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Gelson Antonio Lopes Junior Universidade Federal de Pernambuco

I

Em um território geográfico-áspero, jovens se acomodam como cargas em caminhões diversos, e ali ficam sossegados, por vezes um sussurro com o amigo, ou desconhecido. Todos estão cabisbaixos, privados de uma enverga- dura vertical: colunas curvadas, joelhos dobrados, olhares turvos. De modo repentino, um rapaz decide erguer a cabeça, e não vê mais do que a sua posição anterior. Ele observa além de seu cômodo, e enxerga a terra vermelha, seca e motinada que todos seguem! Também percebe que há outros caminhões com suas cargas sossegadas e sussurrantes. Por breve momento ele sorri, pois na porta há um ícone de um menino correndo, provavelmente de alguma empresa de pronta entrega.

Ele desce com os outros, e o vermelho distante da terra que observou, se apazigua em seus joelhos. Ele se depara no centro de todos os outros: à sua di- reita alguém enxuga o suor da face, à sua esquerda o sangue de um ferimento. Ao largo, escuta as vozes replicantes dos que margeiam todos os outros. Umas das vozes parece chorar, parece amuar, mas todas elas, também as silenciosas estão prontas e entregues. Não há delongas, e um vozear, não amotinado soli- cita gentilmente que se alinhem.

Agora, o vermelho da terra motinada e apaziguada maquila sua face. Como todos os outros, e são muitos, ele se encontra alinhado: alinhada sua coluna, seus joelhos e seu olhar. O vozear tranquilo cessa, assim como todas as

vozes para que um ruído bélico transfixe breve e sutilmente suas envergaduras horizontais. De silencio em silencio, o ruído se aproxima para restituir sua envergadura vertical...

O presente texto tematiza uma possível contribuição meditativa sobre o pensamento do filósofo alemão Martin Heidegger. Neste ho- rizonte, assumimos como eixo de tematização o conceito da finitude (Endlichkeit). Essa noção é fundamental na compreensão do que signifi- ca ser um humano apreendido na indissociabilidade com o seu mundo. A meditação aqui, consiste em compreender se este fenômeno indisso- ciável reside na negatividade ou na dubiedade.

O conceito de finitude é habitualmente reportado ao tema da morte, da solidão, ou da sua relação com a infinitude. De modo geral, estes três temas podem ser encontrados em três obras aparentemente distintas no próprio Heidegger, sucessivamente: Ser e Tempo; Os Con- ceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão; e, Kant e o Problema da Metafísica. Do mesmo modo, encontramos as pesquisas sobre o conceito de finitude no Heidegger nestas três instâncias. No cenário da pesquisa acadêmica brasileira1, são incomuns os estudos

que intitulam Heidegger e finitude.

Primeiramente, indicamos breves exemplos. Na pesquisa de Na- ves e Oliveira (2013) a finitude é pensada como conversão à autenti- cidade, um reconhecimento do Ser-aí humano de seu fim exclusivo e irremediável, o fenômeno da morte. Neste reconhecimento, o Ser-aí humano tem seu jaez privilegiado através do qual se desengana com as ocupações continuas e cômodas do mundo, lançando-o em uma ‘outra

dimensão’ existencial, a da “estranheza” perante o mundo, que o faz sentir-se novamente mortal, portador de uma finitude existencial (p. 232).

Na mesma linha desta desilusão frente às ocupações no mundo, Seibt (2013) reúne palavras na intersecção da finitude com a solidão, para expor o poder das massas ou do impessoal, através do qual o humano foge de si mesmo, de sua finitude nas formas do falatório, ambiguidade e curiosidade. Isto significa que as relações humanas encontram-se restritas do seu silêncio, do afastamento das multidões, e portanto, esta compreensão sugere a urgência da formação de uma idoneidade para a solidão.

1 Nos referimos aos setores virtuais mais acessados de compartilhamento de pesquisas acadê- micas: CAPES, SIELO, GOOGLE ACADÊMICO.

Nesse sentido amplo, em que o Ser-aí é arrastado pelos entes intramundanos com os quais convive, dissipando-se nas ocupações, na medida que ele existe enquanto finitude a sua temporalidade é submergida. Costa (2010) reporta a compreensão sobre a finitude como àquela possibilidade irremediável que aniquila todas as outras possibilidades, e, sendo ela própria a possibilidade que permite realizar todas as outras (p. 156).

Segundo Reis (2004), nesta capacidade que aniquila e realiza, o problema desponta ao ponderarmos um esclarecimento positivo da finitude. Isto porque a finitude do existir humano acopla a noção de possibilidade com o de negatividade. Dessa maneira, existir de modo finito é a determinação positiva das possibilidades humanas. Em outras pala- vras, ela é o elemento de negatividade que qualifica as possibilidades existen- ciais e o completo projetar-se nela. Nas análises de Reis, esta determinação positiva e este elemento negativo, a finitude, correspondem a um dos componentes estruturais da temporalidade originária que mais diretamente contradiz as noções usuais do tempo, pois a estas ligam-se os aspectos de infi- nitude (p. 111).

Nos estudos de Ferreira (2003), a noção de infinitude indica a ilusão de vermos acontecimentos distintos de maneira sequencial e sucessiva, em outras palavras, que os acontecimentos se dão suces- siva e continuamente num prosseguimento infindável de fatos. Nos iludimos na crença de uma “ocorrência de agoras”, responsável pela concretização e decurso dos acontecimentos, configurando assim, uma unidade. Para ser mais exato, esta noção de tempo como su- cessão sugere um futuro sem fim e um passado irreparável em um presente pontual, decorrendo na homogeneidade e irreversibilida- de de todo acontecimento. Nesta mesma compreensão, Seibt (2012) pontua que o ponto de vista da infinitude elimina a disposição do espanto e admiração, e o modelo da finitude mantém a idoneidade

para o mistério e, portanto, para a atitude de espanto e admiração (p. 113). Neste percurso, diante destas três perspectivas, em que a finitude tem seu esclarecimento, transfixa a passagem da inautenticidade para a autenticidade. Nestes três esclarecimentos não versamos diretamen- te, mas sim na passagem, na qual buscamos compreender a finitude no como de um duplo significado, se uma dubiedade ou uma negati-

vidade. Para tal, seguimos a obra norteadora de tal artigo, Os conceitos

Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão.

II

]O terror dado como tragédia de si. De início, a finitude indica a condição humana de sua contingência radical, de um sentimento de dever-morrer. Assim, cerca de dez mil quilômetros de nosso território, arde na mídia mais um episódio sobre a área mais conflituosa do mun- do, o oriente médio. De início, cercam páginas virtuais dessa luta pela subsistência como proveniente de coligações políticas, consequente sequestro, e execuções sumárias: o assassinato de jovens israelenses, a decapitação do jornalista americano Steven Sotloff, e a execução dos soldados sírios.

De fato, estamos atualmente acometidos por uma política ver- tiginosa, corrupta, indigesta; por uma crise econômica na qual a mais extrema pobreza convive com a mais extrema riqueza (KONINCK, 2007, p. 16); pela falta de força da sociedade civil em sua reivindicação (basta lembrar do colapso do movimento OcupeEstelitano Recife)2; pelo de-

sespero político em 13 de agosto de 2014 com o falecimento acidental de um dos candidatos à presidência, Eduardo Campos: Trata-se de um evento que constrangeu o cenário político no período das eleições, ge- rando teorias conspiratórias decorrente da névoa corrupta na política brasileira. Mediante isto, segundo Heidegger, pontuamos que há penú- rias por toda parte, e todas estas partes não podem ser consideradas de modo parcialmente simples, na medida que semelhantemente violen- tas e ruidosas são as tentativas de manobrar, suprimir e administrar as penúrias à ordenação e à satisfação. Nas quais se empenham,

não apenas indivíduos singulares, mas também grupos, associa- ções, círculos, classes, partidos estão por toda parte em obra em consonância com estas tentativas e esforços – tudo e todos estão organizados contra as penúrias e cada organização tem seu pro- grama. No entanto, justamente esta reação atual contra as pe- núrias do ser-aí as ratifica; e ainda confirma ao mesmo tempo e antes de tudo algo diverso. A reação de defesa que se agita contra as penúrias não deixa justamente vir à tona uma penúria na totalidade. (HEIDEGGER, 2003, p. 192)

Conforme Heidegger, o somatório das penúrias mais diversas, a opressão desta ou daquela penúria não possibilita uma penúria na totalidade, “o que oprime da maneira mais profunda e velada é mui- to mais: o permanecer de fora de uma opressão essencial de nosso ser-aí na totalidade” (HEIDEGGER, 2003, p. 193). Este permanecer de fora da opressão essencial impossibilita o encontro de um com o outro na uni- dade enraizada de um agir essencial, na medida em que todos e cada um de nós somos funcionários de uma palavra de ordem, adeptos de um programa, mas,enfatiza Heidegger nenhum de nós é o gerenciador da grandeza interna do ser-aí e de suas necessidades. (HEIDEGGER, 2003, p. 193).

Com isso, temos de um lado o permanecer de fora e, do outro o permanecer por dentro de uma opressão essencial do ser-aí na totalida- de: uma opressão essencial, significando aqui o permanecer por dentro dela, de uma opressão na totalidade, uma finitude na totalidade. Re- portemos: o soldado sírio deve-morrer, assim restituindo sua enverga- dura vertical, decorrente de uma opressão política. Porém, não adianta aqui, se evadir desta opressão para restituir sua envergadura.

É preciso permanecer dentro de uma opressão do fim na totalidade de seu existir. O seu fim não chegou, o fim está ali, adiante; Ele-advir de silencio em silencio, e com isto o soldado permanece por fora de tal opressão – uma opressão simplesmente dada. E mesmo que o seu fim não tenha chegado, ele está para o fim. O não gerenciamento, ou o não se posicionar numa opressão essencial, impõe para si uma tragédia: o de que nossa envergadura vertical se encontra do outro lado, no além! Não obstante, uma envergadura essencial reside no reconhecimento do ser-para-o-fim na totalidade do existir.

III

Finitude in-compreendida: entre inquietudes!Diante de fatos que expressam o desespero humano, no seu cerco cultural, social e pessoal de uma fazer ou esperar, Heidegger nos dirá que «o problema do ser-aí humano, a finitude, não se tornou um verdadeiro problema da filoso- fia», e por esta razão deveríamos «seguir este caminho que consiste em se evadir de uma finitude incompreendida e aquietar-se na infinitude» (HEIDEGGER, 2006, p. 241). Ao passo desta inquietação, seguimos na

compreensão desta finitude a partir da preleção apresentada na Uni- versidade de Freiburg, de outubro de 1929 a março de 1930 Os conceitos fundamentais da metafísica: mundo, finitude e solidão.

Conquanto, é preciso ponderar a situação desta obra entre as outras. Preliminarmente, ovaivém entre Ser e ser-aí, referente ao acon- tecimento da verdade do ser, e a virada decorrente de uma mudança no itinerário das meditações do Heidegger, apontam pra uma mesma palavra: Kehre (viravolta). Estes dois momentos correspondem as duas fases de suas meditações filosóficas: a primeira à analítica existencial da estrutura do ser-aí (Ser e Tempo); e a segunda referente ao sentido de ser como horizonte da temporalidade originária (Tempo e Ser). (DOWELL, 2014, p. 99) Sendo a segunda um desdobramento da primeira, marcando os anos pós e pré a 1930, Os conceitos fundamentais da metafísica: mundo, finitude e solidão reside nesta passagem, nesta dúbia viravolta.

De modo específico, a obra tematiza o tédio como resolutivo para a formação de nosso mundo atual – uma fenomenologia do té- dio (REIS, 2013). Posto isto, Heidegger nos solicita a perquirir em nós mesmos se o tédio, como tonalidade afetiva fundamental, reside na impetuosidade de nossas práticas. A incumbência desta obraestá em- provocar explicitamente o tédio no qual desde sempre nos movemos, em despertar o homem para o seu ser-aí, em liberá-lo da revolta con- tra a finitude.Sendo assim, nessa busca para conectar o homem ao seu mundo, à finitude, a obra dispões de 76§: os quinze primeiros corres- pondem aos três capítulos das considerações prévias; a primeira parte segue com cinco capítulos até o §38; e os outros, aos seis capítulos res- tantes. Nós dispomos estes parágrafos em três grupos.

No primeiro grupo, do §1 ao §7 acentuamos nosso problema em torno da finitude, se uma oscilação ou negatividade. No segundo gru- po (§8- §48), no qual Heidegger esclarece as três formas de tédio, fri- samos a finitude posicionada em um “E”, como instancia unificadora, também como negatividade, porém, ligada à tonalidade afetiva. Ago- ra, já iniciada a análise do mundo nas instâncias “a pedra é sem mun- do”, “o animal é pobre de mundo” e o “homem é formador de mun- do”, demarcamos nestes dois precedenteso último grupo (§49 - §76): à finitude não encontramos mais este aspecto negativo ou oscilante, mas seu elo com a questão “o que é o homem? ”.

No primeiro capítulo desta preleção, Heidegger está elucidando de modo introdutório o mundo, a finitude e a solidão. Ele inicia me- diante a definição de filosofia para Novalis, como saudade da pátria, como um impulso pra se estar por toda parte em casa. Mundo indica uma totalidade, uma integralidade:

Somos impelidos, em nossa saudade da pátria, para o ser na to- talidade. Nosso ser é a determinação deste impulso. Já sempre nos encaminhamos de algum modo para esta totalidade; melhor ainda, estamos sempre a caminho desta totalidade. Mas somos impelidos, isto é, de algum modo somos ao mesmo tempo pu- xados para trás por alguma coisa, repousamos sob um peso que nos empurra para baixo. Estamos a caminho desse na totalida- de. Nós mesmo somos este “a caminho”, esta travessia, este nem um, nem outro. O que significa ficar oscilando entre o nem um, nem outro? Um, não, mas também não o outro, este claro que sim, e, porém, não, e novamente sim. O que é essa inquietude do não? Nós a denominamos finitude. (HEIDEGGER, 2003, p. 7)

Está claro que a finitude implica, nesta citação, é um oscilar, mas ele finaliza perguntando sobre o que é a inquietude do não, e não o que é a inquietude da oscilação. Não obstante, isto que oscila também res- soa com as linhas da página 11, “o que acontece nesta pergunta e nesta busca, neste para cá e para lá, é a finitude do homem” (HEIDEGGER, 2003); Do mesmo modo, na página 24 do segundo capítulo, Heidegger trata a finitude como um saber de tipo singular, por estar entre a cer- teza e a incerteza.

E até este momento tudo indica um entre, um oscilar que, linhas abaixo parece entrar numa inconsequência, pois “como o próprio nome já diz, filosofia, este amor a... que se dá com a saudade da pátria... precisa se manter na negatividade, na finitude.” (HEIDEGGER, 2003, p.24). É peculiar perguntarmos: a finitude é este oscilar entre o sim e o não, ou esta inquietude do não? Isto que se manifestou linhas de distância, toma sua proximidade na página 27 deste último (segun- do) capítulo:

em primeiro lugar: explicitamos o questionar filosófico em meio à interpretação de uma sentença de Novalis: o filoso- far é uma saudade da pátria, um impulso para se estar por toda

parte em casa. Em segundo lugar: caracterizamos a dubiedade própria ao filosofar. De tudo isso, retiramos o suficiente para po- dermos afirmar que a filosofia é algo que repousa sobre si mesmo (HEIDEGGER, 2003, p. 27)

Agora, recapitulando, isto que se manifestou linhas de distân- cia e, nesta citação, de proximidade nos mostram duas definições de finitude. Nesta última citação, Heidegger confirma que a dubiedade, o para lá e para cá, a oscilação é própria da filosofia, contudo, ela re- pousa sobre si mesma, ou seja, ela repousa sobre um peso que nos puxa pra baixo. Todavia, onde repousa, na dubiedade ou na negatividade? Pois, ao final da citação da página 7, tendo se referido à oscilação, ele finaliza com a inquietude do não – repousar sobre um peso que nos puxa para baixo é referência à inquietude do não.

Sendo assim, a finitude é a dubiedade ou o que nos puxa para baixo, a negatividade? A intenção é elucidar se a finitude é uma dubiedade, uma negatividade ou os dois juntos. A finitude é um tipo de saber singular por se manter entre a certeza e a incerteza? A filosofia que se mantém na negatividade é finitude? E a dubiedade, seria negada? Por fim, a filosofia é o não, o entre sim e não, ou, é finitude da negatividade/ incerteza ou finitude da dubiedade entre certeza e incerteza?

Nas páginas seguintes, a finitude é articulada à noção de alethéia alusivo ao infinito(HEIDEGGER, 2003, p. 36).Sendo a verdade desti- no do homem, e nela estando a negatividade, tem-se, portanto que “a verdade é um destino da finitude no homem”,e alerta que esta palavra (alethéia) “para a filosofia antiga, não tem nada a ver com a sobriedade e a indiferença das proposições demonstradas” (HEIDEGGER, 2003, p. 37). Sucessivamente, Heidegger já assomadona primeira forma de tédio, questiona afim de ponderar a relação deste com a finitude “o que o tédio tem afinal a ver com a pergunta por mundo, por finitude e por singularização?”, e acrescenta que elas “devem aflorar para nós de uma tonalidade afetiva fundamental” (HEIDEGGER, 2003, p. 97). Mediante questões, ele articula uma virada, na qual marcará a finitude à proporção que, igualmente originária com o tempo (relativo ao tédio) e com o mundo (HEIDEGGER, 2003, p. 98).

Até aqui, temos nestas pequenas frases duas coisas: um realce da finitude como negatividade, e, uma ênfase ao que é dispare à sobrie-

dade e à indiferença, e em vista disto, concordante a uma tonalidade afetiva.Não obstante, cem páginas subsequentes à finalização do escla- recimento sobre as três formas de tédio, Heidegger retoma a finitude articulando-a de modo central (unificadora) com as outras duas per- guntas (o que é singularização, e, o que é mundo?), nos dizendo que

esta unidade no sentido do que esta tonalidade afetiva funda- mental do tédio profundo nos dá própria e efetivamente a per- guntar, quando perguntamos: desde onde e por que há esta ne- cessidade de ligação da amplitude com o ápice – do horizonte com o instante – do mundo com a singularização? Que tipo de “E” é este que se encontra entre estes dois? Por que aquela ampli- tude do horizonte que bane precisa ser, por fim, quebrada pelo instante? Por que ela só pode ser quebrada por ele, de modo que o ser-aí chega à existência própria justamente nesta quebra. A essência da unidade e da junção de ambos é enfim uma quebra? O que significa esta quebra do ser-aí em si mesmo? Nós a chamamos a finitude do ser-aí e perguntamos:o que significa finitude? Somen- te com esta pergunta conquistaremos a pergunta plena, que se apossa do que quer se expressar naquela tonalidade afetiva fun- damental. Não é a finitude do ser-aí que ressoa na tonalidade afetiva fundamental do tédio profundo e nos transpassa de maneira afinadora? (HEIDEGGER, 2003, p. 198)

Assim sendo, nesta citação a finitude encontra-se [entre], em um E enquanto raiz unificadora e originária das outras duas questões (mun- do e singularização). A passagem do ser-aí à existência própria se dá com uma quebra do mundo horizontal pelo instante singular, no meio dos quais questiona-se se a finitude é essa quebra. E de fato o sendo, mantém a questão pela finitude.Nada obstante, ele dispõe a finitude na penúria essencial do ser-aí, discriminando-a de perguntas livrescas, literárias e afins de alguma escola filosófica. A propósito desta distin- ção reporta que a permanência de fora da opressão e a falta do segredo em nosso ser-aí, dispõe para este penúrias diversas e mecanismos de defesa, na medida que

está plenamente em ordem o fato de o homem normal de hoje e o janotinha bem-comportado se atemorizarem e terem talvez mesmo por vezes as suas vistas embaçadas em meio a esta exi-

gência e ao empenho por nos aproximarmos do segredo. Está plenamente em ordem o fato de eles se agarrarem através daí tão conclusivamente a seus ídolos. Seria uma incompreensão querer algo diverso. Precisamos primeiramente clamar uma vez mais pelo que está em condições de apavorar nosso ser-aí. Pois como andam as coisas em relação ao nosso ser-aí, se um tal aconteci- mento-apropriativo como a guerra mundial passa no essencial ao largo de nós sem deixar rastros? Este não é um sinal de que talvez nenhum acontecimento apropriativo, por maior que seja, está em condições de assumir esta tarefa, se o homem mesmo não tiver se colocado antes a caminho de despertar? Quando esta tonalidade afetiva de um tédio profundo está desperta, ela pode revelar para nós simultaneamente a permanência de fora desta opressão e deste instante. (HEIDEGGER, 2003, p. 200-201)

De modo congênere, pensemos como anda o ser-aí diante dos conflitos do oriente médio, diante de suas penúrias, e apesar disso, no essencial diante de uma penúria na totalidade. Um acontecimento- -apropriativo, quando assumido desperta a permanência de fora da opressão e o instante. Devidamente, à finitude é preciso o pavor, o es- tar por dentro da opressão. Este pavor revela simultaneamente a per- manência de fora, e o instante. Mais uma vez, até aqui, a finitude surge como uma quebra, um pavor unificador do mundo e da singulariza-