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Eu não fui a filha que a minha mãe quis Mas também não tô sendo a pessoa que eu tenho capacidade de

No documento Histórias de Vida, vozes da rua (páginas 153-155)

ser”

Eu... eu não fui a filha que a minha mãe quis. Mas também não tô sendo a pessoa que eu tenho capacidade de ser. Trabalhei no Banerj... Eu... Eu sou uma pessoa que não sou... Nunca botei um chinelo no pé, hoje em dia nem minha unha eu tô fazendo. Eu não sei, exaustão... Era minha mãe, sim. Eu comecei, voltei pro dentista com treze anos de idade, porque eu tomo, eu tenho problema de garganta. Então eu nunca tive catapora, rubéola, sarampo, nada disso. Só a garganta. Tinha um problema infla- matório. Aí... Já usei aparelho, eu já usei isso, já usei aquilo, já usei tudo que tinha direito... Mas... não tinha problema de saúde, nem dentário, médico. Hoje em dia meu dente tá tudo assim, sabe? Como eu pude esquecer eu?

Eu tô me matando porque... porque eu me cobro muito. Por eu não ter sido a filha que a minha mãe mereceu. Deixa eu explicar, não é vício. Porque, se você botar um quilo aqui, e se o quilo acabar, eu vou continuar conversando com você da forma que eu tô, e eu vou continuar sendo a pessoa longe daquele povo ali. Não me desfazendo deles, mas... Nada a ver. Eu sempre fui enjoada, eu sempre fui nojenta, eu já fui até racista. E hoje em dia, dizem que a gente paga quando cospe para o alto, né? Minha mãe queria que eu tivesse uma profissão. Ela queria me ver com aquele quadradinho na cabeça, com aquela cordinha pendurada e com aquele bastãozinho na mão. Formação. Que eu tivesse uma formação. Sabe, ela só queria ter sempre essa lembrança de mim, com aquele chapeuzinho e aquela... aquela bata.

”Eu estou me excluindo de tudo e de todos. Eu bloqueei

tudo pra mim, entendeu? Eu não quero a vida que eu

tô vivendo, sei a minha capacidade, mas não boto em

prática”

Eu não fui, eu não fui... eu não fui o que a minha mãe quis, pra mim eu não quero mais nada. Como eu digo. Eu já fui neta, fui filha, de boca pra fora, né? Fui mãe, da boca pra fora também. Por que eu não sou avó? Porque minha filha, eu não criei minha filha. E a minha neta, tem quatro anos. Com isso, acho que eu não vou ao aniversário delas, eu não durmo com elas, eu me envergonho muito. Se é por conta da droga? Não, por tudo que eu não fui. Eu estou me excluindo de tudo e de todos. Eu bloqueei tudo pra mim, entendeu? Eu não quero a vida que eu tô vivendo, mas também... sei a minha capacidade, mas... não boto em prática e... Não sei...

Eu criei minha filha até os dois anos. Aí eu me separei do pai dela. O pai dela trabalhou dezoito anos na Volkswagen, é... Quem criou a minha filha, como é que eu vou saber? Como sempre Deus, entendeu? Minha mãe... a minha mãe foi mãe de... pra mim, entendeu? Por causa que ela trabalhava de dia e de noite, né? E a mesma coisa a minha filha. Eu morava... ela foi morar na Penha, foi quando o meu pai faleceu. Voltei pra a Penha, morava na Ilha, voltei pra Penha. Aí lá morava, nos fundos, o meu tio, minhas primas, e na frente, minha vó. Aí morava eu, minha vó, meu tio solteiro e minha mãe.

Quem me criou sempre foi minha mãe. Quem cuidava de mim durante o dia era minha vó, minha prima, que é sobrinha e afi- lhada da minha mãe, desse meu tio... um dos meus tios, um... um... O meu tio, era solteiro. Ele era... espírita, acho que é até hoje... sempre morou ali, mora lá até hoje. Entendeu? Trabalha, trabalha no aeroporto... E o meu outro tio, é um tipo um eu da vida, entendeu? Que foi pra tudo quanto é coisa, mas nunca quis nada, e é o pai dessa minha prima que morava também lá. Então... quando a minha tia trabalhava, a mulher desse meu tio, mêrmo eles tando separado, a minha mãe pegou uma empre- gada, botou a empregada lá... e ela ficava junto com a minha vó tomando conta de mim.

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Eu... eu... eu nunca morei com homem nenhum, entendeu? Eles que iam... ele é que morou na minha casa, entendeu? Então ele saiu. Continuou a mêrma coisa, eu, minha filha e minha mãe. A minha filha ficou com infecção urinária e eu... eu morando, eu mora... eu morava na Ilha, estudando em Bonsucesso e tra- balhava num outro shopping e ficou esse triângulo. E a médica da minha filha era na Penha. Médica que, que já foi minha... médica de... da família. Então, a minha tia... que é uma moça que minha vó criou, como, como filha, mora na Vila da Penha. Então... E ela também é aposentada e, tem a minha prima que mora com ela, que é que nem eu e minha mãe morando sozinha, ela e minha prima.

Então, a minha prima estava fazendo só cursinhos, então minha filha ficou lá, pra minha prima levar... pra mim fazer esse triân- gulo e pra não ficar pesado pra minha mãe. Entendeu? Porque a minha mãe é que resolve, resolve tudo. Ela faz aquela listinha, fazia aquela listinha dela, fazer compra, ir não sei aonde, não sei aonde... até dez horas da noite, a hora que ela chegava. Entendeu? Isso, aí foi isso. Nisso, a minha filha ficou na minha tia, né? Com o tempo passando, a minha... a minha filha tendo lá... semanalmente, o... a visita no médico pra tratar da infecção urinária, com um dois anos de idade, e... eu ia lá, pegava, levava pra casa, no final de semana, e acabou ficando sempre assim, depois.

”Depois que a minha mãe morreu, eu fui largada no

mundo, eu me desfamiliarizei”

Porque a minha prima ela é cristã, então, a neta da minha tia é a minha filha. E até hoje. Dois anos que eu não vejo minha filha e minha neta. Depois que a minha mãe morreu, eu fui largada no mundo, eu me, eu me desfamiliarizei. Essa minha prima tem notícia minha... Minha tia... que é a mãe dela ... É, a minha família é só elas duas...

”Eu ia pra rua pra usar droga, dia de domingo pelo

No documento Histórias de Vida, vozes da rua (páginas 153-155)