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FRIA TRANSMONTANA

2. O Negócio da Castanha

2.3. Organização da Produção no Armazém do Grossista

2.3.1. Limpeza e Tratamento da Castanha para o Mercado Interno e Externo

2.3.1.1. Exigências ao Nível do Tratamento da Castanha

Segundo reunião promovida pela Comissão Europeia em Lisboa em Julho de 2002, onde estiveram presentes três dos grossistas entrevistados, está em estudo uma solução para a resolução do problema que afecta a qualidade do ambiente em Portugal e no mundo, pela utilização na actividade agrícola de produtos químicos (neste caso particular o brometo de metilo) perigosos à qualidade de vida e ao ambiente.

O que tem estado a suscitar problemas relativamente à utilização de brometo de metilo em Portugal, é que qualquer agricultor ou armazenista pode usar indistintamente o produto, sem mesmo conhecer as dosagens a utilizar. Perante este facto, a situação pode tomar proporções desastrosas em termos ambientais!

Os valores de utilização de brometo de metilo recolhidos em Portugal, no dizer dos três AE presentes na reunião, apontam para uma utilização média anual de 200 toneladas, não incluindo o que é utilizado em estufas, o que é notoriamente exagerado. Este tipo de produtos deveria ser usado por um técnico ou uma empresa credenciada, no entanto, os exportadores garantem que conhecem as quantidades a utilizar e que globalmente são poucos a aplicá-lo, enquanto que os agricultores são muitos. É disto um bom exemplo que

54 Para os países geograficamente mais afastados é necessário desinfectar a castanha para destruir as larvas de carpocapsa

170 foi debatido na reunião e nos foi relatado por um dos AE presentes: se um exportador no expurgo da castanha exportada gasta 1 tonelada no ano todo, que sejam 10 ou 15 exportadores grandes (que não são!), não é possível consumirem-se 200 toneladas no país. Portanto, não é com certeza o tratamento efectuado à castanha o responsável por tais níveis de consumo de brometo de metilo em Portugal!?! Estas grandes dosagens são utilizadas em estufas, principalmente nos morangos, tomate e outros. As entidades governamentais em vez de se preocuparem com o brometo de metilo na castanha, devem preocupar-se com aspectos mais importantes como a tinta e o cancro, isso sim!... Eu até já disse ao Ministro para ir comprando moto-serras...

Numa perspectiva diferente, os utilizadores dos métodos naturais de desinfecção de castanha alegam que os AE que expurgam o fruto com brometo de metilo não conhecem assim tão bem a técnica de fumigação. Mediante a quantidade de castanha a expurgar e o espaço físico onde estão localizadas é necessário calcular muito bem as dosagens a utilizar e o tempo de exposição das castanhas ao químico. Este trabalho não é assim tão simples e deve ser efectuado por um técnico especializado. O único controlo existente é efectuado à posteriori pela DRATM que não visualiza a execução do trabalho. Com este processo – retorquiu um dos utilizadores do método de imersão – são expurgadas castanhas com o bicho lá dentro, podres e vendem na mesma. Matam o bicho mas vendem-na com ele, vai tudo. As perdas de armazém são assim muito menores.

Ficou assente na reunião, segundo os nossos respondentes, que até finais de 2004, não haverá entraves por parte da UE, à utilização de brometo de metilo na actividade agrícola em geral. Contudo, a partir de Janeiro de 2005 e por um período aproximado de 10-15 anos, apenas será permitida a utilização de brometo de metilo no expurgo da castanha, sendo interdita a sua aplicação noutros produtos agrícolas. Posteriormente, entrarão no mercado produtos fitossanitários alternativos para o mesmo efeito. Neste momento, em teoria, foi restringida a sua utilização nas culturas agrícolas, estando atribuída a Portugal uma quota de Bruxelas (Reg. CE nº2037/2000 de 24 de Junho) que os importadores de brometo de metilo não poderão exceder.

Neste contexto, e no caso da castanha, a curto prazo não haverá alterações. No entanto, com o decorrer dos acontecimentos, a atitude dos AE perante a utilização deste produto tem vindo também a modificar-se para uma possível alteração do método de tratamento da castanha. Face ao questionamento sobre as intenções dos AE se prepararem para as novas exigências castanhas exportadas para estes países.

171 dos mercados (interno e externo) se o método de expurgo com brometo de metilo fosse interditado na desinfecção da castanha, recolhemos dados que nos levam a afirmar que seis AE estariam dispostos a realizar investimentos em material e equipamento necessário à esterilização por imersão. Destes seis AE, três, já estão incondicionalmente rendidos ao método, como fica claro pelas palavras de um deles: embora 90% das minhas vendas sejam para a Europa e 10% para o Brasil, pretendo fazer a esterilização, pois os clientes europeus pedem a castanha isenta de químicos, vou investir mesmo sem que a legislação me obrigue. Os restantes três, investiriam na esterilização por ser uma imposição de um normativo legal para a sua continuidade no sistema de comercialização de castanha, embora prefiram utilizar a fumigação (Quadro VI.14).

Quadro VI.14: Métodos de Desinfecção de Castanha Utilizados pelos AE e Suas Intenções no Caso de uma Mudança Legislativa.

AE Brometo de Metilo Via Húmida

2001 1   1  10  - 1 - - Com Mudança Legislativa 8 55 - 5  -

Fonte: Dados recolhidos directamente.

O tratamento pelo método de imersão exige grandes investimentos em maquinaria, do mesmo modo, os custos em know-how são muito avultados. Como sabemos, dois dos AE já têm na sua posse os equipamentos como forma de enfrentar uma mudança na legislação portuguesa face à utilização do brometo de metilo. Um já se encontra perfeitamente familiarizado com a técnica de esterilização e integra pessoal com formação adequada ao tratamento do produto afecto a estas operações. Daí, podermos afirmar que possui o know- -how necessário para a utilização correcta dessa tecnologia. O outro encontra-se numa fase de adaptação, tendo vindo a preparar-se nesse sentido desde o ano 2000.

Na perspectiva deste último AE, a esterilização por via húmida tem duas vantagens e duas desvantagens. Relativamente às desvantagens, refere o aumento do risco de humidade do fruto e a morosidade do método. Quanto às vantagens, a primeira é que mata o bicho, que é condição fundamental, a segunda, é que este método elimina imediatamente uma

55 Dois já possuem o equipamento, três já têm intenção de investir no equipamento mesmo que a legislação os não obrigue e três apenas investiriam para continuar na actividade.

172 percentagem de 10 a 20% de castanha furada, sem peso, que vem à tona da água e que o mercado viria a rejeitar.

Como este AE intervém no mercado interno com um peso de 40% do total da castanha que comercializa, considera que essa quebra no produto, mesmo sendo excessiva, acaba por ser proveitosa pois traduz-se em ganhos de mercado.

O mercado nacional está a tornar-se muito exigente e este operador não pode arriscar a qualidade dos seus frutos. Os hipermercados nacionais absorvem uma quantidade considerável das suas vendas e exigem frutos sãos. Desta forma, as perdas ficam no armazém, mas, em contrapartida, os clientes agradam-se. Do mesmo modo, as reclamações do mercado externo relativamente às perdas verificadas no destino, foram também diminuindo, sendo hoje reconhecido a nível interno e externo pela qualidade dos seus frutos.

Actualmente, este AE só utiliza o brometo de metilo quando há muita pressão dos clientes para o cumprimento dos prazos de entrega, pois lidando com prazos de comercialização tão curtos, não consegue processar todas as encomendas atempadamente só com uma linha de esterilização por via húmida56. Assim, mantém dia e noite em simultâneo os dois processos a funcionar nos períodos mais críticos da campanha de comercialização.

Relativamente aos restantes cinco, em caso algum efectivariam tais investimentos dados os altos montantes requeridos e a concomitante baixa de rentabilização que iriam obter. As opiniões dos entrevistados que partilham desta opinião estão associadas à inexistência de ajudas ao financiamento. Alegam que “a ser obrigados” a efectuar tal investimento, prefeririam constituir uma unidade de transformação para descasque e congelação do fruto porque rentabilizariam a actividade durante todo o ano. Nunca fariam tal investimento só para vender castanha numa época tão curta. Além disso, o mercado brasileiro tem dado problemas com os pagamentos, e sendo este um investimento tão avultado, seria muito arriscado efectuá-lo praticamente para vender uma boa parte da sua castanha num país que não oferece garantias na assunção dos seus compromissos.

Como vimos, as opiniões sobre a utilização de brometo de metilo ou a via húmida no tratamento da castanha variam muito no seio dos AE. Referem alguns utilizadores de

56 O nosso inquirido refere que este processo permite o tratamento de apenas 500 Kg de cada vez, já no processo de expurgo com brometo de metilo não existe limite para as quantidades a utilizar no tratamento.

173 brometo de metilo, que o método de esterilização preconizado pelos italianos está associado a uma estratégia concorrencial própria para retirar protagonismo à castanha portuguesa, pelo facto de relegar para segundo plano a fumigação com brometo de metilo. Acrescentam ainda os grossistas que os fabricantes italianos destes equipamentos só apresentam vantagens ao valorizá-los pois têm que os vender. Pelo contrário, os próprios operários italianos que se ocupam da esterilização do fruto por via húmida, referem que depois de tratadas por este processo, as castanhas ficam com um aspecto baço e apagado. Algumas desvantagens apontadas pelos AE pela utilização deste método estão relacionadas com a sua ineficácia às eventuais altas temperaturas suportadas pelo produto durante o transporte para o Brasil, que propiciam um bom ambiente para o desenvolvimento da larva; com as quebras de armazém, que são bastante superiores e com a morosidade do método, pois como os AE tratam muitas toneladas de uma só vez, é mais rápido e cómodo o expurgo com brometo de metilo.

Assim, reforçam estes grossistas que o único método eficaz é a fumigação com brometo de metilo e que não é prejudicial para os consumidores do fruto se for usado na dosagem adequada. Portanto, tudo aponta para que estes operadores continuem a efectuar o tratamento da castanha pela via da fumigação com brometo de metilo enquanto a legislação o permitir. Os motivos apontados prendem-se com a rapidez, o baixo custo, o menor consumo de mão-de-obra e de energia. Assim, configura-se-lhes um método ímpar em termos de eficácia, não proibido por lei e de menor custo.

O que os AE não estão a vislumbrar é que no mercado europeu, como de uma maneira geral no resto do mundo, consumidores, empresários e governos também já vão exigindo os métodos naturais no tratamento dos produtos alimentares! No Canadá é mesmo norma interna importar apenas castanha tratada por métodos naturais, pelo que o tratamento com brometo de metilo está interdito. Mudanças externas que impulsionem a compra de máquinas de esterilização poderão fazer com que as empresas que apostem neste processo, transformem as fraquezas em forças agarrando as oportunidades do meio envolvente pela transacção de um produto tratado com processos naturais.

174 da castanha em Portugal, dez utilizam57 o expurgo com brometo de metilo sempre que necessário e um não utiliza qualquer processo de desinfecção.

3. Os Clientes

Do mesmo modo que o AE possui fornecedores fixos e eventuais, também os seus clientes são fixos ou eventuais. Assim, onze AE possuem quase todos os clientes fixos e dois, pelo contrário, possuem quase todos os clientes eventuais. Estes últimos clientes vão circulando por todos os armazenistas sem qualquer empatia.

Uma grande parte dos clientes fixos mantém uma relação de confiança de longa data com os AE, existindo afinidades e relações de amizade, palavra e honra que se foram solidificando ao longo dos anos. Há clientes que se mantêm fiéis ao fornecedor há mais de vinte anos.

Antigamente no comércio havia palavra, dizem os AE mais idosos, os negociantes tinham um nome, adquiriam relações de estima após as trocas comerciais e compartilhavam-se almoços e jantares com as famílias. Hoje, deixou de haver aquela filosofia de tradição, os antigos negociantes foram vendendo as empresas, entraram para a reforma ocupando outros o seu lugar58.