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Excurso preliminar: a investigação qualitativa em educação e sua importância nesta pesquisa

CAPÍTULO III: A BUSCA DE UM CAMINHO: CONSTRUÇÃO DO QUADRO TEÓRICO METODOLÓGICO

3.1. Excurso preliminar: a investigação qualitativa em educação e sua importância nesta pesquisa

Nos dois primeiros capítulos abordamos a questão da formação e a ação dos professores de infância na atualidade, colocando em destaque especificamente a situação de educadores de Aveiro e do Rio de Janeiro. Para tal, trabalhamos com o subsídio teórico de diversos autores de Portugal e do Brasil e outros comentaristas de relevância internacional. Abordamos a situação geral dos docentes no panorama da atualidade, num mundo globalizado e com a eclosão dos meios virtuais na informação e especificamente na educação. Além disso, realizamos um histórico da profissão docente, em Portugal e no Brasil, analisando especificamente o aparato legal que regulamentou o desempenho dos educadores de infância. Após essa abordagem teórico conceitual, tornou-se indispensável analisarmos os depoimentos dos educadores de infância. Com esse intuito, foi imprescindível a ida ao campo, o contato direto com as narrativas e depoimentos desses professores. Então, após a trilha teórica e conceitual percorrida nos dois primeiros capítulos, agora, neste terceiro capítulo, traçamos a metodologia com que, na fase conclusiva desta tese, abordaremos esse material factual, isto é, vamos mostrar os passos metodológicos, adotados no curso da pesquisa qualitativa, com que sistematizamos no último capítulo nossa ida ao campo. Após esse percurso metodológico, nos encontramos em condições de obter ponderações precisas e rigorosamente embasadas sobre a questão essencial da tese: o discurso sobre a formação e ação dos professores de infância em Aveiro e no Rio de Janeiro.

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Segundo Bogdan & Biklen (1994), só no final dos anos 1960 o desenvolvimento da investigação qualitativa passou a ser empregada com mais frequência nas diferentes áreas das ciências humanas e sociais. E no campo da educação, apesar de ter sido adotada apenas recentemente, ela revela ‚uma longa e rica tradição‛ (p. 19).

Em educação a investigação qualitativa assume diversas formas e pode ser empregada em múltiplos contextos. A abordagem qualitativa não visa responder a questões prévias totalmente definidas ou testar hipóteses formuladas com antecedência, mesmo que os que empregam esta metodologia possam vir a focalizar questões específicas quando estão fazendo a recolha dos dados (Bogdan & Biklen, 1994). O importante para o investigador qualitativo não é partir de generalizações abstratas e de interpretações apriorísticas, mas sim procurar compreender os significados e sentidos singulares presentes na fala de cada entrevistado.

Bogdan & Biklen (1994) destacam cinco características da pesquisa qualitativa; essas características são, no nosso entender, essenciais para a investigação em educação e justificam a escolha dessa metodologia. Elas são: i) o investigador tem um papel essencial na pesquisa; a fonte directa de dados é o contexto, o local onde os acontecimentos emergem, e quando esses dados estão vinculados diretamente à vida dos sujeitos entrevistados, torna-se necessário saber em que circunstâncias históricas acontecem; ii) ela é descritiva e o investigador qualitativo não pretende reduzir as muitas páginas das narrativas apenas a uma fria quantificação, mas analisa-as em toda a sua riqueza, tendo a palavra escrita importância particular no registro dos dados e na análise dos resultados; iii) o importante para o investigador, na pesquisa qualitativa, não é o resultado, o produto final, mas sim o processo, o percurso de encontros com entrevistados, a troca com eles, isso que tem sido particularmente fecundo quando se trata da investigação educacional; iv) os investigadores

qualitativos tendem a analisar os dados de forma indutiva, partindo do que é singular, particular, para chegarem a conclusões gerais, não antecipando ponderações importantes antes de fazerem a investigação; v) o significado tem importância vital para os participantes, que são considerados protagonistas essenciais da investigação; o rumo da pesquisa está sintonizada com os significados que esses participantes atribuem aos fatos narrados, ou às percepções singulares que manifestam durante as entrevistas.

A investigação em curso pretende que o pesquisador estabeleça um contato direto com os ambientes da pesquisa, levando-o a ter uma percepção acurada dos contextos dos entrevistados - o bairro, a família e principalmente as escolas em questão nesta tese, de Aveiro e Rio de Janeiro. É fundamental, sempre que se fizer necessário, recorrer à observação empírica para poder situar e contextualizar o nosso objeto de estudo, favorecendo uma análise mais precisa do âmbito educacional dos educadores de infância abordados nessa pesquisa. Portanto, tal como aponta Bogdan, R. & Biklen (1994), os investigadores qualitativos se interessam mais ‚*...+ pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos‛. Assim, partindo de uma análise indutiva, tenta-se construir ‚abstrações *<+ | medida que os dados particulares que foram recolhidos se vão agrupando. Uma teoria desenvolvida deste modo procede de ‘baixo para cima’ (em vez de ‘cima para baixo’), com base em muitas peças individuais de informação recolhida que são inter-relacionadas‛ (p. 49). Os autores em tela propõem um conceito de análise qualitativa que orientará os rumos de nossa pesquisa de campo; seguindo essa metodologia será possível implementar as perspectivas teóricas que nos ajudam a compreender o ‚sujeito- objeto‛, não se tratando de ‚montar um quebra-cabeças cuja forma final conhecemos

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de antemão. Está-se a construir um quadro que vai ganhando forma à medida que se recolhem e examinam as partes‛ (Bogdan & Biklen, 1994, p. 50).

O processo de investigação aqui adotado consistiu, por conseguinte, na observação direta dos fatos e dos ambientes em estudo (uma escola de Aveiro e outra do Rio de Janeiro), considerando todo um conjunto de fenômenos que nos colocarão frente a questões importantes de nossa tese e que poderão suscitar novas interrogações, inicialmente não previstas, até porque o investigador que se apóia na metodologia de cunho qualitativo não parte de teses pré-concebidas antes de efetuar a sua pesquisa (Minayo, 1992; Cortesão & Stoer, 2005). Ele está atento, como já foi dito, aos significados que os entrevistados outorgam às suas próprias experiências. Com efeito, o ‚significado é de import}ncia vital na abordagem qualitativa. Os investigadores que fazem uso deste tipo de abordagem estão interessados no modo como diferentes pessoas dão sentido |s suas vidas‛ (Bogdan & Biklen, 1994, p. 50).

Aqueles que se dedicam à investigação qualitativa em educação estão com frequência interpelando, questionando, os sujeitos de investigação porque pretendem perceber aquilo que tais sujeitos experimentam, o modo como eles interpretam as suas experiências, bem como a forma segundo a qual eles próprios outorgam significados ao mundo social em que vivem. Assim sendo, é legítimo inferir que a investigação qualitativa consiste em uma espécie de diálogo entre investigadores e os sujeitos investigados, tentando compreender o ponto de vista destes. Essas perspectivas singulares serão o eixo, o pilar de todo o estudo. Mesmo que o investigador possa tecer as suas próprias interpretações, tingidas sem dúvida pela sua própria subjetividade, algo que é inevitável, deve sobretudo empregar de forma rigorosa a sua base conceptual, mantendo uma análise consciente. A proposta desta modalidade de investigação educacional pretende estudar objetivamente, os estados subjetivos

focados na pesquisa, mas visando | construção de um ‚conhecimento e não o de dar opiniões sobre determinado contexto‛ (Bogdan & Biklen, 1994, p. 67).

A investigação qualitativa em educação constitui um terreno muito rico de produção de conhecimentos, capaz de lançar luzes sobre os próprios rumos das políticas educativas adotadas em determinado país e sobre o trabalho docente e sua inserção num horizonte histórico marcado por mudanças sócio culturais. Ela é uma ferramenta adequada para o estudo das representações da própria educação como campo de embate político. Na atualidade tal campo traduz diversas lutas políticas pelos direitos de cidadania, pelo acesso democrático à educação de qualidade. Nessas reivindicações, também focamos a reivindicação por uma educação de infância de qualidade, bem como outras disputas que identificam, conforme já se pode argumentar, a presença histórica de outras formas de avaliar e posicionar-se perante a globalização.