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O Exercício de um Direito

TEORIA GERAL DO CRIME E DA PENA FDUCP

6. O Exercício de um Direito

6.1. Direito e exercício do direito. Conceito e fundamentação da justificação

Exercício de um direito e crime são antíteses: onde há crime não há direito subjectivo, onde existe exercício de direito não é possível a prática de crime.

Direitos são poderes abstractos definidos por lei, modelos de comportamento permitidos ao titular, mas o exercício do direito é uma situação concreta, o comportamento ou facto que realiza o direito  o facto que consubstancia o exercício do direito é justificado, lícito, enquanto se contenha dentro dos limites que o demarcam.

O fundamento da causa de justificação está na valoração positiva feita pela ordem jurídica a respeito dos comportamentos que consubstanciem o exercício de um direito, ainda quando esse exercício possa por em perigo ou lesar efectivamente bens jurídicos penalmente tutelados – nas situações de conflito deve prevalecer o direito reconhecido, sob pena de o Direito entrar em conflito consigo mesmo.

Interpretação do art. 31º/2 al. b): exercício do direito abrange todas as situações em que a ordem jurídica atribui à pessoa uma faculdade de agir no interesse próprio ou de terceiro, seja um direito subjectivo, um direito potestativo, um poder/dever ou outra qualquer faculdade de agir.

6.2. Limites do Direito e Limites ao Exercício do Direito

Cada direito tem os limites da sua própria definição, ou seja os limites decorrentes das faculdades e outras situações jurídicas cujo conjunto integra o conteúdo do direito, desenhado pela lei ou pelo negócio jurídico.

Devido à impossibilidade de especificar os actos que formam o conteúdo do direito, a lei sentiu necessidade de estabelecer instruções quanto ao exercício do direito, ou seja directrizes sobre o modo como pode agir o respectivo titular:

 Visam orientar os respectivos titulares na determinação dos actos que lhes é lícito praticar

 Constituem válvulas de segurança contra a aplicação rígida e cega dos esquemas abstractos da lei

Limitações Específicas do Exercício do Direito: directrizes que respeitam a certas

espécies de direitos  a seu lado existem instruções genéricas, aplicáveis ao exercício de todo e qualquer direito e que representam também limitações ao exercício do direito (ex: abuso do direito (art. 334º CC). As limitações podem ser:

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Extrínsecas: decorrem de imposições de caracter genérico ou resultam de

colisão de direitos

6.3. O Abuso Do Direito (art. 334º CC)

Abuso do Direito: excesso dos limites genérico de um direito (boa fé, bons costumes e

o fim social ou económico desse direito).

Pressupõe a existência do direito, embora o titular exceda-se no exercício dos poderes que o integram. Existe uma utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse que exorbita do fim próprio do direito ou do contexto em que ele deve ser exercido.

No art. 334º do CC, existem três conceitos que fornecem o critério de determinação da legitimidade ou ilegitimidade do exercício do direito:

Concepções ético jurídicas dominantes na colectividade para determinar os

limites impostos à boa fé aos bons costumes:

Boa Fé: o exercício de um direito é ilegítimo quando o agente não agir

de boa fé, ou seja quando o titular do direito mais do que prosseguir um interesse seu, vise prejudicar outra pessoa.

Bons costumes: o exercício de um direito é ilegítimo quando o agente

não se conformar com as regras de convivência que, num dado ambiente e em certo momento, são comumente admitidas.

Juízos de valor positivamente consagrados na lei para determinar os limites impostos ao fim social ou económico do direito  cada direito possui uma

função instrumental, que justifica a uma atribuição ao titular e define o seu exercício; o titular do direito deve exercê-lo nos limites do seu fim económico e social, sendo que ultrapassadas essas fronteiras o exercício será abusivo, não sendo o facto conforme o direito.

6.4. Colisão de Direitos (art. 334º CC)

Se os direitos em conflito forem direitos iguais ou da mesma espécie devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito; se os direitos em conflito forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deve considerar-se superior  Limitação Externa (coexistência de direitos de outrem).

Problema: quando se trate de direitos da mesma espécie, o titular de um direito tem de ceder parte dos seus poderes para que o direito em colisão possa também produzir o seu efeito  a medida da cedência pode causar dúvidas.

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6.5. As denominadas limitações ético-sociais

Nomeadamente a propósito do direito de defesa, a doutrina discute a possibilidade da limitação dos direitos, especificamente quando constituam causas de justificação dos comportamentos típico-penais, pelas denominadas limitações ético-sociais.

Prof. Germano Marques da Silva: trata-se de limitações jurídicas, fundamentadas em razoes éticas, sendo expressão de tal o instituto do abuso de direito (abrangido pela clausula geral do art. 29º/2 da DUDH).

Quando o art. 29º/2 da DUDH refere ‘’justas exigências da moral, da ordem pública e do bem estar’’, tal significa, segundo o Prof. Jorge Miranda

 ‘’justas exigências’’: apelo a um conceito de justiça ou a uma ponderação ética avaliadora dos preceitos de direito positivo que, em nome da moral, da ordem pública e do bem estar envolvam limites dos direitos.

 Ideia de proporcionalidade nas suas três vertentes – só são admissíveis os limites que sejam necessários, adequados e proporcionais em face dos princípios constantes da declaração

 A ‘’moral’’ tem de ser apercebida enquanto moral social e moral pública, não se identifica com uma moral religiosa.