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Mapa IV.1: Produção Agrícola em Trás-os-Montes.

1. Recolha da Informação

1.1. Técnicas e Procedimentos Metodológicos

Convencionalmente existem dois tipos de técnicas ou fontes de informação: as fontes de informação documentais (ou secundárias) e as fontes de informação não documentais (ou primárias). Metodologicamente, esta dissertação pode dividir-se em duas fases. Na primeira fase, recorreu-se fundamentalmente a fontes de informação documentais e na segunda fase, a fontes de informação não documentais.

Para Almeida e Pinto (1982:95), as fontes de informação documentais envolvem procedimentos muito diversificados, desde logo porque são muito diversos também os documentos reveladores de fenómenos sociais. Para estes autores, as fontes documentais

123 abarcam uma multiplicidade de documentos escritos e não escritos gerados para outros fins mas que são utilizados por todas as ciências sociais.

Para Greenwood (1965) a vantagem da utilização das fontes documentais está associada à quantidade e diversidade de informação, que permite a comparação de dados de diferentes épocas com diferentes abordagens, a menor custo em termos de recolha de informação. Contudo, o autor considera que muitos destes dados não estão comprovados cientificamente, fornecendo-nos uma verdade contada por outros, pelo que o investigador não controla o processo de produção destes documentos, cujos dados, na sua recolha, estão sujeitos a erros. Tomando em linha de conta esta opção metodológica, para concretizar a primeira fase da pesquisa, foi efectuado o estudo exploratório, constituindo este o pano de fundo que pretende dar sentido ao texto explicativo, senão na totalidade, pelo menos em parte, das interacções entre os diversos intervenientes no sistema de comercialização. Esta acção teve como primeiro recurso a técnica de consulta de documentos escritos, facultados pelos arquivos públicos e privados. Foram consultados documentos oficiais (legislação nacional e europeia sob a forma de estatísticas ou não) centrais e locais, de origem governamental ou administrativa e trabalhos de investigação (artigos, estudos, relatórios) relacionados com o nosso estudo.

Ao analisarmos esta bibliografia, constatámos que por um lado essa análise nos foi útil, na medida em que a mesma temática pode ser abordada sob várias perspectivas consoante os autores e nos faculta indicações preciosas de documentos de interesse, mas por outro, nos foi um pouco infrutífera dada a carência de material (insuficiência, inexistência, indisponibilidade) com a abordagem pretendida (a informação adquirida não se encontra desagregada ou é inadequada ao estudo). Esta limitação, funcionou como um entrave à análise de pormenor, dado não nos permitir aprofundar alguns aspectos de interesse para a pesquisa. Existe, de facto, um vasto manancial de bibliografia sobre o castanheiro e a castanha no âmbito da investigação agrícola, técnicas culturais, fitossanidade e fisiologia, porém, sobre a comercialização de castanha na Terra Fria Transmontana é escasso, o material bibliográfico publicado.

Nesta perspectiva, a primeira fase da dissertação, teve fundamentalmente origem em fontes de informação documentais, que permitiram a articulação de teorias e factos, de modo a proceder à definição de alguns conceitos inerentes ao objecto de estudo. Assim,

124 efectuou-se o enquadramento da comercialização, seguindo-se uma menção sumária sobre a qualidade e consumo dos produtos agrícolas numa perspectiva comunitária e identificaram-se os processos de conservação da castanha à luz da legislação ambiental, tendo em atenção os diferentes métodos utilizados. Integrou ainda esta fase, uma breve apreciação sobre a evolução do souto na segunda metade do século passado e fez-se a caracterização da fileira da castanha e da Terra Fria Transmontana e seus constrangimentos socio-económicos.

As fontes não documentais integram a informação produzida por meio de entrevistas para um assunto específico. Uma das características deste tipo de informação é o facto de ser confidencial e responder com precisão às questões colocadas. Greenwood (1965) e Helfer e Orsoni (1996) consideram que a maior vantagem das fontes não documentais, é que o investigador pode recolher ele próprio os factos, percepções, opiniões, e ao contrário da técnica documental, pode formular o tipo de questões adequadas ao seu estudo e recolher os dados pertinentes. As restrições prendem-se com o custo e a morosidade desta técnica. Assim, só se deve utilizar a entrevista como processo de recolha, quando os dados não estão disponíveis de outra forma.

Neste contexto, para complementar a técnica documental adoptada na primeira fase da investigação, recorreu-se, numa segunda fase, à recolha informação não documental. Esta técnica implicou a colecta de dados primários pelo contacto directo com os indivíduos relacionados com o objectivo de estudo. Este recurso foi imprescindível na análise do sistema de comercialização da castanha na Terra Fria Transmontana e sua cadeia de valor. A título de uma primeira abordagem a esta problemática, foi efectuado um levantamento de dados em apenas um concelho, no âmbito de um projecto de investigação – Projecto PATAMAR: Identificação, Avaliação, Priorização e Valorização das Potencialidade Agrárias de Trás-os-Montes e Alto Douro30. Este projecto visou o estudo dos pares de concelhos Macedo de Cavaleiros, Vinhais e Vimioso (Terra Quente/Terra Fria/Planalto Mirandês). Na sequência deste projecto foi elaborada uma comunicação subordinada ao tema: Constrangimentos à Valorização de Produtos Agrícolas Tradicionais: O Caso da Castanha de Vinhais31

30 Financiado pelo PAMAF e executado para a DRATM, pelo Departamento de Economia e Sociologia da UTAD, durante o período de 1998-2001.

31 Por Alda Matos, Lúcia de Jesus e Chris Gerry, em 2001, no 1º Congresso de Estudos Rurais. Território, Agricultura e Desenvolvimento. UTAD. Vila Real.

125 Numa segunda abordagem e na certeza de não existirem métodos e técnicas ideais que contemplem uma análise científica total, foram efectuadas entrevistas aos agentes de comercialização de castanha, que nos permitiram elaborar uma descrição integrada do estudo. Foram ordenados os dados resultantes das entrevistas, com a finalidade de obter a compreensão do fenómeno de modo a identificar, descrever, enquadrar e relacionar os factos recolhidos e seleccionados de acordo com o nosso objectivo. Neste contexto, foi apresentado o perfil dos agentes de comercialização e suas estratégias na transacção da castanha, desde a produção aos mercados de destino e aplicou-se à fileira da castanha, embora de uma maneira crítica, a chamada análise SWOT, a fim de se avaliarem as suas forças, oportunidades, fraquezas, ameaças e a competitividade da fileira. Foi também nesta fase que se teceram as conclusões do estudo.

Segundo Morin (1984), a entrevista em profundidade examina todas as ramificações de uma dada conjuntura, podendo definir-se como um encontro verbal e de carácter interactivo entre o investigador e o entrevistado. De acordo com o mesmo autor, na entrevista intensiva com perguntas abertas, o entrevistado tem grande liberdade no contexto das perguntas que lhe são feitas, tornando-se extremamente ricas as suas respostas. Para Kotler e Armstrong (1993), as questões abertas são mais reveladoras que as questões fechadas na medida em que os entrevistados não ficam limitados nas suas respostas, sendo especialmente úteis em pesquisas exploratórias, nas quais o pesquisador deseja descobrir o que as pessoas pensam, em vez de determinar quantas pessoas pensam de uma determinada forma. Para estes autores, as questões fechadas, pelo contrário, contêm respostas mais fáceis de interpretar e ordenar. Estas reflexões metodológicas serviram para nos situar no “como” e “a quem” fazer as entrevistas. Neste sentido, foram efectuadas entrevistas em profundidade aos produtores de castanha, associação de produtores, ajuntadores, armazenistas-exportadores e “magusteiros”, com o auxílio de dois guiões semi-estruturados em questões abertas (ver Anexo III). Nestas entrevistas, foi apenas utilizado o lápis e o papel para a recolha de informação. As entrevistas foram integralmente executadas pela própria, a investigadora – aos produtores, no segundo semestre de 2001 e aos intermediários, no primeiro semestre de 2002. Cada entrevista ao produtor prolongou-se por cerca de uma hora a uma hora e meia e ao intermediários, por cerca de duas a três horas.

126 No período em que foi recolhida a informação secundária32 e no período em que decorreram as entrevistas ao produtor, a moeda corrente no nosso país era o escudo. Assim, para evitar a presença de dupla moeda, foi esta a adoptada ao longo de toda a dissertação.

Sempre que possível, é desejável que o local permita a identificação das circunstâncias em que o sistema analisado se desenrola (Beebe cit. in Pereira 1992:42). A entrevista deverá ocorrer preferencialmente no local de trabalho do inquirido, e como é particularmente do interesse do investigador, deve-lhe ser dada a opção da marcação da hora e local de entrevista. Este é um aspecto muito importante na relação entrevistador-entrevistado que traz vantagens a ambos, pois para além do entrevistado se sentir mais confiante no seu ambiente de trabalho, pode, caso seja necessário, expressar exemplos práticos do âmbito da pesquisa. Para o investigador, é particularmente importante que a entrevista se efectue no local de trabalho, pois permite-lhe observar e contactar directamente com a situação real estudada. Embora tenhamos que reconhecer que esta não é condição sine qua non para o bom resultado da entrevista, quase todos os nossos respondentes elegeram como local de entrevista o seu local de trabalho, nomeadamente, nas explorações agrícolas, na associação, nos armazéns, nos escritórios ou nos restaurantes e nas suas casas.

Efectuaram-se quatro pré-testes junto de dois produtores e dois armazenistas-exportadores (um destes incorpora também a transformação de castanha na sua actividade de AE) com vista a melhorar a qualidade e pertinência das questões propostas, no sentido da obtenção de informação concisa e rigorosa. Após a reelaboração dos guiões, as entrevistas aos produtores sucederam-se até se considerar um certo esgotamento na variedade das respostas e situações. As questões foram colocadas directamente aos chefes da exploração agrícola no caso dos produtores (houve casos em que outros elementos do agregado familiar também participaram) e ao empresário ou ao responsável pela comercialização da castanha, no caso dos AE.

A elaboração dos guiões de entrevista foi posterior à recolha de material bibliográfico relativo à fileira, de modo a proporcionar uma visão mais próxima da realidade socio- -económica a explorar. O objectivo das entrevistas foi o de captar o modo de transacção de castanha e sua cadeia de valor, por isso, as questões centraram-se na actuação dos AE e nas

32 Referimo-nos principalmente aos dados do INE recolhidos em 2001, que no nosso trabalho remontam à segunda metade do século XX.

127 suas relações com os outros elos da cadeia. Assim, como estas relações se estendem a múltiplos elos da cadeia de comercialização, houve necessidade os incluir.

A comercialização compreende todo um processo que tem início no momento em que o agricultor toma a decisão de produzir um produto com a finalidade de o vender, e neste processo intervêm inúmeras operações desde a colheita, à desinfecção até ao transporte e distribuição final. Neste âmbito, o guião de entrevista ao produtor33 foi elaborado com o objectivo de recolher informação mais directamente ligada à fase de expedição de castanha. Não foi nosso propósito efectuar uma análise exaustiva e rigorosa sobre a estrutura física da exploração agrícola, mas sim, recolher elementos que afectam a racionalidade do agricultor na produção (como por exemplo a selecção dos porta-enxertos) e transacção da castanha, e as repercussões desta racionalidade a jusante da produção. Assim, com o guião de entrevista ao produtor, pretenderam-se captar os elementos que a seguir se enunciam:

- estrutura física e nível tecnológico (selecção das cultivares para plantio, características das plantações e colheita);

- investimentos realizados no âmbito da estrutura física da exploração (alteração da dimensão da área de exploração);

- ajudas provenientes do Estado ou de Programas Comunitários (Medidas Agro- -ambientais, subsídios);

- recursos humanos da exploração (grupo etário, nível de instrução, formação profissional, tipo de mão-de-obra, grau de associativismo);

- produção e distribuição (quantidade produzida, destinos da produção, preços de venda, políticas de venda, mais-valias, características das variedades);

- aspectos relativos ao meio envolvente transaccional (fornecedores, concorrentes) que afectam a competitividade da exploração agrícola.

Casualmente, foi necessário aclarar determinados aspectos pontuais que ficaram menos explícitos no acto da entrevista, conseguido posteriormente, por via de entrevista complementar.

128 O guião de entrevista à Associação de Produtores de Castanha da Terra Fria Transmontana34 teve como finalidade recolher elementos gerais sobre o funcionamento da Associação e sobre o grau de participação dos membros na actividade da mesma. Pretendeu-se igualmente efectuar a recolha de informação junto do Agrupamento de Produtores para a comercialização de castanha DOP. Este Agrupamento foi constituído por iniciativa do presidente da APCNT e de alguns dos seus membros, com a finalidade de comercializar a castanha certificada dos sócios. Nesta conformidade, foi nossa intenção saber em que medida os produtores agrupados se fixaram a jusante para escoar a castanha por meio dos circuitos curtos e quais os benefícios que daí resultaram para o elo da produção. Porém, este Agrupamento encontra-se inactivo. Além da consulta e análise de dados estatísticos e documentais, a pesquisa incidiu também na obtenção de dados não publicados oficialmente, expressamente os elementos constantes nos processos de candidatura dos agricultores às Medidas Agro-ambientais, que nos foram facultados pela APCNT. A referida Associação facultou-nos ainda elementos sobre a incidência das doenças do cancro e da tinta do castanheiro nos concelhos de Bragança e Vinhais.

No elo da comercialização foram recolhidos por entrevista inúmeros dados qualitativos e quantitativos. Na perspectiva analítica, o objectivo principal destas entrevistas foi o de clarificar o papel e a dinâmica dos elementos que efectivamente comercializam a castanha. Para tal, recolheu-se informação inerente à interligação destes elos com todos os outros que se situam a montante e a jusante.

O guião de entrevista35 pretendeu captar os seguintes elementos:

- identificação da empresa, dados pessoais e outras actividades do empresário;

- comercialização (compra, tipo de fornecedores, aspectos relacionados com as variedades comercializadas, armazenamento, tipo de desinfecção ministrada à castanha, locais de venda, tipo de clientes, nível tecnológico da empresa, valor acrescentado, o transporte do produto, itinerários comerciais, expedição e mercados geográficos, evolução dos mercados e política de distribuição, concorrência e industrialização),

- competitividade (encargos e rendibilidade);

- envolvente (aspectos relativos à fileira e à comercialização).

34Anexo III-B. 35Anexo III-C.

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Foi necessário recorrer a uma entrevista complementar a cada uma das unidades agro- -alimentares para coligir dados referentes ao destino da castanha transformada internamente. Esta acção deveu-se ao facto de terem surgido algumas dúvidas no tratamento dos dados, originadas pela imprecisão com que foi colocada a questão aos inquiridos. Assim, foi solicitado às unidades industriais o preenchimento de um quadro elaborado para o efeito, que foi posteriormente incluído no ponto 5 do respectivo guião. Ainda no âmbito destas unidades, foi importante averiguar em que medida a industrialização da castanha é um complemento da comercialização ou se estamos perante verdadeiras agro-indústrias.

Sendo dominante a informação qualitativa, foi efectuada a análise de conteúdo, pela selecção e organização racional de várias categorias. Com base nas regularidades que emergiram da recolha dos dados, foi possível, traçar um perfil caracterizador dos agentes de comercialização e proceder aos registos interpretativos dos seus comportamentos, tendo em conta as dinâmicas e articulações que se potenciam entre os distintos elos da cadeia de valor.

No âmbito da informação quantitativa, depois de sistematizados e ordenados os resultados, procedeu-se à construção das bases de dados necessárias à elaboração de quadros, gráficos e figuras para melhor percepção, leitura e interpretação dos resultados.

A delimitação territorial do nosso estudo, concelhos de Bragança e Vinhais, como área geográfica de observação obedeceu aos seguintes critérios:

- serem dois concelhos com elevado peso, a nível nacional, na cultura do castanheiro (o concelho de Bragança detém a maior área de souto e o maior número de explorações do país e o de Vinhais ocupa o segundo lugar relativamente à área de castanheiros e o terceiro relativamente ao número de explorações36);

- elevada importância económica do fruto com a estreita dependência de um considerável número de famílias, no contexto da região em apreço;

- concentração de um elevado número de agentes de comercialização.

No que respeita às notas escritas retiradas em trabalhos de campo, uma das normas apontadas por Patton cit. in Pereira (1992:26-27) prende-se com a presença de citações efectuadas pelos próprios inquiridos no trabalho de investigação, transcrevendo as suas

130 palavras, dando-lhe o sentido exacto e pessoal que lhe foi atribuído no momento pelo observador e descrevendo em pormenor as acções observadas. O autor releva a importância desses registos porque (...) as observações e as palavras dos entrevistados podem nunca mais ser captadas, precisamente da mesma maneira, mesmo quando é possível repetir essas observações e entrevistas. Elas são matéria preciosa e devem ser tratadas como tal. Assim, na organização de todo o processo de análise de dados, teve-se em conta a atitude e as motivações dos agentes com influência na comercialização de castanha e as relações sociais que se estabelecem entre eles. Foram transcritas algumas citações com as palavras exactas dos entrevistados por nos parecer pertinente fazer ressaltar algumas situações que não se conseguiriam expressar se não fossem reproduzidas no modo original. Estas declarações foram integradas no texto, por vezes de uma forma mais generalizada, por figurarem, apenas nestes casos, como factos representativos do modo de agir do todo.

A partir das fontes de informação documental e não documental, foi efectuada a análise de conteúdo, técnica de tratamento de informação privilegiada para organizar e classificar dados recolhidos de forma controlada e sistematizada com a vantagem de permitir trabalhar sob entrevistas abertas. Esta análise permitiu identificar os distintos elos do sistema de comercialização, descrever os perfis dos agentes integrantes na cadeia de valor, analisar as estratégias dos vários intervenientes na compra e venda de castanha e as mais- -valias geradas/retidas em cada elo, distribuir os agentes por vários elos da cadeia de valor, identificando os problemas comuns, permitindo assim a análise externa e interna da fileira. Assinaladas as técnicas passamos a identificar os indivíduos a inquirir.