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A FORMAÇÃO DOCENTE NA CONTEMPORANEIDADE

Inicialmente, compreende-se que são vários os entendimentos de didá- tica, na história e na atualidade, desde perspectivas mais tradicionais às críticas ou pós-críticas. Em uma perspectiva crítica, pode-se reafirmar que a didática busca superar seu caráter meramente prescritivo e se ocupa de questões teóricas e epistemológicas sobre a natureza do processo de ensino e aprendizagem. Para a compreensão dessa natureza, são impor- tantes as relações que ela permite estabelecer com a epistemologia das disciplinas; a articulação com outras áreas do conhecimento, como a so- ciologia, a antropologia, a filosofia, a psicologia, entre outras; e ainda as possibilidades de aproximações com as tecnologias digitais e sua cultura. Essas aproximações interdisciplinares são necessárias para a compreensão do complexo processo de ensino e aprendizagem e para a orientação de

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caminhos possíveis para a atuação docente. Seu objeto de estudo é, pois, o processo de ensino e aprendizagem ligado à apropriação de conhecimen- tos, em determinados contextos, às discussões atuais sobre o sentido da escolarização, para construir uma educação escolar capaz de dar resposta aos desafios da contemporaneidade.

Nessa perspectiva, são desafios da didática, como dimensão da for- mação docente: conceber os processos educacionais como historicamente situados; promover educação para o diálogo entre diferentes grupos so- ciais e culturais; articular a educação com outros processos sociais; traba- lhar a relação teoria-prática; favorecer processos de construção de sujeitos autônomos, competentes, solidários capazes de serem sujeitos de direito no plano pessoal e coletivo, capazes de construir histórias e apostar em um mundo e em uma sociedade marcada pela diferença, de utilizar metodolo- gias ativas, participativas, personalizadas e multidimensionais, articulado- ras das dimensões cognitiva, afetiva, lúdica, cultural, social, econômica e política da educação. (CANDAU; SIMÃO E KOFF, 2015)

A potencialidade da didática na formação docente, então, está em sua possibilidade de propiciar a construção pelo professor de bases teórico-con- ceituais sobre processos educativos, escolarização, sujeitos dessa escolari- zação, atuação docente e a contribuição das diferentes disciplinas nesses processos. Para isso, é importante compreender as relações entre a didática mais geral e as didáticas específicas, que tratam diretamente de disciplinas e suas formas de realização na escola. Entende-se que a formação do profes- sor é contínua, mas o processo de formação inicial é muito relevante para sedimentar esses conhecimentos, a partir dos quais o professor constrói suas propostas de trabalho. Nesse processo, a relação entre o campo dis- ciplinar, suas formas de produção e de socialização, e o campo da didática propicia a construção do conhecimento docente. Essa inter-relação permite ao professor fazer sínteses das diferentes dimensões de sua própria for- mação – pedagógica e específica, compreendendo melhor seu trabalho na construção de significados para os alunos daquilo que irá ensinar.

A dicotomia entre a formação pedagógica – referente às discipli- nas pedagógicas – e a formação específica – referente às disciplinas de

conteúdo, à Geografia, por exemplo – caracterizou a estrutura de cursos nas diferentes licenciaturas desde sua criação até o final do século XX, expressando uma determinada compreensão de formação nesse âmbito. A partir de críticas a essa formulação – como, por exemplo, a desenvolvida por Pereira (2000) –, houve normatizações que buscaram superar essa dicotomia e promover maior integração entre essas dimensões. Do con- junto das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professo- res da Educação Básica, destacam-se a Resolução do Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP) n° 1/2002 – fundamentada nos Pareceres CNE/CP n° 9/2001 e CNE/CP n° 27/2001 – para os cursos de licenciatura; e a Resolução do CNE/Câmara de Educação Superior (CNE/ CES) n° 14/2002 – fundamentada nos Pareceres CNE/CES n° 492/2001 e n° 1.363/2001 – para o bacharelado e a licenciatura em Geografia, além da recém-aprovada, mas ainda em fase de implementação, Resolução n° 2, de junho de 2015.

Mesmo após esses anos de formação docente construída na maior parte das universidades brasileiras em novas bases, ainda persistem en- tendimentos dicotômicos da relação entre essas dimensões; e também verifica-se ainda um certo centralismo de disciplinas de conteúdos espe- cíficos nas licenciaturas, com a prática dos professores desses conteúdos distanciada da realidade profissional. Muitos desses professores especia- listas são bacharéis e ensinam o conteúdo sem focar na utilidade do que ensinam; mesmo quando o curso é só de licenciatura, muitos professores não internalizam que os alunos estão se formando para serem professo- res da educação básica. De todo modo, as disciplinas pedagógicas, as didá- ticas, as metodologias e, sobretudo, o estágio estão presentes na formação ao longo do curso e com maiores possibilidades de articulação entre con- teúdos específicos e a prática com esse conteúdo.

Para investir na formação do professor no sentido de que ele possa atuar com os princípios do desenvolvimento humano dos alunos, é neces- sário que os conteúdos ensinados sejam significativos. Para isso, é impor- tante ter uma concepção epistemológica da ciência que ensina, dos métodos lógicos e investigativos dessa ciência e das condições históricas e sociais do

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contexto de produção e aplicação dos conteúdos dessa ciência. Também é importante buscar intersecção entre a didática e as didáticas específicas, pois o objeto de estudo de ambas é o processo de ensino e aprendizagem, tendo como referência um conteúdo escolar. Como integrar na formação profissional os dois tipos de conhecimento? Como realizar na prática a vin- culação da didática geral com a compreensão do seu papel na orientação da atuação docente voltada ao processo cognitivo do aluno, tendo como objeto dessa atuação os conhecimentos específicos? Esses questionamentos le- vam às formulações do próximo item.

AS PRÁTICAS DE FORMAÇÃO