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Teoria Geral Do Crime e Da Pena - Apontamentos

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TEORIA GERAL DO CRIME E DA PENA

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Maria Luísa Lobo – 2011/2012

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Capítulo I – Introdução à Teoria do Crime I - Noção Geral de Crime e Sua Análise

Conceito de Crime: o CP vigente não define o que seja crime, ao contrario do que

sucedia nos Códigos de 1852 e 1886, que o definam enquanto facto voluntário declarado e punível pela lei penal.

Crime, além de fenómeno social, é um facto, um ‘’feito’’ de uma pessoa, um comportamento humano, uma conduta, não havendo dois que sejam iguais. Substancialmente, o crime é um facto voluntário que lesa ou põe em perigo de lesão

bens jurídicos protegidos pela ordem jurídica  visão insuficiente para a dogmática

penal, necessitando de ser completada por uma definição mais analítica. Deste modo, crime enquanto facto típico, ilícito e culposo, punível.

O Crime é um comportamento humano voluntário, mas para que tal se possa qualificar como criminoso é necessário que:

 O facto seja típico  O facto seja ilícito  O facto seja culpável  O facto seja punível.

▲ Os pressupostos das medidas de segurança têm de ser típicos, sendo que o fundamento da sua aplicação reside na perigosidade do agente (≠ pressuposto da punição que é a culpa) – art. 91º e ss.

Teoria do Crime: parte da ciência do direito penal que se ocupa de explicar o que é o

crime, ou seja o que é o facto humano relevante para o Direito Penal e quais as características que o facto deve ter para poder ser qualificado como crime. Esta explicação visa tornar mais fácil a averiguação da presença do crime em cada facto humano concreto.

Elementos do Crime:

1. Facto Humano (sinónimo de acção humana positiva ou omissiva, de conduta e de comportamento): qualquer comportamento humano, comissivo ou omissivo, que se tenha produzido sob o domínio da vontade do seu agente. O facto, enquanto elemento do crime, é sempre um feito da vontade do seu autor, um produto da sua vontade.

2. Tipo enquanto descrição abstracta que a lei faz do facto, expressão da conduta. A Tipicidade enquanto subsunção, na adequação de uma conduta da vida real a um tipo legal de crime. Sendo o tipo um modelo de comportamento proibido, abrange ao descrever a conduta proibida, o sujeito da acção, ou seja o agente do crime, a acção, os seus elementos objectivos e subjectivos, e se for caso, o objecto da acção bem assim como o resultado, com a respectiva relação de causalidade.

TEORIA GERAL DO CRIME E DA PENA – PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA

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 O tipo legal desdobra-se em vários tipos (tipo de ilícito, tipo de culpa, tipo de justificação e tipo de desculpa) – da conjugação de todos resulta a norma penal incriminadora.

3. Ilicitude ou Antijuridicidade: contrariedade entre o facto e o ordenamento jurídico. A Ilicitude penal é a contrariedade do facto humano ao ordenamento penal.

4. Culpabilidade ou Censurabilidade: juízo de reprovação jurídica ao agente por ter perpetrado o facto ilícito. Tem por conteúdo a realizado do facto ilícito, constituindo um juízo axiológico negativo sobre o agente por ter praticado o facto ilícito.

5. Punibilidade: consequência lógico-jurídica da prática de um facto típico, ilícito e culposo. Em regra, todo o facto típico, ilícito e culposo é punível, mas não necessariamente – a lei, por várias razões, pode exigir algo mais (condição de punibilidade) para que à prática do crime se siga como consequência uma sanção, uma pena. Não se verificando a condição de punibilidade, o crime existe mas não é punível. Pode suceder ainda que embora o facto seja típico, ilícito e culposo, o legislador entenda que o facto não merece punição (art. 74º do CP – dispensa de pena).

Estrutura Essencial e Estrutura Acidental do Crime

 Elementos Essenciais do Crime: aqueles que a lei considera indispensáveis para a sua existência.

 Elementos Acidentais: aqueles que fundamentam a sua quantidade ou gravidade.

A Ilicitude e a Culpabilidade são juízos de valor não susceptíveis de graduação, sendo o facto objectivamente ilícito é mais ou menos grave, como mais ou menos grave é o facto culpável.

 Ilicitude contrariedade à lei: facto é ou não ilícito

 Culpabilidade é a censurabilidade: o facto é ou não censurável

Circunstâncias: corresponde às características acidentais, sendo que a maior ou menos gravidade do facto depende de tais.

Ex: numa ofensa corporal, desde que haja ofenda não justificada o facto é ilícito, mas

a intensidade da ofensa corporal – a gravidade da lesão – pode variar; também na intensidade da vontade, no dolo (dolo intenção ou dolo eventual); na negligência (simples ou grosseira), desde que voluntário e não desculpável o facto é censurável, culpável, mas o grau e censura do comportamento pode também variar em razão dos motivos e da importância dos deveres (erro sobre a ilicitude censurável – art. 17º/2; estado de necessidade atenuante – art. 35º/2).

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Ilicitude Formal e Material

 Ilicitude Formal: um facto humano será ilícito ou antijurídico sempre que se apresente em oposição à ordem jurídica estabelecendo com esta uma relação de contraposição. Trata-se da propriedade de certos comportamentos humanos, seja sob a forma de acção, seja de omissão, de se oporem, de ser contrários à ordem jurídica.

 Ilicitude Material: toma em consideração, tal como a Ilicitude Formal, a lesão do bem jurídico. é o ponto de referencia na criação dos tipos legais e sua aplicação aos casos concretos, para graduação da ilicitude do facto e sua influencia na dosimetria da penal, e para a interpretação teológica dos tipos e admissibilidade de causas supralegais de justificação com base no princípio da ponderação de bens. Deste modo. Não basta que o facto humano seja formalmente submissível ao tipo legal para que se verifique a ilicitude, é necessário que o facto efectivamente lese ou ponha em perigo de lesão o bem jurídico que a norma incriminadora quer proteger (ex: encostar a mão na cara de outrem pode formalmente ser uma ofensa corporal ou uma injúria, mas pode também ser um gesto de afecto, uma carícia).

A lesão ou o perigo de lesão de um bem jurídico é um elemento do crime, e deste modo a contrariedade à ordem jurídica implica a lesão ou perigo de lesão do bem jurídico tutelado pela norma. Um facto humano apenas formalmente conforme ao tipo legal de crime, mas que não ofenda (lesando ou pondo em perigo) o bem jurídico tutelado pela norma, não é contrário ao Direito.

Ilicitude em geral, e Ilicitude penal

▲ A Ilicitude com relevância penal não se limita à ilicitude típica (aquela que decorre da relação do facto com o tipo de crime). Ex: exigência de ilicitude na agressão na legítima defesa (art. 31º) – a agressão que autoriza a defesa não precisa de ser um facto ilícito penal, mas deverá no mínimo ser um facto ilícito  ilicitude atípica.

A Ilicitude Penal não se restringe ao campo do Direito Penal: um facto ilícito penal pode ser irrelevante para outros ramos do direito, podendo não ter qualquer relevância administrativa, fiscal, laboral, etc. mas não pode ser um facto autorizado ou

imposto, quando relevante, por qualquer outro ramo, pois um acto permitido ou imposto pelo direito civil não pode ser ao mesmo tempo um ilícito penal  art. 31º/1

CP:o facto ilícito penal é um facto contrário à ordem jurídica na sua totalidade.  Um facto ilícito civil, administrativo, fiscal, etc. pode não ser um ilícito penal  Um facto ilícito penal não pode ser lícito para qualquer outro ramo do Direito.

Esboço de estrutura da Teoria do Crime:

Feito Humano com Relevância Penal: há factos causados pelo homem que

não são feitos do homem, não são feitos humanos, enquanto não são produto da sua vontade são meros eventos físicos (ex: factos praticados sob coacção física irreversível e factos praticados em estado de inconsciência).

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Teoria dos Tipos: elementos da lei penal que individualizam de entre os factos

humanos os que são proibidos pelo Direito Penal – quando um facto se ajusta a algum dos tipos legais estamos perante um facto típico e não há crime sem que o facto seja típico.

 Nem toda a conduta típica é um crime – há condutas típicas que não são crimes porque a lei as permite ou impõe em certas circunstâncias (causas de justificação). Quando um facto típico não é justificado, o facto além de típico é ilícito ou antijurídico, na medida em que é contrario à ordem jurídica.

 Nem toda a conduta típica e antijurídica constitui crime, na medida em que a lei exige que a conduta com essas características seja reprovável, ou seja que o autor tenha tido a possibilidade exigível de actuar de outra maneira  característica da reprobabilidade do injusto ao autor enquanto culpabilidade.

 Ao facto humano típico, ilícito e culpável (crime) corresponde normalmente uma pena criminal, mas em certos casos a lei exige ainda a ocorrência de um facto exterior ao crime para cominar uma pena criminal ao seu agente – condição de punibilidade.

▲ O Crime é uma unidade e não uma justaposição de elementos: a decomposição do crime nos seus elementos faz-se apenas para efeito da sua análise, mas os elementos são partes do todo.

II – Tipicidade

1. Conceito de Tipicidade: a lei define o crime nos seus elementos constitutivos

essenciais, a definição ou descrição legal de um crime será um tipo legal. Tipo Legal: modelo do comportamento que é relevante para a lei, compreendendo um conjunto de características do facto punível. Há tipicidade quando o facto se

ajusta ao tipo, ou seja quando corresponde às características do modelo legal,

abstractamente formulado pelo legislador. Tipo enquanto síntese de todos os

elementos constitutivos do crime – contém o sujeito activo, a conduta proibida (nos

seus elementos exteriores ou objectivos e interiores ou subjectivos), o resultado jurídico (o bem jurídico, descrevendo dano ou perigo), o objecto material e o sujeito passivo, a reprovação do sujeito activo ou culpabilidade e a sanção.

Crime, como conduta proibida é um todo, um comportamento integral, abrangendo os elementos objectivos e subjectivos, elementos relativos à ilicitude e elementos relativos à culpa.

O facto ilícito tem de ser considerado na perspectiva do ofensor e do ofendido.

 Quanto ao agente/ofensor, a acção exterior é só sua quando voluntária, porque dele depende e por isso poderia ser evitada

 Quanto ao paciente/ofendido, o dano ou perigo que suporta é, em regra, igual, quer tenha sido voluntária ou involuntária a acção que foi sua causa.

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Para alguns autores, esta dupla perspectiva dá origem à distinção entre:

 Ilicitude Objectiva: contempla-se o comportamento na sua manifestação exterior enquanto lesiva de bens jurídicos.

 Ilicitude Subjectiva: contempla-se na relação do comportamento exterior com o seu agente, enquanto o facto lhe é atribuído como seu.

▲ O Facto Ilícito há-de ser sempre um feito humano, atribuível sempre ao seu agente, donde que a ilicitude do acto pressupõe a vontade do agente  só os actos humanos podem ser qualificados como lícitos ou ilícitos. Os factos involuntários tem

relevância para o Direito mas não podem é ser qualificados de factos ilícitos (ex: a

morte natural de uma pessoa tem consequências jurídico penais, nomeadamente a extinção da responsabilidade penal dessa pessoa, mas não é um facto ilícito.

O Acto Ilícito é necessariamente um Acto Voluntário, contudo pode não ser censurável (não ser culposo), devido:

 Às condições pessoais do agente (incapacidade real ou presumida do agente para entreter e querer)

 Às circunstâncias em que é praticado (inexigibilidade de comportamento conforme o Direito).

Tipos Objectivos: na formulação das normas penais, a lei descreve modelos de comportamento que proíbe.

Tipos Subjectivos: na formulação das normas penais, a lei descreve modelos de imputação dos comportamentos que proíbe ao seu agente.

Na descrição dos comportamentos proibidos, a lei concretiza em tipos delimitados o ilícito, mas quando o fim prosseguido, não abrangido naquela descrição, mas noutros tipos, seja de relevância jurídica positiva, o facto não é ilícito, não é antijurídico  necessário distinguir entre os Tipos Incriminadores e os Tipos Justificadores.

Tipos Incriminadores: conjunto de circunstâncias fácticas que directamente se

ligam à fundamentação do ilícito e onde assume primeiro papel a configuração do bem jurídico protegido e as condições sob as quais o comportamento que as preenche pode ser considerado ilícito.

Tipos Justificadores/Causas de Justificação: servindo à concretização do

conteúdo do ilícito da conduta, assumem o caracter de limitação negativa dos tipos incriminadores – formas delimitadoras do conteúdo do ilícito e podem por isso ser vistos como verdadeiros contratipos funcionalmente complementares dos tipos incriminadores.

Alguns Autores Franceses consideram-nos como Elementos Negativos do Tipo 

Prof. Germano defende que é uma construção possível, mas inconveniente

uma vez que enquanto o tipo subjectivo há-de ser adequado aos elementos do tipo incriminador, o mesmo já não sucede necessariamente relativamente

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aos elementos do tipo permissivo. Verdadeiros Elementos Negativos do Tipo

Incriminador: aqueles cuja ausência na própria descrição da conduta punível

(ex: falta de consentimento no crime de introdução em casa alheia (art. 190º), ou as intervenções medicas sem consentimento do paciente (art. 156º).

▲ Tipo Incriminador e Tipo Justificador: ambos são complementares de modo que a ilicitude nos é revelada através de uns e outros  o facto só é ilícito se for previsto num

Tipo Incriminador e não for justificado (ex: matar uma pessoa (art. 131º) constitui em

princípio um acto ilícito, mas se a morte for causada em legítima defesa (art. 32º), o acto de matar já não é ilícito.

Tipo Subjectivo: voluntariedade do facto como seu elemento (elemento do tipo ilícito). Todo o crime é um facto voluntário e a vontade no facto reveste as modalidades de dolo (vontade directa ou dirigida à prática do facto) ou negligência (vontade indirecta, o facto não seria cometido se o agente actuasse com o cuidado devido).

Ex: o facto de matar outra pessoa só integra o tipo do art. 131º se o agente

sabia o que fazia e o quis fazer (dolo – art. 14º) ou só integra o tipo do art. 137º (homicídio por negligência) se o agente não agir com o cuidado a que esta obrigado e é capaz.

A Culpabilidade enquanto reprovação ao agente, integra o tipo, o modelo abstracto de crime (tipo de culpabilidade). O Tipo Legal de Ilícito não pode ser visto formalmente, tendo de ser analisado substancialmente; o agente do facto é censurado por ter praticado o facto ilícito pois podendo evitá-lo e ter actuado em conformidade com o agente, actuou voluntariamente contra o Direito, podendo obedecer e sendo-lhe exigível que obedecesse ao comando legal. Contudo, se o agente actuou voluntariamente mas não o fez em circunstâncias que não lhe era exigível outro comportamento não será censurado pelo Direito.

Ex: o agente que mata outrem sem dolo ou sem negligência não é censurável,

não age voluntariamente e o juízo de censura pressupõe a vontade do facto, mas o agente pode ter agido voluntariamente mas em circunstâncias em que lhe não era exigível outro comportamento – estado de necessidade, art. 35º. Em suma:

Tipo Legal: modelo de comportamento humano proibido e punível penalmente.

 Tipo Incriminador ou Tipo de Crime  Tipo Justificador

 Tipo de Culpa  Tipo de Desculpa

Da Conjugação de Todos estes tipos  TIPO DE CRIME

Modelo de facto humano lesivo ou criador de perigo para bens jurídicos (tipo

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indesculpavelmente (tipo de culpa) + consequência jurídica do crime (tipo de

punibilidade)

2. Tipicidade e Técnica das Redacções Penais

A Tipicidade das Incriminações esta estreitamente ligada ao princípio da legalidade do direito penal e da fragmentariedade das normas penais incriminadoras.

 Não há crime sem que uma lei descreva o comportamento passível de uma pena criminal (art. 1º), fazendo-o a lei de modo fragmentário, ou seja não tutela todos os interesses jurídicos, mas apenas alguns e mesmo os que tutela só o faz muitas vezes relativamente a certas formas de agressão  torna-se necessária a selecção dos interesses penalmente tutelados (dos bens jurídicos) e dos comportamentos que os ofendem, sendo essa selecção feita através da descrição dos factos relevantes em tipos.

É principalmente na descrição dos factos criminosos que são indicados os elementos constitutivos típicos de cada crime, sendo nesta prespectiva a tipicidade mais questão da parte especial do que geral do CP.

Todos os crimes são constituídos por elementos comuns: todos têm um sujeito, uma conduta humana, um resultado jurídico, muitos têm um resultado material.

3. O Bem Jurídico como Elemento do Tipo Legal de Crime

Não há norma penal, proibitiva ou impositiva que não se destine a tutelar bens jurídicos.

Bem Jurídico enquanto objecto jurídico do crime, o interesse ou bem que a norma

penal incriminadora visa tutelar. O comportamento humano, o facto criminoso, é sempre um facto que ofende um bem jurídico, lesando-o ou criando perigo na sua lesão  elementos da norma penal é também o bem jurídico que ela tutela.

O Bem Jurídico embora seja elemento da norma penal é também elemento do tipo legal incriminador: é exterior ao tipo que descreve tão-só o comportamento violador

do bem que a norma tutela. As normas penais não descrevem, em regra, os bens

jurídicos protegidos, mas uma boa técnica legislativa permite ao intérprete identifica-los mediante a clara descrição do facto, ressaltando do tipo os interesses tutelados, mas a descrição desses interesses é a maior parte das vezes alheia ao próprio tipo. Segundo o modelo clássico de ofensa ao bem jurídico, era através da agressão a um objecto material (corpo humano, coisa móvel, casa de habitação, documento, etc.), como expressão dos interesses e valores que gravitam em torno das coisas da vida que se realizava a lesa ou punha em perigo o bem jurídico (vida, integridade física, liberdade moral e sexual, património, domicilio, fé publica).

A Tipificação legislativa do objecto material, como ponto de referencia da conduta para a realização do evento, significava ao mesmo tempo o objecto jurídico, uma vez que a acção se exteriorizava frente a uma pessoa ou coisa que incorporava o interesse protegido. Contudo, ao admitir-se os crimes de mera conduta o bem jurídico já não se pode associar exclusivamente ao objecto material/evento. Contudo, não parece que se deva abandonar o critério da ofensa do bem jurídico como chave

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potencial para a interpretação de todos os tipos legais, distinguindo-se entre bem-objecto ou bem-objecto da acção e bem jurídico tutelado pela norma. O crime não pode ser analisado apenas formalmente como mera conduta proibida, sendo necessária a sua analise substancia como ofensa a um bem jurídico.

4. Elementos do Tipo (Incriminador):

Elementos Descritivos: são apreensíveis através de uma actividade sensorial

(matar, ferir, destruir), ou seja os elementos que referem aquelas realidades materiais que fazem parte do mundo exterior e por isso podem ser conhecidas, captadas de forma imediata, sem necessidade de uma valoração + elementos que exigem já uma qualquer actividade valorativa, mas que ainda é preponderante a dimensão naturalística. Ex: a pessoa (art. 131º), a mulher grávida (art. 140º), o corpo (art. 143º), o automóvel (art. 208º).

Elementos Normativos: só podem ser representados e pensados sob a lógica

pressuposição de uma norma ou de um valor, sem especificamente jurídicos ou simplesmente culturais, legais ou supralegais, determinados ou a determinar – não são sensorialmente percetíveis, mas só podem ser espiritualmente compreensíveis ou avaliáveis, ou seja necessitam de uma valoração jurídica ou

cultural. Ex: caracter alheio da coisa (art. 204º), documento para efeito do

crime de falsificação de documentos (art. 256º e 255º al. a), as intervenções ou tratamentos (art. 156º) e as dívidas ainda não vencidas (art. 229º)

Doutrina: muitos consideram impossível: todos os elementos constitutivos de um tipo de

ilícito seriam normativos, enquanto todos concorrem para a expressão do integral juízo de valor que ele traduz; outros consideram impraticável: nenhum elemento pode ser considerado como puramente descritivo ou normativo (Roxin: exemplificando com elementos como a ‘’pessoa’’ ou a ‘’coisa’’, que apesar de serem marcadamente descritivos impõem uma valoração jurídica, ou ‘’documento’ que tem sempre um suporte material percetível pelos sentidos, concluindo que não importa tanto a (quase impossível) distinção entre elementos descritivos e normativos, quanto reconhecer que a maioria dos elementos do tipo são um misto de elementos normativos e descritivos). Figueiredo Dias: a distinção fara sentido, tornando-se mesmo indispensável, quando tenha importância para a resolução do caso concreto e para a correcta determinação do regime jurídico a aplicar. Ex: em matéria de dolo e erro (art. 13º) a distinção o continua a ser feita pela generalidade da doutrina!

Terceira espécie que entrelaça elementos descritivos e normativos, que se

determinam através de um juízo cognitivo, que deriva da experiencia e dos conhecimentos que esta proporciona (perigo – situação em que se verifica a possibilidade imediata (probabilidade) de ocorrência de um dano).

Prof. Germano: na descrição do tipo de crime encontra-se frequentemente a inclusão

de elementos subjectivos distintos do dolo e da negligência  elementos subjectivos

especiais. Tais referem-se ao tipo objectivo do ilícito, ou seja são elementos essenciais

do tipo de ilícito (intenções, motivações, pulsões afectivas necessárias para caracterizar a espécie de crime – elementos essenciais da descrição).

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O critério destas distinções é relativo, contudo há características predominantemente descritivas, outras predominantemente normativas e outras mistas.

Qualquer dos elementos objectivos que integram o tipo incriminador exigem adequação do elemento subjectivo do tipo, ou seja todos têm de ser conhecidos do

agente, no tipo doloso, ou haver possibilidade de os conhecer, no tipo negligente. Se

a conduta não for dolosa ou negligente, conforme a exigência do tipo incriminador, fica excluído a tipicidade da conduta.

5. Tipos Abertos, Tipos Fechados, Tipos Causais e Tipos Modais Critérios – delimitação dos tipos incriminadores

Tipos Fechados: descrição completa do modelo de comportamento proibido,

sem deixar ao intérprete, para verificação da ilicitude, outra tarefa, alem da constatação da correspondência entre o facto e o tipo legal (incriminador, permissivo, de culpa). Ex: art. 131º.

Tipos Abertos: descrição incompleta do modelo de comportamento proibido,

transferindo-se para o intérprete o encargo de completar o tipo, dentro dos limites e das indicações nele próprio contidas.

Tipo Causal: o facto penalmente relevante pode ser todo aquele que produza a lesão

ou perigo de lesão do bem jurídico tutelado e isso sucede quano o bem jurídico é tutelado em toda a sua extensão e contra qualquer forma de lesão ou perigo de lesão. Apenas importa o facto ou comportamento capaz de produzir o perigo de lesão do bem jurídico. Ex: matar – art. 131º; ofender – art. 143º; destruir – art. 212º.

Tipo Modal: a lei só tutela certas formas de comportamento, só incrimina a lesão ou

perigo de lesão do bem jurídico quando essa lesão se verifique de certo modo. Ex: quem ameaçar outra pessoa de forma adequada a provocar-lhe medo ou prejudicar a sua liberdade – art. 153º; quem por meio de violência ou ameaça – art. 154º; quem por mio de violência, ameaça ou astúcia, raptar – art. 160º; quem com intenção de obter para si para terceiro enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano sobre factos – art. 217º.

6. Função do Tipo Legal de Crime

Funções do Tipo:

Função de Garantia/Tipo de Garantia: o direito penal atribui ao tipo uma

função peculiar, em virtude do princípio da legalidade. Não há, porem, um tipo de garantia: a garantia resulta da função do tipo em face do princípio da reserva legal, pois ele contém a descrição do comportamento incriminado a que facto deve necessariamente ajustar-se.

≠ Tipo de Erro: conjunto de elementos que se torna necessário ao agente conhecer para que possa afirmar-se o dolo do tipo, dolo do facto ou ‘’dolo natural’’. Este tipo não se confunde nem com o tipo de ilícito nem com o tipo de garantia: dele fazem parte os pressupostos de uma certa causa de justificação, bem como proibições cujo conhecimento seja razoavelmente indispensável para que o agente tome

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conhecimento da ilicitude do facto no sentido de que a sua não representação ou a sua representação incorreta pelo agente exclui o dolo ou a punição a esse título. ≠ Tipo de Ilícito: figura sistemática de que a doutrina penal se serve para exprimir um sentido de ilicitude, individualizando uma espécie de delito e cumprimento, deste modo, a função de dar a conhecer ao destinatário que tal espécie do comportamento é proibida pelo ordenamento jurídico. Sem prejuízo do relacionamento entre a tipicidade e a ilicitude o primado caber à categoria de ilicitude, constituindo a tipicidade apenas a mostração, concretização ou individualização de um sentido de ilicitude em uma espécie do delito.

Função de Fundamentação da Ilicitude do Facto: o tipo de ilícito (descrição do

modelo de comportamento objectivamente proibido), representa uma valoração jurídica do comportamento, do facto tipificado, mas não implica necessariamente a ilicitude desse mesmo comportamento, servindo apenas de indício da ilicitude. O tipo representa uma avaliação para as situações normais, significa, que, salvo circunstancias especiais que o justificam, o acto tipificado é ilícito, é valorado negativamente pela ordem jurídica porque lesa ou põe em perigo um bem jurídico digno de tutela penal.

De modo análogo no tipo de culpa: o preenchimento dos elementos do tipo ilícito, objectivos e subjectivos, é em regra suficiente para a incriminação, desde que se verifique os pressupostos da culpabilidade, uma vez que o tipo de ilícito não é neutro, tem implícito um juízo de censura pela desobediência do imperativo legal, mas podem ocorrem circunstancias especiais, desculpantes que não obstante a ilicitude do facto excluem a censurabilidade do agente.

▲ o tipo de ilícito por si só não exprime um juízo de valor jurídico integral do facto – a conduta típica, mas justificada, não é menos conforme ao Direito do que a conduta atípica. A tipicidade do facto exprime uma primeira ponderação da relevância do facto: é um facto penalmente relevante, mas não tem significado jurídico autonomo nem gera por si só consequências jurídicas directas nem implica a reprovação da conduta tipicidade. A ilicitude ou não da conduta tipificada exige exige a contemplação do facto no seu todo, incluindo não apenas a descrição típica da conduta proibida, mas também e juntamente a permissão que resulta do tipo de justificação. So da conjugação de todos os elementos se concluirá se o facto é ou não um ilícito.

A tipicidade tem ainda como efeitos o de incrementar o dever de assegurar-se acerca da concorrência dos pressupostos das causas de justificação, o que pode fazer que o erro vencível sobre os pressupostos das causas de justificação tenha um âmbito maior – uma maior exigibilidade – do que o erro de tipo em sentido clássico.

Deste modo, assim considerada a tipicidade da conduta e as causas de justificação, como partes do ilícito típico, o erro sobre os pressupostos das causas de justificação há-de ter o mesmo tratamento que o erro sobre os elementos do tipo incriminador (art. 16º/2).

Só ao facto típico e ilícito faz sentido o juízo de culpabilidade, necessário para estarmos perante um crime (facto típico, ilícito e culposo).

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7. Desvalor da Acção e Desvalor do Resultado

Desvalor da Acção: conjunto de elementos subjectivos que conformam o tipo de ilícito

(subjectivo) e o tipo de culpa, nomeadamente a finalidade delituosa, a atitude interna do agente que ao facto preside e a parte do comportamento que exprime faticamente este conjunto de elementos. Revela-se de forma exemplar na tentativa de crime.

 O seu relevo foi enfatizado pelo finalismo: se a finalidade de actuar constitui o elemento essencial da acçao, então ela tem de ser ao mesmo título momento integrante do tipo e do ilícito, justamente nesta acepção começou a falar-se de um ilícito pessoal.

Desvalor do Resultado: criação de um estado judicialmente desaprovado, e assim o

conjunto de elementos objectivos do tipo ilícito (eventualmente também do tipo de culpa) que perfeccionam a figura do delito. Revela-se no crime consumado.

 Muitos tentaram uma construção de toda a dogmática do tipo a partir do desvalor da acção. Contudo, esta concepção dogmática ficou prejudicada desde o momento em que foi descoberta a relevância essencial, em muitos casos, de elementos subjectivos para a caracterização do ilícito. E seria definitivamente condenada por todos quando aceitam que em caso algum o ilícito se pode caracterizar exclusivamente através do tipo objectivo, antes se lhe acrescenta sempre o respectivo tipo subjectivo. Seja embora a protecçao subsidiaria de bens jurídicos a função primaria da intervenção penal, daqui não pode efetcivamente deduzir-se que o ilícito se caracteriza apenas ou essencialmente pelo desvalor do resultado. Fosse assim e dificilmente se justificaria a punibilidade da tentativa.

 Tao pouco esta destinada ao êxito a tentativa de prespectivar toda a construção dogmática do facto punível a partir simplesmente do desvalor da acção, negando ao desvalor do resultado significado constitutivo e autónomo para o ilícito. Tal seria fruto, do ponto de vista nomológica, da essência imperativa da norma e da ideia consequente de que o objecto da proibição só podem ser acções, não resultados. Na grande maioria dos casos, não pode ver-se nos elementos objectivos do crime, nomeadamente de resultado, momentos estranhos à valoração da ilicitude e a partir dai irrelevantes para o respectivo tipo de ilícito e reduzidos, no máximo, à categoria de meras condições objectivas de punibilidade. Fosse assim e retirar-se-ia a conclusão de que a tentativa deveria ser punida como a consumação, e não o é, sendo antes punível com a pena aplicável ao crime consumado, especialmente atenuada. Por outro lado, a negligencia deveria ser punida logo na base da verificação de um comportamento contrario ao dever de cuidado, e não o é, sendo em regra apenas quando sobrevem o resultado.

Figueiredo Dias: a constituição de um tipo de ilícito exige por regra tanto um desvalor

de acção como um desvalor de resultado, sem prejuízo de casos haver em que o desvalor de resultado de uma certa forma predomina sobre o desvalor da acção (maxime, nos crimes de negligência), ou em que inversamente o desvalor da acção predomina sobre o desvalor de resultado (maxime, nos casos de tentativa).

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▲ Resultado: afectação da situação de tranquilidade do bem jurídico protegido e não (‘’crimes de resultado’’) enquanto modificação do substracto do bem jurídico, temporal e especialmente cindida da acção.

III – Classificação dos Crimes em Razão da sua Estrutura Típica 1. Crimes Gerais ou Comuns & Crimes Especiais ou Próprios

Crimes Gerais ou Comuns: o agente é indeterminado, podendo ser qualquer um. Ex:

art. 131º. 140º, 143º e 153º  utiliza-se o pronome ‘’Quem’’ para designar que qualquer pessoa pode ser agente do crime.

Crimes Especiais ou Próprios: o círculo dos agentes possíveis fica reduzido àquelas

pessoas especialmente designadas no tipo. Quem não possuir característica prevista no tipo só pode ser co-autor ou cúmplice, exigindo-se sempre que haja um agente com a característica exigida por lei. Ex: art. 370º (advogado) e art. 372º (funcionário)  características do agente.

▲ A designação crime especial é utilizada para designar os crimes previstos em legislação de caracter especial (art. 8º) por oposição aos crimes comuns e para designar os crimes qualificados ou privilegiados, estes em atenção à relação de especialidade existente entre a norma que prevê crime base (comum ou geral) e a norma que prevê o crime qualificado ou privilegiado  quando existe este risco utiliza-se a expressão ‘’crime próprio’’.

2. Crimes Comissivos & Crimes Omissivos

Crimes Comissivos: a conduta do agente consiste numa acção em sentido estrito, ou

seja numa actividade positiva; proíbe-se fazer algo (art. 153º, 163º, 180º).

Crimes Omissivos: o núcleo do tipo é a inactividade do agente; proíbe-se não fazer

algo, em contrariedade com o dever jurídico de fazer (art. 200º, 245º, 250º).

Crimes Omissivos Próprios: crimes de mera actividade ou melhor, de mera

inactividade (art. 200º)

Crimes Omissivos Impróprios/Comissivos por Omissão: crimes de resultado (art.

10º - quando um tipo legal de crime compreender um certo resultado, o facto abrange não só a acção adequada a produzi-lo como a omissão adequada a evitá-lo, exemplo: morte de criança cometida por meio de omissão de assistência alimentar por quem podia e tinha o dever de prestá-la).

3. Crimes Formais & Crimes Materiais; Crimes de Mera Actividade & Crimes de Resultado

Crimes de Mera Actividade ou Formais: o tipo de ilícito realiza-se integralmente através

da mera execução de um determinado comportamento.

Objecto Jurídico ou Forma do Crime: o bem jurídico tutelado  crimes em que

a ofensa do bem jurídico não tem objecto material sobre que incida a acção. Ex: art. 180º, 190º e 200º.

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↳ Crimes de Resultado Cortado: crimes que destinam a produzir um resultado, o tipo menciona o comportamento e o resultado que a acção prossegue e a incriminação que pretende evitar, mas em que este resultado é irrelevante para a consumação do crime, há crime quer o resultado se produza ou não. Ex: art. 153º, 373º, art. 103º RGIT.

Crimes de Resultado ou Materiais: exige-se para preenchimento do tipo além do

comportamento um evento material, ou seja, uma alteração externa espácio-temporal distinta da conduta.

Objecto Material da Acção: a pessoa ou coisa sobre que recai a acção 

crimes em que a ofensa do bem jurídico só se realiza mediante a ofensa pela acção de um objecto material. Ex: art. 131º e art. 212º.

Crimes Causais Puros: aqueles em que o crime é tipicamente definido

em função do resultado lesivo, constituindo a acção todo o comportamento adequado a causar o resultado proibido, seja qual for o modo de perpetração da produção do evento.

Crimes Modais: a acção é condicionada, ou seja só certos tipos de

comportamentos lesivos do bem jurídico são proibidos.

4. Crimes de Dano & Crimes de Perigo

Crimes de Dano: lesão efectiva do bem jurídico protegido (art. 131º).

Crimes de Perigo: são simples potencialidade de lesão do bem jurídico protegido,

realizável ou não, em concreto (art. 291º e 291º).

Crimes de Perigo Concreto: a realização do tipo exige a verificação, caso a

caso, do perigo real (art. 291º)

Crimes de Perigo Abstracto: dispensa-se a constatação, caso a caso, do perigo

real, por se tratar de perigo presumido de lesão (art. 292º).

Crimes de Perigo Abstracto-Concreto: crimes de aptidão, ou seja, só

relevam tipicamente as condutas aptas a desencadear o pergo proibido no caso da espécie. Deste modo, a demonstração de que no caso concreto a conduta é insusceptível de causar perigo determina o não preenchimento do tipo.

Crimes de Perigo Comum (≠ Crimes de Perigo Singular): perigo causado pela conduta

ameaçar danos não controláveis (difusos), com potência expansiva, podendo atingir vários bens jurídicos (a vida, a integridade física das pessoas ou bens patrimoniais alheios de valor elevado) e várias vítimas (art. 272º).

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5. Crimes Qualificados pelo Resultado

Crimes Qualificados pelo Resultado: crimes materiais que possuem, como especial

característica a conjunção de uma acção, em que o crime se esgota, a que pode acrescer um evento material que agrava (qualifica) o primeiro. Nestes crimes, para se evitar uma pura responsabilidade objectiva, exige-se pelo menos negligência no resultado, o que significa ser indispensável, no mínimo, a previsibilidade desse resultado. Sem essa previsibilidade ocorre o caso fortuito, interrompendo-se o vínculo existente entre a acção e o resultado naturalístico mais grave, hipótese em que o agente só pode responder pelo facto antecedente  art. 18º. Ex: art. 147º, 152º/2, 177º/4, 285º e 294/3.

▲ O agente não quer o resultado, mas o resultado ocorre por causa da conduta do agente e é-lhe imputado pelo menos a título de negligência. Ex: o agente quer apenas ofender corporalmente, mas como consequência do murro, a vítima tropeçou e caiu, vindo a morrer em consequência da queda:

 O resultado morte só é imputável ao agente se pelo menos fosse previsível que tal poderia suceder e o agente não atuou com o cuidado devido para evitar a morte.

 Se o agente quis desde logo a morte, responderá pelo crime de homicídio e não pode ofensa corporal agravada pelo resultado.

6. Crimes Simples, Crimes Complexos & Crimes Pluriofensivos

Crimes Simples: identifica-se com um só tipo legal. Ex: ofensa corporal

Crimes Complexos: representa a fusão de mais de um tipo. Ex: roubo

(fusão da ofensa corporal ou a ameaça a outra pessoa (art. 143º e ss e 153º e ss) e a subtração de coisa alheia (art. 203º e ss). Normalmente, são crimes pluriofensivos:

Crimes Pluriofensivos: crimes que lesam ou exporem a perigo de lesão

mais do que um bem jurídico tutelado. Ex: roubo (simultaneamente, atinge-se o património (subtração de coisa) e a liberdade individual (meio de contragimento).

↳ Nem todos os crimes pluriofensvos são crimes complexos: pode haver tipos simples que tutelem simultaneamente interesses plúrimos e o correspondente crime ofenda ou ponha em perigo vários interesses. Ex: crime de emissão de cheque sem provisão: simultaneamente ofende o património do tomador do cheque e o interesse público na credibilidade do cheque e da sua circulação; ou o crime de branqueamento (art. 368º-A): o bem jurídico imediatamente protegido é a realização da justiça, mas simultaneamente protege-se a economia sadia e a transparência na economia.

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7. Crimes Instantâneos, Crimes Permanentes, Crimes Instantâneos de Efeitos Permanentes & Crimes Habituais, Crimes Unissubsistentes e Crimes Plurissubsistentes

Crimes Instantâneos: a consumação ocorre em um momento certo. Ex:

homicídio e furto.

 Consumação: efeito da conduta típica do agente.

 Tipo Legal: construído de modo que a conduta (ação ou omissão) se realize numa unidade de tempo.

 A permanência não é elemento do crime, embora a sua consumação possa prolongar-se no tempo. Ex: crime de usurpação de funções (art. 358º).

↳ Doutrina: distingue entre crime necessariamente permanente e

crime eventualmente permanente (crime tipicamente instantâneo

em que a sua consumação de prolonga no tempo).

Crimes Permanentes: a consumação é constituída por uma situação

duradoura, que se arrasta no tempo e que só termina com a prática de novo facto que restitua a situação anterior à prática do crime. Ex: sequestro (art. 158º) e Associação Criminosa (art. 299º).

 Consumação: prolonga-se no tempo e só cessa mediante um ato de sentido contrário, ou seja, que ponha termo a uma situação antijurídica que se arrasta no tempo e restitua o bem jurídico ofendido à situação anterior ao início da execução.

 Tipo Legal: a conduta típica perdura no tempo, e deste modo a ofensa ao bem jurídico tutelado também.

 A continuidade do estado danoso ou perigoso é essencial à configuração típica de um crime como permanente.

Nota: importância da distinção entre Crime Instantâneo e Crime Permanente

 Direito Penal: aplicação da Lei Penal no Tempo & determinação do início do prazo de prescrição do procedimento criminal

 Processo Penal: detenção em flagrante delito.

Crimes Instantâneos de Efeitos Permanentes: o resultado do crime é

duradouro, mas a duração ou permanência do resultado não depende do agente. Ex: homicídio, furto e dano.

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▲ art. 119º/2: ‘’crime permanentes’’ – crimes necessariamente permanentes; não: crimes instantâneos de efeitos permanentes nem aos crimes eventualmente permanentes.

Crimes Habituais: a estrutura típica do crime exige uma multiplicidade

de atos, de modo a revelarem uma certa habituação por parte do agente, sem que, porém, nenhum deles constitua o crime habitual. O Crime Habitual é constituído pela reiteração desses atos, pela persistência na atuação criminosa, reiteração essa que revela uma tendência ou hábito de vontade. Ex: aborto habitual (art. 141º/2), maus tratos (art. 152º), exercício ilegal da profissão (art. 358º/1). A Habitualidade normalmente assenta numa circunstância agravante do crime (art. 141º/2), mas pode ser circunstância constitutiva essencial (crime de exercício ilegal da profissão: antigamente exigia-se o exercício da profissão o que implicava a reiteração de atos; hoje basta a prática de um ato próprio da profissão).

Crimes Unissubsistentes: a estrutura típica do crime realiza-se com um

só ato. Ex: difamação verbal (art. 180º); homicídio (um só ato – tiro moral)

Crimes Plurissubsistentes: a estrutura típica do crime realiza-se com

vários atos. Ex: burla (não se consuma com o simples emprego da fraude – exige-se que o agente obtenha vantagem ilícita em prejuízo alheio por um ato do burlado (art. 217º); homicídio (vários atos – várias facadas).

8. Crimes Qualificados & Crimes Privilegiados

O legislador, na formulação dos tipos legais, parte da espécie mais simples, sendo que se do tipo se extrair alguma espécie de elemento o crime é descaracterizado. Do tipo mais simples formam-se novos tipos, consoante o acréscimo de novos elementos ou circunstâncias que exprimem uma agravação ou atenuação do conteúdo do ilícito ou da culpabilidade do crime-base.

Crimes Qualificados: o tipo derivado constitui modalidade agravada.

Ex: crime de homicídio qualificado (art. 132º).

Crimes Privilegiados: o tipo derivado constitui modalidade atenuada.

Ex: crime de homicídio privilegiado (art. 131º - 133º; relação de especialidade entre normas).

9. Crimes Dolosos, Crimes Negligentes & Crimes Preterintencionais

Crimes Dolosos: no dolo o agente representa o facto e quer ou aceita

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Crimes Negligentes: na negligência o agente representa o facto, mas

atua sem se conformar com a sua realização ou nem sequer o representa, mas podendo e devendo representá-lo. Ex: homicídio por negligência (art. 137º), ofensa à integridade física por negligência (art. 148º), Insolvência Negligente (art. 228º)

Regra: só é punível o facto praticado com dolo, salvo nos casos especialmente

previstos na lei é que é punível o facto praticado com negligência.

Crimes Preterintencionais: conjugação de um crime doloso com um

resultado mais grave não doloso. O agente quer praticar um determinado crime (dolo), mas como consequência do seu facto querido pratica um outro que não queria (o agente queria ofender corporalmente mas causa a morte).

 Evento não querido: imputado ao agente a título de negligência, contudo teria de ser previsto ou previsível como consequência do perigo causado pelo facto doloso – o CP não prevê este tipo de crimes.

10. Crimes Progressivos, Crimes de Acção Múltipla ou de Conteúdo Variado, Crimes Exauridos, Crimes de Tendência ou Intenção & Crimes de Empreendimento ou de Atentado

Crimes Progressivos: ocorre quando o agente pretende produzir o

resultado mais grave e pratica, por meio de atos sucessivos, crescentes violações ao bem jurídico protegido. Ex: o agente quer matar, mas começa por leves ofensa corporais que vai aumentado sucessivamente de intensidade até causar a morte  unidade de conduta, plurissubsistente & unidade de desígnio.

Progressão Criminosa: pluralidade de desígnios e de condutas. Questão

da subsunção de um crime pelo outro – o agente cometeu um crime, cometendo outro ou outros sucessivamente, mas de modo que o crime posterior incide na linha de atuação do fim que o agente se propôs desde o início. Ex: ofende corporalmente e de seguida decide matar. Em princípio (não parece ser necessário que entre os crimes sucessivos se verifique um nexo de continuação, de insistência na prossecução do fim a que o agente se propôs), os vários crimes são absorvidos pelo crime final.

Crimes de Acção Múltipla ou de Conteúdo Variado: o tipo faz

referência a várias modalidades da ação. Mesmo que sejam praticados as várias formas de ação, elas são consideradas fases de um mesmo crime. Ex: crime de falsificação de recenseamento eleitoral (art. 336º), crime de coação eleitor (art. 341º) e crime de passagem de moeda falsa (art. 265º).

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Crimes Exauridos (art. 119º/4): depois de consumado atinge as suas

últimas consequências danosas. Exaurir é esgotar; para o crime se exaurir é necessário que tenha causado todas as consequências danosas visadas pelo agente e que com a incriminação se quis proteger.

Exaurimento ou Consumação Material enquanto realização do resultado em função d qual se antecipou a tutela penal. Ex: incitamento ou ajuda ao suicídio (art. 135º) e exposição ou abandono de que resulte ofensa à integridade física grave ou morte (art.138º).

Crimes e Tendência, Crimes de Dolo Específico ou Intenção: crime que

condiciona a sua existência a uma específica intenção do agente. Caracteriza-se pela exigência de uma motivação específica. Sem essa motivação especial, que faz parte do tipo objetivo, não há tipo. Ex: crime de burla (art. 217º) – (1) fraude ou engano do agente; (2) é necessário que essa atuação fraudulenta tenha por motivo da vontade do agente obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo.

Crimes de Empreendimento ou de Atentado: crimes em que se verifica

uma equiparação típica entre tentativa e consumação. A tentativa de cometimento do facto é equiparada à consumação. Ex: crime de Traição à Pátria (art. 308º al. a)); crime de alteração violenta ao Estado de Direito (art. 325º) e crime de atentado contra o Presidente da República (art. 327º).

Capítulo II – A Estrutura Geral do Facto Ilícito. Os Seus Elementos e Circunstâncias Essenciais

I – Preliminares

1. O Tipo Legal de Crime e os Seus Elementos Constitutivos

Tipo Legal de Crime: definição ou descrição de um crime, ou seja modelo do

comportamento que é relevante para a lei, compreendendo conjunto de características objetivas e subjetivas do facto punível.

2. Elementos Constitutivos (Elementos Essenciais) e Elementos Acidentais do Crime. Condições de Punibilidade

2.1 Elementos Acidentais e Circunstâncias Essenciais

Elementos: características do feito produzido pelo agente, são o produto da vontade

do agente.

Circunstâncias: situações não criadas pela vontade do agente, mas que precedem,

acompanham ou seguem o facto (tempo, lugar, qualidade da vítima situação de necessidade).

Embora a doutrina tenha vindo a abandonar a distinção clássica entre elementos e circunstâncias essenciais do facto, a distinção ainda é válida, mas os efeitos jurídicos

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são limitados: quando a lei na descrição do tipo inclui alguma circunstância considera-a como uma característica essencial do facto, de tal modo que sem ela não há crime porque o tipo não se realiza.

Circunstâncias Acidentais (art. 71º/2): particularidades do facto, que distinguem os

factos concretos uns dos outros, podem ser relevantes ou não, mas quando relevantes são-no apenas em sede de gravidade, tornam o facto mais ou menos grave, mas o facto constitui crime quer essas circunstancias se verifiquem ou não. Deste modo, as circunstâncias acidentais não fazem parte do tipo de ilícito, embora sejam pressupostas, nomeadamente para efeito de graduação da pena entre os limites da penalidade  elementos acidentais do crime, mas não elementos essenciais constitutivos do tipo legal.

2.2 Circunstâncias Essenciais que concorrem no ato e circunstâncias que concorrem no agente no ofendido

Valoração objetiva do facto: núcleo essencial da própria ação/omissão +

circunstâncias que nele concorrem.

Há factos que só são típicos se com ele ou nele concorrem certas circunstâncias, sendo tais essenciais para a existência do facto ilícito. Ex: crime de instigação pública a um crime (art. 297º), a reunião pública é uma circunstancia essencial do crime.

2.3 Circunstâncias e causas de justificação e de exclusão do dolo (circunstâncias justificativas e de exclusão do dolo) e circunstancias exculpativas

As circunstâncias essenciais podem ser sine qua non da existência do crime.

Embora hajam factos que só são considerados criminosos em razão da ocorrência de determinada circunstância – circunstâncias essenciais – a verdade é que um determinado facto típico pode não constituir facto ilícito se se verificarem certas circunstâncias – causas de justificação.

Ex:

 Matar uma pessoa constitui, em regra, um crime e constitui facto típico por corresponder ao tipo de homicídio. Mas nem sempre matar uma pessoa, mesmo voluntariamente, constitui um facto ilícito, admitindo a lei em certas circunstancias, por exemplo para o agente se defender de uma agressão, que não é ilícito matar o agressor. A agressão que dá origem à legítima defesa constitui uma circunstancia, na medida em que não é produzida pelo agente do facto gerador da morte, e é uma circunstancia negativa, na medida em que não obstante a tipicidade do comportamento que causa a morte em razão daquela agressão a lei não valora negativamente o facto causador da morte do agressor, permitindo-o pelo que o facto embora típico não é ilícito.

 O facto ilícito tem de ser doloso ou negligente, mas já certas circunstancias que excluem o dolo – o erro sobre os elementos objetivos do tipo (art. 16º).

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 Para que exista crime o facto tem de ser culpável, censurável, mas pode suceder que o facto, não obstante reunir todos os elementos objetivos e subjetivos do tipo incriminador, seja praticado em circunstâncias que a lei desculpa (tipo de desculpa) o agente pela sua prática (art. 35º)  circunstancias exculpativas.

2.4 Condições de punibilidade e causas pessoas de exclusão da pena

Condições de Punibilidade: elementos que a lei requer para a punibilidade da

conduta, sendo absolutamente independentes da ilicitude da conduta ou da culpa do agente. Acontecimentos exteriores ao tipo de ilícito, futuros ou concomitantes ao facto, mas incertos. Elementos suplementares do tipo legal, mas não se incluem no mesmo, caracterizando-se precisamente pela circunstância de serem exteriores. São determinadas por razões de política criminal, entendendo o legislador que sem elas não se justifica a punibilidade do facto típico, ou pela ausência de dano efetivo ou insignificante ao interesse tutelado ou por outra razão de oportunidade. Ex: art. 5º - exige-se para aplicação da lei penal portuguesa a factos praticados no estrangeiro que o agente seja encontrado em Portugal; art. 227º e 228º - reconhecimento judicial da insolvência.

A punibilidade é elemento do crime, não havendo crime que não seja um facto punível. A aplicação da pena ao crime é que pode ser condicionada à verificação de determinadas condições – condições de punibilidade.

As condições de punibilidade são alheias à culpabilidade, devendo entender-se que a condição é integrante do tipo, que é elemento do crime e não condição de punibilidade.

Condições de Procedibilidade: natureza processual, sendo a condição para que se

instaure ou prossiga um processo e nessa medida condicional a punibilidade mas de modo indireto (não há punição sem processo). Ex: queixa, nos crimes semipúblicos e particulares ≠ Condição de Punibilidade: condicionam diretamente a punibilidade do próprio facto, dado que se não ocorrerem o facto não pode ser punido.

Causas Pessoais de Exclusão de Pena: circunstâncias legalmente reguladas, que de

antemão conduzem à impunidade do agente e que devem ter-se constituído no momento em que o facto é cometido. Respeitam à pessoa do agente e só a ele aproveitam. Ex: art. 24º - desistência na tentativa; art. 367º/5 – favorecimento pessoal praticado por cônjuge, adotantes e adotados e parentes da pessoa em beneficio da qual se atuou.

II – O Sujeito Ativo 1. O Sujeito Ativo do Crime

1.1. O Autor Singular

Sujeito Ativo do Crime (Agente; Autor): aquele que realiza a conduta típica (o facto

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Antigamente: sujeito ativo tinha de ser uma pessoa humana (afastava-se os animais e as pessoas coletivas).

Autor Singular: previsto em cada norma incriminadora, é aquele que realiza por si só o

crime.

Quando o crime é praticado por vários agentes, a exigência da pluralidade de agentes resulta:

 Do tipo legal incriminador (crimes de participação necessária)

 Da extensão a que procedem as normas sobre a comparticipação e a participação criminosa (art. 26º e 27º), cujo conteúdo se completa com referencia aos tipos incriminadores de cada crime em especial.

Crimes Monossubjetivos: crimes que podem ser praticados por uma só pessoa.

A Técnica Legislativa do CP define no tipo incriminador apenas o autor singular do crime e mediante normas da parte geral estende a incriminação à realização eventual do crime por várias pessoas.

As normas do art. 26º e 27º são normas de Tipificação Indireta  estendem a incriminação do crime previsto como monossubjetivo no tipo incriminador aos casos em que o facto concreto é cometido com a participação de diversos agentes.

Crimes de Participação Necessária: casos em que a lei exige a participação de várias

pessoas no crime.

1.2. Crimes Comuns e Crimes Próprios

Crimes Gerais ou Comuns: o agente é indeterminado, podendo ser qualquer um.

↳ O Código Penal Português utiliza geralmente na descrição dos tipos o pronome indefinido ‘’Quem’’ para designar que qualquer pessoa pode ser agente do crime. Ex: homicídio (art. 131º), aborto (art. 140º) e ofensa à integridade física simples (art. 143º).

Crimes Especiais ou Próprios: o círculo de sujeitos possíveis fica reduzido aquelas

pessoas especialmente designadas no tipo. Quem não possuir a característica prevista no tipo só pode ser co-autor, instigador ou cúmplice, exigindo-se sempre que haja um agente com a característica exigida por lei. Ex: advogado (art. 370º) e funcionário (art. 372º).

 A ação Típica pode ser praticada por um comparticipante. Ex: crime de corrupção para ato ilícito (art. 373º) – a solicitação ou aceitação da vantagem pode ser feita por interposta pessoa.

Crimes de Mão-Própria: crimes que só podem ser executados por ação direta, pessoal,

do agente referido no tipo legal. Ex: abandono de funções (art. 385º) – este crime tem de ser efetivamente executado pelo funcionário que abandona as funções; crime de bigamia (art. 247º/1) – só pode ser cometido efetivamente por pessoa casada que contrai um novo casamento.

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 Prof. Figueiredo Dias: crimes que tipicamente exigem a execução corporal do crime pela própria pessoa do agente.

 Prof. Teresa Beleza: crimes cuja definição legal torna impensáveis em qualquer forma de autoria que não seja direta, imediata, material, dado que a ação descrita só é susceptível de ser praticada por ‘’mão própria’’.

As qualidades ou características pessoas do agente podem constituir apenas circunstância modificativa do crime, determinando a alteração da gravidade da pena aplicável. Ex: Homicídio Qualificado (art. 132º/2 al. a) – quanto à qualidade de o agente ser ascendente, descendente, adotado ou adotante da vítima. Se o agente não tiver as características referidas, o crime é possível configurando um homicídio simples (art. 131º)

1.3. Pluralidade de Sujeitos: Concurso Necessário e Eventual

Um Crime pode ser praticado por uma pluralidade de pessoas:

 A ação criminosa pode ser executada por duas pessoas, em conjunto;

 A ação criminosa pode ser realizada através de terceiro que desconhece o plano criminoso, atuando como instrumento ou longa manus do agente.  A ação criminosa pode ser praticada com a participação secundária de

outras pessoas que incitam ou aconselham, ou mediante o auxílio de outros que proporcionam os meios ou ensinam a utilizá-los, ou mesmo prometem posterior refúgio ou acolhimentos.

Concurso Eventual de Agentes: o crime pode ser praticado por uma só pessoa, mas é

efetivamente praticado com a colaboração, concurso, de várias. Ex:

Crimes de Participação Necessária: crimes que só podem ser perpetrados com o

concurso de várias pessoas. O tipo legal exige a pluralidade de agente para a prática do crime – concurso necessário de agentes:

Conduta Unilateral: a ação de todos os agentes converge num único fim. Ex:

crimes de associação criminosa (art. 299º)

Conduta Bilateral/Encontro: os agentes apresentam-se em oposição uns aos

outros, ou em recíproca agressão. Ex: crime de comparticipação em rixa (art. 151º).

2. As Imunidades

Não Vigora o Princípio do Princeps Legibus Solutus, ou seja a lei é igual para todos e

não existem privilégios pessoais que limitem a aplicabilidade da lei penal. Contudo, há pessoas que por virtude das suas funções na orgânica do Estado ou em razão de regras de Direito Internacional gozam de Imunidades.

Imunidades: privilégios por força dos quais as pessoas a quem são atribuídos não ficam

sujeitas à jurisdição do Estado ou não lhes são aplicáveis as sanções previstas nas leis penais.

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Natureza Substantiva: gozam de uma isenção quanto à

inaplicabilidade das penas previstas nas leis penais para os fatos por eles praticados e aos quais, segundo os princípios gerais, seria aplicável a lei penal portuguesa, o que poderia qualificar-se como causa de não punibilidade.

Natureza Adjetiva: gozam do privilégio de se não submeterem à

jurisdição portuguesa.

Prof. Germano: a natureza substantiva ou processual das imunidades só

pode determinar-se em razão de cada imunidade concreta, em função dos termos da lei que a atribui.

Tipos de Imunidades:

Absolutas: eximem de responsabilidade ou isentam de submissão à

jurisdição por qualquer crime. Reservadas aos Chefes de Estado Estrangeiros – imunidades de Direito Público Internacional.

Relativas/Funcionais: resultam do exercício de determinadas funções e

só se aplicam a determinados factos decorrentes do exercício dessas funções. Podem ser de:

Direito Público Interno: as que gozam os deputados à

Assembleia da República (art. 160º/1 da CRP) e as dos juízes (art. 218º/2 CRP)

Direito Público Internacional: as que gozam os diplomatas e os

agentes internacionais equiparados aos agentes diplomáticos.

▲ O fundamento das imunidades, internas e internacionais, é sempre de natureza política, interna ou internacional.

3. A Responsabilidade Penal das Pessoas Coletivas

Antigamente: o CP não previa a responsabilidade das pessoas coletivas, mas a sua responsabilidade era admitida em legislação especial (DL referente aos crimes contra a economia e saúde pública e pelo RGIT).

Atualmente, o CP foi alterado com a Lei nº59/2007, de 4 de Setembro que:

 Alterou o art. 11º consagra a admissão da responsabilidade da pessoa coletiva e regras de imputação

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Pessoas Coletivas e Entidades Equiparadas: podem ser sujeitos ativos do crime, mas

uma vez que não agem por si mesmas, mas através de pessoas físicas, a sua qualificação como sujeitos ativos do crime depende sempre da atuação e terceiros que com elas têm uma relação especial.

O art. 11º do CP consagra a responsabilidade das pessoas coletivas e em que termos tal sucede. O nº4 do art. 11º refere ainda o que se entende por posição de liderança, ou seja verifica-se quando exige um domínio na pessoa coletiva – directores.

O ordenamento jurídico português não admite a responsabilidade das pessoas coletivas como agentes do crime para todos os crimes, mas só para os crimes expressamente previstos na lei: a sua intervenção pode verificar-se como participantes na comparticipação criminosa em qualquer das suas modalidades, ou seja como autores ou como cúmplices, mas em geral a responsabilidade da pessoa coletiva não resulta de comparticipação criminosa, sendo uma responsabilidade que acresce à do agente, pessoa singular, que atua como seu órgão ou representante.

Teoria da Representação: a atuação do órgão ou representante em nada se distingue

da dos agentes, pessoas singulares, e só porque estes atuam funcionalmente, em nome e no interesse da pessoa coletiva, é que está é também responsável pelo crime.

Dificuldade da Responsabilização Penal das Pessoas Coletivas: determinação do agente pessoa singular que seja o agente do crime (sujeito ativo), na medida que é em razão da qualidade desse sujeito e das suas funções na estrutura do ente coletivo que o crime é imputado à pessoa coletiva.

Responsabilidade Cumulativa: imputação do facto à pessoa coletiva, ou seja a

responsabilidade pelo mesmo facto dos agentes pessoas singulares e da pessoa coletiva. Ex: a empresa só responde quando se apura a responsabilidade de uma(s) pessoa(s) singular(es) (directores)  Teoria da Culpa na Organização.

III – Elementos Objectivos Constitutivos do Facto Ilícito 1. Conceito de Facto Ilícito

1.1 Conceito de Facto: Ação e Omissão

Crime  facto jurídico  todo o evento relevante para o Direito.

Facto Jurídico:

Puros Factos Jurídicos: independentes do conhecer, do querer e do agir

humano. Ex: nascimento, morte natural, decurso do tempo.

Factos Voluntários/Atos Jurídicos: condutas voluntárias, modos de atuação

humana dirigida pela vontade, que tanto podem consistir numa ação ou numa omissão.

Factos Lícitos: praticados em conformidade com o Direito.

Referências

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