfície aproximada de 70 000 hectares de castanheiros dos quais cerca de 5 000 hectares são explorados em talhadia raza para produzir arco, aduela, postes, etc. Os restantes 65 000 cultivam-se para produzir fruto (Fernandes, 1954:48). Segundo este autor a produção global era naquela data de 52 000 toneladas.

Em Portugal, o sector da castanha assumiu no passado grande importância económica e foi decisivo para a subsistência das populações de montanha, mantendo-se intimamente ligado à sobrevivência das populações rurais com a sua utilização na dieta alimentar. Como nos diz Magalhães (1910:184), (...) quanto essa abençoada arvore se desfaz em beneficios para o homem! Quer dos seus fructos quer da sua madeira, ella distilla perenne riqueza: “pinga” sempre! (...)mas só mais tarde eu conheci que as suas “pingas”, juntas, produziam grossa chuva de oiro na minha provincia. Actualmente, a comercialização representa uma das principais receitas das explorações agrícolas do Interior Norte. Depois da 2ª Guerra Mundial, o castanheiro encontrou um período de crise, não sobrevivendo em certas áreas do país. Alterações socio-económicas principalmente em zonas de montanha, como a mobilidade da população agrícola, o desenvolvimento tecnológico nas cidades e a mudança de hábitos alimentares fizeram o resto. Concretamente, a decadência desta cultivar teve origem:

- no progressivo abandono de terras pela população residente, que teve como consequência a diminuição da oferta, e por outro lado, a mudança de hábitos alimentares por parte dos consumidores provocou o decréscimo da procura;

- no número acentuado de incêndios;

- de 1950 a 1980, aspectos associados a outro tipo de aproveitamento do solo, com o incremento de novas culturas (batata, milho, trigo, centeio e olival), tiveram como consequência a redução vertiginosa das áreas destinadas à produção de castanha. O desinteresse pela cultivar foi-se instalando entre os agricultores, preterindo-a a favor

60 daquelas culturas de maior cotação de mercado. Assim, o castanheiro foi deixado para segundo plano, mantido apenas em terrenos menos férteis ou abandonados, onde não havia lugar para outras culturas. Contudo, as condições edafo-climáticas das zonas mais inóspitas de Portugal não deram outra alternativa à população remanescente, senão a de proteger esta espécie em crise, tratá-la e valorizá-la ao máximo;

- no elevado valor da madeira, que aliciou o abate de um número significativo de árvores para utilização em marcenaria;

- de acordo com Gomes (1982), os organismos decisores ligados à arborização têm insistido no plantio de espécies resinosas em detrimento das folhosas. Assim, de acordo com Bourgeois (1992), Portugal importava de França 60 000 toneladas de madeira de castanheiro por ano, destinada à indústria de mobiliário e parqués. Estas importações não teriam razão de existir, se os órgãos decisores do planeamento florestal introduzissem as folhosas nas nossas florestas, com maior apetência para a produção de madeiras e menos susceptíveis a incêndios que as resinosas;

- o maior estrangulamento à sobrevivência do souto teve origem em causas fitopatológicas, designadamente, a doença da tinta do castanheiro e o cancro americano. Estas debilidades constituíram o principal motivo de desaparecimento de poderosas manchas de soutos no nosso país e por toda a Europa, originando quedas consideráveis na produção e no valor de mercado do seu fruto;

- a reposição de novos castanheiros por parte dos agricultores não conseguiu ainda compensar as quantidades abatidas e/ou doentes, pois uma parte da população de castanheiros jovens acaba por não resistir aos problemas fitossanitários já instalados nos soutos.

É na década de 1970 que aparece o primeiro sinal de recuperação económica e social da cultura do castanheiro na Europa, aliado à preservação e valorização do ambiente e do espaço social rural. Porém, só a partir de 1990 a área de soutos e a produção de castanha têm vindo a aumentar em Portugal (Gráfico III.1). A necessidade do repovoamento cria raízes e centra de novo atenções na recuperação do castanheiro. Para isso, foram aprovados programas governamentais, incentivando os produtores para a plantação de soutos e castinçais.

61 A batata trazida da América no séc. XVI, que retirou o lugar à castanha na segunda metade do século XX, cede agora lugar ao cultivo do souto em muitas explorações do Nordeste Transmontano. A crescente procura de castanha no mercado internacional e a diminuição da rendibilidade, principalmente do cereal e da batata9 aliadas à escassez em mão-de-obra e à crescente erosão demográfica, conduziu os proprietários idosos a apostarem novamente na cultura do castanheiro.

Esta cultivar entrou num período de revalorização do repovoamento florestal e da castanha como fonte de riqueza agrícola, o que é confirmado pelos valores da área actual, 28 940 ha, ou seja, o dobro comparativamente à década de 1980, e pouco mais de metade, se nos reportarmos à década de 1970, que ascendia a 54 000 ha. A produção sofreu algumas oscilações com tendência à diminuição desde 1970 até 1993, após o que, volta a aumentar devido aos novos pomares de soutos que vão saindo do período de maturação, situando-se a produção nacional no ano 2000 em 33 359 toneladas. Note-se que esta é uma espécie de crescimento lento, por isso os valores produtivos tendem a aumentar, uma vez que grande parte das plantações são recentes não tendo ainda atingido a plena produção.

Fonte: INE: Estatísticas Agrícolas do Continente (1971-1980); Anuário Hortofrutícola (1981-2002).

Gráfico III.1: Evolução da Superfície Ocupada com Castanheiro para Fruto e Produção de Castanha em Portugal no Período de 1970 a 2000.

9 Estes produtos necessitam de solos mais ricos e muita mão-de-obra. 0 10000 20000 30000 40000 50000 60000 1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 ha , t on Superfície Produção

62 1.1. Distribuição Geográfica do Souto em Portugal

Segundo Paiva (1990), os soutos e castinçais adaptam-se melhor aos solos frescos, profundos e leves do que aos graníticos, xistosos ou arenosos das zonas de montanha do Centro interior e Norte de Portugal10. Para Bounous e Abreu (1998), a maior parte dos soutos no nosso país situam-se em altitudes compreendidas entre os 700 e os 1 000 m. Em 1999, das 22 660 explorações (RGA, 2001) existentes em Portugal, que se dedicavam à cultura do castanheiro, 73% situavam-se na região de TM (Gráfico III.2).

Fonte: INE: RGA (2001).

Gráfico III. 2: Importância Relativa do Número de Explorações de Castanheiros por Regiões em Portugal (1999).

Como pode inferir-se pela observação do gráfico III.2, às 22 660 explorações correspondia uma área de 27 675 ha, ou seja, 84% da área total de soutos do país (Gráfico III.3).

Fonte: INE: RGA (2001).

Gráfico III.3: Importância Relativa da Área de Castanheiros por Regiões em Portugal (1999).

Nº Explorações TM 7 3 % BL 5 % BI 1 1 % LVT 0 % ALE 1 % ALG 0 % MAD 2 % AÇO 3 % EDM5 % Área TM 8 4 % BL 2 % ALG 0 % BI 1 0 % ALE 2 % MAD 0 % EDM 2 % AÇO 0 % LVT 0 %

63 As maiores manchas de soutos localizam-se no Centro e no Norte, com as maiores produções na Beira Alta e em Trás-os-Montes, respectivamente, devido a investimentos feitos em novas plantações a partir de 1991. A Beira Alta é uma das regiões que tem apostado mais energicamente em plantações jovens. Só em 1985, segundo os dados do INE (1987), os produtores do distrito de Viseu compraram quase 50% das árvores dos viveiristas. Relativamente ao total do país, tem sido relevante a compra de castanheiros pelos produtores transmontanos no período de 1995 a 2000, que adquiriram aos viveiristas, em média, 57 569 plantas de castanheiro, ou seja, 55,5% do total existente no Continente (Gráfico III.4).

Fonte: INE: Anuário Estatístico de Portugal (1996-2001).

Gráfico III.4: Evolução do Número de Castanheiros Vendidos pelos Viveiristas no Continente e na Região de Trás-os-Montes no Período de 1995 a 2000.

Com base nos dados do RGA (2001), os castanheiros dispersos estão sobretudo distribuídos pelas pequenas explorações enquanto que os pomares industriais se situam, maioritariamente, nas explorações de maior dimensão. Bragança é o concelho que detém maior número de castanheiros dispersos e simultaneamente o que possui maior área de pomares.

Existem algumas manchas não muito significativas no Minho (serra do Gerês), Alentejo (serra de S. Mamede) e Algarve (serra de Monchique). De acordo com os dados estatísticos do INE dos últimos dez anos, tem-se verificado uma diminuição da área de produção no Norte Alentejano (Marvão e Castelo de Vide) devido à doença da tinta. Nos Açores, salienta-

10 Anexo I. 0 20000 40000 60000 80000 100000 120000 140000 95/96 96/97 97/98 98/99 99/00 anos nº p és Continente T M

64 -se a ilha Terceira com um renovado interesse pela variedade precoce Viana, com frutos deiscentes11 na primeira semana de Agosto.