• Nenhum resultado encontrado

Finalidade e objeto

No documento FERNANDO HENRIQUE DE MORAES ARAÚJO (páginas 139-142)

5. DO INQUÉRITO CIVIL

5.6 Finalidade e objeto

A finalidade do inquérito civil pode ser extraída do próprio conceito que há pouco propusemos.

159

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública: comentários por artigo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995, p. 173.

160

Muito embora a maior parte da doutrina que trata do tema apresente finalidade do inquérito civil como sendo um instrumento de colheita de elementos ou provas somente para o ajuizamento de ação civil pública/coletiva não temerária, entendemos, com a devida vênia, que não seja visão atual sobre o instituto.

Explicamos.

Quando da entrada em vigor da Lei da Ação Civil Pública em 1985 não havia previsão de possibilidade de formalização de compromisso de ajustamento de conduta.

Logo, a finalidade do inquérito civil só podia ser mesmo a de angariar dados para que o Ministério Público ajuizasse ações civis públicas/coletivas ou então, em caso de não comprovação dos fatos, restaria possível o arquivamento.

No entanto, lancinante foi o Código de Defesa do Consumidor, que então previu expressamente a possibilidade de firmar-se compromisso ajustamento de conduta entre os órgãos legitimados e os investigados, acrescendo tal dispositivo à Lei da Ação Civil Pública161.

Por tais motivos, em nosso entender, desde a entrada em vigor da Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), necessária se faz nova visão sobre a finalidade do instituto, revisando-se o conceito do inquérito civil para que contemple em suas finalidades precípuas, a solução do conflito, seja de que forma jurídica isso se dê: por simples encaminhamento de ofício recomendatório ou por meio de composição extrajudicial (formalização de compromisso de ajustamento de conduta) e, em não sendo possível, o ajuizamento de ação civil pública/coletiva, sem que isso represente, por óbvio, uma condição de procedibilidade, como veremos adiante.

Martins César afirma que:

“O objeto do inquérito civil é a colheita de elementos para formação do convencimento do membro do Parquet sobre a veracidade dos fatos narrados na representação que ensejou a sua instauração.

De posse dessas informações, o representante do Ministério Público pode chamar o investigado para tentar a assinatura de compromisso de ajustamento de conduta, propor uma ação civil pública ou fazer a promoção

161

“Art. 113. Acrescente-se os seguintes §§ 4.º, 5º. e 6.º ao art. 5º, da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985:

§ 6º. Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial”.

de arquivamento do inquérito, no caso de entender não existir ofensa ao ordenamento jurídico.”162

Por sua vez, Leonel entende que:

“Não obstante sua finalidade primeira seja a colheita de informações para a propositura da ação coletiva, identifica-se nele também o escopo de elaboração eventual de compromisso de ajustamento, para solução extrajudicial do conflito coletivo.

Possível também que, configurando o fato investigado alguma infração penal, sejam fornecidas cópias do procedimento ao órgão do Ministério Público com atribuições para oficiar na esfera criminal, a fim de que seja veiculada investigação específica ou proposta diretamente ação penal.

Esta anotações revelam a utilidade do procedimento administrativo em análise.”163

Igualmente pensam João Batista de Almeida164 e Raimundo Simão de Melo.165

Logo, cremos que não apenas se destina à colheita de elementos para o ajuizamento de uma ação civil pública/coletiva como proposto por quase a totalidade da doutrina e jurisprudência relacionadas ao tema, mas também a possíveis ajustamentos de conduta, pois sua finalidade foi ampliada pela Lei n. 8.078/90, que criou referida via alternativa de pacificação de conflitos sem a necessidade de uma demanda judicial.

Importante mencionar que em se tratando de dispositivo criado pela Lei da Ação Civil Pública há entendimento de que somente por lei federal seja possível sua normatização.

É o que defendem Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

“Regulamentação estadual do IC. Os Estados membros podem, eventualmente, traçar parâmetros para a operacionalização do IC, no âmbito da organização interna corporis do MP local, fazendo-o, por exemplo, por meio de normas dirigidas aos membros do Parquet a respeito da forma das portarias de instauração do IC, do modo como atender às representações dos particulares e dos órgãos públicos etc. no entanto, não poderão editar leis normatizando o IC no âmbito estadual, pois estariam ferindo o modelo

federal da LACP, que já traçou o regime jurídico integral do IC. Assim, v.g.,

a LOEMP-SP 108, que estabelece recurso, com efeito suspensivo, contra a instauração do IC, em flagrante inconstitucionalidade por ferir o modelo federal. Na regulamentação, o Estado tem de agir secundum legem, sendo-

162

CÉSAR, João Batista Martins. Tutela Coletiva: Inquérito Civil – Poderes Investigatórios do Ministério Público – Enfoques Trabalhistas. São Paulo: LTr, 2006, p. 40.

163

LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do processo coletivo. São Paulo: RT, 2002, p. 313.

164

ALMEIDA, João Batista de. Aspectos controvertidos da ação civil pública: doutrina e jurisprudência. São Paulo: RT, 2001, p. 130.

165

MELO, Raimundo Simão de. Inquérito civil: poder investigatório do Ministério Público do Trabalho. Revista de Direito do Trabalho v. 28, n. 107, São Paulo, jul./set. 2002, p. 254.

lhe vedado proceder contra ou praeter legem, como no caso de estabelecer recurso contra o IC.”166

É o mesmo entendimento de Mazzilli:

“É, pois, írrito o sistema de recursos no inquérito civil, criado pela lei estadual. Ainda que em tese pudesse o legislador estadual dispor sobre

procedimentos, não está a disciplina do inquérito civil contida no objeto da

Lei Orgânica Estadual do Ministério Público. O objeto a esta reservado consiste apenas em dispor sobre a organização, as atribuições e o estatuto

do Ministério Público e não dar disciplina normativa ao inquérito civil.”167

Comungamos dos entendimentos trazidos ao trabalho, não apenas de que somente compete aos Estados regulamentar normas gerais sobre o trâmite do inquérito civil, mas não impor restrições ou prever recursos contra sua instauração, como indevidamente ocorreu na Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Analisaremos agora os princípios relativos ao inquérito civil.

No documento FERNANDO HENRIQUE DE MORAES ARAÚJO (páginas 139-142)