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Demonstrada a classificação dos precedentes judiciais quanto aos efeitos por ele produzidos, resta saber em que se fundamenta a atribuição de um ou outro efeito a determinado núcleo normativo, demonstrando-se o que é irrelevante na atribuição dessa força. A atribuição de um ou outro efeito ao núcleo do precedente judicial depende de

fatores institucionais e de fatores extrainstitucionais118.

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BERGHOLTZ, Gunnar; PECZENIK, Aleksander. Precedent in Sweden. In MACCORMICK, D. Neil; SUMMERS, Robert S. (coord.). Interpreting precedents: a comparative study. Estados Unidos: Dartmouth, 1997, p.299; PECZENIK, Aleksander. The binding force of precedent. In MACCORMICK, D. Neil; SUMMERS, Robert S. (coord.). Interpreting precedents: a comparative study. Estados Unidos: Dartmouth, 1997, p.462. Nesse sentido: Robert S. Summers diz que, nos Estados Unidos, os precedentes judiciais podem ser formalmente vinculantes (formal bindgness), não formalmente vinculantes, mas que têm força (not formally

binding but having force), não formalmente vinculantes, sem força (not formally binding and not having force) e

meramente ilustrativos ou dotados de outros valores (mere illustrativeness or other values). Sem definir o momento de produção dos efeitos e os contornos desses efeitos produzidos por um precedente judicial, o referido autor apenas demonstra as consequências decorrentes de sua inobservância. O desrespeito a um precedente judicial formalmente vinculante conduz à revisão da decisão em sede recursal. A não observância de precedente não formalmente vinculante, mas que tem força, conduz a possibilidade de reversão da decisão em sede recursal. A não aplicação de um precedente não formalmente vinculante, sem força, leva à exigência de que se fundamente na decisão a não utilização do precedente judicial. A inobservância de precedente judicial meramente ilustrativo não traz consequências. (SUMMERS, Robert S. Precedent in the United States (New York States). In MACCORMICK, Neil D.; SUMMERS, Robert S. (coord.). Interpreting precedents: a comparative study. Estados Unidos: Dartmouth, 1997, p.368).

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p,306. Neil Duxbury também entende que a autoridade de um precedente judicial é variável e depende de vários fatores. (DUXBURY, Neil. The nature and authority of

Dentre os fatores institucionais que determinam a força de uma norma jurisprudencial, citam-se o contexto institucional stricto sensu, a tradição jurídica e a estrutura constitucional.

Utilizando-se o contexto institucional stricto sensu, pode-se estabelecer que quanto maior o posto hierárquico do órgão jurisdicional que prolatou uma decisão, maior será

sua força como precedente judicial119. Dessa diretiva geral, decorrem outras subsidiárias, a

saber: a) decisões proferidas pelo Tribunal Pleno ou por órgãos especiais de um tribunal têm autoridade mais elevada do que precedentes de órgãos inferiores na estrutura hierárquica de

um mesmo tribunal120; b) havendo dissenso entre os votos dos julgadores componentes dos

órgãos colegiados, o precedente tem força vinculante relativizada121; c) decisões que formem

uma tendência jurisprudencial identificável e estabeleçam uma linha definida têm força maior

do que os precedentes isolados122; d) decisões que representam visão unânime de um tribunal

têm mais força do que as decisões que representam uma visão majoritária ou que representam

visões isoladas123; e) os conflitos entre precedentes judiciais tendem a enfraquecê-los,

tornando-os meramente persuasivos124; f) as decisões dos juízes mais antigos e renomados ou

as decisões mais testadas têm maior força125; g) decisões proferidas por órgão jurisdicional

que tem mais experiência no julgamento da matéria gozam de maior peso126; h) o período em

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DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Estados Unidos: Cambrigde, 2008, p.62-65; DOBBINS, Jeffrey C. Structure and precedent. Michigan Law Review. Vol. 108, 2010, p.1455-1496, p.1463; BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.310-311; ATAÍDE JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues. Precedentes

vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais

Superiores e sua Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012, p.103.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.310-311.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.310-311.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.310-311.

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DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Estados Unidos: Cambrigde, 2008, p.62; ATAÍDE JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual

brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais Superiores e sua Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012, p.53 e 103.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.310-311. Jaldemiro Rodrigues de Ataíde Júnior adverte que a atribuição de força aos precedentes judiciais depende de uma série de fatores, dentre eles, a relação hierárquica entre o tribunal que produziu o precedente e o tribunal do caso em julgamento, o fato de o precedente encontrar- se em conflito com o precedente da mesma corte, o fato de a questão de direito ter sido decidida pela maioria dos membros do órgão julgador, em virtude de os diversos juízes terem apresentado variadas razões, tendo a questão sido julgada por voto médio. (ATAÍDE JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues. Precedentes vinculantes e

irretroatividade do direito no sistema processual brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais Superiores e sua

Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012, p.99-100).

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DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Estados Unidos: Cambrigde, 2008, p.62; ATAÍDE JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual

brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais Superiores e sua Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012, p.53 e 103.

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que o precedente judicial vem sendo observado pelos órgãos jurisdicionais amplia sua

força127; i) o fato de o precedente ser citado na própria corte que o produziu ou em outra,

fortalece-o128.

A tradição jurídica em que o aplicador do direito está inserido, como fator que contribui para o peso a ser atribuído ao núcleo de um precedente judicial, pode ser relativizado, porque os sistemas do common law e do civil law tendem a convergir, havendo em ambos, espaço para “a criação de normas adscritas por meio de atividade de aplicação do

Direito pelos tribunais129”. Conclui-se, então, que a tradição jurídica que norteia o aplicador

do direito já não é fator determinante de atribuição de força à ratio de um precedente

judicial130. Trata-se, em verdade, de fator irrelevante ou de pouca importância na atribuição de

força ao núcleo normativo do precedente judicial.

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Michael J. Gerhardt fala em permanência de determinada decisão judicial no tempo, no âmbito de determinado tribunal. (GERHARDT, Michael J. The power of precedent. United States: Oxford, 2008, p.3/14- 37); ROSITO, Francisco. Teoria dos precedentes judiciais: Racionalidade da tutela jurisdicional. Curitiba: Juruá, 2012, p.117.

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GERHARDT, Michael J. The power of precedent. United States: Oxford, 2008, p.3/14-37; ATAÍDE JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual

brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais Superiores e sua Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012, p.99.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.312. Nesse sentido: MELLO, Patrícia Perrone Campos.

Precedentes: O desenvolvimento judicial do direito no constitucionalismo contemporâneo. Rio de Janeiro:

Renovar, 2008, p.52-54; MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.99

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A respeito da aproximação dos sistemas do common law e do civil law: “Continuando o discurso no plano da comparação de modelos e chegando à relação entre ordenamentos processuais de civil law e de common law, parece oportuno desobstruir o campo de algumas contraposições tradicionais, que foram usadas com frequência para expressar as diferenças fundamentais entre os dois tipos de ordenamentos, mas se mostram há tempo superadas e já incapazes de fornecer conhecimentos atacáveis”. (TARUFFO, Michele. Observações sobre os modelos processuais de civil law e de common law. Revista de Processo. Ano 28, n° 110, abr-jun. 2003, p.143). José Carlos Barbosa Moreira também acredita na aproximação entre o common law e o civil law. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O processo civil contemporâneo: um enfoque comparativo. Temas de direito processual. São Paulo: Saraiva, 2007, 9ª série, p.53). “Este sugere a idéia de uma relação dinâmica entre a deriva de dois

icebergs, e deste modo pressupõe que – o iceberg do civil law e o iceberg do common law – existem como

entidades relativamente homogêneas, mesmo que ocorra uma tendência de recíproca aproximação”. (TARUFFO, Michele. Icebergs do common law e do civil law? Macrocomparação e microcomparação processual e o problema da verificação da verdade. Revista de Processo. Ano 35, n° 181, mar. 2010, p.168); SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do Precedente Judicial à Súmula Vinculante. Curitiba: Juruá, 2011, p.320. “Os juízes italianos, alemães, espanhóis, e imagino que também os latino-americanos, usam o precedente de forma substancialmente igual, não diferente do modo em que o fazem os juízes da common law. Até alguns anos, fizemos um estudo comparado com um grupo de amigos filósofos do direito, precisamente sobre essas coisas levando em consideração doze ordenamentos distintos, dois de common law: Inglaterra e Estados Unidos, e dez de civil law: Finlândia, Itália, Alemanha, etc., e analisamos estes ordenamentos com os mesmos instrumentos. O resultado foi que, na realidade, as diferenças no uso concreto do precedente são pouco relevantes. A única exceção aparente está representada pela França, onde os juízes não citam os precedentes quando fazem a motivação da sentença, mas os franceses dizem que não as citam, “as usam”, portanto esta é uma diferença somente aparente e não uma diferença real. Não é que o juiz francês não utiliza o precedente para raciocinar, mas não o especifica por razões de ordem judicial”. (TARUFFO, Michele. Trad. Rafael Augusto Zanatta. O precedente. Disponível em <http://cadernodeestudosjuridicos.blogspot.com.br/2010/11/o-precedente.html> Acesso em 03 maio 2014, p.3).

A estrutura constitucional é elemento importante na determinação da força da norma geral do precedente judicial. Nesse âmbito, existem três fatores que também devem ser levados em consideração pelo aplicador da ratio. São eles: a doutrina dominante acerca das relações entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, a autocompreensão do Poder Judiciário quanto à sua atividade e as normas de direito positivo sobre a aplicação de

precedentes judiciais131.

A teoria dominante adotada por um Estado sobre os limites do Poder Judiciário e suas relações com o Legislativo é fator importante para se entender a força atribuída ao núcleo normativo de um precedente judicial. Quanto mais amplos forem os poderes do Poder Judiciário, mais especificamente, de um tribunal, para realizar revisão das decisões judiciais,

mais força terá a ratio do precedente judicial132.

A autocompreensão do Judiciário, ou seja, a forma como os juízes entendem a sua atividade também influencia a força que se atribui à norma jurídica geral dos precedentes judiciais. Os juízes podem encarar que sua atividade é de produção normativa ou de aplicação de normas em sentido estrito. Se entenderem que atuam na produção normativa, os

precedentes judiciais serão vinculantes em sentido forte133.

Outro fator capaz de determinar a força da norma jurídica geral de um

precedente judicial é a existência de normas de direito que dispõem sobre a sua força134.

Dentre os fatores extrainstitucionais que determinam a força de uma norma jurisprudencial, citam-se as concepções jurídico-teóricas, os fatores normativos-estruturais e a correção substancial da decisão-paradigma.

Com base no primeiro fator extrainstitucional, “quanto maior for o peso que se atribua à dogmática jurídica e quanto mais racionais e socialmente eficazes sejam as

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.314.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.314-315.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.315-316.

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BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação das regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p.322. Michael J. Gerhardt fala em compulsão, quando se coage os juízes a decidirem de determinada maneira. (GERHARDT, Michael J. The power of precedent. United States: Oxford, 2008, p.3/14-37). Segundo Lenio Luiz Streck, esse efeito de vinculação não decorre de lei ou de Constituição, mas sim, da tradição. (STRECK, Lenio Luiz. Súmulas, vaguezas e ambigüidades: necessitamos de uma “teoria geral dos precedentes”? Direitos fundamentais e justiça. N° 5, out-dez. 2008, p.165). Pierluigi Chiassoni diz que a relevância formal do precedente depende de regra jurídica de direito escrito ou não escrito, enquanto que a relevância empírica dispensa essa previsão. (CHIASSONI, Pierluigi. Il precedente giudiziale: tre

esercizi di disincanto. Disponível em

<http://www.giuri.unige.it/intro/dipist/digita/filo/testi/analisi_2004/07chiassoni.pdf> Acesso em 03 maio 2014, p.96).

premissas dogmáticas utilizadas na justificação de um precedente”, mais peso ele terá135”. Valendo-se do segundo fator, extraem-se algumas diretivas: “normas jurisprudenciais

adscritas do tipo ‘regra’ têm um peso ou vinculatividade maior que as do tipo princípio136”,

“quanto mais explicitadas e fundamentadas estejam as transformações necessárias para justificar dedutivamente essa decisão –, maior peso ou força deverá ser atribuído à norma

adscrita que puder ser extraída de referido ato jurisdicional137”, “quanto mais coerente138 for a

justificação dada às normas adscritas a que se pretende atribuir força de precedente, maior

deverá ser seu peso139”. Utilizando-se o terceiro fator, tem-se que o precedente judicial só

deve ser seguido, isto, é, somente gozará de força, se for justo e racional140.

Foi visto que, quanto aos fundamentos para se classificar os precedentes judiciais, o repertório é imenso, como acima exposto, de maneira que no capítulo 3 (item 3.3.2), serão demonstrados aqueles que conduzirão efetivamente a taxar um precedente de vinculante/obrigatório ou persuasivo, no ordenamento jurídico brasileiro.