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Função dos tribunais

No documento Tiago Cardoso Vaitekunas Zapater (páginas 156-164)

3 DIREITO E PROCESSO JUDICIAL NA SOCIEDADE COMPLEXA

3.2 Direito como sistema autopoiético 1 O direito diferenciado pela função

3.2.3 Função dos tribunais

Autopoiese implica o fechamento operativo – por meio do código, que garante a autoreferência das operações – e abertura cognitiva, que possibilita, por meio dos programas, orientar a aplicação dos códigos à luz de heterorreferência. Observações de segundo grau permitem articular autorreferência e heterorreferência e, apenas nesse nível, reside alguma chance de certeza: uma certeza das condições de observação do sistema, não do resultado das suas operações. Para tanto, é essencial compreender outro aspecto do sistema jurídico e que possibilita essas observações: a operação dos tribunais como organizações centrais do sistema.

A consolidação do constitucionalismo, o fim dos regimes absolutistas e o desenvolvimento de uma dogmática jurídica específica, voltada à organização conceitual do material jurídico à luz dos interesses existentes no ambiente social,465 dissolveram o modelo dedutivo baseado na hierarquia legislação/jurisdição. Como explica Luhmann, embora no plano semântico o modelo hierárquico legislação/jurisdição não chegue a ser imediatamente questionado, a partir de meados do séc. XIX a atividade judiciária não pode mais ser vista como mera aplicação mecânica da lei.466 Nesse cenário, questiona-se a função dos tribunais no sistema jurídico moderno.

A diferenciação de competências e procedimentos para a elaboração de leis estabiliza uma atividade legislativa rotineira. A consolidação do Estado moderno e as

465 E que, assim, viabilizava a construção de novos conceitos jurídicos adequados a situações sociais inovadoras. Nesse

sentido: DEGIORGI,Raffaele. Scienza del diritto e legitimazione, critica dell’epistemologia giuridica tedesca da Kelsen

a Luhmann. Poscritto 1998. Lecce: Pensa MultiMedia, 1998, p.62.

466 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

inovações tecnológicas após a Revolução Industrial vão tornando necessário o uso cada vez maior da legislação. O excesso de temas tratados pela legislação e a progressiva quantidade de leis fazem com que o legislador, para evitar contradições e abranger um número de casos cada vez mais imprevisível, recorra a uma progressiva indeterminação conceitual. A lei demanda cada vez mais interpretação e o juiz simplesmente não pode ser visto como a boca da lei. Ademais, a diferenciação sistema político/sistema jurídico já não ampara recursos como o référé législatif. A vontade do legislador precisa ser interpretada.

A par dessa necessidade de interpretação, a prática dos tribunais vai utilizando o material jurisprudencial acumulado. Vale dizer, a decisão judicial, ao mesmo tempo, aplica programas decisionais (leis, contratos, outros precedentes) e se firma como um programa para novas decisões (como precedente). E o juiz, ao decidir, sabe que sua decisão é também precedente. Nesse cenário, o juiz já não tem como representar sua decisão como mera dedução, mas deve considerar que sua decisão é parte de um processo de generalização congruente da expectativa normativa que absorve e reduz a indeterminação dos programas decisionais.467

Em outras palavras, toda decisão judicial que aplica uma lei ao caso reduz o espaço de indeterminação da lei enquanto programa, isto é, reforça o programa decisional que a lei integra. Cabe à dogmática jurídica, especialmente à hermenêutica, estabilizar o sentido desse operar. Daí a afirmação de Luhmann de que o crescimento de um direito judiciário é um fenômeno “adequado ao sistema que é possível apenas sobre a base do direito positivo. E, de fato, através da positivação do direito, o peso decisional é tão extenso que deve ser distribuído e assumido em parte também pelo juiz”.468

Os poderes de interpretação precisam ser aumentados, pois deve, cada vez mais, decidir mais temas e não se pode, ao mesmo tempo, estar obrigado a decidir e proibido de interpretar, razão pela qual proliferam métodos interpretativos. Paralelamente, fica claro que a completude de um ordenamento variável, contingente, não depende da racionalidade dos códigos e leis, mas da obrigação de decidir imposta aos juízes.469

467 LUHMANN,Niklas. Differenziazione del diritto, contributi ala sociologia e ala teoria del diritto. Tradução de

Raffaelle de Giorgi. Bologna: Il Mulino, 1990, p.118.

468 LUHMANN,Niklas. Differenziazione del diritto, contributi ala sociologia e ala teoria del diritto. Tradução de

Raffaelle de Giorgi. Bologna: Il Mulino, 1990.

469 LUHMANN,Niklas. Differenziazione del diritto, contributi ala sociologia e ala teoria del diritto. Tradução de

Daí a centralidade da posição dos tribunais que, ao contrário do legislador e dos contratantes, têm obrigação de decidir. Trata-se de um aspecto típico dos ordenamentos jurídicos modernos. Embora o mecanismo legal de proibir a denegação de justiça seja antigo, ele se relacionava com a demora dos procedimentos e não com a universalidade da jurisdição. Como anota Luhmann, o direito romano e o medieval “só ofereciam proteção jurídica às demandas definidas com exatidão (actio, writ)”. É na transição à modernidade que se torna normal – e corriqueiro nos ordenamentos – que toda demanda deva ser respondida “mesmo que não esteja estipulada por uma lei (por exemplo, o famoso art. 4 do Code Civil). Só com essa norma de conceder à jurisdição a responsabilidade própria, o juiz se emancipou do velho controle imperial da política”.470

A essa importante mudança estrutural corresponde, já no séc. XIX, a reelaboração da ciência do direito processual. Como aponta Arruda Alvim, com a reelaboração de, praticamente, toda a ciência do direito no séc. XIX, do direito processual, particularmente, na segunda metade do século XIX, tratava-se de construir as bases científicas que permitissem autonomia do direito processual como ciência.471 Até então, por influência do direito romano, o processo era considerado como um aspecto do direito material, uma projeção do direito material que, em situações de litígio, permitia determinadas ações judiciais. O direito processual, por sua vez, era um capítulo do direito civi, disciplinado por princípios do direito civil. Direito (material) e ação expressavam uma mesma realidade.

Em 1868, Oskar von Bülow publica a obra Teoria das exceções dilatórias e dos pressupostos processuais em que acaba por distinguir o direito material controvertido do processo em que a controvérsia se resolvia. A partir de então, o direito processual identifica a relação processual como algo diverso do direito material e um direito ao processo que é direcionado contra o Estado e não contra a parte, razão pela qual é direito público. Daí porque Arruda Alvim afirma que “a partir desta distinção, passou-se a identificar, na principiologia do processo, a predominância da marca do Direito Público”,472 germe que levará as preocupações

470 LUHMANN,Niklas. Differenziazione del diritto, contributi ala sociologia e ala teoria del diritto. Tradução de

Raffaelle de Giorgi. Bologna: Il Mulino, 1990, p. 372-373.

471 ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 13.ed.São Paulo: RT, 2011, p.101-105.

472 ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 13.ed.São Paulo: RT, 2011, p.101-105. Também Cândido Rangel

Dinamarco, para quem “Von Bulow abriu os olhos dos estudiosos para o outro lado do instituto, mostrando que há também entre o juiz e as partes uma relação, progressiva sim, mas verdadeira relação jurídica, por força da qual, de um lado, o juiz assume a concreta obrigação de decidir e realizar o direito deduzido em juízo; e, de outro, as partes ficam obrigadas, perante

da ciência do direito processual a se deslocarem, já no século XX, para o problema da decisão judicial, mais do que da ação.473

Como se nota, no pano de fundo de toda essa problemática está a imposição normativa ao juiz da proibição de denegar justiça, o que significa que o sistema jurídico convive com uma expectativa com validade contrafática nesse sentido.474 A obrigação de decidir, imposta normativamente, demarca nitidamente a diferenciação interna do sistema jurídico: só os tribunais estão obrigados a decidir, por isso, estão no centro do sistema. Leis não estão obrigadas a serem emitidas e contratos não estão obrigados a serem concluídos. Só os tribunais estão obrigados a “transformar a indeterminação em determinação; só eles fingem, quando é necessário, a indisponibilidade dos princípios. Só eles estão obrigados a decidir e, por consequência, só eles gozam do privilégio de poder transformar a necessidade em liberdade”.475 E é assim que o paradoxo do sistema – o direito que determina o que é

direito – é manejado no centro, isto é, nos tribunais: só eles são obrigados a aplicar o código lícito/ilícito.

Na medida em que cabe aos tribunais manejar o paradoxo do sistema – estão juridicamente compelidos a aplicar juridicamente a distinção lícito/ilícito –, integrando em última instância as premissas decisionais, não se pode descrever o sistema jurídico como uma

ele, a prestar uma colaboração indispensável e a submeter-se aos resultados dessa atividade comum”. (DINAMARCO,

Cândido Rangel. Fundamentos de direito processual civil moderno. 6.ed. v.1. São Paulo: Malheiros, 2010).

473 Cândido Rangel Dinamarco fala, ainda, em três fases metodológicas do direito processual: sincretismo, autonomista ou

conceitual e teleológica ou instrumentalista. A primeira corresponde ao processo considerado como projeção do direito material e não poderia ser considerada ciência do direito processual, pois não se concebia a relação jurídica processual. A segunda fase, inaugurada pela obra de Büllow proclama a existência de uma relação processual entre juiz, autor e réu, que não se confunde com a relação de direito material e que tem pressupostos independentes do direito material. Daí se pode falar em ciência do processo e em reflexividade do direito processual. Nessa fase desenvolvem-se os conceitos fundamentais como

ação, as condições da ação, pressupostos processuais, princípios etc. Contudo, instaurada a fase conceitual, “foi preciso

quase um século para que os estudiosos se apercebessem de que o sistema processual não é algo destituído de conotações éticas e objetivos a serem cumpridos no plano social, no econômico e no político. Preponderou, por todo esse tempo, a crença de que ele fosse mero instrumento do direito material apenas, sem consciência de seus escopos metajurídicos”. A partir dos trabalhos de Mauro Cappelleti e Vittorio Denti teriam sido lançadas as bases para um processo focado nos resultados que pode produzir. Mas só na segunda metade do século XX a teoria do direito processual irá abandonar a actio para conceber a obrigação de decidir (a jurisdição) como o núcleo das preocupações processualistas. Sobre essa passagem teórica:

DINAMARCO,Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.17.

474 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.374-375. Para Luhmann, a fórmula da proibição da denegação de justiça – a despeito de seu grande

significado estrutural, que possibilita inclusive que o juiz decida contra suas convicções, abrindo caminho para a sua

neutralização política, ocorrida no início modernidade –, surge por questões pragmáticas. Não existem razões puramente

lógicas para a vedação ao non liquet. O direito, especialmente moderno, não oferece garantias para uma dedução lógica das

decisões (a completude real do ordenamento). Sempre há lacunas e a saída lógica para o juiz vinculado à lei seria, diante de lacunas, deixar de decidir.

475 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

hierarquia em que a lei subordina o juiz. Nem o contrário, com o juiz subordinando o sentido da lei. É evidente que os juízes estão sujeitos à lei e devem cumpri-la, assim como os legisladores estão. Os tribunais não emitem ordens ao legislador, mas, na sua prática decisional e interpretativa, antepõem condições mediante as quais a legislação será entendida e praticada, isto é, “fazem valer sua própria existência”.476

Os tribunais são organizações formais, isto é, um tipo específico de sistema social477 que, como organização, produz decisões sobre os critérios de inclusão/exclusão dos seus membros e, desse modo, possibilitam comprometimentos específicos dos juízes. Todo o não-judicial está na periferia do sistema, sejam formas públicas ou privadas de produção do direito, nenhuma delas parte da obrigação de decidir e, por isso, no sistema se equiparam. Na periferia “podem se apresentar interesses de qualquer índole e os impor com todos os meios disponíveis, sem que isso implique distinguir interesses legais/interesses ilegais. Precisamente por isso a periferia serve de zona de contato com outros sistemas de funções da sociedade”.478

A obrigação de decidir, de manejar o código do sistema em última instância, coloca o Poder Judiciário, organização formal, no centro do sistema. As leis, os contratos, a dogmática, enfim, todas as formas de produção normativa que não estão, de partida, obrigadas a decidir, estão na periferia.

Na periferia, o direito não está obrigado a aplicar o código lícito/ilícito. Todos os interesses, formalizados ou não, de fonte pública ou privada, se apresentam como projeções de expectativas normativas, isto é, projeções de uma comunicação que generalize de modo congruente a distinção lícito/ilícito. É só no centro que essa distinção deverá ser, obrigatoriamente, aplicada e, com isso, o sistema protege sua autonomia. Ao não ter que decidir (i.e. aplicar o código) garante-se que o sistema “não funcione simplesmente como extensão, sem vontade, de operações externas ao direito”.479

476 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.382-383.

477 O conceito de sistema social inclui desde a sociedade como um todo até breves interações entre pessoas presentes e,

também, as organizações formais, como os tribunais. Nesse sentido: (LUHMANN, Niklas; DE GIORGI, Rafaelle. Teoria

della società. 11.ed. Milano: FrancoAngeli, 2003, p.25; sobre sistemas interacionais e organizacionais, p. 316-325).

478 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.383.

479 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Por esse motivo, o centro precisa de maior proteção. Se demandas de normatividade vindas do ambiente do direito (a sociedade) pudessem ser imediatamente submetidas à decisão dos tribunais, o sistema teria dificuldades de manter sua autonomia, seu sentido específico. Por isso, comparados com o legislador ou com contratantes, os tribunais trabalham com um “isolamento cognitivo muito mais drástico”.480 O processo desenvolve uma

função fundamental aqui na medida em que subordina o conflito de interesses, as projeções de expectativas normativas contrapostas, a uma argumentação e encaminhamentos propriamente jurídicos. Ademais, “o acesso aos tribunais deve ser discreto e organizado, o mais possível, de maneira seletiva. Só um minúsculo percentual de questões jurídicas se coloca aos tribunais para que decidam”,481mas quando precisam decidir, devem fazê-lo independentemente da

facilidade do caso e do resultado perante a opinião pública.

Na medida em que estão obrigados a decidir, os tribunais não podem depender de consenso real. A obtenção de consenso é delegada à periferia, na forma do contrato e das leis (aprovadas mediante consenso).482 A decisão, assim, tem condições de se aplicar sobre uma controvérsia jurídica e não valorações políticas (de consenso), econômicas (eficiência) ou moralistas, que terminariam por corromper o código e subordinar o direito a programas de outros sistemas.483

Nesse cenário, tem-se que a abertura cognitiva do sistema é muito menor nos tribunais, no centro do sistema, do que na periferia. Isso faz com que os tribunais trabalhem em um fechamento temporal e objetivo, o que dificulta cálculos quanto ao momento e sentido da decisão (dois pontos fundamentais no movimento de reforma do processo sob a égide da celeridade e da previsibilidade das decisões).

De uma perspectiva abstrata, a decisão interrompe a relação entre passado e futuro. A decisão, que só pode ser proferida no presente, seleciona o passado relevante para o caso e determina como esse passado se enlaçará com o futuro. O futuro não é deixado simplesmente às consequências lógicas da decisão. A própria decisão inventa, a partir dos

480 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.385.

481 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002.

482 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.385.

483 Uma análise profunda sobre o problema da corrupção do código sistêmico nas relações entre política e direito.

programas do direito vigente, delimitações obrigatórias no futuro, isto é, constrói seu próprio tempo.484 A ideia da reversibilidade como requisito das medidas de urgência no processo ilustra bem essa construção: reversível, em última análise (quando há dúvida sobre a possibilidade de reverter materialmente os efeitos de uma decisão liminar), é tudo aquilo que, de acordo com o direito vigente, possa ser convertido em perdas e danos.

A decisão judicial, mesmo aquela chamada urgente, concedida liminarmente, não é determinada pelo tempo dos acontecimentos no ambiente, isto é, no exterior do sistema jurídico. A decisão ocorre sempre no presente e constrói, no presente, seu próprio tempo para mediar passado relevante e efeitos da decisão.485 Os problemas referentes à tempestividade da decisão judicial decorrem das dificuldades de sincronizar o tempo construído no processo com o tempo construído nos outros sistemas. Igualmente os problemas da celeridade do processo, ou seja, da duração total do processo: o tempo de duração do processo parece demasiado longo diante do tempo necessário para as operações econômicas, para a tomada de decisões políticas, para o aprendizado, para adoecer e para recuperar a saúde etc., enfim, diante do tempo das operações em outros sistemas.

A clausura cognitiva com a qual os tribunais trabalham é problemática também para a previsibilidade do conteúdo das decisões postulada pelas semânticas da certeza do direito (e pelo movimento reformista). Apenas os tribunais têm a tarefa de supervisionar a consistência das decisões judiciais e o fazem por meio de observações de segundo grau: observam decisões que já observaram o direito. 486

Embora leis e contratos também interpretem o direito para delimitar seu próprio espaço criativo, “os tribunais interpretam em um sentido diferente, a saber, de maneira argumentativa: para demonstrar a racionalidade da sua própria decisão”. 487 Com isso,

examinam até onde a consistência da observação do direito permite integrar novas informações ou modificações. As leis, os contratos, a dogmática, são todos observados como premissas decisionais, que devem ser consideradas na decisão, mas que não determinam a

484 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.388.

485 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002.

486 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002, p.389.

487 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

decisão. A essas premissas, o tribunal integra outras, reduzindo a indeterminação dos programas, mas aumentando a incerteza quanto ao conteúdo da decisão.488

Do ponto de vista do direito processual (e constitucional), a obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais é postulada como igualdade de conteúdo entre o direito estatuído e o direito aplicado: o juiz deve fundamentar sua decisão na lei.489 A perspectiva sistêmica, de outro lado, permite perceber que há uma “transmissão de premissas decisionais mantidas idênticas, do nível da produção do direito ao nível da sua aplicação”, 490 mas em que

há agregação de novas premissas pelo juiz. Trata-se de uma estratégia de redução de complexidade por níveis, pois uma complexidade tão alta, como a produzida pela positividade do direito, não poderia ser reduzida em um único processo decisional.491

Contudo, o estabelecimento de premissas decisionais no nível dos programas não confere previsibilidade à decisão – e isso é um ponto fundamental para compreender as possibilidades de certeza no direito moderno. Diferenciado na forma centro-periferia, com os tribunais ao centro, toda e qualquer tentativa de planificar o operar do direito, ou seja, de controlar externamente – com previsibilidade e calculabilidade – a aplicação do código lícito/ilícito tende a fracassar. Perspectivas desse tipo pressupõem uma hierarquia entre lei e jurisdição, um modelo que não corresponde estruturalmente ao sistema jurídico. Também do ponto de vista interno ao sistema, a forma de diferenciação condiciona o processamento de

488 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. Tradução de Javier Torres Nafarrate. Mexico: Universidad

Iberoamericana, 2002.

489 Para a dogmática tradicional a decisão judicial ou reconhece direitos cuja validade, vigência e eficácia pré-existem ao

processo (tese dualista), ou concretiza direitos que, antes da decisão judicial, são incompletos e não têm condições de eficácia (tese unitária). Assim, adotando a tese dualista, Cândido Rangel Dinamarco, para quem “juiz espera-se a fiel e correta

revelação das normas substanciais concretas, partindo do texto da lei”. (DINAMARCO,Cândido Rangel.Instituições de

direito processual civil. 5.ed. v.1, São Paulo: Malheiros, 2005, p. 59-61). Mais adiante, diz o autor que “a realidade da vida mostra que direitos e obrigações nascem, desenvolvem-se, modificam-se e extinguem-se, na grande maioria, sem qualquer interferência judicial [...] a vida dos direitos é firmemente calcada na premissa da preexistência das situações jurídicas de direito material em torno das quais se desenvolvem os processos em juízo” (p.152; 150-156). Em sentido convergente com a

No documento Tiago Cardoso Vaitekunas Zapater (páginas 156-164)