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2.3 A gestão adaptativa: enfrentando imprevistos no século XXI

2.3.2 Gestão adaptativa e gestão integrada

A proposta de incorporação da gestão adaptativa está intimamente conectada à gestão integrada. Muitas vezes, o planejamento urbano peca pela falta de integração ou inter-relação entre as várias áreas referentes à expansão urbana ao formular estratégias de intervenção em infraestrutura. Um exemplo são intervenções sem qualquer atenção ao impacto ambiental em geral e, em particular, ao impacto para a água urbana em seus componentes (abastecimento, esgotamento e tratamento, resíduos sólidos e drenagem) com consequências como a falta de tratamento do esgoto, esgotamento sanitário sem atenção ao esgotamento pluvial, planejamento de programas de habitação sem atenção à impermeabilização do solo, asfaltamento de vias públicas e canalização de rios e córregos sem atenção à possibilidade do aumento da vazão de cheia e aumento da carga de resíduos sólidos. O impacto da disposição inadequada e a má gestão dos resíduos sólidos tem resultado na insuficiência dos sistemas de drenagem. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2010a) não é implantada. Essas são algumas das consequências da falta de um planejamento integrado (TUCCI, 2004). É notória a impossibilidade de uma empresa de saneamento intervir no uso e ocupação em áreas ribeirinhas, com graves consequências para a qualidade da água de abastecimento. Mesmo intervenções na água urbana tendem a não dar atenção integrada à gestão de seus vários componentes, quando é conhecido o fato de que intervenção em um componente impacta os demais. Assim é que o abastecimento de água e esgotamento sanitário no Município de São Paulo vem sendo tradicionalmente gerido por uma empresa e a gestão dos resíduos sólidos, controle de vetores e drenagem urbana por outras instâncias.

Ainda que ser gerido por diferentes entes não signifique necessariamente ser ineficiente, a bibliografia de apoio à esta pesquisa sugere que a falta de integração pode tornar o sistema pouco operacional. Sobre isso, a bibliografia de apoio à pesquisa constata que os envolvidos na gestão (nos vários níveis) reconhecem que a sustentabilidade e a integração da gestão só ocorrerão com mudanças estruturais que permitam a integração das decisões, e com a flexibilização de estratégias em consonância com a implantação de instrumentos reguladores de uso e ocupação do solo. Autores sugerem que a gestão integrada deve ser abordada mediante o conhecimento da legislação vigente e de seus instrumentos de gestão, da política e

da interface entre planos, arranjos institucionais e articulações entre organizações para o planejamento integrado, sobretudo, de saneamento básico, recursos hídricos, planejamento urbano e uso e ocupação do solo, meio ambiente, resíduos sólidos, saúde e educação. Priorizando o foco em manejo de águas pluviais, o princípio da gestão integrada considera a inter-relação entre estes e outros campos de intervenção que tenham interferência na gestão da drenagem urbana e nos usuários dos serviços que oferece A gestão integrada exige, portanto, cooperação entre instituições, organizações públicas em seus vários níveis de decisão e atuação, o setor privado, a comunidade acadêmica e pesquisadores e a sociedade civil. O uso sustentado dos recursos, a abordagem multissetorial e a prioridade para as medidas não estruturais, como a gestão da demanda, são estratégias básicas na gestão integrada (SILVA & PORTO, 2003). Em consonância com a gestão adaptativa, a flexibilização das políticas será enriquecida com a atenção aos fracassos de intervenções. É o exemplo clássico do fracasso da Lei 898, de 18 de dezembro de 1975 de Proteção aos Mananciais (SÃO PAULO. Estado, 1975), que se tornou contraproducente justamente pela falta de integração com outros setores de intervenção, tendo sido reformulada pela Lei 9.886 de 1997 (SÃO PAULO. Estado, 1997). A falta de infraestrutura adequada de coleta e tratamento do esgoto, com lançamento nas redes naturais de drenagem de águas pluviais e com consequências para o abastecimento, muitas vezes impactado pela eutrofização de reservatórios e a ocupação de áreas ribeirinhas, assim como o aumento da vazão de cheias devido à alta taxa de impermeabilização, exigem a gestão integrada e adaptativa, dada a complexidade existente e o desafio frente à dificuldade da previsão do desempenho das intervenções implantadas.

A „adaptação‟ humana a inundações formulada por White (1945) traz outro conceito atual em drenagem urbana e manejo de águas pluviais: a necessidade de convivência com a água. Esta e outras tendências de uma adaptação a riscos de inundações são apresentadas no Quadro 4.

Em seus enunciados, os autores tratados nesta seção evocam a importância da relação entre as questões relativas ao técnico-científico e aquelas relativas ao sociopolítico. Por outro lado, anunciam, em sua conceituação, a dificuldade que se apresenta ao separar questões técnico- científicas das consideradas relativas ao sociopolítico.

Com efeito, são formulações sobre uso e ocupação do solo, questão intrinsecamente conectada às decisões por gestores na administração pública, às decisões por políticos em seus foros de decisão,

e às decisões por empresas públicas e privadas. Adaptação humana revela que o técnico-científico amputado do sociopolítico não é suficiente. A adaptação humana e a flexibilização da gestão adaptativa e os arranjos propostos para se passar da „drenagem‟ para o „manejo sustentável de águas pluviais‟ na gestão integrada, incluem relacionar todos os níveis dos atingidos por inundações. A reflexão sobre o humano, o papel do cidadão na convivência com a água, o uso de medidas estruturais sustentáveis, os arranjos institucionais para resolver o problema da poluição no lugar onde esta é gerada, sugere a integração entre a sociedade civil, os profissionais e os esforços da gestão pública.

Visão Tradicional Tendências

Drenagem Manejo sustentável da água urbana

Visão higienista Visão ambiental

Afastar a água Conviver com a água

Rio como conduto Rio como ambiente de lazer, contemplação, desenvolvimento de ecosistemas

Canalizar Reter, armazenar, retardar, infiltrar, tratar, revitalizar, renaturalizar Gestão isolada Gestão integrada: esgoto, abastecimento, lixo, meio ambiente, uso e

ocupação. Investimentos dependem

do orçamento Cobrança pelo serviço

Controle da poluição:

sistema separador Controle da poluição: sistemas unitários ou mistos, tratamento águas primeira chuva. Atenção apenas para

medidas estruturais

Atenção também para as medidas estruturais sustentáveis e não estruturais.

Quadro 4 - Tendências em drenagem e manejo de águas pluviais Fonte: Yazaki, 2009.